Niemeyer e a unanimidade | Daniel Piza

busca | avançada
42713 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> ZÉLIO. Imagens e figuras imaginadas
>>> Galeria Provisória de Anderson Thives, chega ao Via Parque, na Barra da Tijuca
>>> Farol Santander convida o público a uma jornada sensorial pela natureza na mostra Floresta Utópica
>>> Projeto social busca apoio para manter acesso gratuito ao cinema nacional em regiões rurais de Minas
>>> Reinvenção após os 50 anos: nova obra de Ana Paula Couto explora maturidade feminina
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
Colunistas
Últimos Posts
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Agora a morte da televisão
>>> For The Love of God explicada
>>> Obsessão por livros
>>> Breve reflexão cultural sobre gaúchos e lagostas
>>> Meu beijo gay
>>> YouTube, lá vou eu
>>> Sonho francês
>>> Minha Estante
>>> A Última Ceia de Leonardo da Vinci
>>> Steven Spielberg
Mais Recentes
>>> Metodologia Da Ciência Do Direito de Fernando Herren Aguillar pela Atlas (2009)
>>> Meu 1º Larousse Dos Herois de Vários Autores pela Larousse (2006)
>>> A Prisioneira Do Tempo de Kate Morton pela Arqueiro (2020)
>>> Loucuras Da Alma de Ana Cristina Vargas pela Vida & Consciência (2016)
>>> Um Caldeirão De Poemas 2 de Tatiana Belinky pela Companhia Das Letrinhas (2007)
>>> Authentic Games: Vivendo Uma Vida Autentica de Authentic pela Astral Cultural (2016)
>>> Um Passeio Com Chapeuzinho Vermelho de Cleber Fabiano pela Palavra Arteiras (2018)
>>> O Cirurgião de Tess Gerritsen pela Record (2010)
>>> O Lado Bom Da Vida de Matthew Quick pela Intrinseca (2012)
>>> Energia Cósmica de Joseph Murphy pela Record (1973)
>>> Eu Fico Loko 2 de Christian Figueiredo De Caldas pela Novo Conceito (2015)
>>> Transparentes de Ondjaki pela Companhia das Letras (2013)
>>> Authenticgames. A Batalha Contra Herobrine de Authentic pela Astral Cultural (2016)
>>> Introdução Ao Estudo Do Direito de Alysson Leandro Mascaro pela Quartier Latin (2007)
>>> Casais Inteligentes Enriquecem Juntos. Finanças Para Casais de Gustavo Cerbasi pela Gente (2004)
>>> Minecraft Diários Perdidos Explorando O Nether de Winter Morgan pela Ciranda Cultural (2016)
>>> Terra Sonâmbula de Mia Couto pela Companhia Das Letras (2015)
>>> God Of War de Robert E. Wardeman pela Leya (2012)
>>> Classicos Da Juventude - Os Tres Mosqueteiros de Alexandre Dumas e Luiz Antônio Aguiar pela Melhoramentos (2000)
>>> God Of War 2 de Robert E. Wardeman pela Leya (2013)
>>> 100 Textos De História Antiga de Jaime Pinsky pela Contexto (2015)
>>> História Moderna Através De Textos de Adhemar Marques pela Contexto (2014)
>>> A Arte De Escrever de Arthur Schopenhauer pela L&Pm Pocket (2021)
>>> Os Que Não São Convidados de Dorothy Macardle pela O Clarim (2013)
>>> Microfísica do Poder de Michel Foucault pela Graal (2008)
ENSAIOS

Segunda-feira, 7/1/2008
Niemeyer e a unanimidade
Daniel Piza
+ de 8700 Acessos
+ 4 Comentário(s)

Oscar Niemeyer divide ambientes no sentido literal e figurado. No figurado, porque está longe de ser a unanimidade que alguns autores brasileiros pintam. Há quem o admire muito, como alguns arquitetos mais novos como Christian de Portzamparc e Santiago Calatrava, e há quem o ataque acidamente, como os ensaístas Kenneth Frampton, Robert Hughes e Marshall Berman. Mesmo no Brasil é comum ouvir críticas à falta de funcionalidade de sua arquitetura, que seria de "um escultor, não um arquiteto", assim como a classificação dele como o maior ou um dos cinco maiores arquitetos do século 20.

Acho que parte dos motivos de tanta polêmica está no fato de que sua arquitetura não se encaixa facilmente nas classificações disponíveis. Ele nunca foi um modernista "bauhausiano" ou "internacionalista", do tipo que pretende abolir todo ornamento e toda referência local; tampouco, porém, pode ser classificado como um tradicionalista ou não vanguardista. Do mesmo modo, não pode ser tido como pós-moderno ou como precursor do pós-modernismo em sua ênfase nos elementos quentes e lúdicos, pois Niemeyer sempre foi adepto da simplicidade. A sua é uma arquitetura ao mesmo tempo minimalista e lírica, contida e ousada ― e talvez este seja o maior elogio que se possa fazer a ela.

Não é de hoje que a interpretação da arquitetura se divide entre os que põem ênfase na paixão e na expressão e os que a põem na razão e na construção. Isso vem desde pelo menos a disputa entre o "romântico" Ghiberti e o "racional" Brunelleschi no Renascimento italiano. Nos termos atuais, a contraposição se dá entre a arquitetura "espetacular", como a de Frank Gehry ou Herzog & de Meuron, e a arquitetura "silenciosa", de Renzo Piano ou Tadao Ando. Como de praxe, os rótulos são insuficientes: basta visitar o museu de Gehry em Bilbao e se surpreender com a sofisticada organização dos vazios internos; e basta pensar no Pompidou e lembrar como Piano pode ser orgânico e rítmico.

É por isso que Niemeyer é reivindicado por ambas as correntes. Os do "espetáculo" salientam seu gosto pelas curvas, pelos elementos coloridos, pela disposição cênica em relação ao ambiente. Os do "silêncio" acentuam sua leveza e singeleza, seu desprezo com o acabamento, seus blocos lisos e suspensos. Na realidade, Niemeyer sempre se colocou, deliberadamente, a meio caminho. Seus aprendizados com Le Corbusier e Lucio Costa foram até onde lhe interessava ― o uso de pilotis para revelar o horizonte, o gosto pelo "brise-soleil", etc. ― e logo ele tratou de buscar outras referências, como a natureza do Rio e a arquitetura colonial, para definir seu estilo. Em Pampulha, especialmente, ficou claro que as curvas do barroco mineiro seriam o recurso essencial.

Aqui faço uma advertência. Niemeyer gosta de se dizer pioneiro no uso das curvas e declara que foi ele quem incentivou Le Corbusier a utilizá-las, o que o arquiteto suíço faria com grande brilho na Capela de Ronchamps. Mas as curvas não eram novidade na arquitetura (a começar por Aleijadinho em sua igreja São Francisco de Assis em Ouro Preto), Le Corbu as utilizou de forma diferente (não como recorte do espaço, mas como quebra de simetria) e nos anos 40 e 50 uma série de arquitetos estrangeiros investiria nelas, como Frank Lloyd Wright (Guggenheim de Nova York), Eero Saarinen (TWA, também em Nova York) e Jorn Utzon (Ópera de Sydney).

De qualquer modo, Niemeyer transformou sua combinação de formas curvas e contornos singelos numa assinatura, numa identidade autoral, de tal modo que jamais se confunde uma obra sua com a de qualquer outro arquiteto. Atingiu uma síntese entre a linguagem modernista e a cor local, como não conseguiram nem mesmo os proponentes dessa tese ― Mário e Oswald de Andrade, os paulistas que conheceu pouco antes de ter contato com Juscelino Kubitschek. À maneira de Drummond e João Cabral, ele combinou o construtivo e o expressivo, só que com uma diferença fundamental: em tom maior, não em tom menor. Num gesto raro nas artes brasileiras, Niemeyer sempre gostou do monumental.

Ele costuma dizer que sua monumentalidade não é a dos prédios altos ou a dos volumes pesados, e é verdade. Mas que é monumental, é. Suas obras muitas vezes têm mais apelo quando vistas de longe ― do avião ou de algum ângulo panorâmico. Foi por esse motivo que Hughes disse que são "fotogênicas" mas "desumanas", pois tornam o homem pequeno diante de tanta imensidão de concreto. Não à toa suas praças, como a da Esplanada dos Ministérios ou a do Memorial da América Latina, que em sua visão seriam tomadas por multidões, em geral se encontram desérticas, inabitadas, como grandes maquetes sem rotina vital. Frampton e Berman associaram essa inclinação para as dimensões grandes e superfícies áridas à sua ideologia stalinista.

Também a idéia de que seria melhor escultor do que arquiteto, como já escrevi, não escapa ao exame visual. Seus monumentos, como o de JK e o do MST, para não falar da mão sangrenta do Memorial, beiram o kitsch, por sua retórica emotiva e ao mesmo tempo impessoal. O efeito, nesses casos, se sobrepõe ao signo. Do excessivamente literal "olho" do museu que leva seu nome em Curitiba, para dar outro exemplo, fez como base uma coluna de azulejos amarelos com uma enorme figura estilizada em azul, à maneira de um ginásio esportivo soviético. Nos últimos tempos, sua arquitetura tem se aproximado mais e mais dessas formas gráficas, talvez porque facilitadas pelas técnicas de engenharia modernas. O museu de Niterói, por exemplo, é pouco mais que uma forma de disco voador com uma rampa sinuosa, tal como queria o futurismo de 80 anos atrás. E seu projeto para o novo MAC de São Paulo é feio.

As melhores obras de Niemeyer são justamente aquelas em que o prédio se combina com o grafismo de uma maneira mais integrada, menos mecânica. É o caso do Palácio da Alvorada, com sua sucessão de colunas angulosas que cria uma espécie de caligrafia ao redor do volume principal; o mesmo ocorre nos arcos do Itamaraty, reaproveitados na sede da editora Mondadori em Milão. É o caso da Casa das Canoas, no Rio, em que há uma rara harmonia com a natureza ao redor, pela composição com a pedra e a paisagem. É o caso do interior da Catedral de Brasília, que surpreende a quem do exterior a achou pequena e que o põe sob um amplo rendilhado de linhas e luzes. É o caso do Copan e do Partido Comunista Francês, grandiosos edifícios dançantes. É até mesmo o caso do conjunto do Ibirapuera, pavilhão-marquise-oca-auditório, talvez a mais democrática de suas obras. Nelas, o lirismo vence o gigantismo.

Apesar dos problemas funcionais (falta de ventilação e iluminação, disposição ou espaço ruins para ambientes como banheiros, etc.) e também políticos (pois se trata do comunista que mais trabalhou para governos em todo o mundo, com especial domínio sobre as obras públicas do Brasil), a arquitetura de Niemeyer não pode ser reduzida a eles. Tampouco precisa ser exaltada em bloco, como se não oscilasse entre momentos geniais e fracassos lamentáveis, só porque está na moda entre cultores da arquitetura "espetacular". O que ele fez, porém, nenhum outro arquiteto brasileiro fez: tornou sua arquitetura, mais do que um marco de época ou nacionalidade, uma marca de estilo e universalidade.

Nota do Editor
Texto gentilmente cedido pelo autor. Originalmente publicado em O Estado de S. Paulo, em 16 de dezembro de 2007.


Daniel Piza
São Paulo, 7/1/2008
Mais Daniel Piza
Mais Acessados de Daniel Piza
01. Arte moderna, 100 anos - 10/9/2007
02. Saudades da pintura - 16/5/2005
03. Como Proust mudou minha vida - 15/1/2007
04. A pequena arte do grande ensaio - 15/4/2002
05. André Mehmari, um perfil - 20/11/2006


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
9/1/2008
20h37min
Oscar Niemeyer é tão excepcional que merece elogios e muitas críticas. Certamente o autor do texto não conhece o nosso pequeno e tão visitado "Mirante" da Ilha Porchart na cidade de São Vicente-SP. No topo da Ilha, majestoso, é o espetáculo que espia outro espetáculo: cidades e praias da Baixada Santista. A TV de Santos costuma ir até lá para dizer "estamos em Santos", quando na verdade estão na cidade acima citada. O artigo faz jus à fama do arquiteto, pois quanto ao nosso monumento ele acertou em cheio.
[Leia outros Comentários de Gelza Reis Cristo]
23/1/2008
20h31min
Gosto de ler tudo o que Daniel Piza escreve. Sem dúvida, ao citar Frampton e Berman, ele tem noção do riscado. De fato, muito se elogia e muito se critica Niemeyer. Escultural, monumental ou não, a verdade é que o arquiteto centenário contribuiu para a elevação da arquitetura brasileira a uma categoria internacional. As poucas referências que existem sobre o Brasil no ramo da arquitetura fazem menção a Niemeyer. Das duas uma: ou se incentivam novos talentos ou teremos que nos contentar com, pelo menos, um nome como Oscar Niemeyer.
[Leia outros Comentários de Lúcia do Vale]
11/2/2008
09h37min
Niemeyer sabe que ele contribui para um mundo melhor, suas obras são fundamentadas na simplicidade, na ternura dos ventos, na beleza do espaço, ele soube como conquistar o mesmo atuando no seu concretismo, na sua dialética histórica.
[Leia outros Comentários de manoel messias perei]
30/1/2010
21h17min
Em tempos de ecologia e ambientalismanis, as obras de Niemeyer deveriam ser banidas da face da terra. Falta de funcionalidade, beleza, desperdício de tempo, dinheiro e material.
[Leia outros Comentários de Titus]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.

Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Os últimos passos de um vendedor
José Roberto Burnier
Globo
(2011)



Livro Ensino de Idiomas English in Mind Student's Book 1
Herbert Puchta; Jeff Stranks
Cambridge
(2004)



Grandes Mestres - Gauguin
Abril Cultural
Abril Coleções
(2011)



Manezinho o Portuga
Carolina Andrade
Infocus
(2006)



Coleão 3 Livros Inteligência Relacional + 5 Passos para o Sucesso + As Pistas que o Sucesso Deixa
Marcelo Leeman
Anjo
(2018)



Market Leader: Upper Intermediate Business English (course + practice)
David Cotton; David Falvey; Simon Kent
Pearson Education
(2001)



A Baía de S. Martinho do Porto Aspectos Geográficos e ...
Maria Cândida Proença
Colibri
(2005)



De Bem Com a Vida
Dra. Ana Maria Malafaya
Globo
(1994)



Livro Psicologia Ritos da Passagem de Nossa Infância Volume 24e Adolescência
Fanny Abramovich
Summus
(1985)



História Social da Literatura e da Arte Volumes 1 e 2 - A. Hauser
A. Hauser
Mestre Jou
(1972)





busca | avançada
42713 visitas/dia
1,7 milhão/mês