Quarta-feira,
8/2/2012
Wikipedia And The Death Of The Expert, by Maria Bustillos
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 485 >>>
A Wikipedia, como um dos maiores símbolos da internet, se tornou alvo de ataques periódicos. A pretensão de uma enciclopédia feita por qualquer pessoa era quase uma afronta ao Iluminismo de Diderot e D'Alembert. Talvez o erro tenha sido usar, justamente, a palavra "enciclopédia", mas a internet, e a tecnologia, sempre tomaram emprestados termos do velho mundo (off-line), renovando-os. Um site, originalmente do inglês, não é mais somente um "lugar" ou local geográfico. Uma webpage é quase a contradição de uma página impressa. E o e-mail está, hoje, muito distante da definição de "correio eletrônico" (o que quer que isso possa ser, ou tenha sido...). Voltando à Wikipedia, um dos maiores ataques à sua pretensão de "enciclopédia" tem como alvo seus "erros" (no sentido mais amplo do termo). Mostrar que um enciclopédia ― outrora, o suprassumo do conhecimento de qualquer civilização ― está errada é, supostamente, invalidá-la por completo. Uma enciclopédia errada é, aparentemente, como um professor que não sabe a sua matéria; como um expert que tropeça na própria especialidade; como um profissional que ignora os rudimentos de seu ofício. Pois bem, em 2006, a revista Nature, percorrendo verbetes aleatórios da Wikipedia e da Britannica ― máximo tradicionalismo em termos de enciclopédia ―, constatou que o número de erros na Web era... tão grande quanto... no papel! Foi um choque. Mas o mundo sobreviveu; e o establishment intelectual aprendeu a lidar com o fato. De modo que, em sua primeira década, a Wikipedia se consolidou, deixando de ser proibida como citação em trabalhos sérios, para se tornar uma ferramenta últil no dia a dia de milhões de pessoas. Tendo isso tudo em vista, Maria Bustillos, escritora, publicou um dos melhores ensaios de 2011... sobre a Wikipedia. Bustillos começa aproximando a internet, berço da Wikipedia, de Marshall McLuhan, o gênio canadense que, no século XX, proclamou que o meio era a mensagem. Bustillos nos conta que McLuhan se formou em Cambridge, pegando um momento, nas letras inglesas, em que, para variar, não se acreditava que nada de útil estivesse sendo produzido. Os acadêmicos que lecionavam naquela época pregavam, abertamente, que não valia a pena ler os contemporâneos e que era mais proveitoso passar a vida inteira se preparando para ler John Milton, um autor do século XVII. McLuhan foi atrás de outro mestre, F. R. Leavis, que, confrontando o status quo, ousava aproximar, de Milton, poetas como Pound e Eliot. Apoiada em biógrafos e estudiosos, Maria Bustillos acredita que, nesse ponto, McLuhan começou a duvidar das noções convencionais de "autoridade" e "especialidade". O que isso tem a ver com a Wikipedia? Tem a ver que, pela primeira vez desde o advento de Gutemberg (e sua prensa), com a Wikipedia (e a internet) estamos subvertendo a noção de que o conhecimento vem "de cima para baixo", que a audiência só deve escutar passivamente e que a "autoria", até etimologicamente, deve rimar com autoridade. McLuhan pregava que a palavra impressa, ao substituir a tradição oral, criara a noção do conhecimento quase como inspiração divina, diminuindo a importância de uma cultura humana compartilhada. E o Romantismo cristalizaria a ideia do gênio criativo individual... Fala, então, Clay Shirky, em uma entrevista concedida à mesma Maria Bustillos: A química surgiu da alquimia. Mas evoluiu ― ao contrário da alquimia ―, porque, justamente, os químicos abriam seu conhecimento para que ele fosse testado por seus pares. Esse conhecimento, portanto, só era válido, quando pudesse ser comprovado por outros, e, não, quando permanecia encerrado por segredos, mistérios ou fórmulas mágicas. É a noção de ciência. Assim, Bustillos fecha o ciclo: A Wikipedia é importante não porque tenha versões definitivas de cada verbete, ombreando-se com outras enciclopédias clássicas como a Britannica, mas, sim, por ― nas suas discussões, na construção de cada verbete e no vaivém de opiniões diferentes ― apostar num processo dialético, talvez numa nova teoria do conhecimento, evocando os primórdios da nossa ciência. Por fim, McLuhan impregnou o ar com o germe da dúvida, sobre o conhecimento "pronto e acabado". Apostou numa expressão mais adequada à nossa época, a da "galáxia de insights". Seria ela a internet? A Wikipedia? As redes sociais?
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Julio Daio Borges
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