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Quinta-feira, 12/8/2010
Digestivo nº 468

Julio Daio Borges

>>> NÃO CONTEM COM O FIM DO LIVRO, UMA CONVERSA COM UMBERTO ECO Entre os livros que discutem, justamente, o "fim do livro", o melhor, em português, até agora, tem sido Não contem com o fim do livro (Record, 2010), transcrevendo conversações entre Umberto Eco e Jean-Claude Carrière, que trabalhou com Luis Buñuel e Peter Brook. A presença do semiólogo e autor de O Nome da Rosa (1980) e O Pêndulo de Foucault (1988) se justifica, afinal, Eco tem sido um dos principais eruditos a discutir o fenômeno da internet desde o início. Já Carrière, embora homem de teatro e de cinema, tem uma bagagem literária invejável e, ao contrário do que poderia parecer, não defende a "civilização de imagens" preconizada por McLuhan. Fora que o título do volume, ainda que chame a atenção nas livrarias, não corresponde ao seu conteúdo com precisão. Contrariando, mais uma vez, as expectativas, não se trata de um libelo contra os novos "leitores eletrônicos", da Amazon e da Apple, nem mesmo de uma visão apocalíptica sobre a ascensão do Google, ou mesmo de um ataque à suposta "literatura" (ou ao suposto "jornalismo") praticado em blogs. Não contem com o fim do livro, à maneira de Borges, faz uma belíssima defesa da leitura, da cultura e da civilização, abordando o livro como objeto, mas também com conceito e como ferramenta humana, imperecível, na visão de Eco. Séculos ou até milênios de História desfilam nas conversas entre Carrière e o semiólogo, num nível que a própria discussão, avançadíssima, sobre os formatos eletrônicos para leitura, nos EUA, ainda não alcançou. É o velho continente - e, não, o novo - discutindo o que os suportes digitais significam para o Homem, no sentido mais amplo, e, não, para os jornalistas, escritores ou publishers. Talvez as elucubrações de Eco e Carrière não alterem em nada o curso da tecnologia, mas sua perspectiva é fundamental em termos humanísticos. Não contem com o fim do livro deve, portanto, ser lido tanto por quem ama os livros quanto por quem já se acostumou à ideia do desaparecimento do objeto físico "livro".
>>> Não contem com o fim do livro
 
>>> COLEÇÃO MPBABY, PELA MCD A música piorou muito. Correção: a música, que circula no mainstream, piorou muito. Com a ascensão do CD, e de estilos como "lambada", "sertanejo", "axé" e "pagode", nos anos 90, a indústria fonográfica vendeu como nunca e nivelou por baixo, como nunca também, a programação das rádios e as atrações musicais da televisão. Nos anos 2000, com a ascensão da internet e a falência do CD, as majors arranjaram a desculpa, que estavam há muito procurando, para não mais investir em qualidade, bajulando a ascendente classe C (da era Lula) e despachando os "medalhões" para os pequenos selos (relegando, ainda, os jovens talentos à obscuridade do Long Tail)... A saída, para quem quer evitar armações musicais da década de 2010, é não circular por ambientes públicos com música (mesmo praias), evitar, a todo custo, a frequência das principais FMs, fugir como o diabo da TV aberta e abandonar, inclusive, as seções culturais de revistas e jornais — que ou divulgam "todo mundo", sem nenhum critério ("procura-se críticos musicais"), ou dão o milionésimo destaque a Roberto Carlos e... Ivete Sangalo. Dado o presente estado de coisas, como introduzir uma criança na música de qualidade, se as velhas referências estão em ruínas e as novas não tiveram tempo ($) ainda para se consolidar? Para quem não quer se limitar aos Baby Einsteins da vida — que até fazem releituras interessantes, em marimba, de monstros como Bach, Mozart e Beethoven — existe, no Brasil, a coleção MPBaby, da MCD. Tudo bem, a nossa música não se restringe apenas ao cancioneiro a partir dos 60, mas "MPB", no caso, é menos um conceito fechado que uma sigla de fácil assimilação (por parte do consumidor). O volume dedicado ao forró, por exemplo, tem desde Luiz Gonzaga ("Olha pro céu", "Numa sala de reboco"), sem e com Humberto Teixeira ("Assum preto" e "Asa Branca"), até clássicos de domínio público, como "Mulher rendeira" e "Cai cai balão" ;-) Gilberto Gil, merecidamente aliás, não fica de fora, com "Lamento sertanejo", e nem Dominguinhos, com e sem Gil, em "Tenho sede". O resultado, muito cuidadoso, é propiciado pelo acordeom e pelos arranjos de Toninho Ferragutti. É óbvio que não vamos salvar as criancinhas, para sempre, do contato, inevitável, com a grande mídia decrépita da nossa época, mas não custa repetir que existem alternativas, mesmo em terrenos aparentemente perdidos, como o da música.
>>> MPBaby: Forró
 
>>> VIRAL LOOP, DE ADAM PENENBERG "Coeficiente de viralidade" e "marketing viral" são duas das expressões mais utilizadas por marqueteiros e publicitários "2.0" na internet, mas, até agora, não havia nenhum livro que se debruçasse, especificamente, sobre os aspectos "virais" da Rede. Adam Penenberg, colaborador de revistas com Economist e Fast Company, resolveu, como ninguém, estudar os maiores fenômenos de "viralidade" da internet, a saber: Netscape, eBay, PayPal, Hotmail, YouTube e Facebook (entre outros). Mas, em vez de contar sua história pela milésima vez, Penenberg estudou o crescimento desses produtos, empresas e sites sob a ótica de sua adesão exponencial, sem precedentes e com resultados inimagináveis. Tanto que algumas das iniciativas não vingaram, pois não souberam, justamente, administrar seu crescimento, como o Friendster (o pai de todas as redes sociais). Outras lutaram, até o final, pela sobrevivência, e deram prejuízo, até serem vendidas (por cifras astronômicas), como o mesmo PayPal (ao eBay) e o YouTube (ao Google). E outras ainda lutam, contrariando até os prognósticos do próprio livro de Penenberg, como o Ning (que reviu toda a sua estratégia recentemente, decidindo cobrar de seus usuários). O fato é que Viral Loop, título da obra de Adam Penenberg, foi absorvido pela intelligentsia da internet, e deve se tornar, ele próprio, uma expressão, como se tornaram Long Tail e Crowdsourcing (entre outras). A questão econômica - de expandir sua base de usuários até o infinito (criando "bolhas") ou de crescer só organicamente (à la capitalismo "old school") - permanece. A opção, do empreendedor de internet, de explodir em audiência, e arcar com as consequências (em termos de infra-estrutura), é extremamente pessoal, e Viral Loop pode ajudar na decisão.
>>> Viral Loop
 
>>> JORGE DREXLER, EM AMAR LA TRAMA, O SHOW NA VIA FUNCHAL Jorge Drexler não cabia em si de alegria por ter, pela primeira vez no Brasil, desembarcado com sua banda completa, nem que fosse para um única apresentação, na Via Funchal. Das outras vezes, o músico uruguaio havia passado pelo Bourbon Street, na formação de trio, basicamente conduzindo o show com suas "guitarra y voz" (como, aliás, cantou). E Amar la Trama, a turnê atual, de fato exigia mais infraestrutura, com arranjos para banda, e uma presença, indispensável, de sopros. Em termos de performance, no entanto, o grupo todo no palco, e talvez o nervosismo de se apresentar para uma plateia tão grande, engessaram Drexler até, mais ou menos, a metade do setlist. O músico e seu conjunto não decepcionaram, abrindo com versões corretas para "Una canción me trajo hasta aquí" e "3000 millones de latidos", mas soaram um tanto quanto protocolares e só começaram a "se soltar" quando, justamente, Drexler reassumiu seu violão e até improvisou um momento de intimidade, lixando as próprias unhas. "Sampa", traduzida e em ritmo de tango, comoveu, mais uma vez, os incautos (é um truque que Jorge Drexler usa para saber quantos novatos há na plateia). O ápice da ovação, contudo, teve lugar quando o músico uruguaio anunciou a participação de um compositor brasileiro, que muito admirava, e cujo disco ouvira durante todo o ano passado... — e todo mundo assoprou "Caetano Veloso", "Milton Nascimento", "Arnaldo Antunes", "Paulo Moska"... Eis que surge, para o deleite das novas gerações, Marcelo Camelo, sem Mallu Magalhães, pós-Los Hermanos. Jorge Drexler, então, prestou tributo à música brasileira, que tanto o influenciou, entoando "Doce Solidão" (inclusive o "tchu-tchu-tchu-tchu-tchu"), deixando a segunda entrada para o próprio autor da canção. O show ainda teve as sempre pedidas "Todo se transforma" e "Soledad", e a música de trabalho "La trama y el desenlace". Ficou-se, porém, aguardando um retorno de Camelo no bis (que não ocorreu). E saiu-se especulando se eles iriam direto para o Genésio ou se a parceria, de repente, renderia participação no segundo álbum de Camelo (em fase de gravação). Jorge Drexler, afinal de contas, está em rota de colisão com a MPB e não espantaria nada se ele, subitamente, trocasse Madrid por São Paulo ou pelo Rio de Janeiro.
David Durán Trejo
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Editor
 

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