Hamburgo: a bela do norte | Luis Eduardo Matta | Digestivo Cultural

busca | avançada
55671 visitas/dia
2,1 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Festival da Linguiça de Bragança celebra mais de 110 anos de seu principal produto, em setembro
>>> Rolê Cultural do CCBB celebra o Dia do Patrimônio com visitas mediadas sobre memória e cultura
>>> Transformação, propósito, fé e inteligência emocional
>>> Festival de Inverno de Bonito(MS), de 20 a 24 de agosto, completa 24 anos de festa!
>>> Bourbon Street Fest 20 Anos, de 24 a 31 de agosto, na casa, no Parque Villa Lobos e na rua
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Chegou a hora de pensar no pós-redes sociais
>>> Two roads diverged in a yellow wood
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
Colunistas
Últimos Posts
>>> Into the Void by Dirty Women
>>> André Marsiglia explica a Magnitsky
>>> Felca sobre 'adultização'
>>> Ted Chiang sobre LLMs e veganismo
>>> Glenn Greenwald sobre as sanções em curso
>>> Waack: Moraes abandona prudência
>>> Jakurski e Stuhlberger na XP (2025)
>>> As Sete Vidas de Ozzy Osbourne
>>> 100 anos de Flannery O'Connor
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
Últimos Posts
>>> Jazz: música, política e liberdade
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Tapa na pantera e a casa do lago
>>> A Garota de Rosa-Shocking
>>> Ofício da Palavra (BH)
>>> Nerd oriented news
>>> Para você estar passando adiante
>>> O fim (da era) dos jornais, por Paul Starr
>>> Macunaíma, de Mário de Andrade
>>> Anos Incríveis
>>> Risca Faca, poemas de Ademir Assunção
>>> Camuflagem para e-readers
Mais Recentes
>>> O Amor Nos Tempos Do Cólera de Gabriel García Márquez pela Record (1998)
>>> A Felicidade Está Dentro de Nós - Miguel Lucas de Miguel Lucas pela Loyola (1987)
>>> Reforma Íntima Sem Martírio de Ermance Dufaux pela Dufaux (2012)
>>> Lendas e fábulas do Brasil de Clássicos da Infância pela Círculo do Livro
>>> Bumba Meu Boi, Mapinguari Curupira Und - Lúcia Pimentel Góes de Lúcia Pimentel Góes pela Vale Livros (1994)
>>> Poemas De Bocage de Manuel Maria Barbosa du Bocage pela Nova Fronteira (1987)
>>> Dicionário Alemão Português de Leonardo Tochtrop pela Globo (1987)
>>> Joaquin Zuluquim Zulu - Ercília Pollice de Ercília Pollice pela Dom Bosco (1983)
>>> Misbehaving A Construção da Economia Comportamental de Richard H. Thaler pela Intrínseca (2018)
>>> Preferência nacional 7 revistas de Editora Ondas pela Ondas
>>> Rasgados de Clube Dos Autores pela Clube Dos Autores
>>> Irmãs em Auschwitz de Rena Kornreich Gelissen pela Universo dos Livros (2015)
>>> Neoliberalismo de Vladimir Safatle pela Autêntica (2023)
>>> Reflexões Da Realidade - Ricardo Nogueira Felício de Ricardo Nogueira Felício pela Gb
>>> Culinária Vegetariana em 30 minutos de Joanna Farrow pela Manole (2011)
>>> Diário de um Zumbi do Minecraft - Vol. 03: Férias do terror de Zombie Zack pela Sextante (2015)
>>> Estradas da Italia de Folha de S. Paulo pela Publifolha (2014)
>>> Estradas da França de Folha de S. Paulo pela Publifolha (2011)
>>> Scuba Diving de Monty Halls / Miranda Krestovnikoff pela Dk (2006)
>>> Rei Spawn - Vol. 1 de Todd McFarlane pela Panini Comics (2024)
>>> 10 Lições sobre Hannah Arendt de Luciano Oliveira pela Vozes (2016)
>>> O Desejo dos Outros de Hanna Limulja pela Ubu (2022)
>>> 10 Lições sobre Heidegger de Roberto S. Kahlmeyer-mertens pela Vozes (2022)
>>> 10 Lições Sobre Husserl de Daniel Guilhermino pela Vozes (2024)
>>> Balé das Emoções de Geni Guimarães pela Malê (2021)
COLUNAS

Terça-feira, 31/1/2006
Hamburgo: a bela do norte
Luis Eduardo Matta
+ de 5300 Acessos
+ 2 Comentário(s)

A primeira vez no exterior a gente nunca esquece. A minha aconteceu alguns anos atrás. Lembro-me como se fosse ontem daquele dia 14 de agosto quando, após longas horas de vôo e uma conexão problemática em Paris, que quase leva minhas malas embora, finalmente desembarquei, sob um calor inacreditável de 33 graus, em solo europeu. Lá estava eu, em Hamburgo, na Alemanha, para a minha primeira temporada fora do Brasil.

Imagino que muita gente, algum dia, tenha fantasiado sobre as circunstâncias de uma eventual primeira ida à Europa. A estação mais apropriada, que cidades visitaria, que tipo de programação faria, que clima encontraria. Durante anos, isso também aconteceu comigo. Eu, volta e meia, me imaginava chegando à Europa, para um périplo cultural e gastronômico que, naturalmente, abarcaria os grandes centros, aqueles mais consagrados junto a qualquer turista de primeira viagem que se preze: Londres, Paris, Roma, Madri... Gosto de viajar, mas me incomodam tremendamente todos os trâmites burocráticos relacionados a viagens, desde a aquisição de passagens até, pesadelo dos pesadelos, a arrumação da bagagem e o seu transporte. Talvez por isso eu tenha adiado tanto a minha primeira ida ao exterior, cujo destino, acabou sendo, justamente a Europa. No entanto, contrariando todos os planos que eu havia traçado por anos, em vez de inaugurar o velho continente por uma das suas famosas cidades, fui parar, por obra do destino, num lugar onde eu jamais havia imaginado colocar os pés. Eu não tinha a menor idéia de como era Hamburgo quando lá cheguei naquele hoje distante mês de agosto. E poder conhecê-la na prática, sem o auxílio prévio de nenhum guia turístico, foi uma das experiências mais vívidas e notáveis pelas quais passei até hoje. Nunca mais, em nenhuma outra viagem, eu pude experimentar sensações e descobertas similares às daquela primeira visita à Alemanha.

Hamburgo fica no norte da Europa, uma zona predominantemente fria. E, naturalmente, por conta disso, os 33 graus que me saudaram na chegada logo arrefeceram para uma média agradável que variava entre 18 e 22 graus, temperaturas típicas do verão naquelas altas latitudes. Fiquei hospedado num apartamento confortável, numa rua densamente arborizada que margeava um canal repleto de cisnes, chamada Salomon Heine Weg, a menos de dois minutos a pé da movimentada Eppendorfer Landstrasse, uma das principais artérias comerciais da região a oeste do Alster. Toda essa área da cidade é pontilhada por amplos parques, cortados por rios e canais e, no verão, as árvores no auge da sua folhagem verde, cobrem as ruas, fazendo-as parecer jardins. A brisa é constante e tem-se a sensação de se estar a dois passos de alguma praia. Eu saía todos os dias a pé e, após passear pela região de Eppendorf, acabava quase sempre tomando o metrô na Kellinghusenstrasse ou na Klosterstern em direção à Stephansplatz ou à Jungfernstieg, no centro da cidade, para tardes memoráveis, em que o prazer maior, era vagar sem rumo pelas ruas, entrar nas lojas e nas galerias e tomar um cappuccino num dos inúmeros cafés espalhados por toda parte. Dessa maneira fui descobrindo uma Hamburgo belíssima, apaziguadora, cordial, simpática e acolhedora, uma cidade aristocrática, elegante e pragmática, mas que tinha sempre um sorriso ou uma gentileza reservados sob medida, contrariando toda a crença que se tem em relação ao humor e à receptividade dos alemães, que a despeito das minhas expectativas iniciais, revelaram-se um povo afável, alegre e extremamente hospitaleiro.

Erguida no estuário do rio Elba, relativamente próxima aos mares do Norte e Báltico, Hamburgo é cortada por uma grande quantidade de canais com cerca de 2.300 pontes, mais do que Veneza e Amsterdã juntas. Com pouco menos de dois milhões de habitantes, é o segundo maior centro urbano da Alemanha, tendo sido o maior da antiga Alemanha Ocidental. Seu porto é um dos maiores e mais importantes do planeta e atraiu para a cidade, sedes e grandes escritórios das principais companhias armadoras e de navegação internacionais, transformando Hamburgo numa espécie de Wall Street do comércio marítimo. Graças às minhas temporadas na cidade, pude visitar demoradamente algumas dessas empresas, o que me rendeu farto material para o meu romance 120 Horas que tem, entre os cenários, justamente uma companhia armadora, baseada na Europa e no Oriente Médio. Também a agitada vida noturna na cidade é reconhecida como uma das melhores da Europa. Em torno da famosa Reeperbahn, a noite ferve nos teatros, casas de espetáculos, bares e também nas dezenas de prostíbulos, sex shops e casas de strip tease, sem contar a impressionante concentração de prostitutas nas calçadas, que fazem as mais concorridas zonas de prostituição brasileiras parecerem conventos semi-habitados por noviças castas.

Minhas recordações de Hamburgo são as melhores possíveis e elas parecem inesgotáveis. Para mim, Hamburgo era o fim de tarde no Café Fleuron, na Kaufmannshaus, onde, sob a luz suave que penetrava pelas clarabóias, era possível apreciar um café com creme e um suco de laranja e depois sair para visitar a galeria de arte que ficava ao lado. Hamburgo era o sommelier australiano do supermercado do subsolo da Karstadt, em Eppendorf, que, ao me ver descendo a escada rolante, sempre me saudava efusivamente, convidando-me, imediatamente, para degustar, de graça, alguns vinhos excelentes; a maioria, é claro, da terra dele. Hamburgo era os quiosques de salsicha na Mönckebergstrasse, onde duas bratwurst thüringer e um copo de refrigerante substituíam com perfeição um almoço farto. Hamburgo era o parque coberto por árvores frondosas ao longo da margem ocidental do lago Aussenalster, que por várias vezes utilizei para ir a pé até o centro em caminhadas inesquecíveis. Hamburgo era o vasto setor de CDs da loja de departamentos Saturn, junto à estação central de trens (Hauptbahnhof), onde se encontravam álbuns de cantores brasileiros que até hoje nunca apareceram por aqui. Hamburgo era as mesas ao ar-livre do elegante Café Lindtner, numa esquina pitoresca da Eppendorfer Landstrasse, ideal para se tomar um chocolate quente, acompanhado de fatias de bolos saborosíssimos, enquanto perdia-se as horas observando o vaivém das pessoas nas calçadas. Hamburgo era a grande livraria Thalia, na Grosse Bleichen 19, que tinha seções em sete idiomas, entre eles o português e uma vasta oferta de livros de arte. Hamburgo era os pães maravilhosos preparados na padaria de Jô Wedemeier, discretamente instalada num simpático sobrado em Wandsbek. Hamburgo era o bar e restaurante Gröninger, fundado em 1750, que mantinha a decoração rústica original e onde a cerveja era servida em pequenos barris de madeira, como no século XVIII. Hamburgo era o tenor que fazia ponto na Alsterarkaden, entoando árias de óperas acompanhado de um exímio violinista. Hamburgo era as elegantes galerias comerciais espalhadas pelo centro: Hamburger Hof, Hanse-Viertel, Alte Post, Gänsemarkt, Bleichenhof e a requintada Levantehaus, que dormiam abertas e desguarnecidas, sem o perigo de furtos ou depredações. Hamburgo era, sobretudo, gastar o dia passeando pelas suas ruas, parques e praças, apreciando as maravilhas da paisagem de uma cidade feita para ser calmamente desbravada a pé.

Neste ano de 2006, em que a Alemanha estará no centro das atenções por sediar a Copa do Mundo de futebol, recomendo ao leitor que estiver planejando assistir os jogos in loco na pátria de Goethe, que reserve pelo menos dois dias para conhecer Hamburgo. O norte da Alemanha pode não ser tão turístico quanto o sul e, de fato, a região não costuma estar incluída nos roteiros dos brasileiros que viajam à Europa, mas isso não deve ser um impedimento, ainda mais levando-se em conta que Hamburgo está situada a menos de trezentos quilômetros de Berlim, uma distância bem inferior à que separa Rio e São Paulo. Não sei ainda quando voltarei à Europa, mas tenho certeza de que, se puder, não perderei a chance de rever Hamburgo e, por alguns dias, me deixar envolver novamente pelos encantos desta bela cidade do norte.


Luis Eduardo Matta
Rio de Janeiro, 31/1/2006

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Cuentos da Espanha de Marcelo Barbão
02. Ritual em Cena de Rennata Airoldi


Mais Luis Eduardo Matta
Mais Acessadas de Luis Eduardo Matta em 2006
01. Sim, é possível ser feliz sozinho - 19/9/2006
02. A favor do voto obrigatório - 24/10/2006
03. Literatura de entretenimento e leitura no Brasil - 21/11/2006
04. As novas estantes virtuais - 14/2/2006
05. Reflexões para um mundo em crise - 16/5/2006


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
31/1/2006
13h24min
Narração entusiasta, com bastante dinamismo e jovialidade. Narração de descoberta de uma nova cidade. Gostei. Tem sopro de juventude! Aurea Maldaner
[Leia outros Comentários de Aurea Maldaner]
1/2/2006
10h09min
Olá, Luis, muito bom ler seu texto; tenho uma amiga que mora em Hamburgo há muitos anos e sempre me convida para ir até lá, e eu acabo indo para os mesmos lugares da Europa, Londres principalmente, que adoro e nunca tenho um tempinho para ir até lá; seu texto "me pegou". Vou agendar Hamburgo para minhas férias de julho e, quem sabe, flanar pelos cafés e galerias e ruas, como você, por esta que me pareceu uma poética cidade. Abraço!
[Leia outros Comentários de isa fonseca]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Livro Comunicação A Nova Mídia A Comunicação de Massa na Era da Informação
Dizard Jr., Wilson
Jorge Zahar
(1998)



Marketing Internacional
Sylvia Constant Vergara
Fgv
(2015)



Hannah E Emil Uma Historia Irresistível
Belinda Castles
Jangada
(2014)



Die Drei??? Und Die Gefährliche Erbschaft
Alfred Hitchcock
Franckh"sche
(1981)



1: Rubicão 2: Magneto Triunfante 3: a Queda dos Mártires Foto Original
X-men Minisérie Em 3 Edições Completo
Abril
(1990)



99 Filmes Clássicos para Apressadinhos
Henrik Lange Thomas Wengelewski
Galera
(2011)



Moon Handbooks Coastal California
Kim Weir
Pub Group West
(2000)



Milagrário Pessoal
José Eduardo Agualusa
Lingua Geral
(2010)



Livro Literatura Estrangeira Assassin's Creed Renascença
Oliver Bowden
Galera Record
(2011)



Buenos Aires de A a Z
Luis Fernando Oliveira Araujo
Artes e Ofícios
(2006)





busca | avançada
55671 visitas/dia
2,1 milhões/mês