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Quinta-feira, 15/9/2005
São Francisco Xavier I
Julio Daio Borges

Mais uma vez descumpri a minha promessa de blogar diretamente do local do crime. O Leitor que me perdoe. Mas, também, que se prepare, porque São Francisco Xavier foi o ápice da Era dos Festivais. Nunca coletamos tanto material. Quando digo "coletamos" não me refiro apenas à equipe do Digestivo Cultural (ou até me refiro), mas me refiro sobretudo a mim e a Carol. Eu, com dados; ela, com imagens. Sem brincadeira, daria pra montar uma revista. Ou uma grande reportagem (quem sabe, um dia desses, realizo o sonho de abrir uma seção de reportagens no Digestivo Cultural...). Seria um bom começo, mas agora não dá. Vamos ao que interessa afinal.

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O convite para São Francisco Xavier surgiu através da Patrícia Ioco, do Photozofia. A idéia dela e do Sandro, seu marido, era realizar a segunda edição do Encontro de Cordas da Mantiqueira ("Mantiqueira", eu aprendi, quer dizer "Montanha que Chora", em tupi guarani). Recebi o release num dia de semana e como havia o interesse, meu e da Carol, de conhecer São Francisco Xavier, propus à Patrícia a cobertura do seu Festival de Música, citando os exemplos de Campos do Jordão, de Búzios, de Rio Preto e da Flip. Ela se mexeu para conseguir uma pousada, a Kolibri, e também conversou com os restaurantes locais - ao final, tínhamos uma programação completa para o feriado. Fomos.

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Saímos na quinta-feira, dia 8, pela Carvalho Pinto em direção a Campos do Jordão. A Carol tinha aquele guia Fuja de São Paulo, da Folha, que eu lhe dei de presente anos atrás, e, graças a uma pequena confusão, escolhemos o caminho mais longo para São Francisco Xavier, depois de nos aconselharmos com a polícia rodoviária, que forneceu um segundo mapa, para a alegria da Carol (ela é mulher-mapa). Passamos por Quiririm, por Santo Antônio do Pinhal e por Monteiro Lobato até chegar ao nosso destino final. Demorou uma hora a mais: 3h30 em vez de 2h30 (o que seria o normal se seguíssemos por São José dos Campos). Não me lembro da primeira impressão da cidade agora...

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Antes de passar na Patrícia (e no Sandro), e no Photozofia, partimos direto para a pousada, pra descarregar o carro etc. A Kolibri, antes de ser uma indicação da Patrícia, tinha sido também, por coincidência, uma indicação do seu Lechner, cliente da Carol (a Carol, além de fotógrafa oficial do Digestivo Cultural, é arquiteta). A Fred, dona da pousada (seu nome, aportuguesado, seria, como disse o Rao - outro "local" -, Frederica, mas "Fred" é como ela prefere ser chamada...), a Fred nos surgiu como um alemã risonha, amigável, cheia de idéias e artista plástica ainda por cima (vem também daí sua sensibilidade e sua iniciativa em nos alojar). Ficamos, para o encanto da Carol, no que ela divertidamente chamou de "estrebarria" ("estrebaria", de cavalos, mas considere os dois erres por conta do sotaque alemão). A Fred, e seu marido, e sua família, que administram a Kolibri, converteu (converteram) a antiga sede - uma fazenda - adaptando as construções originais. Então, dorminos, simpaticamente, numa linda ex-baia para cavalos. A fotografia, mais ou menos, explica.

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Fora isso, a Fred nos contou que veio, com seu marido, de Hamburgo para Santos (ele trabalha em portos, claro). Chegaram ao Brasil e foram ficando, ficando... Até que descobriram São Francisco Xavier e tiveram idéia da pousada Kolibri. A Fred nos mostrou, através de um tour, a recepção, o refeitório, a sala de música (seu marido toca piano), mas o que mais me despertou interesse foi sua sala de leitura (ou biblioteca). Meus olhos foram direto para sua coleção da Pléiade francesa (tenho alguns volumes mas, observando os dela, lembrei, na hora, das aulas do Milton Hatoum sobre Flaubert). Havia, ainda, livros em português (óbvio), em espanhol, em inglês e em alemão (talvez em mais alguma língua que eu não tenha detectado...). Conhecemos, ainda nesta primeira noite, os gatos da Fred e os cachorros. A Carol gostou, particularmente, da Soquete, que pediu para subir no colo dela - então a gatinha, que parecia um cobertor, bateu na porta da nossa "baia" nas noites posteriores. Às vezes, abrimos; às vezes, não.

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Nossa próxima parada foi, óbvio, o Photozofia, a razão inicial da nossa vinda. Encontramos a Patrícia e o Sandro. Ela nos contou que ambos se conheceram graças a um trabalho na rádio Cultura (de São Paulo); ela vinha de Santo André, ele vinha da Argentina. Alimentavam o sonho de criar os filhos fora da metrópole paulistana e o projeto de inaugurar um restaurante, com espaço para shows e exposições, veio à tona com a idéia de mudar para São Francisco Xavier. Nasceu o Photozofia em 2000. É muito difícil comparar com qualquer lugar de São Paulo. (As fotos dizem alguma coisa...) O destaque, a meu ver, é a cara que o Sandro conferiu à sua casa de espetáculos: cheia de materiais reciclados, muitos de demolição, como as estruturas de ferro, as mesas igualmente, e o lustre que foi da BM&F. No Photozofia, são vendidos, ainda, CDs de músicos independentes e são servidas brusquetas maravilhosas (nesta primeira noite já pudemos experimentar...).

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A Patrícia nos contou, ainda, que a idéia do Festival de Música, Encontro de Cordas na Mantiqueira, surgiu numa conversa nas mesas do Photozofia, em que participavam, obviamente, o Sandro e o músico Braz da Viola. Desde a abertura da casa noturna já havia um fluxo constante de artistas, principalmente vindos de São José dos Campos, que procuravam um lugar para se apresentar e encontravam abrigo no espaço que a Patrícia e o Sandro erigiram. Além do Festival, ficamos sabendo que a cidade sedia ainda uma mostra de artes, para os realizadores locais, e inclusive assistimos a uma seqüência de fotos em que desfilavam os artistas e as obras devidamente clicados na última edição (eu e a Carol conheceríamos cada um deles nos dias subseqüentes...).

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Nossa última parada, nesse primeiro dia, seria a pizzaria Caboclo, uma indicação da Patrícia. Lá conhecemos o Donizette, a Vilma e o Guilherme - também uma família que trabalha unida: ele fazendo as pizzas, ela atendendo às mesas e ele, o filho, servindo. Todos muito simpáticos, contaram que a pizzaria começou como um hobby nos finais de semana, que se consagrou e que ganhou fama. Donizette, que trabalha originalmente em construção civil, de segunda a sexta-feira, foi inclusive convidado para abrir uma pizzaria nos mesmos moldes em São Paulo, mas não aceitou: "Pra quê? Pra ficar rico e ser seqüestrado? Eu, não!". (Eu e a Carol adoramos essa justificativa...) Na verdade, uma das razões para o sucesso da sua pizza é um suporte onde a mesma, depois de assada, não esfria (por causa de uma pedra específica - Donizette, prometo que não conto o segredo, tá?). Imperdível. Pena não termos tido tempo para voltar e comer a versão doce da mesma pizza...

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(Continua aqui...)

* fotos de Ana Carolina Albuquerque

Julio Daio Borges
15/9/2005 às 17h12

 

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