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Sexta-feira, 1/11/2002
O humor da Belle Époque
Gian Danton
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Existe uma linha dos estudos históricos que tem como filosofia usar os produtos culturais criados pela sociedade para estudar e compreender uma certa época. É o que faz Elias Thomé Saliba, em Raízes do Riso, recentemente lançado pela editora Companhia das Letras. O volume analisa a representação humorística na época da Belle Époque brasileira.

Elias Thomé Saliba é professor livre-docente na USP. É autor do volume 3 da História da Vida Privada no Brasil, "A Dimensão Cômica na Vida Privada na República".

O livro parece, para um leitor desavisado, uma simples coletânea de piadas, mas passa longe disso. É, na verdade, um estudo aprofundado da cultura e da história brasileira. Saliba não quer apenas mostrar o riso nacional, mas demonstrar que o que esse riso tem de brasileiro.

A preocupação com a questão da identidade é revelada logo no início, quando é contada uma piada na qual um francês, um inglês e um alemão são convidados a escreverem sobre o camelo.

O francês vai ao Jardim Botânico, fica por lá meia-hora, conversa com o guarda, joga pão ao camelo, cutuca o bicho com a ponta do guarda-chuva e, ao voltar para casa, escreve um folhetim cheio de observações picantes e espirituosas.

O inglês prepara-se para a aventura e organiza uma expedição ao Oriente, onde passa três anos e produz um grosso volume, repleto de fatos, mas sem ordem ou conclusão.

Quanto ao alemão, tranca-se num quarto e lá produz uma obra em vários volumes intitulada "A Idéia do camelo deduzida da concepção do Eu".

Saliba arrisca deduzir como o brasileiro reagiria ao desafio: adiaria indefinidamente o estudo, iria para a praia, tomaria uma cerveja e, depois de muito conversar com os amigos sobre o camelo, comporia um samba intitulado "Eu não sou camelo não".

É justamente compreender essa essência do brasileiro, através do humor, que Saliba pretende com seu livro.

Como o volume é resultado de um trabalho científico, antes ele passeia pelas principais definições do que vem a ser humor.

A mais famosa é a do filósofo Henri Bérgson, segundo o qual o cômico nascia do contraste entre os elementos mecânicos e vivos. Como se vê, uma definição muito influenciada pelos fatos ocasionados pela revolução industrial. Os desajustes entre as mudanças e as reações das pessoas a elas estão na base do humor. Exemplo disso é a cena, comum em muitos filmes mudos, da pessoa que se empenha de pequenas ocupações cotidianas, mas as coisas foram embaralhadas ou trocadas de lugar: mete a caneta no tinteiro e sai cola, acredita sentar-se na cadeira e cai. Em suma, age em decorrência de um ritmo ou hábito adquiridos e não consegue se adequar às mudanças.

Uma definição talvez mais interessante seja a de Luigi Pirandello. Para ele, o risível tem suas bases, na época da revolução industrial, nas imprevisíveis rupturas de realidade.

Para ele, o riso nasce da percepção do contrário. Como exemplo, temos uma velha que se pinta, veste-se como moça e pinta os cabelos. Ao vê-la, temos a percepção de que ela não é nem uma velha respeitável, nem uma moça, e dessa percepção do inusitado da situação, surge o riso. Mas o riso também nasce de um sentimento de superioridade.

Entretanto, para Pirandello, a percepção do contrário pode transformar-se num "sentimento do contrário" no momento em que aquele que ri procura conhecer os motivos pelos quais a velha procura mascarar sua velhice. Nesse momento há uma percepção, por parte daquele que ri, de que também ele pode ficar velho e fazer o possível para reconquistar a juventude perdida. Nesse momento, o riso se transforma em sorriso. O cômico se transforma em humor. Para passar de um para outro, é necessário renunciar ao distanciamento e à superioridade.

Exemplo disso é Dom Quixote. Suas atitudes são cômicas, mas Cervantes o descreve como se também ele, Cervantes, fosse um pouco Quixote.

O escritor russo Nicolai Gogol também apresenta essa guinada. Seus personagens são cômicos, desajeitados, perdedores, mas Gogol se compadece deles. É o riso entre lágrimas.

Para Pirandello, essa característica do humor poderia ser usada para conscientizar o público, leva-lo a rever suas próprias premissas e preconceitos. Não é à toa que o conceito de obra aberta, de Umberto Eco, valoriza tanto o humor.

Essa capacidade de conscientização e de crítica social do humor vai ser explorada do Saliba. Raízes do Riso trata da Belle Époque porque foi uma época que no Brasil o humor tornou-se a principal forma de protesto contra os desvios da República. Os humoristas, que sonharam com a abolição e o regime republicano, viam seus sonhos transformarem-se em pesadelo (na verdade, o Brasil passou da monarquia direto para a ditadura militar, sem qualquer transição democrática). Os intelectuais do período eram chamados de mosqueteiros da sátira, ou Dom Quixote da comédia.

Em nossa época, de disputa eleitoral, vale a pena resgatar uma dessas reflexões críticas sobre o pleito. De autoria de Guimarães Passos e publicada originalmente no semanário O Filhote, o poema abaixo narra as desventuras de um brasileiro de sotaque lusitano num dia de eleição e mostra que público e privado sempre foram inseparáveis na democracia brasileira:

José, natural das Ilhas,
que fala cerrado e grosso,
disse anteontem para as filhas:
votem o diavo du almoço!

Beijam se andam mais dipressa!
Bamos! Preciso cumer,
Porque a eleição já cumeça;
Quero cumprir meu deber!

A amásia dele, mulata,
Acode: Que é, seu Zezinho?
Jesus! Este home me mata...
Pro que é que sai tão cedinho?

E o Zé, palpando a barriga:
Tenho presssa d'almuçar!
Saiva você, rapariga,
Que o seu home bai botar!

E ela: Você botar? Iche!...
Seu Zezinho, tome nota!
Não caia n'algum espiche:
Há tanto tempo não bota!

Para ir além





Gian Danton
Macapá, 1/11/2002

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