Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder | Jardel Dias Cavalcanti | Digestivo Cultural

busca | avançada
55760 visitas/dia
2,1 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Comédia sobre barulho estreia em meio a reação de SP à poluição sonora
>>> Festival da Linguiça de Bragança celebra mais de 110 anos de seu principal produto, em setembro
>>> Rolê Cultural do CCBB celebra o Dia do Patrimônio com visitas mediadas sobre memória e cultura
>>> Transformação, propósito, fé e inteligência emocional
>>> Festival de Inverno de Bonito(MS), de 20 a 24 de agosto, completa 24 anos de festa!
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Ozzy Osbourne (1948-2025)
>>> Chegou a hora de pensar no pós-redes sociais
>>> Two roads diverged in a yellow wood
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
Colunistas
Últimos Posts
>>> Tom Brown, fundador da Anthropic
>>> Beraldo e D'Avila comentam Dino e a Magnitsky
>>> Into the Void by Dirty Women
>>> André Marsiglia explica a Magnitsky
>>> Felca sobre 'adultização'
>>> Ted Chiang sobre LLMs e veganismo
>>> Glenn Greenwald sobre as sanções em curso
>>> Waack: Moraes abandona prudência
>>> Jakurski e Stuhlberger na XP (2025)
>>> As Sete Vidas de Ozzy Osbourne
Últimos Posts
>>> Jazz: música, política e liberdade
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> O Próximo Minuto, por Robson Pinheiro
>>> Entrevista com Spacca
>>> Charges e bastidores do Roda Viva
>>> A biblioteca de Rodrigo Gurgel
>>> O belo e o escalafobético
>>> Defesa dos Rótulos
>>> Da decepção diante do escritor
>>> Tapa na pantera e a casa do lago
>>> A Garota de Rosa-Shocking
Mais Recentes
>>> Brincadeira Mortal - Coleção Voo Livre (7º edição - 3º impressão) de Pedro Bandeira pela Ática (2012)
>>> Guia De Aprovacao Em Provas E Concursos (9º edição revista e atualizada) de William Douglas pela Impetus (2010)
>>> Dois Irmaos (Edicao De Bolso - texto integral - 23º reimpressão) de Milton Hatoum pela Companhia De Bolso (2017)
>>> Estrelas tortas (3º edição - 3º impressão) de Walcyr Carrasco pela Moderna (2017)
>>> Depois Daquela Viagem (14º edição - 1º impressão - com suplemento) de Valéria Piassa Polizzi pela Ática (2014)
>>> A Folia De Pilar Na Bahia de Flávia Lins E Silva pela Jorge Zahar (2002)
>>> Sonho De Uma Noite De Verão - historias de shakespeare de Andrew Matthews - Tony Ross pela Companhia Das Letrinhas (2012)
>>> Psicopedagogia da língua oral de Maria José Del Rio pela Artes médicas (1996)
>>> Linguagem e cérebro humano de Cassio Rodrigues; Lêda Maria Braga Tomitch; outros pela Artmed (2004)
>>> Transgressao E Mudanca Na Educação Os Projetos De Trabalho de Fernando Hernandez pela Artmed (1998)
>>> Alfabetizar e Letrar. Um diálogo entre A Teoria e a prática de Marlene Carvalho pela Vozes (2005)
>>> Pântano de sangue (5º edição - impressão) de Pedro Bandeira pela Moderna (2020)
>>> Clínica psicopedagógica epistemiologia convergente de Jorge Visca pela Artes médicas (1987)
>>> Conversando Com Deus - Livro I - um Diálogo Sobre os maiores problemas (1º impressão) de Neale Donald Walsch pela Agir (2009)
>>> Kit Com 4 Livros De Recitas: As Melhores Receitas De Claudia + Claudia Cozinha Só Festa + Receitas De Claudia Para O Inverno + Receitas De Cláudia Para O Outono + 1 livro De Brinde de Vários Autores pela Abril, Círculo Do Livro
>>> Metodologia Do Latim: Vida Cotidiana E Instituições de Vandick L. Da Nóbrega pela Livraria acadêmica (1962)
>>> Revista Banana Chic nº 1 a de Ideia Editorial pela Ideia
>>> Revista Nova edição 483 - Capa Preta Gil de Editora Abril pela Abril (2013)
>>> Revista Serviam nº 4 de Santa Úrsula pela Santa Úrsula (1944)
>>> Will & Will Um Nome Um Destino + O Teorema Katherine + Quem E Você, Alasca? de John Green pela Galera, Intrínseca, Martins Fontes
>>> Revista Serviam nº 5 de Santa Úrsula pela Santa Úrsula (1946)
>>> Revista Serviam nº 6 de Santa Úrsula pela Santa Úrsula (1947)
>>> Revista Serviam nº 3 de Santa Úrsula pela Santa Úrsula (1944)
>>> Revista Serviam nº 2 de Santa Úrsula pela Santa Úrsula (1943)
>>> Revista Serviam nº 1 de Santa Úrsula pela Santa Úrsula (1943)
COLUNAS

Terça-feira, 2/7/2024
Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
Jardel Dias Cavalcanti
+ de 9000 Acessos


Depois de cantar em alto e bom som que não escreveria mais, fruto da decepção em relação ao meio literário ― com seus prêmios, rodadas de pizza, tapas nas costas e ações entre amigos ― Marcelo Mirisola retorna com um delicioso e amargo fruto de sua criação: Espeto Corrido, pela Velhos Bárbaros ― edição do autor ― em uma primeira tiragem numerada de 50 exemplares.

A literatura de Mirisola ― quem já leu, sabe ― é impiedosa. Politicamente incorreta, desconcerta os bem-pensantes. Mas, para além disso, o autor tem algo raro: estilo. Depois da leitura de seus livros, fica a impressão de que lemos alguém que, de fato, escreve uma literatura única, arrojada não apenas na construção de seus personagens em desvario, mas compondo cada frase que exige que se releia ― pois dá gosto ver sua formação, a inteligência, a sutileza e a maldade de sua construção.

Mirisola é autor de uma vasta obra, dentre os quais, os romances A vida não tem cura, Como se me fumasse, Notas de arrebentação, Memórias da Sauna Finlandesa, Hosana na sargeta etc. E as notáveis e imperdíveis crônicas de O Cristo empalado.

Um autor que escreve com tesão e, para jogar a casa abaixo, não economiza nas marretadas. Em Espeto Corrido, a verve tragicômica se destaca. Impiedoso com os personagens, faz de suas vidas uma sucessão de desastres. Não há saída, como diz Ângela Rorô numa música: “a vida não presta”.

E raros são os escritores que encaram de frente, e com pessimismo agudo, essa verdade. Não há redenção, muito menos sublimação ― a pedrada atinge o vidro e o espatifa a cada frase de Mirisola. E quem joga a pedra é o autor, que parece gozar, esse o lado cômico de tudo, ao assistir ao fracasso das existências que ganham vida na sua obra.

O livro é composto de uma série de histórias, digamos, bizarras. Sua base é a crença (irônica, já que se trata de Mirisola) em milagres. Diz o autor “Eu acredito em Milagres. É mais do que necessário, diante da carnificina que é a vida, acreditar em milagres”.

E o milagre, no caso, é o aparecimento do Tinder como possibilidade de mais uma vez se poder tentar criar relações humanas viáveis. É a partir das relações estabelecidas via Tinder que Mirisola conecta vidas humanas que serão imediatamente chafurdadas na selvageria da existência.

Eu não vou aqui resumir as histórias de Espeto Corrido, já que o espaço de uma resenha é curto. O que importa é dizer que tipo de literatura se trata: quando estamos diante de um romance que escapa ao registro do tipo bom-mocismo, literatura de convento para freiras, literatura pedagógica e/ou ideológica de redenção/salvação.

Não há nada disso na obra de Mirisola. Por isso, evidentemente, o autor se torna um marginal, uma espécie de desterrado. Na orelha do livro, escrita por Leo Lama, ele diz: “Marcelo Mirisola está isolado de sua geração como todo criador honesto deve estar(...) Precisamos contar com artistas que sabem que é preciso permanecer à margem, ainda que uma ampla escala de leitores lhes seja devida”.

Os encontros via Tinder (esse “açougue virtual”) anunciam para seu personagem principal uma espécie de felicidade possível, já que realiza, via aplicativo, uma comunicação entre humanos.

Aí é que mora a filosofia: esses humanos não são mais que “restos humanos” ― ou o que sobrou de uma desestruturação total de si mesmos, descritos impiedosamente pelo escritor.

Mirisola também aproveita para pensar criticamente o Brasil e suas zonas de (des)conforto, como a ilusória miragem de uma zona sul Copacabana-carioca dos sonhos dos anos 50, confrontada com a imagem do país alegre que se desfaz nos ferrados anos de verde-e-amarelo do tempo presente ― com suas “madames socialites, influencers & feitoras”, uma rede de corruptos lobos travestidos de cordeiros, numa transa do mal que envolve políticos, figurões do judiciário, artistas da Globo, polícia, milícia etc.

São alfinetadas-sínteses aqui e ali que apontam o desastre de um país dominado pela absoluta falta de sentido, um país que se parece com uma churrascaria de beira de estrada, onde todas classes sociais comem a mesma carne, mas pagam cada qual com a desgraça pessoal de suas vidas.

Claro que nem o Tinder suportará tal personagem. “Sua conta foi banida do Tinder(...) Você não poderá mais acessar sua conta do Tinder ou criar novas contas no futuro”.

O livro se encerra com um “Daqui para a frente é a realidade imposta pela censura, vida que segue, punheta(...)”

Uma alegoria sobre a impossibilidade de se escrever livremente num mundo que exige o politicamente correto do artista, da arte, da vida. Naufrágio da arte.

“Artista bom é artista morto”, já disse alguém. Como aconteceu com Hilda Hilst, por exemplo, que era “impublicável” para o grand monde da literatura ― mas que, ao morrer, viu sua obra sendo devidamente impressa e discutida, o mesmo poderá acontecer com Mirisola, quando alguma poderosa editora comprar seu espólio e o transformar num fetiche subversivo que renderá um saco de moedas de ouro aos seus cofres.

Como disse Aldir Blanc sobre Mirisola: “Marcelo Mirisola é um escritor imenso e o futuro o consagrará(...) Um país que sofre as ignomínias pelas quais passamos, que tem vermes insaciáveis em seu organismo político-social, da presidência do Senado aos empresários, empreiteiros, ruralistas, banqueiros et caterva, precisa de um criador de caso com pena afiada, de vários deles, ou morre à míngua de septicemia(...) Mirisola não é odara, não tem bom astral, não economiza ofensas, não poupa os bem-pensantes tão em voga(...) Os textos, como o autor, são paradoxais: nos iluminam por suas sombras, nos redimem lançando maldições, nos lavam a alma ao enfiá-la de cabeça no pântano em que vivemos”.

Dito e feito, não dá para não ler Mirisola, corram à livraria. E aproveitam para conhecer ― quem ainda não conhece ― toda a obra de Mirisola.


Para ir além
O livro Espeto Corrido pode ser adquirido no @sebodobac.

Nota do Editor
Leia também "O herói devolvido?", "O Herói Devolvido" e "Três vezes Mirisola".


Jardel Dias Cavalcanti
Londrina, 2/7/2024

Mais Jardel Dias Cavalcanti
Mais Acessadas de Jardel Dias Cavalcanti
01. Parangolé: anti-obra de Hélio Oiticica - 17/12/2002
02. Davi, de Michelangelo: o corpo como Ideia - 3/11/2009
03. Picasso e As Senhoritas de Avignon (Parte I) - 20/12/2011
04. O assassinato de Herzog na arte - 30/9/2014
05. Felicidade: reflexões de Eduardo Giannetti - 3/2/2003


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Os Sertões
Euclides Da Cunha
Nova Cultural
(2002)



A Província Fluminense - Administração Provincial no Tempo do Império do Brasil
Org. Jose Edson Schumann Lima
Arquivo Publico
(2012)



Prazer de Matar
Julie Garwood
Landscape
(2004)



Aereality
William L. Fox
Pub Group West
(2009)



Ciência da Oração
Masaharu Taniguchi
Seicho NO IE
(2012)



New Interchange
Jack C. Richards
Cambridge University Press
(2003)



A Síndrome de Otelo
Barry Lenson, Kenneth C. Ruge
Best Seller
(2006)



Nosso Lar
Francisco Cândido Xavier
Feb
(2006)



Brás, Bexiga e Barra Funda
Antônio de Alcântara Machado
Ibep Nacional
(2006)



Vidas Breves Cuentos Malditos
Tonni Lima
Dunken
(2009)





busca | avançada
55760 visitas/dia
2,1 milhões/mês