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Segunda-feira, 10/3/2014
The Zen of Bennett, com Tony Bennett

Julio Daio Borges




Digestivo nº 498 >>> Existem artistas acima do bem e do mal? Se formos lembrar do Procure Saber, não. Mas, mesmo assim, Tony Bennett parece ter atingido essa categoria. Bennett mereceu a admiração de Frank Sinatra, gravou com Count Basie, forjou obras-primas com Bill Evans. E Tony Bennett sobreviveu para contar a história. É uma lenda viva. The Zen of Bennett retrata o artista do alto de seus 85 anos. Lúcido, sábio, produtivo. Como um mestre oral, destila pensamentos ao falar de simples ternos até lembranças de Ella Fitzgerald em família. O name-dropping, no seu caso, não é uma estratégia de marketing pessoal ― é a sua vida. Como um dos grandes nomes do jazz por décadas, é natural que tenha memórias com o who's who da música norte-americana. O "zen" do título, obviamente, sugere uma "filosofia de vida", mas o documentário não trata especificamente disso. Tony Bennett solta pílulas de sabedoria entre os duetos que grava com "vocalistas" de hoje. Para além da música, é interessante, por exemplo, a sua preocupação em salvar Amy Winehouse do vício. Eles se encontram; ele diz que vai falar com ela; mas Amy, como sabemos, não teve um final feliz. É interessante, também, como Bennett se deixa impressionar pelo estrelismo de John Mayer. Danny Bennett, seu filho, idealizador e produtor do filme, chega a sugerir que Mayer poderia "agregar valor" a Tony Bennett. Mayer acaba ficando mais por sua beleza e pela fama de conquistador inveterado... Lady Gaga, quem diria, surge desprovida de toda a parafernália. É um verdadeiro teste para ela. Norah Jones é simplória, quase uma fã, poderia solicitar um autógrafo. Nem parece a filha de Ravi Shankar. Andrea Bocelli requer mise-en-scène. Ambiciona domar o sotaque italiano. Pede ajuda. Já Willie Nelson entra mudo e sai calado. (Nem está no cast.) Aretha Franklin vale por sua trajetória. É preferível assisti-la, por exemplo, em Os Irmãos Cara-de-Pau. De Michael Bublé, quase nem lembramos... O fato é que ninguém faz feio perto de Tony Bennett. E o próprio não está ali para julgar. Vivido, não espera se deparar com nenhum grande talento. Ao mesmo tempo, respeita, escuta, é paciente e ensina o que aprendeu. No fundo, talvez pressinta que a grande era do disco não tem retorno. "Disco" é força de expressão. Poderia ser a "era dos grandes estúdios". Ou "das grandes gravadoras". Quem sabe, Bennett não envia um recado para a nova leva dos que se produzem, se divulgam e se espalham... Cita Duke Ellington. Numa conversa com um executivo da indústria, Ellington teria dito que seu trabalho era gravar música de qualidade. Vender essa música não era seu trabalho. Tony Bennett, quem diria, é um sobrevivente desse momento. Quase outra era geológica. Bennett ainda se deixa registrar como artista plástico em casa, em Nova York. Sua mente inquieta jamais pára. (Uma esposa, décadas mais jovem, não parece muito bem humorada...) Depois de Tony, é Danny, the producer, quem mais dá o ar da graça. Seu pai é um mito e, para lidar com isso, Danny usa e abusa do humor. Perante uma das maiores vozes desde o pós-guerra, simplesmente não tem como se levar a sério. Tony Bennett, mais que um músico, é uma dobra no tempo.
>>> The Zen of Bennett
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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