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Quarta-feira, 31/12/2003
Melhor ser filho da outra

Julio Daio Borges




Digestivo nº 155 >>> Os jornalistas são hoje os grandes contadores de histórias. Num tempo em que a literatura perdeu sua “utilidade” e muito do seu apelo, são os jornalistas que verdadeiramente falam aos corações dos leitores. Quem duvida que eleja os três livros mais importantes de 2002-2003. Alguém discorda de que sejam os de Elio Gaspari, colunista da Folha, sobre a Ditadura Militar? E em matéria de “gênero”, qual foi o grande divisor de águas no panorama das letras brasileiras nos anos 90? A biografia; de Ruy “O Anjo Pornográfico” Castro e Fernando “Chatô: O Rei do Brasil” Morais. Os nossos maiores “escritores” (não-jornalistas) são de épocas passadas: Rubem Fonseca e Dalton Trevisan, apenas para citar dois (nascidos, ambos, em 1925). Por essas e por outras que o livro “Cale-se” de Caio Túlio Costa, ex-editor da “Ilustrada”, ex-diretor do UOL, salta aos olhos e já se coloca como um dos principais lançamentos de 2003. Faz parte do “portfolio” da nova editora Girafa (“cabeça nas nuvens / pés no chão”), comandada por Pedro Paulo de Sena Madureira – uma lenda do mercado editorial brasileiro; responsável (entre outras coisas) pelo portentoso catálogo da Nova Fronteira, de Carlos Lacerda. Caio Túlio Costa revisita a politizada USP do início dos anos 70, quando estudantes sofriam prisões arbitrárias, por acreditarem ainda na “luta armada” (como forma de combate ao regime de exceção, que se instalou de 1964 a 1983). Caio Túlio, que viveu exatamente o mesmo período (exatamente na mesma universidade), reconstitui os 70 dias entre a prisão, tortura e morte de Alexandre Vannucchi Leme até o corajoso show de Gilberto Gil na Escola Politécnica (em que cantaria, pela primeira vez, a proibida “Cálice” [dele e de Chico Buarque] – daí o título do volume). A saga de Vannucchi Leme, a atuação (por vezes, clandestina) de seus companheiros de “ALN” (Ação Libertadora Nacional) e o retrato de uma USP anos-luz da atual são o ponto de partida para a recriação de uma atmosfera de “idealismo”, “sonho” e obviamente “desilusão”. O que fica, ao final das 350 páginas, não é a mensagem política, “desse” ou “daquele” grupo (30 anos depois) – mas as brumas de um tempo que se foi, e que não volta. Ao qual temos acesso, agora, graças aos escritos de Caio Túlio Costa. Mais do que do jornalismo, não será essa também a função da literatura?
>>> Cale-se - Caio Túlio Costa - 350 págs. - Girafa
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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