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Sexta-feira, 20/4/2007
Digestivo nº 325

Julio Daio Borges

>>> CONTAR TEM UM PREÇO Depois de quase se esterilizar como escritor, por causa da experiência suicida com o Teatro da Vertigem, Bernardo Carvalho retoma sua trajetória como romancista em O sol se põe em São Paulo. Apesar do título, e da capa (bonita) cinza, não se trata de denuncismo social (estilo “experimental” Geração 90); nem de pontos de vista dos marginalizados-“autores” (Ninguém é inocente em São Paulo e afins). Pobre São Paulo, como tema terminou associada, na literatura contemporânea, com o que há de pior no Brasil: as desigualdades, o caos social, os maus escritores. Pobre paulista, que tem de aturar tudo isso (e que ainda tem de se sentir “representado” por esses arrivistas). Bernardo Carvalho, um carioca, felizmente não caiu nessa armadilha. Seu livro, pelo contrário, talvez seja, até agora, a melhor tentativa em literatura de registrar as marcas da imigração japonesa, que produziu – em São Paulo – a maior colônia de japoneses fora do Japão. E mais difícil do que captar o clima da Paulicéia, e algumas vezes do interior de São Paulo, Carvalho mergulhou na tradição do romance japonês moderno para, justamente, reconstituir o ramo da história que começa, evidentemente, no Japão, para desembocar, aqui, entre nós. O livro termina sendo um belo teaser para autores como Tanizaki, que Bernardo Carvalho elogiou tanto, num dos lançamentos em São Paulo. Cheia de reviravoltas emocionantes, a história de mal-entendidos, que remonta à Segunda Guerra Mundial e até ao último imperador, revela que por trás da cordialidade e da contenção dos nossos imigrantes japoneses pode haver um histórico de paixões, desastres e, sim, resignação. Ainda em São Paulo, Carvalho se queixou de ter de responder, na época do vestibular, a questões sobre a Mongólia (título de seu romance anterior). Não deveria se espantar, portanto, se, a partir de agora, o procurarem para falar... do Japão. Afinal, em O sol se põe em São Paulo, um pouco da alma do País do Sol Nascente foi, efetivamente, retratada.
>>> O sol se põe em São Paulo
 
>>> FÊNIX Pedro Mariano, no auge de sua carreira ao lado do pai (na época do CD Piano & Voz, ainda pela Trama), declarou sua admiração por Jorge Vercilo, que, segundo ele, vinha de uma carreira de mais de dez anos e estava então estourando. Descontando um exagero ou outro (a carreira, por exemplo, era de menos de dez anos), a aposta estava correta, num cenário em que estreava, justamente, “Maria Rita”, e a MPB vivia um vácuo também sem Marcos Sacramento. Vercilo foi criticado pela Veja como “cover” de Djavan, mas o próprio Djavan, via participação em faixa bônus, não se incomodou e até incentivou. Muitos hits, muitas telenovelas e minisséries depois, Vercilo chega a São Paulo, para lançamento do seu CD (e DVD) Ao Vivo, no Tom Brasil Nações Unidas, tendo batido Pedro Mariano, que hoje desponta para o anonimato, e tendo emplacado uma composição, em parceria com Ana Carolina (refeita dos ataques de Dori Caymmi), no elogiado CD Pirata, de Maria Bethânia. Tudo bem, difícil soar mal na boca de Bethânia no auge da maturidade, mas difícil, igualmente, negar que Vercilo vem se esforçando para fugir da antiga pecha de “genérico”, muito embora a beatlemania das fãs lhe permita atualmente mandar uma banana para o cânone musical do Brasil (leia-se: legado da MPB). Entre sério (momento “Luz do Sol”, de Caetano Veloso) e festeiro (“Que nem maré”, “Monalisa” e a nova “Vela de acender, vela de navegar”), Vercilo está ensaiado com uma banda afinadíssima e pode até escolher: quer continuar sendo um artista popular ou quer amadurecer numa outra vertente? Depois do fogo-fátuo de Chico César e Daniela Mercury nos anos 90, a batida MPB encontra uma nova chance de ressurreição, talvez a última, antes da aposentadoria dos Pais Fundadores. Vercilo caminha nessa direção?
>>> CD | DVD
 
>>> LITERÁRIA, COLORIDA, SONANTE, TROPICAL Hoje, na imprensa-impressa, as entrevistas parecem todas iguais. Não têm nada do entrevistado, muito menos do entrevistador. Mas houve um tempo em que, nessa área, a imprensa-impressa dava das cartas. E publicava entrevistas de jovens de 23 anos como Maria Ignez Corrêa da Costa Barbosa. Gentíssima, o livro relançado pela Ateliê Editorial, quase quarenta anos depois, é a prova viva de que, tudo bem, o Rio de Janeiro era mais rico em personalidades, mas, também, o jornalismo era melhor porque arriscava mais. Maria Ignez entrevista praticamente o século XX, de Salvador Dalí a Juscelino Kubitschek, de Guimarães Rosa ao Barão de Itararé, de Nara Leão a Henry Moore. Admira que ela ainda esteja viva, para contar a história; e não admira que mereça a orelha dupla de Pedro Corrêa do Lago (seu primo mais novo) e Carlos Eduardo Lins da Silva. Da edição original de 1968, Gentíssima mantém o prefácio de João Cabral de Mello Neto e acrescenta, por exemplo, a entrevista com Érico Veríssimo. Maria Ignez continua escrevendo bem, depois de quase quatro décadas longe do jornal, e aborda a questão-chave, inescapável depois da leitura: se era tão brilhante, tão precoce e tão reconhecida, por que abandonou o ofício de todo? Maria Ignez, no auge da inteligência e dos 20 anos, dedicaria um exemplar a seu futuro marido na noite de autógrafos, e ele, diplomata como o pai dela, afastaria a intrépida entrevistadora do jornalismo e a levaria pelo mundo afora. Tão intrigantes quanto suas bem elaboradas perguntas é a indagação maior sobre o que Maria Ignez poderia ter sido e não foi. Gentíssima, felizmente, ressurge para inspirar toda uma nova geração digital. Que os vinte e poucos anos de Maria Ignez Corrêa da Costa Barbosa contaminem os vinte de bloggers e outros mais.
>>> Gentíssima
 
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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