Inicialmente, quero me desculpar com quem me honra com o acesso a esse blog que ficou meio abandonado nos últimos meses. Em parte porque (reconheço) tenho me dedicado mais a outro blog com tema semelhante - o Fabio Gomes Foto & Cinema. Pretendo, a partir deste post, voltar a manter uma regularidade de publicações aqui também.
No post anterior, 10.049 km pelo Brasil, fiz um balanço da minha mais recente viagem pelo Brasil, que acabou em setembro do ano passado. A ideia, então, é fazer uma rápida atualização desses cinco meses.
Em setembro, tive um convite para exibir um dos meus curtas da série As Tias do Marabaixo, Tia Chiquinha, num evento no Rio de Janeiro. Porém houve contratempos técnicos que impediram a exibição, de modo que minha estreia como cineasta no Sudeste teve que esperar um pouco mais - foi em 11 de novembro. O curta Tia Biló, também da série d'As Tias, foi selecionado via edital para fazer parte da Mostra Cine Redemoinho, realizada no Instituto de Educação da Universidade Federal Fluminense, durante o 2º Congresso de Diversidade Cultural e Interculturalidade de Angra dos Reis (RJ). Mais que ser selecionado, meu curta teve a honra de abrir a mostra, sendo o primeiro a ser apresentado no primeiro dia, dedicado aos temas "Gênero, Sexualidades e Afrodescendência". Foi o único filme da Região Norte no evento, e também foi a primeira vez que um filme meu foi selecionado para exibição em uma mostra! Já em dezembro tive aprovada pela Casa de Cultura Mario Quintana a inclusão da exibição de todos os cinco filmes da série em sua programação de 2017 (datas serão anunciadas oportunamente).
Isto me prova que é preciso acreditar sempre e mandar o trabalho para todos os canais possíveis - o que não faltam são festivais no Brasil e no exterior. Nem cinema nem fotografia têm enfrentado a diminuição do volume de editais abertos, como tem acontecido com outras linguagens artísticas a partir da posse do atual governo federal.
Bueno, mas é evidente que não basta apenas se preocupar em exibir ou inscrever os filmes que você faça. É necessário estar sempre produzindo material novo. E por quê? Por causa da chamada "janela" dos festivais. Quando comecei a me inscrever regularmente em editais de cinema, no final de 2015, a maioria dos festivais aceitava produções feitas a partir de 2012 ou 13 (ou seja, filmes produzidos nos últimos dois ou três anos). Ao retomar essa prática, no final do ano passado, constatei que agora os festivais pedem filmes produzidos no próprio ano, quando muito no ano anterior! Ou seja, a "janela" diminuiu. Cheguei a comentar isso com um colega do curso de Introdução à Montagem Cinematográfica, ministrado por Renato Vallone no SESC Araxá (Macapá) em novembro; o colega falou que os festivais têm diminuído a janela devido ao aumento da produção independente, em especial de curtas. Se continuassem recebendo filmes de até três anos, o volume de material a ser analisado agora seria absurdo. Enfim, é compreensível, mas acaba de algum modo... eu não queria usar a palavra "prejudicando", mas enfim... acaba nos tirando da zona de conforto. Nós, cineastas independentes, precisamos ter em mente que, tão logo concluamos um filme, devemos inscrevê-lo logo em todos os festivais possíveis e imagináveis, porque muito possivelmente no ano seguinte ele já não será aceito.
Pensando nisso, tenho remexido meus arquivos em busca de material filmado que ainda esteja inédito (e acredite, tem muuuita coisa). Não importa se você filmou em 2014, se editar e lançar o material em 2017 ele será considerado um filme de 2017. Os primeiros frutos dessas remexidas nos arquivos viram a luz em outubro. São dois vídeos em que a Poeta Amadio declama dois poemas seus que fazem parte do CD Bem que Podia: Vê se Vê e Nuvem, filmados durante apresentação do grupo de que ela faz parte, o 3DNós, em novembro de 2015 em Porto Velho. A ideia é seguir editando novos curtas & vídeos ao longo do ano, seja para veicular na internet, seja para inscrever diretamente em festivais (alguns exigem ineditismo total para a inscrição).
A coleção Leve um Livro, que publica 60 mil exemplares por ano de livretos de poesia contemporânea, entrou na terceira temporada. Em janeiro, foram distribuídos os títulos do poeta mineiro Ricardo Aleixo e da pernambucana Micheliny Verunschk. Em fevereiro, foi a vez do mineiro Leo Cunha, conhecido pela literatura infantil, e da carioca Alice Sant'anna. Os livros impressos circulam na capital mineira, mas é possível baixar todos, inclusive de coleções anteriores, pelo site.
Neste sábado, 10, são comemorados os 50 anos de existência robusta do Suplemento Literário de Minas Gerais, jornal impresso criado por Murilo Rubião e outros escritores de uma geração que, justamente, em MG, ficou conhecida como "geração Suplemento". Como a desinformação impera e os holofotes são concentrados, é sempre bom saber que um dos - se não o - jornais literários mais longevos do Brasil estão aí pela meia idade. Valem os parabéns e uma espiada inspirada na versão digital comemorativa. A festa presencial será na livraria Ouvidor, em Belo Horizonte, na manhã deste dia 10 de fevereiro, a partir das 11h, com entrada franca e jornais para levar para casa.
O relevo em cimento "Shikasta" é inspirado em romance homônimo da autora Doris Lessing, Nobel de Literatura. Narra o desenvolvimento da humanidade a partir da intervenção de seres divinos.
A narrativa se desenvolve da esquerda para a direita, como uma história em quadrinhos. Ao mesmo tempo, o painel é dividido por uma linha horizontal entre duas seções, superior e inferior.
Na inferior, vê-se uma parábola da história humana, através do uso da tecnologia em benefício da guerra.
Na parte superior, vêem-se figuras aureoladas que, como fabula Doris Lessing, intervém pelo bem da humanidade.
Descritivo
Frontão em relevo de cimento com incrustrações de chapas cortadas de cobre, latão e ferragens.
Dimensões: 4 mt. x 2 mts. (8 m².)
Localização: Ibiporã, PR.
Data da realização: 1986
Costumava eu dizer que em 3 coisas nos EUA eram melhores que o Brasil: a constituição, os parques nacionais, e as faculdades de artes liberais.
Porque a constituição era respeitada, os parque incentivam a visitação, e as faculdades ensinam para os alunos. Fora isso, a diferença é a bitola mais larga do papel higiênico.
Agora que o regime do Agente Laranja está rasgando a Constituição, é forçoso substituir o 1o item pelo milho de pipoca, que nos EUA estoura todo sem deixar piruá.
Trabalhei neste painel durante 18 meses, aproximadamente.
Foi um período quase monástico para mim.
Entalhava diariamente, consumia muitas drogas.
Era um adolescente recém chegado de Nietzsche, Hermann Hesse e Dostoievsky.
Gostava da cultura grega.
O cheiro do cedro, o tac-tac do trabalho de "pica-pau" até hoje são lembranças muito emotivas.
Painel entalhado em pranchas de cedro.
Dimensões aproximadas de 18 m².
Localizado na cidade de Ibiporã, PR.
Realizado em 1982.
Estava com o rosto diante do espelho contando as rugas quando percebi algo
quase invisível se movendo.
Encostei o rosto até bem perto do espelho e me dei conta que havia um longo fio de cabelo no lóbulo da minha orelha direita.
Puxei o danado, gritei de dor.
Com o rosto abrasado, fiquei me perguntando por quanto tempo ele estava ali, sem que eu percebesse.
Por segundos insanos pensei em fazer com aquele fio de cabelo o mesmo que fazia com o cigarro nos tempos de fumante: puxar papo, conversar diversos assuntos.
Puxei novamente, a dor recuou porque já não existia a surpresa e no instante seguinte me preparei para dar fim ao incomodo, apanhei a tesoura e estiquei o fio até o fim, mas eis que reparando de perto, notei que o danado tinha um tom dourado.
Será que alguém vai acreditar que quando criança eu era loiro dos cabelos cacheados?
Talvez fosse o último remanescente dos meus tempos de cabelos cacheados e que tenha sobrevivido há mais de meio século.
Senti um inesperado apego por aquele fio de cabelo e até pensei em guardá-lo numa caixa de vidro.
Minha nossa, que louco é esse que guarda o fio de cabelo numa caixa de vidro?
Depois fiquei em dúvida se devia contar isso numa crônica.
Eis me aqui, decidido.
Devo declarar que desde muito moço sofro com a falta de cabelos.
Tenho cultivado ultimamente uma barba ralinha para disfarçar, que cuido com esmero, por vaidade e porque se tornou um motivo para eu ir a uma barbearia, costume que havia abandonado desde os anos noventa, quando os cabelos se foram e me tornei ligeiramente calvo.
Foi um tempo ruim, de repente, tudo despencou.
No começo, tentei disfarçar usando boné, mas não me acostumei, porque me pesava a cabeça e escondia os olhos.
Nunca entendi o sujeito que tem cabelos e usa boné.
Resolvi deixar para o outro dia o que fazer com o fio dourado. Quando acordei, corri para frente do espelho e procurei em vão o meu precioso fio dourado, mas notei apreensivo que só existia a maciez de sempre no lóbulo da minha orelha.
Será que durante o sonho puxei sem querer a ponta da orelha e o fio se soltou?
O que foi que sonhei, afinal?
Não me lembro de nada.
Mas recordei com riqueza de detalhes uma árvore imensa que existe bem à frente do colégio Dom Bosco, tão velha que deve ter visto de tudo, seus galhos secos insistem abraçar em tons cinza a cidade que engoliu o vilarejo, e lá no alto, bem no canto direito, num verde tão belo que emudece, despenca um fino galho de folhas verdes.
E me apeguei àquele galho verde para nunca mais, porque ele desperta a vitalidade, o conhecimento e toda a história que ainda pulsa na árvore antiga, talvez tal e qual o fio dourado, agora desaparecido na minha orelha.
Então pensei no amigo Marcos Estevão, que além de médico é poeta, psiquiatra dos bons, quem sabe numa boa conversa ele me indique algum remédio, ou apenas um bom gole de uísque, para por fim à falta que me faz aquele cabelo dourado, que sumiu sem se despedir, deixando esse inexplicável sentimento de vazio no lóbulo da minha orelha direita.
Ao Deus pudesse então lançar-me à sorte
Em busca de alívio aos pesares nossos,
Bem o sentiria entre a pele e os ossos,
Do tempo, paz e peso, que eu suporte.
Jamais vos direi que desejo a morte,
Em nada meu sentir ao Cristo imita,
Não lhe reviverei a voz contrita
E aqui espero amor que me conforte.
Não vos direi da existência sofrida,
Inda que fugaz, conforta-me o dia,
Fortuita luz a incendiar-me a vida.
Do eterno tempo nesta romaria
Ao instante que sem corte o divida,
Em busca do amor, não me apartaria.
Recentemente voltei de uma viagem de dez dias a Madrid, Toledo e Valencia, para a qual não tive muito tempo de me preparar. Não era a primeira vez que visitava a Espanha e, das outras vezes, havia feito meu dever de casa diligentemente, vasculhando informações em livros, filmes e artigos publicados sobre este país encantador e sempre surpreendente. Autoconfiante no meu castelhano (talvez um pouco demais!) e nas boas experiências passadas, fiz a mala de qualquer jeito e rumei ao aeroporto, despreocupada e feliz. Porém - há sempre um "pero" quando se fala a língua dos espanhóis! - por mais que a gente se prepare antes, a Espanha sempre nos faz sentir como um marinheiro de primeira viagem.
Compartilho aqui algumas observações culturais e gastronômicas que fiz durante esta curta temporada, que provam, mais uma vez, que a Espanha é um universo infindável de descobertas deliciosas para o estrangeiro.
1) Ao contrário do que eu supunha - depois de ter lido reportagens sobre a crise financeira que atravessa a Espanha desde 2008, com taxa de desemprego superior a 25% e um grande número de jovens que têm deixado o país em busca de melhores condições de trabalho -, o que vi nas ruas das cidades que visitei não reflete absolutamente o clima de um país em crise. Os espanhóis parecem se divertir bastante, frequentam bares e restaurantes alegremente até altas horas da madrugada, não se preocupam com a segurança nas ruas e utilizam meios de transporte público perfeitamente confiáveis a qualquer hora do dia ou da noite. Não vi crianças vendendo balas ou pedindo esmolas. Avistei alguns grafites na periferia das cidades, mas não vi nenhum edifício do centro pichado.
2) Os espanhóis são muito diretos, falam o que lhes dá na telha, sem subterfúgios, em alto e bom som. Adoro isso! Imagino que, para muitos estrangeiros, esse jeito franco pode vir a ser confundido com grosseria - mas é apenas uma característica da cultura espanhola. No fundo, são bem afáveis. Eles têm uma mania semelhante à dos brasileiros de tocar fisicamente a pessoa com quem estão falando (um tapinha nas costas, um pequeno toque no braço) para demonstrar certa atenção especial. Há pessoas que detestam esse tipo de invasão do espaço privado, mas o espanhol nem liga e vai tateando quem ele bem entender. Sinceramente, acho que eu me daria muito bem se vivesse entre eles.
3) A vida noturna em Madrid é uma das mais animadas (e econômicas) de toda a Europa. A “noite”, aliás, começa bem depois do sol se por. Notei que eles dizem “sete horas da tarde”, em vez de “sete horas da noite”. Pessoas de todas as idades (inclusive crianças) circulam ruidosamente pelas ruas da cidade, conversando, rindo e cantando, até se cansarem. É invejável o jeito guloso dos espanhóis de curtirem a noite. Quando saem de casa para qualquer programa, eles sempre passam antes em algum bar para tomar pelo menos uma taça de vinho ou cerveja e mordiscar tapas. "Nós não sobreviveríamos sem nossos bares", me disse um espanhol. Numa noitada típica, percorrer diversos bares de tapas, um após o outro, é o próprio programa. Parece algo “normal”, mas não é. Desafio qualquer turista brasileiro a fazer isso sem a ajuda de um amigo espanhol! Muito provavelmente o viajante voltará ao quarto de hotel exausto e faminto. É que há uma “técnica” toda especial que só eles entendem de se pedir alguma coisa nos balcões, em geral apinhados de gente comendo, bebendo e gritando.
Bar de tapas El Lacón em Madrid
É preciso, antes de mais nada, que o turista tenha conhecimento de um fato perturbador: o espanhol não faz fila. Sério. Os atendentes dos balcões só prestam atenção aos clientes que lhes dirigem a palavra gritando. Além da gente ter que brigar para ser ouvido, tem que se esforçar para pronunciar corretamente o nome daqueles tapas que estão no cardápio, mas que a gente nunca viu antes. Para complicar, alguns desses nomes não estão sequer escritos em castelhano, mas em algum dos outros muitos idiomas ou dialetos falados no país. Palavras como “pintxos” (espetos bascos) e “espencat” (tapa valenciano) aparecem em perfeita harmonia ao lado de “patatas bravas”. Levei algum tempo para perceber que “chato” não era o que eu pensava, mas uma pequena dose de vinho e que “vaso de chato” é um diminuto copo para degustação.
4) Confesso que alguns tapas não me apeteceram quando li seus nomes no cardápio – como “oreja de cerdo” (orelha de porco) e “matambre de ternera” (mata-fome de vitela), mas os entendidos garantem que são muito saborosos. Em contrapartida, me deliciei à vontade com as tradicionais “gambas al ajillo” (camarões no alho), “croquetas de jamón” (croquetes de presunto), “queso manchego” e inesquecíveis porções de “jamón ibérico” (presunto curado, orgulho da região). Aprendi que “tostas” correspondem às nossas conhecidas “bruschettas” e são sempre uma boa pedida para acompanhar o vinho ou a cerveja.
Tostas no Mercado San Miguel, Madrid
5) Para a gente se aquecer num dia frio, há poucas bebidas mais deliciosas do que o “carajillo” – café fortificado com algum tipo de bebida alcoólica. Tomei uma vez com Bailey’s e logo fiquei viciada. Em que outro lugar do mundo você pode pedir em voz alta no balcão “un carajillo, por favor!”, com a maior dignidade ?
6) Outra bebida muito apreciada pelos espanhóis é a “horchata”, um tipo de refresco feito com o leite extraído de uma planta chamada “chufa”. No Brasil ela é conhecida como “junquinho” (ou “junça”) e considerada planta daninha, mas na Espanha é cuidadosamente cultivada. Não morro de amores por esta bebida leitosa e adocicada, mas, quando a gente viaja, parece que tudo fica mais atraente. Tomei “horchata” duas vezes na rua e achei ótimo!
Horchatería em Valencia
7) Outra coisa que não como de jeito nenhum aqui no Brasil, mas que na Espanha tem um sabor todo especial é “churro”. Não que esta fritura massuda e sem graça tenha um gosto melhor lá na Espanha. O que muda é o jeito de se comer: antes de levá-lo à boca, a gente deve mergulhar o churro numa xícara de chocolate quente. Só então, tentando evitar os respingos de chocolate pela mesa no trajeto entre a xícara e a boca, estaremos prontos para saboreá-lo à moda espanhola. É viagem garantida de volta à infância!
Churros com chocolate: uma viagem à infância
Enquanto comia meus primeiros churros da viagem, achando que já dominava toda a cena madrilenha, dei com os olhos num cartaz que me confundiu um pouco, onde se anunciavam “porras con chocolate”. Uma rápida consulta ao garçon me tranquilizou. Na Espanha, “porra” é um tipo de churro, feito com a mesma massa, porém mais grosso e sem as ranhuras na superfície.
Churros e porras são vendidos por todos os cantos da Espanha, mas há um local em Madrid que se destaca de todos os outros – a Chocolateria San Ginés, fundada em 1894. No começo do século XX, era ponto de encontro de celebridades literárias, mas hoje os frequentadores são na maioria turistas. Um detalhe que me impressionou: a chocolateria fica aberta 24 horas por dia, sete dias por semana.
8) Uma dica valiosa para qualquer turista desavisado na Espanha: “bocadillo” não significa “bocadinho”, mas sanduíche feito com aqueles pães deliciosos, tipo baguete italiana, de farinha boa. Logo no início da viagem, caí na besteira de pedir um “sándwich de jamón”, caprichando na pronúncia, apenas para receber da balconista o sanduíche de presunto mais sem graça deste mundo, feito com pão de forma. Depois dessa experiência frustrante, aprendi: para comer um bom sanduíche, é preciso pedir “bocadillo de jamón ibérico”. E nem precisa caprichar na pronúncia, que todo o mundo entende.