Rousseau e a Retórica Moderna | Carlos Eduardo Suprinyak | Digestivo Cultural

busca | avançada
42373 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Responsabilidade dos planos de saúde na cobertura de tratamentos para autistas
>>> Eunucos [Irmãs Brasil] + Repertório N.3 [Wallace Ferreira e Davi Pontes]
>>> Projeto com concertos gratuitos promove encontro entre obras de Haydn, Mozart e Brahms em outubro
>>> Trajetórias Cruzadas reúne fotografias de Claudia Andujar, Lux Vidal e Maureen Bisilliat
>>> Associação Paulista de Medicina leva orquestra a hospitais de São Paulo
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
>>> Xingando semáforos inocentes
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
Colunistas
Últimos Posts
>>> Mesa do Meio sobre o Primeiro Turno de 2024
>>> MBL sobre Pablo Marçal
>>> Stuhlberger no NomadCast
>>> Marcos Lisboa no Market Makers (2024)
>>> Sergey Brin, do Google, sobre A.I.
>>> Waack sobre a cadeirada
>>> Sultans of Swing por Luiz Caldas
>>> Musk, Moraes e Marçal
>>> Bernstein tocando (e regendo) o 17º de Mozart
>>> Andrej Karpathy no No Priors
Últimos Posts
>>> O jardim da maldade
>>> Cortando despesas
>>> O mais longo dos dias, 80 anos do Dia D
>>> Paes Loureiro, poesia é quando a linguagem sonha
>>> O Cachorro e a maleta
>>> A ESTAGIÁRIA
>>> A insanidade tem regras
>>> Uma coisa não é a outra
>>> AUSÊNCIA
>>> Mestres do ar, a esperança nos céus da II Guerra
Blogueiros
Mais Recentes
>>> O homem que não gostava de beijos
>>> A Serbian Film: Indefensável?
>>> Sobrescritos, de Sérgio Rodrigues
>>> Entrevista com Daniel Piza
>>> E se você me desse um beijo?
>>> Confiabilidade
>>> Completude
>>> O começo do fim do Facebook?
>>> Varinha de condão
>>> O soldado absoluto
Mais Recentes
>>> Bhagavad Gitã: A Mensagem Do Mestre de Bhagavad Gitã pela Pensamento (2006)
>>> Iniciação Ao Yoga de José Hermógenes pela Nova Era (1994)
>>> Maes Que Oram Pelos Filhos de Angela Abdo pela Planeta (2016)
>>> História da música no Brasil de Vasco Mariz pela Nova Fronteira (2012)
>>> Abaixo A Ditadura de Jose Dirceu / Vladimir Palmeira pela Garamond (1998)
>>> Os Anos Ocultos De Jesus de Elizabeth Clare Prophet pela Best Seller (1994)
>>> A Árvore Dos Anjos de Lucinda Riley pela Arqueiro (2017)
>>> Brazilian Issues on Education, Gender and Race de Vários autores pela Fundação Carlos Chagas (1996)
>>> O Mundo De Sofia de Jostein Gaarder pela Companhia das Letras (2003)
>>> As Armas Da Persuasão: Como Influenciar e não se deixar influenciar de Robert B. Cialdini pela Sextante (2012)
>>> Formação Histórica do Brasil de Nelson Werneck Sodré pela Brasiliense (1971)
>>> Inquisição: O Reinado Do Medo de Toby Green pela Objetiva (2011)
>>> Stalingrado: O Cerco Fatal de Antony Beevor pela Record (2002)
>>> A Terceira Onda de Alvin Toffler pela Record (1980)
>>> O Livro De Ouro Da História Da Música de Otto Maria Carpeaux pela Ediouro (2001)
>>> Introdução À Psicologia de Linda L. Davidoff pela McGraw Hill (1983)
>>> Visões do Golpe: a Memória Militar de 1964 de Maria Daraujo; Gláucio Soares; Celso Castro pela Ediouro (2004)
>>> A Escola e o Conhecimento - fundamentos epistemológicos e políticos de Mario Serio Cortella pela Cortez (1998)
>>> Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda pela José Olympio (1977)
>>> Os Generais De Hitler de Correlli Barnett pela Jorge Zahar (2001)
>>> Estórias, Bichos! 2 - antologia infantil de Danilo Ferreira Fonseca; Eliza Bettini e outros pela Dos Escritor (1976)
>>> A Intuitiva de Hannah Howell pela Lua De Papel (2024)
>>> A Vidente de Hannah Howell pela Lua De Papel (2024)
>>> Lição De Morte-Casa Do Pesadelo de Diane Hoh pela Rocco (2000)
>>> A Verdade Ou A Morte - Série Casa Do Pesadelo de Diane Hoh pela Rocco (2000)
COLUNAS

Sexta-feira, 7/12/2001
Rousseau e a Retórica Moderna
Carlos Eduardo Suprinyak
+ de 12100 Acessos
+ 1 Comentário(s)

Um aspecto que sempre atraiu muito minha atenção no Contrato Social foi o caráter semidivino que Rousseau atribui ao conceito de vontade geral, por ele cunhado nesta obra. Todo o discurso do Contrato se desenvolve, creio eu, em torno deste conceito, e Rousseau consegue de uma forma mais do que brilhante conformar toda sua teoria política às implicações do mesmo. Em prol da defesa da vontade geral, Rousseau deixa de lado vários aspectos até certo ponto dogmáticos da vida social e política, visando manter uma coerência e uma fidelidade que são paradigmáticos, ao menos para mim, em se tratando de discurso teórico.

A vontade geral, como desenvolvida por Rousseau, é a verdadeira fonte do poder político, que pode estar representada na figura do monarca, dos aristocratas dominantes ou emergir de uma assembléia geral democrática. O poder político encontra sua justificação na vontade geral, sendo sua única função fazê-la cumprir contra o que quer possa contrapor-se a ela. Desta forma, o poder político que foge a este compromisso primordial é, irremediavelmente, um poder degenerado.

O conceito é bastante amplo, e vai agigantando-se cada vez mais ao longo do livro, transformando-se numa verdadeira entidade. As digressões do autor em torno do tema são numerosas e extremamente interessantes. À guisa de exemplo, há uma passagem em que Rousseau afirma que a vontade geral é, antes de qualquer coisa, a vontade de todos. Eventuais discordâncias entre os cidadãos contratantes políticos não representam uma real discordância quanto ao que seja ou não preferível, e sim um equívoco temporário por parte dos discordantes que representam a minoria, sendo que estes muito em breve perceberão seu erro e verão que a decisão da maioria era, sim, a melhor opção.

O exemplo acima referido é um caso extremo, sem dúvida, mas bastante representativo do espírito de total desprendimento do autor em favor de seus conceitos e elaborações. No entanto, me parece que o exemplo mais contundente de como Rousseau abdica de considerações de ordem ética na construção do Contrato é o tratado dado por ele para a questão da religião. Religioso, porém não adepto de nenhuma igreja particular, Rousseau distingue três tipos de religiosidade. O primeiro deles, a religião do homem, corresponde ao contato direto do indivíduo com seu deus, num foro íntimo. O segundo, a religião do cidadão, é o conjunto de crenças e ritos que serve como fator de coesão social e identificação mútua entre indivíduos de um mesmo grupo. E o terceiro, o único maléfico dentre os três, é a religião dogmática, que apresenta um conjunto de regras a serem seguidas pelo indivíduo, regras estas que podem conflitar, e geralmente conflitam, com as outras regras sociais, as de ordem política estabelecidas no contrato social. Esta terceira forma é maléfica por “submeter o homem a dois senhores”, funcionando como fator de enfraquecimento do poder e da unidade políticos.

No entanto, mesmo entre as duas formas benéficas de religiosidade – benéficas por promoverem o bem-estar do homem consigo mesmo e com o mundo a seu redor –, Rousseau professa preferência por uma delas, qual seja, a religião do cidadão. Para o filósofo, a religião é importante, fora de seu âmbito específico, para promover ou aperfeiçoar a coesão social e política de um povo. E aqui encontramos a implicação extrema do argumento, que Rousseau expõe sem nunca tentar encobrir determinados aspectos ou mesmo maquiar a conclusão como um todo: a religião mais perfeita, do ponto de vista político, é a própria teocracia, onde as figuras dos soberanos político e espiritual estão reunidas numa mesma. É claro que Rousseau, em pleno século das razões e das luzes, não é um adepto da teocracia. Repugna-a, pois a mesma tolhe a liberdade e a tolerância religiosas que, para ele, são fundamentais. Mas leva sua teoria política até às últimas implicações e reconhece-a como ideal de coesão social.

Com vistas ao paralelo que intento traçar neste texto, o ponto mais importante a ser considerado relativamente ao Contrato Social e à vontade geral rousseaunianos é o seguinte: em termos gerais, uma das crenças professadas por Rousseau, mesmo que implicitamente, neste trabalho é que não existe uma regra absoluta de conduta política a ser seguida, e nem mesmo regras que podem ser aplicadas a determinadas situações específicas. A boa solução é a solução que agrada aos interessados. Consequências boas ou ruins, isto não importa, até porque não existem parâmetros concretos para este tipo de avaliação. Uma alternativa consensual, que agrade à comunidade, é sempre a melhor alternativa. E nenhuma outra deve lhe tomar o lugar.

Face à (mais do que tardia) falência dos modelos científicos positivistas das últimas correntes popperianas ocorrida nas últimas décadas, cresceu bastante em vulto e importância o que se convencionou chamar “moderna proposta retórica”. Os teóricos desta corrente propõe-se a resgatar a retórica, como formulada pelos filósofos da Antigüidade Clássica, destituí-la da conotação negativa que acumulou ao longo dos séculos (a retórica como artifício persuasivo voltado para fins escusos), e atribuir-lhe um papel primordial em todos as formas de discurso e comunicação em geral, principalmente no meio científico. A proposta, como pode-se facilmente entrever, gerou e vem gerando grandes celeumas e controvérsias. Seu conteúdo, no entanto, não é tão anárquico quanto poderia parecer à primeira vista, sendo, por outro lado, extremamente instigante e renovador.

A retórica moderna, em ciência, propõe que a evolução e a resolução de controvérsias dá-se não através de métodos falseacionista ou qualquer outro artifício teórico positivista, e sim através de discurso argumentativo, persuasivo e da utilização de recursos retóricos, como os conhecemos. Não convém para os propósitos deste texto uma descrição pormenorizada das críticas e questões levantadas por esta corrente epistemológica, bem como dos argumentos contrários a ela. De forma geral, sob um ponto de vista retórico, uma boa teoria é uma teoria capaz de gerar consenso em torno de si. Os métodos científicos para tanto utilizados são de pouca ou nenhuma relevância.

Há que se prestar atenção, no entanto, para o que está por trás desta definição. O que é, afinal, necessário para que uma teoria forme consenso em torno de si? É claro que belas palavras não formam consenso por si mesmas, ao menos não em todos os casos, e principalmente no meio científico, onde pode-se verificar uma predisposição à não aceitação de argumentos e, consequentemente, à não formação de consenso. Enfim, para formar consenso, a teoria precisará mostrar-se convincente de acordo com seja qual for o parâmetro adotado pela comunidade científica em questão. Formar consenso significa convencer e agradar os envolvidos na discussão.

Ora, o que se pode entrever nisso é, justamente, uma negação de verdades universais e absolutas, da Verdade, professada abertamente pelos teóricos da moderna retórica. O que eu entrevejo nisso é uma sintonia, talvez mesmo involuntária, com o bom e velho Rousseau. A teoria que forma consenso em torno de si, convencendo aos envolvidos na discussão, não é de forma alguma uma Verdade, absoluta, universal e atemporal, mas antes uma verdade conjuntural, contingente, adequada à situação em questão. E esta verdade conjuntural, que aqui forma consenso em torno de si, nada mais é do que a alternativa que lá no Contrato Social era a melhor pois agradava à maior parte da comunidade.

De formas diferentes, sob ângulos diferentes e em épocas diferentes, estas duas manifestações teóricas levantaram uma mesma questão. É necessário preocupar-se com as verdades absolutas, despender nossos esforços intelectuais tentando encontrá-las, ou fazemos melhor atendo-nos aos problemas que se apresentam à nossa frente e que demandam uma solução? A segunda proposta, essencialmente pragmática, torna-se cada vez mais plausível à medida que crescem, dia após dia, os excessos provocados pelo “chauvinismo científico”, como descrito por Feyerabend. O problema, partindo do âmbito científico, pode ser facilmente estendido às mais diversas áreas da vida social, e por isto mesmo a idéia deste texto é estimular uma pequena reflexão acerca do tema. De minha parte, fico com Rousseau e os retóricos.

Para ir além

Cinetc...


Carlos Eduardo Suprinyak
Curitiba, 7/12/2001

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Relações de sangue de Gian Danton
02. State of the art de Rafael Azevedo


Mais Carlos Eduardo Suprinyak
* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
7/12/2001
08h00min
Na minha opinião - não científica - não existe nada absoluto neste universo, tudo á relativo. Verdade idem. Cada um tem a que melhor lhe veste as necessidades, com ou sem Rousseau. Gostei do texto, um bom exercício de racicínio para quem, como eu, não é do ramo. Sonia Pereira.
[Leia outros Comentários de Sonia Pereira]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Cómo Dibujar El Cuerpo Humano/ Como Desenhar o Corpo Humano
Dani Cruz
Ilus Books
(2011)



Diagnóstico de Enfermagem
Nebia Maria Almeida de Figueiredo
Yendis
(2011)



Calculando Adição
Ciranda Cultural
Ciranda Cultural
(2018)



Vida e atos dos apóstolos 591
Cairbar Schutel
O Clarim
(1949)



Deuses No Exilio
J. J. Van Der Leeuw
Teosófica
(2013)



Aos Pedaços
Rodrigo Levino
Jovens Escribas
(2006)



Livro Infanto Juvenis As Duas Vidas de Adônis Coleção Aventuras Mitológicas
Mustafa Yazbek
Ftd
(1999)



Perfect Match
Fern Michaels
Zebra
(2015)



La ciudad de los dioses
Miguel de Cervantes
Santillana
(2008)



O Senhor dos Pássaros (lacrado)
Rogério Andrade Barbosa
Melhoramentos
(2016)





busca | avançada
42373 visitas/dia
1,7 milhão/mês