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Segunda-feira, 1/4/2019
O NAVEGANTE DO TEMPO
Ayrton Pereira da Silva
+ de 9100 Acessos

Tomou o bonde circular e embarcou para o século passado. O condutor com a destreza de um malabarista aproximou-se, equilibrando-se no estribo como se já tivesse nascido ali. Balançou para ele a mão direita onde as antigas moedas de níquel chacoalhavam unidas umas às outras, feito soldados numa parada militar, cobrando a passagem.

O passageiro enfiou os dedos no bolso da calça, onde só havia moedas atuais, mas o condutor que o conhecia de há muito disse não haver problema algum. Amanhã o senhor acerta tudo, doutor. E levou a mão direita à pala do quepe de seu uniforme azul-marinho num gesto de deferência.

Está tudo muito estranho neste trajeto, pensou o passageiro, vários são meus contemporâneos, mas voltaram todos ao tempo de criança e nem sequer me reconhecem...

São fantasmas do passado ou estou delirando? Não sabia responder à própria pergunta nem como embarcara naquele veículo elétrico anacrônico, cujos trilhos tinham sido removidos da cidade fazia mais de meio século.

Deteve-se então no exame minucioso do interior do coletivo, onde os longos bancos de ripas de madeira envernizada causaram-lhe a sensação de familiaridade de quem neles se sentara incontáveis vezes. No teto do veículo, os mesmos reclames de antigamente propalavam a excelência dos produtos anunciados, inclusive a propaganda de um famoso elixir cujo nome ele guardara na memória: Rum Creosotado.

Após essa inspeção interna, lançou o olhar para a paisagem urbana que se desenrolava ao longo do percurso como num filme antigo que resgatasse a arquitetura das desaparecidas casas de centro de terreno, com árvores frondosas e flores nos jardins, enquanto o velho bonde sacolejava e rangia na bitola estreita dos trilhos. Comparando-o a uma caravela em mar revolto, chegou a esboçar um arremedo de sorriso ao se considerar uma espécie de navegante do tempo. Nisso, um insólito lampejo de consciência, como se, de repente, emergisse de um sonho, sacudiu-o de cabeça aos pés -- diabos, como vim parar aqui?

Jamais deixamos de fazer este trajeto, doutor, mas só os escolhidos se apercebem disso, pareceu-lhe escutar a voz do motorneiro que, bem distante dele, movia a manivela de direção, concentrado no comando do bonde.

Daqui a duas paradas, vai subir no bonde aquele viúvo, que levava sempre consigo o seu violino para tocar no túmulo da esposa a mesma música, ele se surpreendeu pensando, com uma certeza premonitória, e, ao mesmo tempo, recriminando-se por ter, quando menino, seguido secretamente aquele homem até o cemitério, junto com uma malta de colegas do ginásio, para depois imitarem, entre risos e zombarias, numa mímica grotesca, um recital de violino.

Estava ainda às voltas com esses pensamentos terríveis quando o bonde parou para que o violinista subisse no estribo e se acomodasse no mesmo banco onde se encontrava o passageiro idoso, que, olhando-o de soslaio, surpreendeu-se ao ver que o viúvo não envelhecera como ele, era, sim, o menino de outrora, carregando o estojo do violino para aula de música. É preciso ter calma e ponderação: na verdade esse garoto que vejo é muito mais velho que eu, e pelos meus cálculos o garoto e futuro viúvo já deveria estar debaixo da terra. E esses outros passageiros também permanecem imunes à passagem das décadas, inclusive o condutor e o motorneiro, enquanto ele já velho a tudo assistia através das grossas lentes dos óculos de grau que agora usava como um apêndice indispensável. Engoliu a custo um silêncio amargo - o que fizera outrora, quando adolescente, tinha requintes de uma crueldade inominável. Sentiu-se tremendamente envergonhado. Sim, estava pagando por isso um alto preço. Teve que fazer um esforço sobre-humano para não confidenciar ao menino e futuro viúvo que não se casasse com a mulher que morreria na flor da idade. Não queria passar por maluco e nem poderia imaginar como seria a reação do estudante de violino, agora apenas uma criança. Seria certamente internado num hospício como um louco perigoso e de lá só sairia morto. 

Esse dilema trágico aumentou ainda mais seu sentimento de culpa, quando voltou à realidade absurda do retrocesso no tempo, quem sabe por escapismo ou talvez por um gesto desesperado de autodefesa, como algo que ficaria dentro de si sem resposta alguma, sob a forma de uma eterna interrogação. Matar-se, cometer suicídio? Era covarde demais para isso.

Buscava febrilmente outra solução, algo pragmático, que não iria decerto aplacar suas insônias que viraram uma constante em suas noites, e quando cochilava de pura exaustão era pior ainda, acordava berrando em agonia por causa dos pesadelos persecutórios.

Preciso encontrar, preciso encontrar, está aqui dentro de minha cabeça. Dizem que quem procura, acha, embora haja controvérsias.

Mas ele achou, pois essas coisas acontecem no universo ficcional, se o personagem conseguir impressionar o autor que o criou...

E foi isso que se deu, precedido dos toques de trombetas bíblicas que só o idoso escutou.

Vou consultar urgentemente o oculista, pois essas lentes estão fracas demais. Em seguida, retirou os óculos para limpar as lentes com o lenço, pensando que, além de fracas, estavam completamente embaçadas...

Ayrton Pereira da Silva



Postado por Ayrton Pereira da Silva
Em 1/4/2019 às 16h38

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