busca | avançada
105 mil/dia
2,0 milhão/mês
Terça-feira, 21/10/2003
Minto, logo existo

Julio Daio Borges




Digestivo nº 146 >>> Fellini é mesmo um grande mentiroso, conforme o documentário em cartaz por estas plagas. Aliás, um dos melhores momentos é quando Donald Sutherland (para os mais jovens, o pai de Kiefer Sutherland), aparece para desmascará-lo, dizendo que destratava os atores, pondo-se histérico no set de filmagem, passando por cima do roteiro e tirando cenas literalmente da cartola. É sabido que os gênios não são as pessoas mais afáveis e democráticas do mundo (se o fossem, não imporiam sua vontade – seguiriam a maioria e sucumbiriam, como quase todo mundo, à mediocridade). O diretor do documentário, Damian Pettigrew, inclusive, percebeu os estratagemas de Fellini para mentir e mentir, ao longo de décadas, e enfiando-lhe a câmera na cara, nos seus últimos anos, tentou pegá-lo “no contrapé”. Conseguiu? O resultado é discutível. Existem sobre Fellini documentários melhores. Como “Entrevista com Fellini” (2000), que esteve por aqui durante a 24ª Mostra (na Sala UOL), e que até Ignácio de Loyola Brandão prestigiou. Afinal, qual o segredo de um bom documentário? Não ser totalmente veraz... e mentir um pouco. A injunção jornalística de Damian Pettigrew torna “Fellini – sono un gran bugiardo” (2002) excessivamente investigativo, o que não combina com seu protagonista e até cansa um pouco. São obviamente destaques os trechos do mestre italiano dirigindo, com seu inglês limitadíssimo, comandando como num balé os movimentos da câmera. Nega veementemente o “improviso”, embora não faltem testemunhos sobre o seu estilo um pouco caótico de conduzir as coisas. O produtor conta que, para trabalhar com ele, era necessário estar preparado, porque Fellini exigia somas vultuosas e mudava constantemente de idéia (desperdiçando montanhas de dinheiro) sem pestanejar. Algo que é confirmado por Roberto Benigni, que reforça: diante de “il maestro” ninguém questionava nada, pois ele tinha o direito de ser quem era, e ponto. O comportamento absolutista de Fellini é, desta vez, o grande destaque – e não, surpreendentemente, o próprio.
>>> As mentiras verdadeiras de Federico Fellini
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

busca | avançada
105 mil/dia
2,0 milhão/mês