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2,0 milhão/mês
Segunda-feira, 5/5/2008
Edney Souza
Julio Daio Borges

Como blogueiro, Edney Souza ficou conhecido por faturar algumas dezenas de milhares de reais por mês, com o InterNey.net. E, há pouco mais de um ano, ficou também conhecido, junto com Alexandre Inagaki, por lançar o hoje mais importante portal de blogs da internet brasileira, o Interney Blogs. Um dos seus objetivos principais é remunerar os blogueiros participantes da iniciativa, desenvolvendo um plataforma sólida, que permita crescimento ilimitado e profissionalização sem precedentes.

Edney ou "Interney", como também é chamado, não é, contudo, um neófito na área. Formado em Processamento de Dados pelo Mackenzie em 1997, trabalha com programação de computadores desde 1990, foi analista de sistemas da Microsiga, chegando a coordenador e gerente de sistemas da Divicom em 2005 — quando descobriu que faturava mais com seu próprio
site do que com o salário da empresa. Desde 2004, é sócio-administrador da InterNey Informática e um dos empreendedores atualmente mais lembrados da Web brasileira. Isso tudo com pouco mais de 30 anos.

Nesta Entrevista, Edney relembra os primórdios da internet: "Há dez anos, se você não encontrasse o que estava procurando, você simplesmente ia lá e criava". E faz, também, algumas previsões: "Conhecimentos de computação serão obrigatórios em todas as áreas no futuro". Sobre a nuvem de incompreensão que paira sobre a blogosfera brasileira, observa: "A maioria dos jornalistas não entende do que estamos falando". Mas, em termos publicitários, adverte: "Para alguns segmentos de mercado, o papel e a TV não são mais opções viáveis". Aposta, ainda mais, no crescimento dos
blogs: "Existem muitas pessoas que dariam ótimos blogueiros, porque têm histórias incríveis para contar". E reserva um único conselho para os iniciantes: "Se eu tivesse de indicar uma direção, apostaria em conteúdo de qualidade". — JDB

1. Edney, você estourou em fevereiro do ano passado, com o Alexandre Inagaki e o Interney Blogs, mas eu, obviamente, sei que a sua história vem de longe na internet. Pesquisando na sua auto-entrevista, descobri que você foi uma daquelas pessoas que montou uma homepage no Geocities, em 1997. Eu estava me formando, como você, naquele ano, e tinha colegas também tentando montar páginas no mesmo lugar — então eu me lembro bem do espírito da internet brasileira naquela época... Eu tenho certeza de que as pessoas olham para você, agora, e imaginam: ou que você é mágico (para viver do InterNey.net); ou que você pegou algum atalho (como se a internet fosse uma espécie loteria, para afortunados) — quando eu sei que não é nada disso. Analisando seu currículo profissional, a gente percebe que tem dez ou mais anos de trabalho com sistemas (e Web) por trás do seu sucesso... Enfim, por que a internet ainda é tão mal compreendida, até como business, no Brasil?

Dias atrás me perguntaram o que era internet, para um TCC de faculdade. O Bruno Accioly me encaminhou a pergunta e depois colocou algumas respostas em seu blog. Na minha definição: "A internet é uma rede de pessoas mediada por computadores, ou uma rede de computadores operada por pessoas. Depende da versão do usuário".

Eu estou acostumado com pessoas usando computadores desde 1989 e trabalho com eles desde 1990, então, na minha cabeça pré-internet, os computadores tinham um papel bem definido. Quando tive meu primeiro contato com a Web em 1995, eu entendi que aquilo não era simplesmente um conteúdo compartilhado, vindo de outro computador — era um conteúdo que alguém havia colocado lá.

Talvez a forma como se deu meu primeiro contato influencie muito a compreensão que eu tenho da Web: o primeiro site que acessei foi da rádio 89FM, eles tinham colocado on-line uma mini-biografia e discografia de uma série de bandas de rock. Na época, a gente pegava discos emprestados para copiar a música em fita cassete e "xerocava" os encartes (quando saia uma revista Bizz especial, a gente copiava as letras das músicas preferidas...). Naquele momento, me veio na cabeça que a internet iria mudar tudo isso e, na minha cabeça também, as pessoas iriam trocar entre si essas informações on-line.

Eu olhei a internet como uma rede social desde o início. Por isso, inclusive, gostava daquela metáfora de endereço do Geocities: você entrava numa cidade, numa rua e num número, meu endereço era www.geocities.com/SiliconValley/Way/3255.

Antes de olhar a Web como business, é importante entender como as pessoas passam o tempo delas on-line. A indústria de parques de diversão, por exemplo, não vive de fazer os brinquedos, vive de produzir entretenimento: eles sabem que as pessoas vão fazer fila naquele brinquedo; se não tiverem certeza disso, o prejuízo é certo. O baixo custo de se fazer um site gerou uma porção de tentativas mal-sucedidas de se marcar presença on-line — e, em poucas empresas, isso evoluiu para algo mais substancial. A maioria delas simplesmente abandonou a internet, dizendo que não funciona para o próprio negócio — quando, na verdade, não entenderam como ela funciona de fato...

2. Quando a gente fala em 1997, as pessoas esquecem que os blogs — os primeiros blogs — estavam nascendo e que quase não havia páginas dinâmicas: para ter um endereço na internet, uma URL, o sujeito tinha de, obrigatoriamente, "programar" em HTML. A grande novidade eram os GIFs animados, e era uma "glória" colocar uma musiquinha, breeega, de fundo... Hoje, a gente não consegue responder a todos os e-mails que recebe, perde todo dia algum tempo com spam, fica atrás de idéias para otimizar o desempenho do site, estuda sempre novas estratégias de monetização, procura agradar, cada vez mais, o Google... Mudou muito, não mudou? Eu queria que você falasse se, na sua opinião, foi importante participar desses primórdios (no fim da década de 90) ou se, na história da computação em geral, existe sempre aquele tom nostálgico, típico dos pioneiros que começaram uma determinada coisa (o PC, a Web, os blogs)...

Naquela época, se você não tinha algo, você criava — hoje, se você não tem algo, você fica dias vasculhando na internet até encontrar; porque você tem certeza de que alguém já fez. Feliz ou infelizmente, o buraco é mais embaixo. Falta muita coisa na Web ainda e pouca gente toma a iniciativa de criar. Esperamos que o Google resolva todos os nossos problemas quando, na realidade, poderíamos resolver muitos deles sozinhos (ou com a ajuda de amigos próximos).

Esse sentimento de "copiar" e "colar" é também o grande culpado pela ausência de sites nacionais adequados às necessidades do público brasileiro. O Digg, por exemplo, faz sucesso lá-fora? Então se criam cópias aqui! Uma série de sites nacionais copia os americanos em tudo e se esquece de que os brasileiros têm necessidades diferentes... Em função disso, um número muito reduzido de players — que têm criado ferramentas legitimamente nacionas consegue destaque...

Apesar de entender que participar dessa primeira era consolidou conceitos importantes, hoje não tenho nenhuma saudade da "Web estática", dos monitores pequenos e da internet por linha discada...!

3. Em 2006, a Sílvia Mello, na ECA, produziu um trabalho sobre o Digestivo, onde concluía que o futuro "profissional da era da informação", do conhecimento, da internet enfim, vai precisar ter um forte background em sistemas/ computação. Se a gente olha para os fundadores do Google, do Yahoo!, da Microsoft e da Apple, e para grande parte dos empreendedores da chamada "Web 2.0", essa máxima se confirma em quase 100% dos casos. Você, para mim, é um exemplo acabado nesse sentido, no Brasil — e eu vivo dizendo, aos jovens jornalistas do Digestivo, que eles têm de olhar para a internet, se quiserem respostas profissionais, e não para as redações de papel (que vão acabar)... É sabido e notório que a tecnologia é um fator crítico para a economia de qualquer país, mas, depois da internet — que mudou o jornalismo, a música, o cinema, a política, as relações humanas, o comércio... —, parece que essa certeza se intensificou ainda mais. Você aconselharia todo mundo a ser um pouco analista de sistemas, como você sempre foi, ou estou exagerando?

Eu acredito que o meu papel, e de outros profissionais de tecnologia também, é tornar a Web simples o suficiente para todos os outros profissionais aproveitarem seus recursos sem a necessidade de conhecimentos técnicos avançados. Mas não posso negar que entender como sistemas de computador funcionam dá uma enorme vantagem competitiva...

É como organizar informação: os melhores sistemas utilizam uma série de conceitos de biblioteconomia — e eu acho isso fundamental para quem quer organizar conteúdo —, mas muita gente ignora o valor desse conhecimento...

Conhecimentos básicos de computação, lógica e biblioteconomia, com certeza, serão obrigatórios para profissionais do futuro, assim como todos têm hoje noções básicas de Física, Química e Matemática (mesmo que não venham a trabalhar com Engenharia, por exemplo). Creio que precisamos retomar o chamado "colegial técnico"; inclusive com a troca de matérias elementares por aquelas que a nova economia pede...

4. E eu gostei de ver você, no ano passado, debatendo com o Pedro Doria, no auditório do Estadão, em defesa dos blogueiros que foram, inegavelmente, injustiçados por aquela campanha publicitária da agência Talent. Ainda assim, eu achei que — mesmo tendo gente como você lá — eles não "captaram" a mensagem. Pareceu uma espécie de concessão paternalista, por parte do pessoal do jornal: "Ah, vamos ver quem são esses blogueiros, o que eles têm a dizer (se é que eles têm alguma coisa)...". Para mim, independente do discurso do mérito jornalístico (que é altamente subjetivo e do qual os jornalistas nunca vão abrir mão), o que estava em questão, ali, era que você já tinha um modelo de negócio e eles, ainda, não. E para piorar a situação, o Estadão não teve nem a capacidade (administrativa até) de perceber isso... Outro dia eu disse, num Encontro do Digestivo, que essa discussão me cansa, porque, como numa Torre de Babel, ninguém parece falar a mesma língua — você, quando conversa com jornalistas, não tem igualmente essa impressão?

Depois de ter tantos amigos jornalistas, eu creio que aprendi a língua deles — mas, tirando os jornalistas que me são próximos (ou próximos de outros blogueiros), a maioria não entende do que estamos falando. Da mesma forma que a maioria da blogosfera — sem quase nenhum contato com jornalistas — não sabe quais são as reais preocupações deles com essa transformação que hoje vivemos, no mundo da comunicação.

Alheias a tudo isso que discutimos, existem, por exemplo, as donas de casa, criando comunidades no Orkut e blogs, para encorajar umas às outras, em seu dia-a-dia, suas dietas, trocando experiências na criação dos filhos etc. — será que elas estão preocupadas com coisas como credibilidade, reputação, remuneração e modelo de negócio?

A reputação dessas donas de casa vêm do fato de que elas se conhecem pessoalmente. A reputação que construí no InterNey.Net começou quando algumas pessoas, de repente, seguiam as dicas que eu dava e conseguiam resolver seus problemas com informática — essas pessoas indicavam para outras, e foi havendo, nesse caso, uma "transferência de reputação". O jornal se distanciou da população e vive da transferência de reputação do papel — só que a receita do on-line não paga a estrutura off-line, que sustenta essa reputação. É a resposta para esse último enigma que eles têm de encontrar nos próximos anos...

5. A ficha dos blogs já caiu, há tempos, fora do Brasil, antes da Web 2.0 (2005), antes até da explosão do Google (2001)... Mas, aqui, a sensação é a de que estamos tentando, ainda, explicar, para as pessoas, a "Web 0.0": os banners, as newsletters, os links... Você fez fama ao saber tirar o melhor proveito de programas de afiliados (como do Google, do MercadoLivre, do Buscapé...), onde o grande trabalho é de programação, colocando os robôs para funcionar, e faturando comissões a partir das ações das pessoas no seu site. Ao criar o portal Interney Blogs, no entanto, você e o Inagaki passaram um pouco para o lado da publicidade mais tradicional (ou tentaram), onde essa mentalidade atrasada, sobre a internet, pesa. Eu queria saber se vocês estão conseguindo civilizar (ou "sensibilizar") o mercado com os resultados que o InterNey.net sempre apresentou, ou ainda é mais fácil ganhar dinheiro com as ferramentas automáticas do que com as agências de publicidade? Todo mundo usa o Google, mas, na hora de anunciar, a inércia aponta para o papel — vocês também sofrem com isso?

Lançamos em fevereiro deste ano a Blog Content. Um dos motivos para a criação dessa empresa de consultoria foi a grande procura de agências, empresas e assessorias de imprensa que, de repente, precisavam de uma "mãozinha", para fazer com que a publicidade on-line desse certo... Para alguns segmentos de mercado, o papel e a TV não são mais opções viáveis: o consumidor dessas empresas está 100% on-line — então: ou elas se entendem com o meio on-line ou fecham suas portas. Além disso, a audiência de jornal, revista, rádio ou TV é sempre muito concentrada: você faz um planejamento com poucos veículos e já cobre uma audiência muito grande. Na Web, a audiência é fragmentada e os players de reputação ainda não são conhecidos em todos os nichos...

Nosso trabalho, além de orientar as empresas, é "mapear" a blogosfera. Portanto, tem de ser feita uma "aculturação" de ambos os lados, para que se entendam. Ainda há muitas coisas que precisamos corrigir, no próprio InterNey.Net (e que pretendemos resolver ainda este ano...). Existe uma série de ações acontecendo neste momento, mas posso resumir a resposta com: "Sim, estamos conseguindo civilizar (e sensibilizar) ambos os setores, sobre modelos publicitários de sucesso na chamada Web 2.0".

6. Você, rapidamente (na minha opinião), partiu para um servidor dedicado, e eu sei que vocês têm, no site, visitantes-únicos na ordem das centenas de milhares por dia... Há algumas semanas, eu ouvi uma entrevista com o fundador do Internet Archive (e do Alexa) e ele, mais ou menos, contestava a teoria do Long Tail: para ele, o problema da internet é que, aproximadamente, dez sites aglutinam o fluxo de 20% de toda a Web. Ou seja, alguns ganham muito dinheiro, e o resto ganha pouco ou nenhum dinheiro. Não quero colocar você nem o InterNey.net numa situação difícil, apenas quero saber se, no seu caso também, as receitas só se tornaram significativas a partir das dezenas de milhares de visitantes-únicos por dia... E, caso seja assim, se você acredita que é mesmo custoso para um blogueiro, independente, romper com essa barreira (a não ser que ele conheça tanto de tecnologia quanto você etc.).

O InterNey.net certamente só se tornou rentável a partir de um milhão de visitas/mês. Muita gente tem um blog rentável com menos que isso, mas é uma estrutura prestes a entrar em colapso, devido a um baixo investimento em servidores, e uma história que eu já vi se repetir dezenas de vezes (e parece absurdo que ninguém ainda tenha documentado isso): o blogueiro muda para um servidor de baixo custo, incrementa seu blog, ele faz sucesso, o blogueiro começa a faturar bem e melhora ainda mais... — até que chega um momento em que aquele servidor não comporta sua visitação; ele tem de mudar para um muito mais caro (que ameaça o lucro do blog); nesse ponto, entra num período de estagnação ou morre.

Esse foi um dos motivos para criação do Interney Blogs, criar "escala" e compartilhar conhecimentos de tecnologia, e marketing, com todos os blogueiros participantes. Na minha opinião, a saída mais fácil para um blog lucrativo ainda é criar reputação para vender produtos e serviços: conheço bastante gente que vive muito bem da reputação criada pelo blog. Como o Cristiano Dias, com o seu Vilago, por exemplo.

7. Essa declaração desse mesmo sujeito explicaria por que existe tanto trabalho "a fundo perdido" na internet, e, ao mesmo tempo, por que existe um Google — que é a empresa que mais rápido cresceu na História. Enfim, em termos de internet, eu também quero saber se você continua otimista ou se às vezes é pessimista, temendo a dominação de um Google, de uma Microsoft... Hoje, a internet ainda é uma das plataformas mais interessantes para se montar um negócio, lançar uma iniciativa, até "mudar o mundo" (digamos assim) — mas será que ela permanecerá desse jeito por muito tempo (aberta aos "entrantes", de baixo custo, altamente competitiva)? Mesmo porque uma das diferenças entre o boom dos anos 90 e esse dos anos 2000 é que as novas empresas/iniciativas de internet, de Web 2.0, não abrem mais capital na bolsa — recebem investimentos de fundos também, mas para serem adquiridas por um Google, por um Yahoo!, ou até por uma Microsoft... Quer dizer: quando uma nova coisa cresce na internet dos anos 2000, ela cresce para ser vendida e não para competir com os gigantes... Isso não te preocupa?

Existe muito espaço na Web para serviços personalizados, a Microsoft e o Google oferecem uma versão fast-food, drive-thru — agora, se você quiser comer comida de verdade, tem de ir a um bom restaurante, que não é uma multinacional, nem tem centenas de empregados, mas que vai muito bem, obrigado.

Sobre o trabalho a fundo perdido, considero o Google AdSense um ótimo exemplo disso. Os blogueiros se esforçam para conseguir cada vez mais cliques, em vez de efetivamente vender os produtos anunciados. Como a lógica é a de gerar cliques, o anunciante não obtém muito retorno (pois as pessoas só clicam; não compram), assim ele acaba diminuindo o valor do clique... Ao receber menos por clique, o blogueiro faz um esforço ainda maior, a fim de que seus visitantes cliquem sempre mais... Isso gera um círculo vicioso, que impede os anúncios de pagar valores mais razoáveis.

Aos poucos, estou trocando, no InterNey.net, toda a publicidade via AdSense por outras ferramentas... O Google tem capacidade de sobra para corrigir esse problema da noite para o dia: basta permitir que o editor do blog defina um lance mínimo (pelo clique), valorizando, ainda, os resultados obtidos via CPA (custo por ação) em vez do CPC (custo por clique) — mas será que o Google tem mesmo interesse em corrigir isso?

Com tantas empresas sob a batuta do Google, certamente falta visão — a mesma visão que, antes, deu ao Google oportunidade de explorar um terreno que a Microsoft ainda não havia enxergado; e que dará oportunidade, a outros, de tomarem o lugar do Google, no futuro...

8. Aliás, vamos falar de negócios agora: já bateram na porta do InterNey.net querendo comprar? Pelas suas receitas, eu apostaria numa oferta na ordem dos milhões de reais... Suposições à parte, você é um empreendedor do tipo Web 1.0 (que quer ser grande) ou do tipo Web 2.0 (que quer ser adquirido por alguém maior)? Eu às vezes penso que, fora os portais (que são de empresas tradicionais de mídia ou de telefonia), nós não tempos mais, no Brasil, os grandes players da Web 1.0. Nacionais, quero dizer — temos, aqui, o Yahoo!, o Google, já tivemos a America On Line... Mesmo veteranos como o Submarino e o Buscapé não parecem ter o poder, proporcionalmente, que um Yahoo! tem, nos Estados Unidos, que um Google tem... Era mais para imaginar quem compraria o InterNey.net (considerando, claro, que as empresas de mídia, das "famílias", estão cegas para os blogs como o Estadão está)... O Julio Hungria, do Blue Bus, disse que esse pessoal todo (Globo, Abril, Folha...) vai sumir e que gente como você vai perdurar. O que acha? É muita responsabilidade?

Quando decidi largar minha vida como executivo para me tornar empresário, minha principal preocupação era tornar o InterNey.net algo estável, em que eu pudesse investir meu tempo e ter rendimentos até o fim da minha vida...

O Interney Blogs, apesar de ter sido pensado como um negócio à parte, nunca teve uma possível venda no horizonte, como parte de sua estratégia... Igualmente não pensei em transformá-lo num grande grupo de comunicação — creio que há um meio termo aí, onde o Interney Blogs pode ser algo equivalente a um grande jornal ou a uma grande revista (na prática, ele tem audiência maior do que muitos jornais e revistas por aí...).

Hoje minha principal missão é fazer com que o Interney Blogs consiga remunerar todos os seu blogs (o que ainda não ocorre). Mas, mesmo quando chegar nesse ponto, não vejo, como muito atrativa, a venda — já que o modelo de negócios atual remunera o blogueiro com 80% dos lucros gerados por seu blog; ou seja: não tenho funcionários; tenho, na verdade, sócios pro resto da vida...

Será que os grandes grupos vão desaparecer? Eu sei que alguns estão planejando sua presença on-line há anos, mas a maioria está no caminho errado (ainda que haja tempo para mudar de direção...). A quem insistir no erro, só restará mesmo a extinção. O maior erro, a meu ver, é colocar pessoas que não usam a Web com freqüência (que não são internautas, de fato) para decidir o rumo das estratégias on-line... Por outro lado, as pessoas com expertise o suficiente, para colocar esses grupos novamente na rota certa, preferem trabalhar em empresas estrangeiras ou por conta própria... Os velhos grupos de mídia se acostumaram a ter profissionais bajulando o tempo todo, atrás de vagas (em suas redações do passado) — mas chegou a hora da humildade e de, justamente, fazer o caminho oposto.

9. Voltando um pouco aos blogs, eu queria que você fizesse um balanço da atuação de vocês, na blogosfera brasileira, desde o ano passado, desde o lançamento do portal. Fora todo o barulho, e uma tonelada de e-mails de blogueiros (pedindo para fazer parte do projeto), o que você acha que o Interney Blogs acrescentou à paisagem internética? Descontando a Talent (e o Estadão), pensa que os blogs são mais respeitados no Brasil hoje? E os blogueiros, debaixo do guarda-chuva de vocês, como se sentem (depois deste ano de atividades)? Estão mais felizes com seus blogs? Estão mais realizados em sua vocação de blogueiros? Alguém mais, fora você e o Inagaki, já está conseguindo viver 100% de internet? Extrapolando um pouco o cenário, você imagina um portal vertical, no Brasil, como o Weblogs, Inc.? Ou, de repente, ter um Engadget (ou um Boing Boing), aqui, já não é suficiente? Eu estou te cutucando porque as pessoas que não lêem a internet em outras línguas, provavelmente, nem entendem o que vocês estão tentando fazer...

O Interney Blogs tinha um projeto inicial de atividades que ainda não foi concluído — fazer uma avaliação, agora, seria considerar que eu planejei algo específico para um primeiro ano de atividades, quando, na verdade, não o fiz... Eu planejei, sim, um conjunto de ações e imaginei que, quando concluídas, todo mundo teria uma remuneração respeitável por seu blog. Como eu ainda não encerrei esse primeiro ciclo, não creio que possa supor que haja alguma satisfação adicional dos participantes do projeto... Eu espero, claro, que, no fim, eles estejam mais felizes — mas, hoje, ainda não sei dizer e nem creio que é o momento oportuno para especular.

O lançamento do Interney Blogs, de forma direta ou indireta, inspirou a criação de outros portais de blogs, e o surgimento de diversos novos blogs. Com certeza, os blogueiros brasileiros, em geral, passaram a ser mais respeitados: não só pela presença que eu o Inagaki temos tido na mídia, mas pela oportunidade que diversos outros blogueiros (não apenas do Interney Blogs) têm tido para falar de diversos assuntos...

Minha principal preocupação, inclusive, não é pegar um blogueiro "mediano" e transformá-lo em um blogueiro "de sucesso". Na minha humilde opinião, todos os participantes do Interney Blogs já são blogueiros fantásticos — mas ainda existe um grande universo de leitores, lá fora, que não sabe disso... Em contrapartida, existem muitas pessoas (especialistas em diversos assuntos) que dariam ótimos blogueiros — pois têm histórias incríveis para contar, e conteúdo relevante para debater na Web.

Sinceramente, para concluir, eu acho o Engadget e o Boing Boing sobrevalorizados, eles deram certo mais porque a audiência deles não depende exclusivamente do mercado americano — é mundial. No Brasil, um blog em língua portuguesa tem um alcance diferente... Então, tem de ter outro estilo e foco.

10. Última e clássica pergunta: que conselhos dar ao jovem interneteiro que deseja trabalhar com essa plataforma tão fascinante? O que, na sua formação, foi mais importante (para você chegar onde chegou)? E o que, na sua experiência anterior, foi mais importante? Você acha que os cursos de graduação em tecnologia, por exemplo, estão preparando os jovens para entender o Google, para monetizar seus sites, para lidar com as limitações de infra-estrutura no Brasil? Ou os professores ainda preferem ficar ensinando a velha teoria da comunicação? Quando você vai montar o seu curso para blogueiros e empreendedores interessados? Ou, também na sua opinião, o sonho de todo brasileiro é ser funcionário público (Caetano Veloso), e esse papo de probloggers é apenas mais um modismo em nosso País? Se o Edney Souza começasse de novo, ele faria alguma coisa diferente ou não mudaria nada em sua trajetória?

Se eu mudasse algo em minha trajetória, acho que nada daria certo! Escrever bem é fundamental para ter um blog; conhecer tecnologia é também fundamental para torná-lo acessível ao máximo ("legível" para todos os browsers, sistemas operacionais, mecanismos de busca, agregadores, etc); conhecer o mercado é igualmente fundamental, para "formatá-lo" comercialmente. Se eu tivesse que indicar uma única direção, apostaria em conteúdo...

Os cursos de graduação em tecnologia não preparam o profissional para absolutamente nada atualmente. Os últimos estagiários que contratei (ainda como gerente) tiveram de ser treinados "do zero", para exercer suas funções. A faculdade dá uma base que poderia facilmente ser dada, eu repito, em um curso colegial técnico...

Existem planos para cursos, com a minha marca, sim, mas por hora não tenho nada a declarar!

Probloggers, com certeza, são um modismo. Eu, por exemplo, nunca me considerei um "problogger". Blogueiro "profissional" tem de ter algo mais na bagagem, senão fica igual a jornalista: sabe escrever bem mas não conhece a fundo nenhum assunto. Na verdade, termina pior que jornalista, porque a média dos jornalistas escreve e apura razoavelmente bem — já a média dos "blogueiros profissionais" não sabe escrever, nem sabe o que é apurar uma informação...

Existem blogueiros "amadores" com muito mais competência que os probloggers de plantão; por isso, volto a dizer: se eu tivesse de apostar numa única coisa, apostaria em conteúdo.

Para ir além
InterNey.net

Julio Daio Borges
São Paulo, 5/5/2008

 

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