Para cantar o ilusório, o coração do poeta Cartola bateu forte. A seguir, confirmou-se a melancolia do amor não correspondido. Ante a esperança dissipando-se, ele ritmou lamentoso solilóquio ao tempo de um fim de verão:
"Bate outra vez
Com esperanças o meu coração
Pois já vai terminando o verão
Enfim
Volto ao jardim
Com a certeza que devo chorar
Pois bem sei que não queres voltar
Para mim".
Nesse jardim do Cartola, cabe o mundo inteiro. E, sorrindo ou chorando ─ ou fazendo-nos corar ─, no mundo afloram não ditos e, em mangas de camisa, entram eles no nosso corpo, explodindo de erotismo ou saudade, antes do avanço dos lábios ou depois do beijo. Ao fecho da canção, à desesperança esperançosa dirigida à amada, a súplica do poeta desejoso de sonhos realizados:
"Devias vir
Para ver os meus olhos tristonhos
E, quem sabe, sonhavas meus sonhos
Por fim".
Porém, antes de falar à amada, amorosos sentimentos rastrearam os cálices das rosas no jardim, quando nas pétalas sentimos umidade. Quando nas pétalas ouvimos a canção a pulsar. Na poesia, o jardim se fez acolhimento das mágoas do coração queixando-se às rosas. Das queixas do poeta, a resposta se perfumou em etéreo mar de flores ─ volúvel bálsamo ─ a envolver chamados do corpo:
"Queixo-me às rosas
Mas que bobagem
As rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti, ai".
Decifrando silêncios do jardim, eu quis colorir essas rosas, porque o amor inventa brilhos para fantasiar encontros. A poesia nos leva a colorir o Universo e os objetos. Tingimos de afeto grãos de arroz, a colcha da cama, a asa da abelha. Ouvindo a canção do Cartola, me perguntei: Que tonalidade lhe perfumaram as rosas?
Então, ao desejar isto que o poeta desejou ─ decifrar a linguagem das flores ─, a semente ungiu-se no sangue de antiga placenta. Ao desejar isto que o poeta desejou ─ o encontro ─, volto ao meu jardim de silêncio, para escutar meu coração afeito às mágoas do poeta.
Vivente, o amor se revela carmim. Faz enrubescer o corpo. À colheita, a romã se veste de pele púrpura.
Vermelhas, pressinto. Não podem ter outra cor as rosas dos versos do Cartola.