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Quarta-feira, 9/2/2005
Dormindo com o inimigo

Julio Daio Borges




Digestivo nº 213 >>> A monogamia passa por uma reavaliação. Desde que Freud abriu as comportas da sexualidade, os relacionamentos passam por uma reavaliação. A liberação dos anos 60, na verdade, cobrou seu preço e o amor livre, que não se implementou 100% (mas quase), produziu uma nova geração de desorientados. Não que devam retornar o moralismo e a hipocrisia – isso não –, mas os repentes da nova relação homem-mulher, pelo menos, quebram a cabeça de casais até hoje (sem esperança de solução). E pelo que se pode depreender de exemplos recentes, como o filme Closer (Perto Demais), os questionamentos entraram numa nova fase. A fase da traição (palavra forte), das ligações ilícitas (juridicamente falando) ou das experiências de uma relação aberta, quase aberta ou aberta na prática. Mike Nichols, um subproduto de Bergman (digam o que disserem os entusiastas), quer provar que todo mundo tem o seu lado podre ou algo de podre, no que se refere à própria sexualidade. Desejos inconfessos, realizações para se envergonhar, comportamentos anômalos. São os baixos instintos (antigos) e ou as trevas (como Nélson Rodrigues preferia chamar). Bem, então o diretor sugere que desde o freqüentador de prostíbulos e de chats pornográficos até o escrevinhador metido a sensível, desde a stripper até a fotógrafa sofisticada, todos são humanos e todos agem mal, não importando quem são na vida real. Todos traem, todos podem ser promíscuos e todos ferem uns aos outros com palavras em nome da “verdade”. Apesar de pouco profundo, até grosseiro na apresentação, o longa é desconfortável (e assim instigante) porque – por mais que não se aceite aquilo como realidade – tripudia em cima do até então sagrado valor da fidelidade e da lealdade. Tudo em nome de uma certa coerência consigo próprio e com os próprios sentimentos (chavão). A mesma que atira desconhecidos de rua para uma vida em comum e que transforma uma sessão, de trabalho profissional, numa aventura afetivamente aterradora. A única conclusão proveitosa a se tirar é a seguinte: num mundo amoral (e não imoral, necessariamente), resta apenas a ética particular. Quem não conseguir forjar a sua, e principalmente resistir nela, está condenado ao descontrole dos apaixonados crônicos.
>>> Closer
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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