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Segunda-feira, 22/11/2004
Mongólia

Julio Daio Borges




Digestivo nº 202 >>> E os escritores continuam desconfortáveis em sociedade... Se antes não eram reconhecidos, e reclamavam, sentiam-se como párias. Como extraterrenos – algo que se costuma admirar com um interesse zoológico, mas de um ponto de vista antropomórfico. Acontece que os escritores, de repente, deixaram de ser ficção e tornaram-se objeto de diversas honrarias. As mais bizarras, como experiência, são as premiações literárias. Os escritores arrastam-se pelas paredes como lagartixas e se esgueiram quando há um ameaça concreta de contato físico. Muitos nem comparecem às cerimônias de entrega. Outros desfilam com o ar aviltado por ter perdido, e desaparecem o mais depressa possível. Não foi diferente na celebração do II Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira. Apesar de toda a pompa e circunstância (Vinicius de Moraes, Nelson Motta e Júlia Lemmertz), as grandes estrelas da noite não foram propriamente os vencedores, mas, sim, os principais executivos da Portugal Telecom. E não por culpa desses últimos; mas por inabilidade dos primeiros. Marcelo Mirisola, um dos concorrentes, avançava apressadíssimo por entre as fileiras – num temor que misturava: a possibilidade escassa de ser reconhecido e a ameaça iminente de anonimato completo. Já Décio Pignatari, outro concorrente, sabendo-se vencido, desvencilhava-se de mãos efusivas, que o obrigavam a parar, enquanto arrastava sua senhora rumo à saída. Certos estavam os que agiram com fleuma – e levaram o cheque e a estátua. Diante da chance de abocanhar um dos troféus, Sérgio Sant’Anna, entre bandejas de canapés, desviava de si as expectativas: “Tá difícil... Tá difícil...”. Segundos depois, transmutava-se para o telão – onde, do palco, via-se que ficava com o 2ª lugar. No preâmbulo, Carlos Lyra diluiria o alto teor literário do encontro, com histórias do Poetinha, e Olívia Byington iria além das medidas, ao cantar mais que o recomendável. O comentário geral, sobre sua performance, seria: “Podia ter ficado em 3 ou 4 músicas...”. Enfim, tirando a falta de tato dos nossos pares, foi uma homenagem justa às letras nacionais. Sem confundir literatura com MPB, os jurados não incensaram, mais uma vez, Chico Buarque; e, sem embarcar nas vanguardas-que-já-não-são, deixaram os Irmãos Haroldo de fora. Malgrado, portanto, a falta de traquejo do escritor médio brasileiro, a coisa vai ficando cada vez mais séria e interessante.
>>> Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira 2004
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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