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Terça-feira, 7/8/2001
Dor na cacunda
Rafael Lima
+ de 6100 Acessos

Li n'O Dia, um dos poucos jornais do Rio que pode reclamar para si o rótulo de popular, que o estúdio do Allan Sieber está produzindo um curta de animação cujo roteiro funde um conto do Aldir Blanc e uma história verídica do Jaguar, envolvendo o Fausto Wolff. Ótima notícia.

Allan Sieber faz parte da enxurrada de cartunistas gaúchos que deu as caras há uns 10 anos, com Adão Iturrusgarai, Guazzelli e Fabio Zimbres entre outros. Essa turma ficou conhecida ao aparecer nos jornais durante o processo que sofreram: tinham conseguido dinheiro da prefeitura de Porto Alegre para lançar uma revista em quadrinhos, a DumDum, e os vereadores subiram nas tamancas ao verem o dinheiro público sendo utilizado para encher páginas e páginas de baixarias. Allan, nessa época, militava no fanzine Glória, Glória Aleluia. Só quando lançou o curta Deus é Pai, há 2 anos - abrindo, em algumas salas, a sessão de Dogma era, fácil, a melhor coisa do programa - é que Allan mostrou que em casa de saci uma calça dá para dois. Vejam só o argumento: Deus e Cristo tentam resolver seus problemas de relacionamento numa sessão de análise em grupo com uma psicóloga, mas daquelas psicólogas bem de botequim mesmo. Blasfêmia hilariante. O curta serviu também para lançar o manifesto Dogma 1.99, uma gozação com o Dogma 95, defendendo o uso de menos recursos técnicos nos desenhos animados...

Jaguar e Aldir Blanc não precisam mais de crachá para passear nesse meio recém adentrado pelo Allan. São consagrados - no cartum, o primeiro; nas letras de música e crônicas, o segundo. Ambos fazem parte de uma geração muito particular da história recente, porque mesmo tendo sido derrotada politicamente, fez a cabeça de todas que vieram depois dela, com raros dissidentes. Uma turma que, chegando à idade da razão em plena década de 60, teve a chance de escrever o próprio mito - e a maior parte do que vive hoje é fruto desse mito, transformado em prestígio político ou intelectual, cujo mais alto e inatacável degrau é o formador de opinião. Essa trajetória foi seguida pela minoria que teve a habilidade, a visão e a esperteza suficientes para serem ativos nessa transformação. A maioria, claro, se sujeitou, preferindo viver as histórias ao invés de contá-las.

(Não é por acaso que, em mais de 40 anos de cartum, o Jaguar só tenha lançado 2 livros de coletâneas - Átila, Você é Bárbaro e É Pau Puro. Mesmo contando-se suas participações em outros livros, o número não cresce muito. As letras do Aldir Blanc para músicas de João Bosco, Moacyr Luz ou Guinga parecem inacabáveis diante desses números. Não é por acaso, também, que vários membros daquela geração tenham morrido em meados dos anos 80, como narra um dos últimos capítulos da biografia de Carlinhos Oliveira: a redemocratização política, o advento da AIDS, a inflação galopante, as novas bandas de rock brasileiras, o crepúsculo do macho trombeteado por Fernando Gabeira, tudo aquilo compunha um cenário confuso e agressivo demais para quem cresceu acostumado com praia vazia, bossa nova, Garrincha e Brigitte Bardot. Teve até quem não agüentou e se mandou de vez).

Histórias como a que inspirou o curta da Toscographics (eu sempre me emociono com a singeleza do Allan Sieber na escolha das alcunhas): em viagem que fizeram ao Sul do Brasil, conforme consta nos anais da mitologia etílica carioca, o Jaguar ganhava dinheiro apostando em Fausto Wolff contra os campeões locais. Não, não se tratava de briga de rua, nem de prosaicos torneios de queda de braço: Fausto Wolff tinha uma resistência incrível; bebia mais do que qualquer outro no bar. A cena se repetia: depois do pinguço local sair carregado, Fausto limpava o beiço com as costas da mão, recolhia o dinheiro que Jaguar contava e dizia:

- Agora, vamos beber socialmente.

Essa história é contada na orelha de alguns livros do Fausto, e eu achei tão boa que, no lançamento do livro O Lobo atrás do Espelho, não resisiti em perguntar ao próprio se era verdade. Ele concluiu o autógrafo, e me encarou (felizmente estava sentado; levar uma encarada daquele mastodonte de 1.90m seria assustador) por trás dos óculos:

- É, sim. Absolutamente verdadeira.

Outra história com esses dois acabou ficando fora de Conversas de Botequim, último livro do Jaguar, mas foi narrada na sua coluna semanal daquele mesmo jornal popular lá de cima. Na época em que o Didi ainda era engraçado, a Brahma patrocinava uma competição chamada - atenção para a última sílaba - Maratoma. Tratava-se do seguinte: os competidores partiam do Jardim de Allah, margem oeste de Ipanema, onde ficava o antigo Garden bar, e ganhava quem chegasse na praça General Osório, quase fronteira com Copacabana, tendo bebido mais chopes nos bares e botequins credenciados pela cervejaria. Apesar de ser da comissão julgadora, Jaguar fez sua fezinha em Fausto e marcou de encontrá-lo na largada para uma tulipa. Ao ver seu puro sangue já avançado nos trabalhos antes do início da disputa, se desesperou, no que foi acalmado pelo Fausto:

- Calma. Isso era só o aquecimento.

Jaguar terminou o dele e tomou o táxi para a churrascaria Carreta, onde ficariam a comissão. Algumas horas e vários beberrões depois, entra aquele imenso urso branco catando cavaco e quase atropela a mesa de jurados. Apuraram-se os chopes, fecharam-se os números e chegaram à conclusão que o Fausto tinha sido... o segundo colocado!, atrás de um crioulo do morro do Vidigal, que caiu em prantos ao ouvir o veredicto:

- Eu não mereço! Eu não mereço!

Não merecia mesmo, e acabou confessando: na verdade não era um, mas dois crioulos, revezando a mesma camisa, que tinham competido juntos. A verdade se reestabeleceu e Fausto Wolff finalmente pôde fazer o que mais gostava: abraçar - mais um - o caneco. Como se vê, histórias a inspirar mais um curta daqueles gaúchos celerados, não fosse pela iniciativa deles, cada vez mais fadadas a desaparecer com a globalização. Qual CEO da Ambev vai pensar em patrocinar um torneio desses hoje em dia? Tom Jobim, apesar do desgosto para com o país no fim da vida, dizia que voltaria ao Brasil para morrer, porque aqui era o único lugar no mundo em que ele podia dizer para o médico que estava com uma dor na "cacunda" - e ser compreendido. Está cada vez mais difícil encontrar lugares assim.

Para ir além

* Órfão da Tempestade - a vida de José Carlos Oliveira - Jason Tércio - Ed. Objetiva, 1999

* Confesso que bebi - Jaguar de bar em bar - Ed. Record, 2001

* ABC de Fausto Wolff - Fausto Wolff - Ed. L&PM, 1984

* O Lobo atrás do Espelho - Fausto Wolff - Ed. Bertrand Brasil, 2000



Rafael Lima
Rio de Janeiro, 7/8/2001

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