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Quarta-feira, 9/1/2002
Por ser uma menina má

Julio Daio Borges




Digestivo nº 63 >>> É, antes de tudo, lamentável que Cássia Eller tenha morrido. Mas a nossa imprensa prefere alimentar debates secundários, como a viciada discussão sobre drogas, ou como e quanto Cássia Eller ingeriu de cocaína e de álcool para terminar onde terminou. No primeiro caso, como fez Veja, polariza-se a questão em torno dos mesmos argumentos: de um lado, os defensores da moral e dos bons costumes, entoando slogans no estilo “eu bem que te avisei”, ou resumindo toda a história pelo viés simplificatório da campanha “drugs kill”; do outro lado, lógico, os simpatizantes das ditas “substâncias tóxicas”: valentes na hora de teorizar sobre a liberação, mas covardes na hora de assumir que o consumo pode ter conseqüências fatais. No segundo caso, o da autópsia, o da Folha de S. Paulo, os idiotas da objetividade não vão sossegar enquanto não se descobrir quantos miligramas foram inalados e quantos espasmos e choros a cantora vivenciou antes do desfecho final. Na correria pelo furo e pelo “jornalismo verdade”, os méritos artísticos de Cássia Eller sequer foram mencionados. Provavelmente, os plantonistas de “Brasil” não tinham como avaliar, embora citem displicentemente um certo CD “Acústico”. Cássia Eller foi uma das mais importantes – se não a mais importante – intérprete de Cazuza (outro roqueiro maldito, que acabou como sinônimo, não de overdose, mas de Aids). Ela vinha se afirmando como um dos pilares da geração dos anos 90, ao lado de compositoras como Marisa Monte (mainstream de mais) e Zélia Duncan (mainstream de menos). Já era cult, há anos, entre os seus pares, “a artista dos artistas”, mas só desfrutou de popularidade graças a uma parceria do formato vitorioso “unpplugged” da MTV com a produção de Nando Reis, o faro “pop” mais apurado dos Titãs. Toda a obra dela está à espera, para ser inventariada. Isso se a seção “policial” deixar de invadir a seção “cultural”, e se os jornalistas abandonarem as suas penas de precisão cirúrgica.
>>> Cássia Eller
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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