A crise do patriarcalismo e a ascensão da mulher | Héber Sales | Digestivo Cultural

busca | avançada
47578 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Teatro do Incêndio e Colmeia Produções convidam o público a partilhar saberes no ciclo Incêndios da
>>> ZÉLIO. Imagens e figuras imaginadas
>>> Galeria Provisória de Anderson Thives, chega ao Via Parque, na Barra da Tijuca
>>> Farol Santander convida o público a uma jornada sensorial pela natureza na mostra Floresta Utópica
>>> Projeto social busca apoio para manter acesso gratuito ao cinema nacional em regiões rurais de Minas
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
Colunistas
Últimos Posts
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> O Livro dos Insultos, de H.L. Mencken
>>> Cenas da vida carioca
>>> Aproximações políticas, ontem e hoje
>>> Surf em cima do muro
>>> E não sobrou nenhum (o caso dos dez negrinhos)
>>> Semana da Canção Brasileira
>>> Cartas@de.papel
>>> 24 Horas: os medos e a fragilidade da América
>>> Ai de ti, 1958
>>> Cultura, técnica e uma boa idéia
Mais Recentes
>>> Design Thinking de Tim Brown pela Campus Elsevier (2010)
>>> Você Eu E Os Robôs: Pequeno Manual Do Mundo Digital de Martha Gabriel pela Atlas (2018)
>>> Psicoterapia Fenomenológico-existencial de Valdemar Augusto Angerami Camon E Outros pela Thomson (2002)
>>> A Parisiense: O Guia De Estilo De Ines De La Fressange de Ines De La Fressange e Sophie Gachet pela Intrinseca (2011)
>>> Organizações Exponenciais de Salim Ismail pela Hsm (2015)
>>> Para Sempre Sua de Sylvia Day pela Paralela (2013)
>>> Profundamente Sua de Sylvia Day pela Paralela (2012)
>>> Toda Sua de Sylvia Day pela Paralela (2012)
>>> O Conde Futreson: Uma Aventura Da Turma Do Gordo de João Carlos Marinho pela Global Editora (2009)
>>> A Psique Do Corpo de Denise Gimenez Ramos pela Summus (1994)
>>> Cada Pessoa Tem Um Anjo de Anselm Grun pela Editora Vozes (2009)
>>> Você é Insubstituível - Este Livro Revela A Sua Biografia de Augusto Cury pela Sextante (2006)
>>> Prática Espiritual: Como Começar de William Bloom pela Triom (1995)
>>> Das Mãos De Deus de Nelson Moraes pela Wpaz (2006)
>>> Virtudes Que Nos Unem A Deus: Fé, Esperança E Amor de Mauro Grun pela Vozes (2007)
>>> O Dialogo Com O Barro - O Encontro Com O Criativo de Regina Fiorezzi Chiesa pela Casa do Psicólogo (2004)
>>> Felicidade de Eduardo Giannetti pela Companhia Das Letras (2002)
>>> Guia Do Mochileiro Das Galaxias de Douglas Adams pela Arqueiro (2009)
>>> Hamlet: O Príncipe Da Dinamarca de William Shakespeare pela Scipione (2001)
>>> Angélica de Lygia Bojunga pela Casa Lygia Bojunga (2014)
>>> O Relógio do Tempo de Rosa Freua de Carvalho pela Feesp (1993)
>>> Por Que Sou Uma Menina Xadrez de Blandina Franco pela Matrix (2015)
>>> A Mágica Da Arrumação de Marie Kondo pela Editora Sextante (2015)
>>> Quando Jesus Teria Sido Maior? de Paulo Alves Godoy pela Feesp (2011)
>>> Ratinhos de Ronaldo Simões Coelho pela Companhia Das Letrinhas (2011)
COLUNAS

Quarta-feira, 25/9/2002
A crise do patriarcalismo e a ascensão da mulher
Héber Sales
+ de 17100 Acessos
+ 3 Comentário(s)

País de uma sociedade patriarcal forjada nas casas grandes e senzalas como descreveu Gilberto Freyre, da sociedade semi-tradicional como define Roberto da Matta, estará o Brasil vivendo uma crise do patriarcalismo?

Consultando-se as estatísticas sobre arranjos domiciliares, pensa-se que sim. Primeiro, verifica-se que cresce o número de domicílios chefiados por mulheres. A tendência foi forte nos anos 1990. A proporção de domicílios chefiados por mulheres passou dos 18,1% apurados em 1991 para 24,9% em 2000, um aumento de 37,5%. Incluem-se aí o universo das mulheres sozinhas, jovens ou não, divorciadas, viúvas ou solteiras, sem filhos, um contingente que cresce bastante. Em alguns casos, esse domicílio unipessoal feminino resulta da maior instabilidade dos casamentos, do mercado matrimonial desfavorável a mulher mais madura, da longevidade das mulheres (especialmente nas regiões sul e sudeste) e da migração de jovens mulheres do interior para as metrópoles em busca de melhores oportunidades de trabalho (fenômeno notável em Salvador, por exemplo).

Se os números não mentem, admitamos por enquanto que o patriarcalismo brasileiro está em crise. Famílias chefiadas por homens é um arranjo que diminui com os anos, e novos esquemas domiciliares são cada vez mais observados. Temos então um fator que pode redefinir a intimidade da nossa sociedade. Porém isso não é tudo. É preciso observar qualitativamente essas famílias matriarcais e essas moradoras solitárias, e, especificamente, analisar até que ponto elas são realmente portadoras de novos valores e condutas que transformariam a intimidade do brasileiro.

De saída, observa-se que grande parte das mulheres torna-se chefe de família mais por contingência do que por opção. São mulheres abandonadas por seus maridos, viúvas e que migram do interior para as grandes cidades em à procura de um emprego, de uma profissão. Em Salvador, por exemplo, encontra-se muitas jovens mulheres de classe média, ainda solteiras, que vieram do interior para estudar e fazer carreira. Conheço várias dessas moças de que estão ganhando seu dinheiro, num começo de carreira promissor, e que, ao mesmo tempo, ainda sonham com um príncipe encantado. É verdade que praticamente todas elas não podem mais ser chamadas de moças no sentido consagrado pela tradição, pois têm uma vida sexualmente ativa. Vivem-na no entanto de uma maneira no mínimo contraditória, cercadas por culpas, medos e cuidados com a imagem pública, afinal um príncipe encantado prefere as virgens, ou, na falta destas, as mais inocentes e discretas sexualmente. E esse padrão parece aplicar-se também a muitas jovens de seus 20 anos que cresceram na metrópole, hoje a terceira do Brasil, assim como a mulheres divorciadas. Aquelas são universitárias ou recém bachareladas, com acesso a mídia global, alto nível de informação sobre sexualidade; estas são profissionais bem estabelecidas que chefiam sua casa; ambas porém preservam-se para um bom casamento (o primeiro ou um seguinte). Ora, essa submissão do desejo feminino às exigências masculinas é muito mais típico de uma sociedade patriarcal, onde o homem, e não a mulher, controla (formalmente) a fecundidade e a sexualidade femininas.

Tais contradições que emergem de uma reflexão mais detida parecem reafirmar a marca de uma sociedade fundada numa tríplice ética, a ética da casa, a ética da rua e a ética do outro como descreve o antropólogo Roberto Da Matta em seu livro A Casa e a Rua. Neste livro, o autor afirma que o espaço da casa (ou da intimidade) parece imune às transformações do universo político e da rua (ou da lei). Qualquer semelhança com a situação que descrevemos não deve ser mera coincidência.

Porém tais evidências não esgotam nossa análise. Há mais aspectos reais a dissecar. Assim deve-se atentar para o fato de que a condição econômica da mulher sozinha ou chefe de família é, na maior parte das vezes, precária. A desigualdade econômica e a discriminação no emprego determinam tal estado de coisas. A maioria dessas mulheres é pobre como o é a maioria dos brasileiros, e com um agravante: têm mais dificuldade para encontrar um emprego formal. Já aquela minoria de classes média e alta bem empregadas, ganha menos do que os homens para desempenhar função similar.

Diante de tais discriminações sexuais, sociais e econômicas, o que faz, como reage a mulher brasileira? Debilmente, muito debilmente se comparadas às suas colegas norte-americanas e européias. Ao contrário do que acontece nesses países, o movimento social feminista não decola no Brasil. Há uma minoria organizada e ruidosa, mas que não consegue mobilizar as demais mulheres num esforço mais sistemático e abrangente de mudança. Analisemos alguns casos.

Antes que me patrulhem, aviso que não se trata de absorver sumariamente a governadora Roseana Sarney, mas como as mulheres reagiram à ofensiva política de que foi vítima a primeira mulher com reais condições de vencer uma eleição presidencial no Brasil? Quem viu na grande mídia alguma mobilização nesse sentido por parte dos movimentos feministas? Eu não vi, e olha que leio a seção de política da Folha de São Paulo e do Globo quase todos os dias. A hipótese lançada por Roseana de que estaria sendo vítima também de machismo não parece ter encontrado eco entre as feministas de plantão (talvez por estarem vinculadas à organizações políticas de esquerda que antagonizam o partido da ex-candidata a presidente...). Nem sequer li ou ouvi tais líderes feministas debaterem o assunto em público. Será que os interesses políticos de partidos ainda controlados pelos homens estão acima da luta feminista?

Um segundo e último caso intriga-me. Sou professor e pesquisador na área de administração e convivo com acadêmicas competentíssimas mas quase que totalmente alheias ao movimento feminista. Alguém aí pode lembrar que há muitas feministas em outras áreas do conhecimento científico, particularmente no seio das ciências sociais tradicionais. E é verdade. Certo, mas pergunto-lhes: essas mulheres são a maioria das que atuam no ramo? Se sim, tudo bem, temos um foco de resistência, mas muito pequeno e isolado em relação à outras carreiras.

Mas, para não dizer que não falei de flores, devo admitir e relatar que as mulheres progridem. Nos bancos das minhas salas de aula na Faculdade Adventista da Bahia, localizada em Cachoeira, Recôncavo Baiano, as mulheres já ocupam quase 50% do espaço. Nas turmas de mestrado em administração da Universidade Federal da Bahia, as mulheres representam pelo menos 40% dos assistentes. Nestas eleições presidenciais, uma mulher é candidata a vice-presidente, a Rita Camata. Este fato é representativo de um fenômeno mais amplo: a participação da mulher na política vem crescendo a reboque da lei de 1996 que impôs cotas e mulheres candidatas aos partidos. Desde 1994, dobrou o número de mulheres que disputam uma vaga na Câmara dos Deputados ou nas Assembléias Legislativas Estaduais. Nestas eleições de 6 de outubro, um número recorde de 40 mulheres concorrem ao senado, e 19 candidatas concorrem ao posto de governadora de estado - 4 delas no Rio de Janeiro, que assiste a uma verdadeira campanha cor de rosa.

Também devo reconhecer que no seio das famílias as mulheres têm hoje muito mais poder de decisão do que no passado. Mais informadas, instruídas do que no passado, a maioria empregada, sua participação na renda familiar parece dar maior poder de influência à sua voz na esfera doméstica. O mercado, que não perde oportunidade de aumentar suas vendas e lucros, vêm tratando de se adequar a essa tendência adaptando os produtos de uso comum e a sua promoção às necessidades, desejos e hábitos das mulheres. As montadoras de automóveis por exemplo tratam de cuidar do design e da ergonomia de olho nas exigências e preferências das mulheres.

E todos esses avanços parecem acontecer sem grandes traumas e cisões. As feministas brasileiras, lésbicas ou não, continuam femininas na sua maioria, e dispostas a construir pontes entre os três sexos no seu fazer cotidiano. Esse tom cordial das brasileiras que se emancipam é bastante coerente com o caráter conciliatório e mestiço da nossa sociedade (salve Sérgio Buarque de Holanda!), que é traço distintivo da nossa identidade cultural frente as demais nações.


Héber Sales
Salvador, 25/9/2002

Quem leu este, também leu esse(s):
01. O túmulo do pássaro de Elisa Andrade Buzzo
02. Caminhos para a esquerda de Celso A. Uequed Pitol
03. Frases que soubessem tudo sobre mim de Duanne Ribeiro
04. Não há vagas? Então viva a informalidade! de Diogo Salles
05. Trocando os presentes do Natal passado de Sol Moras


Mais Héber Sales
* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
25/9/2002
16h46min
Olá Héber. Ao ler seu texto, certos termos me causaram certo "estranhamento". Chefe de família? Movimento social feminista? Coisas deste tipo me soam um tanto anacrônicas. A idéia de que alguém "chefia" a família me pareceu muito, mas muito estranha mesmo. Estou habituada a observar os casais, mesmo os mais velhos, desenvolvendo modelos de parceria, sem "chefes", algo aliás imprescindível num mundo em que ambos trabalham e cuidam dos filhos e da casa igualmente. Quanto às dificuldades profissionais da mulher, entendo que não são "privilégio" feminino. Hoje a coisa está complicada para todos, homens, mulheres, jovens, velhos. Os homens não me parecem ter mais facilidades profissionais que as mulheres. Mesmo quanto à remuneração. Portanto, os movimentos feministas perderam o sentido já há algum tempo. As conquistas não são mais femininas ou masculinas e sim das pessoas, da sociedade, dos trabalhadores, dos indivíduos, dos consumidores. Se as mulheres lutam, elas lutam contra quem? Contra o homem? Separar o mundo com homens de um lado e, do outro, bem longe, as mulheres, é enfraquecer a humanidade como um todo. A hora não é de derrotar ninguém. E sim de vencermos todos. Abraços. Kelly.
[Leia outros Comentários de Kelly]
25/9/2002
17h14min
Kelly, os termos que você questiona são conceitos operacionais usados em pesquisas sociológicas sobre o tema abordado. Pessoalmente, compartilho dos valores igualitários que você defende. Abraços. Héber.
[Leia outros Comentários de Héber Sales]
6/1/2004
19h37min
Meu caro Héber, é de se estranhar que você, ao dissertar sobre a lenta modificação dos papéis sexuais no interior das famílias busque encontrar um paralelo entre a falta de defesa da ex-candidata a presidente e candidata ao presídio com uma pretensa discriminação sexista. Não houve defesa pública de Roseana pelos movimentos feministas ou movimentos democráticos por uma simples razão: ela não foi indiciada por ser mulher, por pretender disputar a presidência da República, mas por ter gerido e se locupletado por um enorme golpe no erário público. O simples fato de ser mulher não exime ninguém de suas responsabilidades. Quero lembrar que Celso Pitta foi o primeiro prefeito negro de São Paulo e foi escorraçado não por ser negro, mas por ser corrupto.
[Leia outros Comentários de lizardo paixão]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Lanfeust De Troy. O Marfim Do Magohamoth - Volume 1
Christophe Arleston
Jupati
(2014)



Ridiculo Politico
Márcia Tiburi
Record
(2017)



Juntos no Infinito
Álvaro Basile Portughesi
Feesp
(2012)



Livro Literatura Estrangeira À Procura de Audrey
Sophie Kinsella; Glenda D Oliveira
Galera
(2015)



Uma Canção Para Jack
Celia Bryce
Vergara & Riba
(2014)



Livro Infantil A Lenda da Vitória-régia
Terezinha Éboli
Universo dos Livros
(2012)



A Volta Do Viajante Apresado
Mozart Victor Russomano
Globo
(1979)



Livro Literatura Estrangeira Renascença Assassin
Oliver Bowden
Galera
(2011)



Salerno: Invasão da Itália
David Mason
Renes
(1977)



Batman 1 - bem vindo a gotham city terra de ninguem
Abril
Abril





busca | avançada
47578 visitas/dia
1,7 milhão/mês