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Quarta-feira, 19/11/2003
Samba da benção

Julio Daio Borges




Digestivo nº 149 >>> Os 90 anos de Vinicius de Moraes estão passando sem grandes novidades. Um fonograma rearranjado aqui, um documentário recauchutado acolá. As homenagens chovem no molhado, citando, pela milésima vez, os trechos decorados: “...que seja eterno enquanto dure”, “as feias que me perdoem...”, “...o cachorro engarrafado”, etc. e tal. José Castello, o biógrafo, disse diferente em “Continente Multicultural”: o músico matou o poeta, que, desde então, é muito ouvido e pouco lido. Tem razão. Embora o problema seja de uma época (e não só do Brasil), que fica na superfície, no “slogan”, nas frases mal-acabadas, nas histórias mal contadas. Quem leu alguma coisa a respeito deve ter encontrado, por exemplo, inúmeras versões para a lenda dos muitos “Vinicius de Moraes” (em detrimento de um único “Vinicio de Moral”; uma piada sem graça, afinal). Enfim. As palavras ainda estão muito derramadas; as vozes, muito embargadas; os juízos críticos (se é que os há), suspensos pela amizade. Para quem duvida, basta confrontar a opinião de João Cabral de Mello Neto, ressuscitada durante a comemoração. Para o autor de “A Educação pela Pedra”, Vinicius teria sido o maior de todos (os poetas), não fosse o chamamento da sereia da música. Até um ouvido pouco afeito ao canto se deixou levar pela malemolência do Poetinha. Não só não teria sido (o maior de todos), como não foi. João Cabral errou; como erram muitos, em seu sentimentalismo de boas intenções. Lógico: não há como resistir aos apelos do Vinicius “hippie”, com os cabelos escorrendo “nazarenos” (no dizer de Ruy Castro), entre Tom Jobim e Miúcha, esquecendo a letra de “Garota de Ipanema”. Porque é irresistível a sua figura folclórica, quase “santa” (no dizer de Sérgio Cabral). Amém. Saravá. Talvez tenha sido mesmo, como Oscar Wilde, um artista “da vida”, mais que “da arte”. E os que conviveram com ele (ou que conviveram com “os que conviveram”) postergam por mais 90 anos o julgamento de sua obra.
>>> Vinicius 90 Anos
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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