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Segunda-feira, 22/6/2015
Bicho urbano
Raul Almeida
+ de 1300 Acessos

Depois de muitos anos encontrei um grande e velho amigo. Puro acaso. Desde que mudei de endereço, nunca mais tive notícias daquela turma que, quase todos os fins-de-semana, reunia-se em grande algazarra, depois da praia, no mesmo restaurante lá em São Vicente.
Fiquei na dúvida se era ele mesmo. O que trouxera um conhecido de outros tempos, para a rua São José, bem no centro velho do Rio de Janeiro? O que é que estava fazendo ali, sentado no bar com cadeiras na calçada, bem ao estilo do "Independência" lá em Santos? Ainda mais naquela hora sem graça, quando todos estão indo buscar ou levar alguma coisa, quando estão trabalhando, andando, correndo. É bem verdade que muita gente está por ali, vagabundeando, rondando o prédio da Assembléia, vendendo bugigangas, procurando um otário para dar um golpe, mas não é desses que estou falando. Nossa turma sempre foi a outra: Trabalhar, ganhar, pagar as contas e divertir-se sempre que possível.
Era ele!
Muito mais velho, um pouco mais magro, calvo, o semblante um tanto amargo, cenho cerrado e olhar escondido por trás dos óculos escuros. Continuava com a mesma marca de cigarros, cujo maço estava sobre a mesa, ao lado do velhíssimo isqueiro Zippo. A discreta pilha de discos de papelão, usados para marcar o consumo, confirmava a preferência pelo chope de colarinho de dois dedos.
Aproximei-me cauteloso em não abordar um sósia ou uma pessoa bem parecida e fui chegando. Quando me notou, levantou-se e abriu, quase ao mesmo tempo, os braços e o sorriso inconfundível.
- Mas que prazer! O que é que você está fazendo aqui no Rio, neste calor, nesta hora de ninguém? Quanto tempo! Que bom te encontrar!
- Pois é, faz tempo que mudei para cá. Continuo com o coração lá, mas a vida tem dessas coisas. Você sabe que eu sou daqui né?
- É sei sim, você nunca perdeu o sotaque de carioca... Tentava dar uma de paulista da Mooca, mas era muito forçado...
Rimos um pouco, e nem foi preciso insistir para que eu sentasse. O dia ia começar como nos velhos tempos, naquela hora pouco passada do almoço e ainda longe do lanche.
- Pois é, começou a falar, estou morando nesta cidade já faz uns poucos anos. Aposentei, fiz alguma coisa sob a capa de consultor, montei um escritório, mas acho que não tenho mais nada a declarar. Perdi a graça, o interesse e, a bem da verdade, a necessidade de ir a luta foi diminuindo e acabei por perder o contato com o mundo dos ocupados, dos trabalhadores, dos construtores de progresso, etc e tal. Meus amigos foram morrendo, outros assim como eu, mudaram-se para outros lugares, e a coisa foi ficando vazia.
Teve gente que foi morar numa praia no nordeste. Bem eu até que tentei algumas vezes, mas praia é um conjunto de facilidades. Praia linda, deserta, sem bar, sem a mulherada do fim de semana, afoita, fervendo, com os hormônios lá encima, não é praia.
Essa de morar em vila, aldeia, etc, é muito romântico por algum tempo, mas só levando e mantendo uma belíssima peteca, para jogar de vez em sempre... De repente você percebe que foi para um lugar miserável, cheio de gente precisando de ajuda e pensando que você é milionário, não. Alguns nativos aparecem cheios de graça querendo até vender a filha mais velha! Um horror. Lugar aonde a maior autoridade é um cabo da meganha, não me atrai não! Nada disso.
O mesmo vale ir para o interior. Que lindo, bucólico, maravilhoso céu azul, sem poluição, sem isso e mais aquilo das mazelas das cidades. Chega a noite, aquela luz amarela de um boteco fajuto, a mesma conversa, os mesmos de ontem querendo descobrir como é que você ganhou dinheiro para comprar aquele sitio ou aquela casa velha...
Depois de uma semana, tem mulher encalhada querendo fazer uma comidinha pra você, tem viúva alegre e dura, tem o cara da farmácia que sabe da vida de todo mundo, tem uns chatos invasores e dissimulados que acham tudo certo quando alguém paga a conta. Não dá não. Que bom é voltar...
Fiquei escutando aquele quase monólogo, até que resolvi intervir:
- Mas vir para cá, você trocou seis por meia dúzia! O que é que houve? Só para mudar de ares, assim sem mais nem menos?
- Não. Foi coisa de família. Fiquei sozinho por lá, como já disse. Os amigos foram desaparecendo e, um belo dia, meus filhos resolveram que eu tinha que voltar para cá. Para ficar mais perto, pois não tinha sentido viver só, beber só, andar só, aquelas coisas... Aqui eles estariam sempre por perto e, em caso de alguma necessidade, rapidamente, me dariam assistência. A pressão foi tão grande que acabei cedendo.
- Então você está morando com a família? Perguntei.
- Não, uma das condições foi que eu continuasse morando sozinho. Não imagino como seria "invadir" no bom sentido a casa de qualquer um deles. Moro no Catete, perto do Largo do Machado. Imagine que até o Lamas, o Café Lamas mudou de Lugar. Agora tenho que andar mais para comer aquele filé com fritas.
- Lamas?
- Você precisa conhecer, é a melhor batata frita do Rio, até hoje.
- Bem, e o que mais? Teus amigos daqui? Encontrou algum?
- Nada. Morreram ou mudaram-se.
- Então?
- Pois é, Eu já fiz metade. Mudei. Mudei para lá e para cá agora...
Fez uma pausa, pigarreou, acendeu outro cigarro, pediu mais dois chopes e uma calabresa no palito, tirou os óculos, deu um sorriso de dentes amarelados, ajeitou-se na cadeira e disse:
-Sou bicho urbano. Chegando a hora eu só não quero é sentir dor.
Batemos os copos no velho estilo ritual, demos um gole prolongado, colocamos de volta sobre os cartões de marcação de consumo, e mudamos de assunto.
RA


Postado por Raul Almeida
Em 22/6/2015 às 15h04

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