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Sexta-feira, 5/5/2017
On the Road, 60 anos
Luís Fernando Amâncio


Em 05 de setembro de 1957, a Viking Press lançou On the Road – Pé Na Estrada, segundo livro de Jack Kerouac. A publicação se deu após sete anos de recusas e com alterações no texto original, pois os editores consideravam o manuscrito impublicável. Por exemplo, para não atrapalhar seu fluxo de escrita, Kerouac não utilizou parágrafos enquanto redigia o texto. O livro é o relato das viagens feitas pelo autor entre 1947 e 1950, cruzando os Estados Unidos de costa a costa, incluindo uma ida ao México. Os deslocamentos foram feitos de modo precário, através de caronas e ônibus, ou em carros dirigidos a altas velocidades por Neal Cassady. O romance foi escrito em três semanas.

On the Road foi, de imediado, bem recebido pela crítica. Também foi um sucesso de vendas. É considerado por muitos o grande livro da Geração Beat, termo usado para classificar autores como William S. Bourroughs (Almoço Nu), Allen Ginsberg (Uivo e Outros Poemas), Gregory Corso, Gary Snyder, dentre outros. É um livro sobre a liberdade, a representação literária de uma geração de autores que inspirou a contracultura, o movimento hippie, músicos e artistas em geral. O cinema, por exemplo, tem um gênero de filmes, os roads movies, cuja gênese está atrelada ao romance. Até hoje, turistas que cruzam fronteiras experimentando diferentes culturas com mochilas nas costas têm dívida com Kerouac.

Passadas seis décadas desde a publicação do livro, faço a pergunta: será que a obra envelheceu?

Posso dizer sobre minha experiência com On the Road. Li o livro pela primeira vez no fim do ensino médio. Era um garoto, mais jovem do que os protagonistas. O efeito da leitura, claro, foi arrebatador. Não tanto por seu teor subversivo – sexo, psicotrópicos, bebidas... O que chamou a minha atenção era a história simples, com personagens se lançando pelas estradas para experimentar a vida.

O livro me marcou. De forma que, apesar de ter tanto para ler e assistir (já falei nisso aqui), me permiti fazer uma releitura do On the Road, quase 15 anos depois de conhecer a obra. Para justificar a empreitada, aproveitei o convite da amiga Lívia Torquetti para comentar o livro em seu podcast, Chá das Cinco Com Literatura.

Reler o livro tantos anos depois foi, claro, uma experiência diferente. Sobretudo por eu, leitor, ter mudado bastante nesse tempo. Pude observar aspectos que não tinham me chamado a atenção na primeira leitura, como a ebulição social daquele Estados Unidos ainda marcado pela segregação racial – o jazz era o ritmo que embalava as viagens – e a posição bastante marginal das mulheres da Geração Beat.

Sobre esse ponto, é válido observar que a adaptação cinematográfica do romance, dirigida pelo brasileiro Walter Salles Jr. em 2012, trata a situação com alguma sensibilidade. Embora a narrativa esteja focada nas viagens dos amigos Sal Paradise e Dean, há cenas sutis que mostram o desamparo de Marilou e Camille, mulheres de Moriarty, diante de sua personalidade hedonista.

O cartaz do filme

Mas se há algo que a releitura de On the Road me fez concluir é: se alguém envelheceu nessa história, fui eu, não o livro. A narrativa de Kerouac ainda soa poderosa, seu ritmo frenético é avassalador e suas descrições de personagens, paisagens e experiências, seguem excelentes. E por mais que o mundo não seja o mesmo do pós-Segunda Guerra Mundial, o conflito entre impulsos individuais e a rigidez das normas sociais segue atual. E, afinal de contas, um bom livro jamais envelhece.

Luís Fernando Amâncio
Belo Horizonte, 5/5/2017

 

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