A Euforia Perpétua, de Pascal Bruckner | Ricardo de Mattos | Digestivo Cultural

busca | avançada
72040 visitas/dia
2,5 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Renata Pizi ministra workshop online sobre criação de espetáculos musicais infantojuvenis
>>> EUNIC Brasília anuncia a programação cultural gratuita da Semana da Europa 2025
>>> Abdias do Nascimento ganha espetáculo sobre sua trajetória no Teatro SESC Copacabana
>>> Agito gratuito: Decco Torres estreia o projeto “Neo Baile” no Centro
>>> Guinga
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
Colunistas
Últimos Posts
>>> Daniel Ades sobre o fim de uma era (2025)
>>> Vargas Llosa mostra sua biblioteca
>>> El País homenageia Vargas Llosa
>>> William Waack sobre Vargas Llosa
>>> O Agent Development Kit (ADK) do Google
>>> 'Não poderia ser mais estúpido' (Galloway, Scott)
>>> Scott Galloway sobre as tarifas (2025)
>>> All-In sobre as tarifas
>>> Paul Krugman on tariffs (2025)
>>> Piano Day (2025)
Últimos Posts
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
>>> Transforme histórias em experiências lucrativas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> A pobreza cultural nossa de cada dia
>>> Samurais de Fecaloma
>>> Antologia Ser Mulher
>>> Henry Moore: o Rodin do século XX
>>> Wanda Louca Liberal
>>> Rainbow 1977
>>> A avó e a montanha-russa
>>> Novo site da Filmes Polvo
>>> Rodrigo Capella em turnê
>>> Deitado eternamente em divã esplêndido – Parte 1
Mais Recentes
>>> Gramática Escolar da Língua Portuguesa 2ª ed Novo Acordo Ortográfico de Evanildo Bechara pela Nova Fronteira (2010)
>>> Biomass For Energy And The Environment Volume 3 de P. Chartier/ G. L. Ferrero/ U. M. Henius pela Pergamon (1996)
>>> Topicos de fisica 3 - eletricidade (10º edição) de Gualter; Newton; Helou pela Saraiva (1995)
>>> Biomass For Energy, Environment, Agriculture And Industry Volume 2 de Chartier/ Beenackers/ G. Grassi pela Pergamon (1995)
>>> Guerra Do Fim Do Mundo de Mario Vargas Llosa pela Francisco Alves (1982)
>>> Making A Business From Biomass In Energy, Environment, Chemicals, Fibers, And Materials, Volume 2 de R P Overend and E Chornet pela Pergamon (1997)
>>> Poemas De Contagem E Enigmas Populares de Lúcia Pimentel Góes pela Prumo (2009)
>>> Single-channel Recording (perspectives On Individual) de Bert Sakmann/ Erwin Neher pela Springer (1995)
>>> Super apresentacoes - Como Vender Ideias E Conquistar Audiencias (7º impressão) de Joni Galvao - Eduardo Adas pela Panda Books (2013)
>>> Biotechnology For Fuels And Chemicals: The Twenty-third Symposium (abab Symposium) de Mark Finkelstein/ Brian H Davison pela Humana Press (2002)
>>> O Ratinho, o Morango Vermelho Maduro e o Grande Urso Esfomeado (1º ed.) de Don e Audrey Wood pela Brinque Book (2012)
>>> Proceedings of the Twenty-Fifth Symposium on Biotechnology for Fuels and Chemicals Held May 4-7 de Mark Finkelstein/ Brian H Davison pela Humana Press (2004)
>>> Enrico De Prata (capa dura) de Madonna pela Rocco Jovens Leitores (2005)
>>> Biotechnology For Fuels And Chemicals: The Twenty-seventh Symposium (applied Biochemistry And Biotechnology, Volumes 129-132) de James D. Mcmillan pela Humana Press (2006)
>>> O Homem-pássaro - História De Um Migrante (2º edição - 5º impressão) de Ricardo Dreguer - Bruna Assis Brasil pela Moderna (2017)
>>> Biotechnology For Fuels And Chemicals: The Twenty-eighth Symposium. (abab Symposium) de Jonathan R Mielenz/ K Thomas Klasson pela Humana Press (2007)
>>> Biotechnology For Fuels And Chemicals: The Twenty-third Symposium (abab Symposium) de Mark Finkelstein/ Brian H Davison pela Humana Press (2002)
>>> Twentieth Symposium On Biotechnology For Fuels And Chemicals: Presented As Volumes 77-79 de Brian H Davison / Mark Finkelstein pela Humana Press (1999)
>>> O Discreto Charme Das Partículas Elementares (2º edição - capa dura) de Maria Cristina Batoni Abdalla pela Lf Editorial (2016)
>>> Crc Handbook Of Chemistry And Physics, 91st Edition (crc Handbook Of Chemistry & Physics) de W M Haynes editor in chief pela Crc Press (2010)
>>> Topicos de fisica 2 - termologia, ondas e optica (10º edição) de Newtob - Helou - Gualter pela Saraiva (1993)
>>> Signos Solares para o Século XXI - Um Guia Prático para o Dia a Dia Moderno de Babs Kirby pela Nova Era (2007)
>>> What to Expect The First Year de Arlene Eisenberg; Heidi E Murkoff; Sandee Hathaway pela Workman Publishing (1989)
>>> O Sonho Que Brotou (capa dura) de Renato Moriconi pela Dcl (2010)
>>> O Maior De Todos Os Mistérios de Giselda Laporta Nicolelis pela Editora Do Brasil (2017)
COLUNAS

Quinta-feira, 5/6/2003
A Euforia Perpétua, de Pascal Bruckner
Ricardo de Mattos
+ de 18400 Acessos

E felicitei mais os mortos do que os vivos; considerei mais feliz do que uns e outros aquele que ainda não nasceu, e que não viu os males que se fazem debaixo do sol”. (Eclesiastes: 4,2-3)

Disse que Sarah tinha o dever de ser feliz, dever para com ela mesma e para com os outros. ‘Espero que esteja alegre, pois você não tem porque não estar. É errado que um coração tão querido esteja de outra forma, pois nesse caso estaria mostrando-se insatisfeito e você não tem motivos para estar. Estou certa disso’. Desta forma, mais um peso, o de não cumprir, para com aqueles que a amavam, a obrigação de ser feliz, fez afundar ainda mais o coração de Sarah”. (Aristocratas, de Stella Tillyard, pág. 244)

Creio ser erro do Homem acreditar n’um estado pleno de Felicidade, refractário a qualquer sofrimento. Deveras, cabe-nos melhor anelar ilhas de desafogo e alívio d’alma, instantes não muito frequentes de suspensão dos males. A vida espera-nos tomar fôlego para novas atribulações. Verifico ainda uma antipática contradição: cansa-se da Felicidade um dia tão almejada. Isso talvez explique-se pelo facto de conhecer-se melhor o objecto ao qual voltou-se um dia o labor e o empenho, além da maior ou menor resistência ao cerco do tédio. Ou mesmo a classificação precipitada de um estado ou objecto: “serei feliz quando formar-me na faculdade”. Veja-se sobre este pormenor o conto O professor de Letras de Chekhov. Um livro de leitura há muito esperada apresenta-nos um imbróglio inútil. A mulher sonhada exala cheiros e porta-se de maneira inconveniente. “Ah, meninos, só os loucos vão para o mar – a não ser que seja para trocar de mulher de vez em quando. Um homem certamente não pode se sentir satisfeito com um tipo só para sempre” (Faulkner). Algo de terrível devemos ter cometido contra Deus para, calejados, insistirmos nesta busca sisífica de algo não destinado a nós. Alguns esperam a Felicidade n’uma vida futura e bem triste será o logro se esta vida não existir. O cérebro arquiva as frustrações e o inconsciente cria um lugar onde elas seriam substituídas por vitórias. Passamos então a desejar algo existente apenas em nós e temo ser o “Céu” um paliativo auto-aplicado pela mente antes que o ser mergulhe definitivamente no Nada.

A Euforia Perpétua, do romancista e ensaísta francês Pascal Bruckner (1.947), é um competente ensaio sobre o que ele denomina “o dever de felicidade”. Infelizmente, como muitos poderão lê-lo imbuídos do prevalecente espírito de poltronaria, o livro corre o risco de ser taxado como pessimista e “fora da realidade”, quando na verdade é em extremo esclarecedor e lúcido. O talento do autor está em organizar as ideias que já trazíamos em mente. O dever de felicidade é definido como “a ideologia própria da segunda metade do século XX, que obriga a que tudo seja avaliado pelo ângulo do prazer e da contrariedade, intimação à euforia que expõe à vergonha e ao mal-estar os que não aderirem a ela”. O grosso da humanidade, buscando a resposta imediata para tudo, realmente procura aquilo que causa exclusivamente prazer. Tal posicionamento perante a vida é irracional e antinatural. Para alcançarmos um estágio próximo ao entendido como “Felicidade”, não é necessário lembrar a quantidade de obstáculos a serem afastados, muitas vezes a duras penas. Hoje quer-se o resultado sem o sacrifício intermediário e a aceitação da ideia da presença deste sacrifício é vista como cobardia, modo de pensar apenas a dificultar ainda mais a evolução do indivíduo. Evita-se pensar “Desejo tal objectivo, mesmo sabendo da inevitabilidade de tais e tais percalços” para pensar “Quero tal coisa, mas sem tais e tais percalços, senão, não” – neste ponto tangencia-se o conceito do fun. Não nego a presença d’um grande cansaço entre as pessoas, mas esta segunda forma de pensar tira-lhes a determinação para enfrentar as dificuldades da vida além de mantê-las n’uma inútil indefinição bem como n’um evitável conformismo. “Queria aquilo, mas é tão difícil conseguir ... fico com isto aqui mesmo”.

Logo na introdução, Bruckner apresenta três paradoxos ao projecto pessoal de felicidade: indefinição, apatia após a realização e disfarce do sofrimento. A indefinição é o mais explícito destes paradoxos. Alguém afirma querer ser feliz, mas pergunte-se-lhe o significado desta asserção: ou não responderá, ou o fará de forma genérica, citando objectos de desejo. A apatia após a consecução já foi tratada até pela Literatura. Em Guerra e Paz – misto de História e receituário da natureza humana –, o príncipe André Bolkonski enfastia-se de suas conquistas amorosas tão logo certificado de seu sucesso. Daí alguns falarem estar a felicidade no caminho e não no ponto de chegada. Eu já não acredito nisso, pois suponho ser erro da pessoa não examinar bem suas intenções antes de empenhar-se. Há privilegio do sonho – seja lá o que for isso – e desdouro do plano.

O pior dos três paradoxos é o terceiro: disfarce d’um sofrimento não resolvido. Está sendo criada uma geração de efeminados e melindrosas de tal proporção que ou os compreendemos ou enojamo-nos. Indivíduos não sabem lidar com os menores contratempos impostos pela Vida, de tudo têm medo e mantêm uma conduta caracterizada pela omissão. Há um medo imenso no comprometimento, abandonam amigos e parentes para depois confortarem-se com uma justificativa convincente. Toda responsabilidade os assombra e a energia gasta em afastar um problema poderia ser melhor empregada em resolvê-lo. A batalha prosseguirá e qual a serventia do soldado borrado e trémulo, não ao empunhar as armas mas, pior ainda, ante a possibilidade de manejá-las?

A Morte. Esta palavra sequer pode ser pronunciada, sob o argumento de não se precisar aludir a assunto tão “tenebroso” quando se tem a vida inteira pela frente. Não se sabe. Iniciado o dia, não sabemos se concluiremos a jornada. A manhã não garante a tarde, nem esta a noite. “Comamos e bebamos, porque amanhã morreremos”, eis a versão judaica do carpe diem latino. Há devaneios com o futuro incerto, e nenhuma preocupação com o futuro inevitável. Contudo, é milenar a lição que condiciona à ocorrência da morte o julgamento da felicidade ou não de uma pessoa em vida (vide Herodoto, História, Livro I, capítulo XXXII e Montaigne, Ensaios, Livro I, capítulo XIX). Mesmo este julgamento baseia-se no aparente, pois não poucas tragédias desenvolvem-se e extinguem-se no íntimo do homem sem a sociedade ser informada a respeito.

O plano de felicidade começa a ruir, segundo o ensaísta, no ambiente revolucionário do século XVIII. Por milénios evitou-se pensar nisso como algo a ser procurado neste mundo e nesta vida. Melhor dizendo: a Felicidade real seria encontrada somente após a morte, quando efectivada a salvação providenciada na duração da vida terrena. Os pensadores do Iluminismo trouxeram para cá a noção de Felicidade e acabaram por agravar a sensação de angústia do homem que seguiu a nova cartilha mas mesmo assim ainda não era feliz. Séculos de reflexão foram substituídos por arroubos de instantes e a conclusão é o desânimo do indivíduo, pois entre ser feliz agora e ser salvo amanhã, escolheu a primeira alternativa e hoje não é nem um, nem outro. Não se acha feliz e não acredita em uma vida posterior na qual se fale em “salvação”. Todos consideram eloquente o núncio da morte de Deus – preciso verificar o contexto exacto desta assertiva – mas não sabem como agir com o consequente sentimento de orfandade. O mal dos pensamentos ateístas está em sua persuasão, pois buscam seus argumentos nos sofrimentos humanos e a aceitação destas ideias, se sossega a alma por alguns instantes, não traz uma solução duradoura. Para evitar condenação, limbo, ou qualquer outra situação ou lugar ruim, a providência foi a eliminação estas possibilidades e preferir-se a óptica da Existência como um “breve parêntesis entre dois Nadas”. A religião tirava do indivíduo a causa do sofrimento e a dor era tida como inevitável; depois o homem foi colocado frente a frente com o sofrimento e com a ideia da evitabilidade. Agora somos responsáveis por tudo e não temos o que Bruckner nomeia “álibi religioso”. Até a robustez de espírito dada pela religião foi substituída, voluntariamente, por uma indecisão intimamente ligada à insegurança.

Bruckner, enfim, faz um detalhado estudo tanto da infelicidade quanto do dever de ser feliz, mal moderno que faz a pessoa observar a aparente felicidade alheia, afligir-se por não estar igualmente “satisfeita” e ainda por cima correr o risco de ser excluída ao convívio por seus semelhantes mais teimosos. Banalidade, rotina, anulação, culto ao corpo e prejuízo do espírito são, entre outros, os temas finamente abordados pelo autor. Não oferece solução, pois não há uma saída aplicável a todos, uma fórmula prévia a ser indicada.

Para ir além





Ricardo de Mattos
Taubaté, 5/6/2003

Mais Ricardo de Mattos
Mais Acessadas de Ricardo de Mattos em 2003
01. Da Poesia Na Música de Vivaldi - 6/2/2003
02. Poesia, Crônica, Conto e Charge - 13/11/2003
03. Da Biografia de Lima Barreto - 26/6/2003
04. Stabat Mater, de Giovanni Battista Pergolesi - 27/11/2003
05. Estado de Sítio, de Albert Camus - 4/9/2003


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




La Conscience Juive Face a La Guerra
Jean Halpérin et Georges Levitte
Presses Universitaires de Frac
(1976)



Lingua e Literatura Vol 3 2 Grau
Faraco & Moura
Atica
(1992)



Pedaço de Santo
Godofredo de Oliveira Neto
Nova Fronteira
(1997)



A Tragédia Grega (2vols)
H. D. F. Kitto
Arménio Amado
(1972)



Livro Infanto Juvenis Antologia De Contos Contos Brasileiros Contemporâneos
Julieta de Godoy Ladeira
Salamandra
(2005)



Nueva Sociedad
Marcio Pochmann e Outros
Talleres
(2013)



Memórias de um sargento de milícias
Manuel Antônio de Almeida
Ática
(2003)



Análise do homem
Erich Fromm
Zahar
(1974)



Negocie Qualquer Coisa Com Qualquer Pessoa
Eduardo Ferraz
Gente
(2015)



The Amazon Rain Forest
Bernard Smith
Penguin Readers
(2005)





busca | avançada
72040 visitas/dia
2,5 milhões/mês