Uma gentileza, por favor | Adriana Carvalho | Digestivo Cultural

busca | avançada
63805 visitas/dia
2,1 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Nouveau Monde
>>> Agosto começa com música boa e grandes atrações no Bar Brahma Granja Viana
>>> “Carvão”, novo espetáculo da Cia. Sansacroma, chega a Diadema
>>> 1º GatoFest traz para o Brasil o inédito ‘CatVideoFest’
>>> Movimento TUDO QUE AQUECE faz evento para arrecadar agasalhos no RJ
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Two roads diverged in a yellow wood
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
Colunistas
Últimos Posts
>>> As Sete Vidas de Ozzy Osbourne
>>> 100 anos de Flannery O'Connor
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Lourival, Dorival, assim como você e eu
>>> Órfãos do Eldorado, de Milton Hatoum
>>> Festival do Rio 2005 (II)
>>> Meus melhores filmes de 2008
>>> Festa da Cerejeira
>>> Santo Antonio de Lisboa
>>> Dar títulos aos textos, dar nome aos bois
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
>>> Deitado eternamente em divã esplêndido – Parte 2
>>> Manoel de Barros: poesia para reciclar
Mais Recentes
>>> Livro O Vôo da Madrugada de Sérgio Sant'Anna pela Companhia das Letras (2003)
>>> Vitória Na Crise: Trajetórias Das Esquerdas Latino-americanas Contemporâneas de Fabricio Pereira Da Silva pela Ponteio (2011)
>>> El camino de Santiago - Guia Prática del peregrino de Millán Bravo Lozano pela España (1999)
>>> O Próximo Passo de Marcelo Cezar pela Vida E Consciência (2015)
>>> Vunesp: 860 Questões Comentadas, Alternativa por Alternativa por Autores Especialistas de Paulo Lépore, Leandro Bortoleto pela Juspodivm (2018)
>>> Vunesp: 860 Questões Comentadas, Alternativa por Alternativa por Autores Especialistas [Capa comum] [2018] Lépore, Paulo; Bortoleto, Leandro de Paulo Lépore, Leandro Bortoleto pela Juspodivm (2018)
>>> Um Dia de David Nicholls pela Intrínseca (2011)
>>> Livro O Vôo da Madrugada de Sérgio Sant'Anna pela Companhia das Letras (2003)
>>> Livro 90% Das Mulheres São Loucas de Wilson Ferraz Veras pela Baraúna (2013)
>>> Nas Esquinas Da Vida de Márcio Fiorillo pela Vida E Consciência (2017)
>>> Guia Ilustrado Zahar de Astronomia de Ian Ridpath pela Zahar (2014)
>>> O Texto Na Tv de Vera Iris Paternostro pela Campus Editora Rj (1999)
>>> Democracia: Uma Proposta De Mudança de José Antonio Rufino Collado pela Porto Das Idéias (2015)
>>> Fala, galera: Juventude, violência e cidadania no Rio de Janeiro de Maria Cecilia De Souz Minayo pela Fundação Ford (1999)
>>> Minha Imagem de Eliana Machado Coelho pela Lúmen (2013)
>>> Livro Direito E Processo de Jose Roberto Dos Santos Bedaque pela Malheiros (2006)
>>> Televisao - Ensaios Metodologicos de Elizabeth Bastos Duarte pela Sulina (2004)
>>> Ideologia e técnica da notícia de Nilson Lage pela Insular (2001)
>>> A Morte É Um Dia Que Vale A Pena Viver de Ana Claudia Quintana Arantes pela Leya - Casa Da Palavra (2016)
>>> Era No Tempo do Rei de Ruy Castro pela Alfaguara (2007)
>>> Livro Le Tour Du Monde En 80 Jours de Jules Verne pela Hatier (2011)
>>> Livro Gênio Obsessivo O Mundo Interior de Marie Curie de Barbara Goldsmith pela Companhia Das Letras (2006)
>>> Livro Questionamento de um Jovem de Ednei Nunes Gervávio pela All Print (2010)
>>> Apenas Começando de Elisa Masselli pela Lúmen (2014)
>>> Texto E Coerência de Ingedore Grunfeld Villac§a Koch pela Cortez Editora (1989)
COLUNAS

Quinta-feira, 6/12/2007
Uma gentileza, por favor
Adriana Carvalho
+ de 6600 Acessos
+ 3 Comentário(s)

"Mamãe, gentileza é de comer?", pergunta o pequeno no restaurante. "Não, por que?", questiona a mãe. "É que eu ouvi o papai pedindo uma gentileza, por favor, para o garçom". Se a resposta da mãe fosse "sim, meu filho, é de comer", quais características teria a gentileza que o garçom traria em sua bandeja?

Com certeza não seria industrializada, nem condensada, tampouco pasteurizada ou prensada, não teria conservantes e nem corantes artificiais. A verdadeira gentileza, para ter seus delicados e voláteis princípios ativos intactos, deveria ser servida de modo bem natural. Quase dispensável é dizer que estaria entre os alimentos orgânicos, porque seria um paradoxo uma gentileza recheada de agrotóxicos, fazendo malcriações para o meio ambiente ou para os trabalhadores que a cultivassem.

As contradições da gentileza não estariam na sua forma de cultivo, mas sim no fato de que seria, como tudo que é bom e gostoso, extremamente calórica sem, contudo, entupir artérias ou provocar síndromes metabólicas. A cada mordida, a cada "Hummmm!" de prazer, os sucos nutritivos da gentileza elevariam os níveis dos hormônios e neurotransmissores relacionados com o prazer humano. Seriam, dessa forma, uma ameaça - com todo o cavalheirismo possível - ao império do chocolate, o grande curandeiro atual das carências de amabilidade. Alguns estudos investigariam inclusive sua relação com o aumento da presença de ocitocina, hormônio que dá uma força química aos vínculos entre mães e filhos, e entre casais.

Voltando ao restaurante, a gentileza não se demoraria em chegar à mesa, porque não seria delicado deixar os comensais esperando e com fome. Poderia ser servida à temperatura ambiente ou morna, nunca fria: gentileza fria é mera polidez, reflexo condicionado do ser "educado", e é cheia de falsidade.

O menino pequeno veria o garçom colocar à frente de seu pai um prato com um alimento de formas arredondadas e harmoniosas, como uma pêra em calda, talvez. Pediria para provar um pedaço e veria que ela seria suavemente doce. Não lhe caberia um sabor escandalosamente açucarado, muito menos amargo, ácido ou salgado, embora cada um deles tenha sua função, seu momento e sua graça.

Os médicos receitariam o consumo de gentileza para a manutenção de um estilo saudável de vida: "Você precisa incluir na sua dieta verduras, frutas e legumes. Diminua as frituras. Gentileza pode consumir à vontade". Poderia ser um alimento usado em desenhos infantis para incentivar bons hábitos e costumes. O marinheiro Popeye, se ao invés de espinafre enlatado, comesse umas gentilezas recém-colhidas do pé, não sairia por aí dando sopapos em ninguém. Encontraria umas maneiras menos macho-man de resolver seus problemas com o Brutus.

As empresas que incluíssem gentilezas no cardápio de seus refeitórios seriam de fato socialmente responsáveis com seus funcionários e deixariam de pedir nos processos de seleção candidatos "dispostos a trabalhar sob pressão".

Quem comesse gentileza nunca se esqueceria de dar bom-dia, até-logo ou pedir por favor. Faria isso de forma natural e não mecânica, como acontece com os atendentes moldados pela Blockbuster, McDonald´s ou Starbucks. Esses comem na firma a amabilidade padronizada e esterilizada, que provoca desagradáveis efeitos colaterais. Como o sorriso escancaradamente morto, igual ao que o Jack Nicholson, no papel de Coringa, inimigo do Batman, provocava em suas vítimas com um gás infame. Essa gentileza é sem graça como petit gâteau industrializado. Sem gosto como peixe preparado no microondas.

Gentileza seria ainda um alimento especialmente recomendado para quem sofre de algum dos seguintes problemas: dormir com a bunda descoberta, que provoca mal humor crônico e distúrbios da cortesia; compulsão por mágoas em conserva, ardidas como pequenas cebolas transparentes (cebolas são, sabidamente, vegetais que fazem muita gente chorar); consumo exagerado de verdade de colherinha na infância.

Tenho uma amiga que diz isso: "Fulana comeu muita verdade de colherinha quando era pequena, por isso ficou assim". Diferentemente da gentileza, a verdade de colherinha pode ser imaginada como um alimento com calorias vazias, tais quais os refrigerantes: deixam o indivíduo inchado de si e dão a falsa sensação de alimentação. Poderiam ser vistos também como papinhas de nenê de potinho. Sem sal, sem tempero, sem experimentação dos sabores e texturas originais. Comida morta. Pseudo-sabedoria.

Prática de consumir, a verdade de colherinha isenta o indivíduo de filosofar, pensar, ponderar ou mesmo considerar que pode estar errado. Não exige que se procure outras fontes de conhecimento, que aceite outras opiniões. Não é necessário nem sujar muita panela, nem mesmo lavar louça depois, porque a verdade de colherinha já vem, é claro, com uma colherinha de plástico descartável totalmente grátis.

Está escrito no pote que é Verdade, então não há mais o que discutir. E o rótulo ainda diz que é enriquecida com dez vitaminas e ferro, o que alivia a consciência de quem a come, mesmo que não saiba para que serve tanta vitamina exatamente. Quem se entope de verdade de colherinha sempre critica de maneira pouco cortês o que você ou os seus filhos comem, como se vestem, como se portam. Sempre tem um conselho que é para o seu bem, sempre lança seu olhar recriminador para as criaturas inferiores com quem acredita ser obrigada a conviver.

Novamente de volta à mesa, o menino pequeno aprovaria a novidade que acabara de provar. A mãe ficaria feliz e surpresa de vê-lo experimentando algo novo. O pai não pediria café e deixaria até mesmo para escovar os dentes bem mais tarde, só para preservar um pouco mais na boca o gosto da gentileza.


Adriana Carvalho
São Paulo, 6/12/2007

Mais Adriana Carvalho
Mais Acessadas de Adriana Carvalho em 2007
01. Meta-universo - 16/8/2007
02. Minhas caixas de bombons - 14/6/2007
03. Esses romanos são loucos! - 22/3/2007
04. Práticas inconfessáveis de jornalismo - 12/7/2007
05. Uma gentileza, por favor - 6/12/2007


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
9/12/2007
13h02min
Seria mesmo bom se gentileza fosse algo comestível, fácil de obter. Nosso mundo é carente desse ingrediente, que torna as relações mais saborosas, mais apreciáveis. Na sociedade, gentileza, cortesia, é coisa de mulher, sinônimo de alguém bobinho, frágil, que requer cuidados, atenções, ou seja, é frescura. Não é pra macho, que deve ser grosso, ou irônico, sarcástico, pra perceberem que é inteligente, e as mulheres também estão aprendendo isso, pois não querem mais se submeter às grosserias dos homens, agora é tratamento de igual pra igual, em vez de tentar torná-los mais gentis, mais agradáveis, estamos nos igualando a eles em grosserias. Mas, há outro modo de mostrarmos que também somos inteligentes, sem usarmos os recursos da ironia e do sarcasmo? Uma mulher é valorizada, ou sequer escutada, se for apenas gentil, delicada? E por que inteligência tornou-se sinônimo de ironia, sarcasmo? Ser doce, gentil, não é ser inteligente? Em vez de uma, peçamos muitas gentilezas! Ótimo texto!
[Leia outros Comentários de Cristina Sampaio]
15/12/2007
11h24min
Oi Adriana. Que bom ler um texto como este, logo pela manhã. Pensei num link para o Blog Linha. Gosto muito destes assuntos. E muito mais quando escrito da maneira como fez. E num post anterior, escrevi sobre dálogo. Um assunto bastante ignorado pelas pessoas. Então, a partir dele, vamos reconhecer a presença do outro. E vamos ter prazer em distribuir, partilhar, fazer gentilezas, certo?
[Leia outros Comentários de Anna]
24/5/2012
02h42min
Ri muito, talvez especialmente com a "verdade de colherinha". Delícia de texto. Por que vocês não deixam endereço das contas de Twitter das escritoras do blog, quando tiverem, para quem quiser seguir? O da Adriana Baggio consegui achar fuçando, mas tem muuuiitas contas no Twitter com o nome de Adriana Carvalho, e nenhuma informação sobre a escritora neste site... como é que faz? Abs.
[Leia outros Comentários de Blog Ani Dabar]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Advocacia nos Tribunais Homenagem a Aristoteles Atheniense
Maria F. P. C. Pereira e Raquel D. Silveira
Del Rey
(2012)



Anatomia De Um Desastre
Claudia Safatle, João Borges e Ribamar Oliveira
Penguin
(2016)



Livro Literatura Estrangeira A Escolha Até Onde Devemos Ir Em Nome do Amor?
Nicholas Sparks
Novo Conceito
(2012)



Wiersbe Novo Testamento - a Bíblia Explicada de Maneira Clara...
Warren W. Wiersbe
Geografica
(2020)



A Evolução Semântica da Maternidade
Renato Alves Moretto
Academia Campista de Letras
(2005)



Uma Mulher de Seu Tempo
G. J. Scrimgeour
Círculo do Livro
(1982)



The Wines of France: The Essential Guide for Savvy Shoppers
Jacqueline Friedrich
Ten Speed Press
(2006)



O Que Faz de um Degas um Degas?
Richard Mühlberger
Cosac & Naify
(1993)



Grandes Mistérios do Tio Patinhas 9
Walt Disney
Abril
(1991)



Chão de Vento
Flora Figueiredo
Geração Editorial
(2005)





busca | avançada
63805 visitas/dia
2,1 milhões/mês