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Sexta-feira, 22/4/2016
A Decisão
Heberti Rodrigo
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"Tomando a decisão e realmente querendo, os próprios pés o conduzem para a realização." Talmude babilónico


Foi num domingo que tomou uma daquelas decisões que definem um caráter e seu destino. Àquela hora, não somente em sua casa, mas em toda a rua, todos ainda dormiam quando ele ergueu-se da cama decidido a tirar a velha bicicleta do pai da garagem. Se quisesse descobrir – e ele queria – como seu pai realmente se sentia nas aventuras que lhe narrou repetidas vezes, e com um entusiasmo que sempre o contagiava, teria de seguir em frente com aquilo. Cresceu ouvindo coisas como “Há dias, meu filho, em que as nuvens encobrem as montanhas e pedalamos em seu interior. Quando isso acontece, tudo o que me move é o desejo de avançar entre elas para ver o mundo do ponto mais alto. Nesses momentos não penso nem no esforço, nem no cansaço, nem nas dores. É como se os pneus deixassem de tocar o solo. Eu me sinto como se fosse pura vontade. Um dia você entenderá o que estou dizendo e verá como é indescritível a vista do mundo e da vida que se descortina diante de nós quando atingimos semelhantes alturas!”. Estas frases não lhe saíam da cabeça. Queria desvendar o seu real significado, e para isso sabia que deveria dar o primeiro passo.

Quando entrou na garagem, surpreendeu-se ao ver como a bicicleta era grande e pesada. Nunca haviam estado tão próximos. Ao menos, nunca a havia sentido tão próxima de si. Sempre adiou aquele encontro porque se habituou a pensar que não tinha idade suficiente. Na verdade, quem desejava convencê-lo disso era a mãe, sobretudo depois do acidente sofrido pelo pai. Ele, no fundo, mas lá no fundo mesmo, há algum tempo sabia que a idade não era mais um obstáculo. Não que até ali houvesse mentido para si mesmo quanto a isso, pois bastava vê-lo ao lado da única bicicleta da casa para abolir qualquer dúvida: ele era pequeno para ela. Naquele momento, entretanto, de um modo que jamais soube explicar, sentia que não era assim tão pequeno. Por isso, se bem que assustado, resolveu não tornar ao seu quarto.

Respirou fundo buscando se acalmar e ganhar ânimo enquanto se esforçava em rememorar os preparativos do pai antes de pedalar: verificou a pressão dos pneus, ajustou a altura do selim, lubrificou a corrente e os cabos do freio e, certificando-se que estava tudo em ordem, levou-a para a rua com muito cuidado para não fazer barulho. Temia que sua mãe descobrisse o que planejava. Ela sempre descobria o que se passava em sua cabeça. Como ela era capaz disso, ele nunca soube.

Fora de casa, olhou à sua volta à procura de um lugar onde apoiar a bicicleta com segurança para que pudesse subir nela. Encontrou apoio num bloco de pedra. Quando conseguiu sentar no selim, um de seus pés não mais tocava o chão. Dali a instantes, o outro também deixaria de tocá-lo. Sem dar por isso, atingiria, então, aquele ponto em que não haveria como voltar atrás. Como não conseguiria equilibrar-se por muito tempo estando parado e não teria a segurança que havia encontrado no bloco de pedra, assustou-se ao ver que não teria onde se amparar. “Vou cair”, pensou, mas, no mesmo momento em que esse pensamento lhe assomou à mente, prendeu a respiração, contou “um, dois, três” e, num impulso decisivo, foi-se embora, ziguezagueando. Sentiu o coração disparar. Foi tomado por um medo terrível, um medo tão inerente àquilo que estava fazendo quanto o próprio oscilar de seu corpo e da bicicleta buscando desesperadamente encontrar o equilíbrio. Ao tirar os pés do chão, adentrara numa nova realidade. O medo de cair o fazia pensar, mas não havia mais tempo para pensar. Não poderia pensar, pelo menos não como antes. Chegara o momento de apenas sentir o movimento, de deixar-se ser e simplesmente pedalar, mas, para ele, não era nada simples. Naquele instante, pela primeira vez se deu conta de que coisas simples podem se tornar terrivelmente assustadoras quando temos a sensação de que nossas vidas estão em jogo. O pai, certa vez, lhe preveniu que alguma oscilação é natural, que o próprio medo e a incerteza são naturais e que aos poucos ele se habituaria a tudo aquilo. “Tem que aprender a conviver com o medo”, dizia seu pai, “O que não pode é parar. Se parar, você vai cair”. Como seu corpo, o medo e a coragem, sua confiança e desconfiança iam e vinham. Deliberavam, agitavam-se, confundiam-se dentro de si. Sentia tudo pender ora para um lado, ora para outro até que, após alguns insucessos, os músculos da face finalmente evidenciaram os primeiros sinais de confiança e não demorou a que um sorriso assomasse. Aprendera a andar de bicicleta.

Anos mais tarde, quando tomou outra decisão, desta vez de que se tornaria escritor, comparou o medo que sentia, diante de uma folha de papel em branco, de não conseguir escrever, e a sensação do indescritível por ter escrito a tudo aquilo que seu pai havia lhe descrito anos antes sobre ver o mundo e a vida das grandes alturas. Compreendeu que os anos passaram, mas algo nele não havia mudado. De algum modo, era ainda aquele menino, e escrever havia se tornado sua maneira de reviver aquela que talvez tenha sido a experiência mais significativa de sua infância.


Postado por Heberti Rodrigo
Em 22/4/2016 às 10h56

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