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Segunda-feira, 11/3/2024
Apagão
Anchieta Rocha
+ de 300 Acessos

Ela chegou, tocou o meu braço. Em vez de me conduzir como todo mundo faz, segurou minha mão até a porta da frente do ônibus, me pôs na cadeira, rodou a roleta e em seguida se sentou do meu lado.

Falou que trabalhava até tarde, não disse com quê. Eu imaginava: loura, morena, negra, magra, alta... A voz doce, falava e pausava. A pausa diz muito. Na hora me lembrei de um locutor de rádio que dizia que o Tostão jogava sem bola.

Trabalhava todas as noites. Podia ser uma enfermeira, uma garçonete, uma professora, não quis perguntar. Contei do meu serviço de telefonista na fábrica de bebidas, onde passava o dia datilografando pedidos, e que os colegas de vez em quando aprontavam comigo escondendo minhas coisas. Ela riu quando disse que um dia um cara trocou a minha escova de dente com a de um motorista. Não me importava, molecagem eles faziam com todo mundo.

Senti a maciez da sua mão no meu braço quando sem graça desculpou-se pela pergunta que tinha feito, a de não sentir medo enquanto esperava o ônibus no escuro. Contei que, desde pequeno, mamãe só apagava a luz do meu quarto depois que via que eu dormia. Disse ainda que sentia a noite de diversas maneiras. — Uma mulher também — acrescentei. Não demorou me perguntou se eu a imaginava bonita. Me aproximei mais, senti sua respiração, toquei o seu rosto. Não tinha dúvida, foi a minha resposta. Conversamos até ela descer.

No dia seguinte, na mesma hora, me pegou pela mão, aflito, demorou a se sentar do meu lado.

Morava com a mãe, chegava em casa de madrugada, quase não via o filho. Falou que não aguentava mais, queria ter uma rotina como todo mundo, chegar do trabalho no fim da tarde, botar uma bermuda e ver novela. Perguntou como era a minha vida, se sentia solidão, medo e outras coisas.

Foram dias assim. A minha alegria começava na hora em que nos assentávamos e eu tentava adivinhar como era o seu penteado, como se vestia. Se acertava, ganhava um afago.

Um dia não veio. Peguei o ônibus e procurei me concentrar no itinerário da volta pra casa. Os lugares por onde passava eu identificava pelo barulho, pelo cheiro e até pelo ar. Com algumas viagens e perguntas gravei a sequência: a umidade do vapor da lavanderia, a algazarra das crianças saindo da escola. Mais na frente, a pastelaria – um lanche, qualquer dia descia – e em seguida um longo trecho sem parada. Depois do semáforo o quartel e a cavalariça. A fábrica de tecidos com o ruído das máquinas, e o mais bonito, a alegria das meninas deixando o turno. Bares e bares. O presídio, um silêncio de entristecer, a igreja – a música! Mas o que mais me extasiava era a parada em frente à entrada do parque onde o ônibus permanecia por mais tempo. Num fim de tarde, um calor de ferver o asfalto, tinha chovido, o cheiro da vegetação invadiu o ônibus. Foi o meu pôr do sol. Espichei as pernas, abandonei o corpo e deitei a cabeça no encosto.

Por que ela não veio?

Entrei no quarto, liguei o rádio, só chieira.

A sopa, amarga.

– Nada não, mãe, muito serviço.

Se existe escuro, eu conheci naquela noite. Pesadelo, um atrás do outro, acordei com mamãe me entregando o telefone: — Já passou, o menino teve um febrão, amanhã tá bom, a gente se vê.

No dia seguinte, a boca perto da minha, precisava conversar. Deixamos o ônibus no ponto em que ela sempre descia.

Uma escada longa, vozes de mulheres. No quarto, me acomodou numa poltrona e perguntou se eu queria beber alguma coisa. Depois de algum tempo cantávamos as músicas do rádio. Riu muito quando pedi pra ela fazer strip tease.

Percorri o seu corpo com as mãos. Cada saliência me conduzia a mistérios e êxtases. Nunca tocara uma mulher daquele jeito. Cada parte, cada detalhe, tudo me pertencia?

No dia seguinte, a longa espera, ela não veio. O menino de novo, pensei. Já pra ir embora, outra mão, a de uma amiga, tocou o meu braço: — Ela não vem hoje. A polícia deu uma batida na casa onde trabalha, levou as mulheres, a mãe dela não sabe de nada também.

Eu me sentei no ônibus, baixei a cabeça e em vão tentei organizar o caminho de volta pra casa. As vozes dos bares se juntavam ao coro da igreja, os cavalos do quartel pisoteavam os canteiros do parque, as frituras da pastelaria e do vapor da lavanderia me confundiam.


Postado por Anchieta Rocha
Em 11/3/2024 às 16h40

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