|
BLOG
>>> Posts
Segunda-feira,
20/1/2025
Um olhar sobre Frantz Fanon
+ de 1000 Acessos
O crítico literário argentino Alberto Manguel dizia que "todo retrato é, em certo sentido, um autorretrato que reflete o espectador”. Seriam os retratos meros espelhos, a refletir menos a imagem retratada do que as experiências vividas pelo retratante? É uma posição ousada. Ninguém negará, contudo, que o retratar pressupõe uma perspectiva: é ela que circunscreve nosso olhar ao retratarmos o outro, fazendo-nos ressaltar este ou aquele aspecto que desejamos - ou que podemos - enxergar.
Essa ideia parece ter animado Alice Chekri a intitular o seu ensaio biográfico sobre o intelectual, revolucionário e psiquiatra martiniquense Frantz Fanon de "Frantz Fanon: um retrato" (Editora Perspectiva, tradução de Rainer Patriota). Na introdução à obra, ela nos alerta que sua intenção não é escrever uma biografia exaustiva de Fanon: a obra foi pensada como um "testemunho à distância" - "um esforço, necessariamente incompleto e inacabado", segundo ela. A ênfase na parcialidade do trabalho, além de exercício de honestidade intelectual, é declaração pública de sua posição enquanto escritora: nascida na Argélia, Cherki conheceu Fanon na juventude e, ainda estudante, juntou-se e à sua equipe psiquiátrica, compartilhando, além disso, espaços de atuação política. Não poderia, portanto, aspirar fazer um retrato de longe, como um observador desinteressado diante de um objeto.
A publicação do livro de Chekri vem em bom momento: neste 2025 que ora inicia, comemoramos 100 anos do nascimento de Fanon. Infelizmente, ao que tudo indica, sem holofotes: ao contrário de outras figuras de sua geração, ele não logrou ultrapassar o estreito e fechado círculo de militantes e intelectuais de esquerda, onde era e é referência permanente. Fanon é, hoje, sobretudo uma figura das revistas acadêmicas, das bibliografias de disciplinas universitárias e das menções pontuais nos debates especializados. Um destino inesperado para um homem tão envolvido com a ação coletiva e tão preocupado com as consequências políticas de seus trabalhos - e que, em uma curta vida de apenas 36 anos, ganhou a atenção e o respeito dos revolucionários de todo o mundo, de Che Guevara a Bobby Sands, passando pelos Panteras Negras, pelo MPLA e por Mandela. Alice Cherki soma-se a estes admiradores e retrata Fanon com o olhar amigável, quase fraterno, de uma ex-camarada de armas, firmemente convencida - e prova-o ao longo deste belo livro - de que o hoje centenário Fanon ainda nos traz uma importante mensagem.
Postado por Celso A. Uequed Pitol
Em
20/1/2025 às 10h15
Quem leu este, também leu esse(s):
01.
O MCP da Anthropic de Julio Daio Borges
02.
David Sacks no governo Trump de Julio Daio Borges
03.
Elephant by The Wiggles (2021) de Julio Daio Borges
04.
Uma história do site Pathfinder.com (2014) de Julio Daio Borges
05.
Barbara Heliodora e a crítica de Julio Daio Borges
* esta seção é livre, não refletindo
necessariamente a opinião do site
|
|
|
|