Riobaldo | Paulo Polzonoff Jr | Digestivo Cultural

busca | avançada
52275 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Começa o Cerrado Cup, o maior circuito itinerante de e-sports do DF
>>> “Malina” é o primeiro e único romance de uma trilogia inacabada da austríaca Ingeborg Bachmann
>>> Kitchen, de Banana Yoshimoto
>>> Galeria de Arte São Luís: 1959-1966
>>> Um ano no Japão: Descubra o Japão que vai além dos roteiros turísticos
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
Colunistas
Últimos Posts
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Um rio dez vezes maior que o segundo maior rio
>>> O centenário de Contos Gauchescos
>>> Revista Jukebox em São Paulo
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
Mais Recentes
>>> Estudos de Literatura Brasileira de Douglas Tufano pela Moderna (1983)
>>> Por Onde Anda A Virtude? (coleção Letras Italianas) de Fernanda Pivano pela Berlendis E Vertecchia (2002)
>>> Mãos em Evolução de Mauricio Moscovici pela Med Line (2014)
>>> Fundamentos de Matemática Elementar 4 de Gelson Iezzi e Samuel Hazzan pela Atual (2013)
>>> Fundamentos de Matemática Elementar 7 de Gelson Iezzi pela Atual (2013)
>>> A Assustadora História Da Medicina de Richard Gordon pela Ediouro (1995)
>>> Curso de Vinhos de Jancis Robinson pela Cotovia (1999)
>>> Chave da provisão infinita de Masaharu Taniguchi pela Seicho no Ie (2007)
>>> As Uvas E O Vento de Pablo Neruda pela L&pm (2010)
>>> Hq Marvel 99 - 4 revistas: 1,2,3,8 de Vários Autores pela Abril (1998)
>>> O Castelo Animado de Diana Wynne Jones pela Record (2007)
>>> As Melhores Histórias De Sherlock Holmes de Arthur Conan Doyle pela L&pm (2010)
>>> Toda Sua de Sylvia Day pela Paralela (2012)
>>> Chok Leyisrael - Bereshit (Edição Bilíngue) de Rav Yoseph Milstein pela Rdx (2017)
>>> Manifesto Do Partido Comunista de Karl Marx pela Martin Claret (2009)
>>> Um Longo Domingo De Noivado de Sébastien Japrisot pela Asa (1991)
>>> Memórias de Sherlock Holmes de Sir Arthur Conan Doyle pela Martin Claret (2007)
>>> Felicidade não tem cor (2º ed. - 37º impressão) de Julio Emílio Braz - Odilon Moraes pela Moderna (2009)
>>> A Abadia De Northanger de Jane Austen pela L&pm (2014)
>>> Um Estudo Em Vermelho de Sir Arthur Conan Doyle pela L&pm (2008)
>>> Fiz O Que Pude (2º edição - 56º impressão) de Lucilia Junqueira De Almeida Prado pela Moderna (2011)
>>> Regras de Futebol Interpretação Das Leis do Jogo de Leopoldo Sant'Ana pela Cia Brasil
>>> O Príncipe de Maquiavel pela L&pm (2025)
>>> O Signo Dos Quatro de Sir Arthur Conan Doyle pela Martin Claret (2009)
>>> The Luxe Food Lovers Companion de Sharon Tyler Herbst e Ron Herbst pela Barrons (2009)
COLUNAS >>> Especial Festas 2001

Quarta-feira, 2/1/2002
Riobaldo
Paulo Polzonoff Jr
+ de 8200 Acessos
+ 1 Comentário(s)

Daniela Mountian

Vou começar este texto com o maior clichê do mundo: ano novo, vida nova. Ah, vai, confessa que você deve ter pensado nisso quando o relógio deu meia-noite. Não se envergonhe, por mais inteligente que você for, é normal. Jung, aquele filho da mãe, deve ter uma boa teoria para isso. Como não sou discípulo de Freud nem nada, apenas repito o lugar-comum das areias de todo o Brasil (perdão se você mora no interior, mas é que só consigo lembrar de anos-novos na areia da praia). Ano-novo, pois, vida nova, pois.

Antes de qualquer coisa, um causo. Um causo literário, por assim dizer. Há quem o considere a tragédia extrema da família, mas eu o considero apenas um marco, assim uma espécie de divisor de águas entre o certo e o duvidoso. Aconteceu na noite de Ano-Novo mais relevante dos últimos mil anos: a de 1999 para 2000. Sim, eu sei que o século não mudou nesta data, e sim de 2000 para 2001, mas a mística dos três zeros estava por toda a parte.

Eu estava deitado tranqüilamente na rede da casa de praia, sentindo aquela brisa da noite do mar. Adoro aquilo. Odeio praia, com aqueles corpos se sobressaindo de biquínis vulgares (não adianta atacar minha masculinidade, senhores leitores), mas adoro aquela brisa do mar. O calor até que me fazia bem. Sem dizer que, volta e meia, eu ia até a praia, olhar as estrelas, as ondas, compor poemas que jamais escrevi, pensar na porra da vida que tomava um rumo indesejado. Pois deitado na rede eu lia Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa. Vai ser muito patético se eu disse que é o melhor livro brasileiro do século 20 e quiçá um dos melhores da literatura mundial, e que assim seria reconhecido, não escrevêssemos numa língua periférica? Bem, agora á disse, não há como volta atrás. Ali lendo, sorvendo aquele desbunde lingüístico, eu também esperava uns parentes que passariam a noite conosco. A casa estava bastante calma para o horário razoavelmente avançado: oito da noite. Meu pai fazia churrasco, eu lia e bebia e fazia todo o esforço do mundo para não ficar bêbado, para continuar a leitura. Coisa rara: houve respeito e ninguém colocou músicas de mau-gosto, como é de costume. Até que.

Até que os parentes chegaram. Em duas caminhonetes e um carro. Chegaram com seus chapelões de rodeio. Chegaram gritando, dando abraços apertados demais e beijos babados. Foram estacionando seus carros na garagem e abrindo caminho por entre as comidas da ceia. E eu ali, na rede, abraçado ao Guimarães Rosa (outro ataque à minha masculinidade; pode bater que ela é forte...), começando a odiar a situação. E então, de repente, eu escuto. Não, não é Strauss. Nem é Cole Porter. Obviamente, isto está muitos degraus acima da escala evolutiva destes. Não era nem ao menos Caê ou Marisa Monte, travestidos de inteligência. Não era sequer o Roberto Carlos, que, numa última concessão, eu até suportaria. Era música sertaneja-brega mesmo. E num volume acima do recomendável pela Organização Mundial de Saúde, que nestes casos é de silêncio extremo.

Talvez motivado por um espírito de Riobaldo, levantei-me da rede e reclamei. Parece uma atitude normalíssima, mas numa família de descendentes de italianos isso é absurdo, porque se preza a felicidade (ainda que falsa) alheia, acima de tudo. O pedido para que abaixassem o volume de nada adiantou. O telefone tocava, mas ninguém conseguia falar nele porque um cantor desafinado qualquer gritava dos autofalantes do carro. Por meio de uma gambiarra, os filhos da mãe juntaram os autofalantes dos dois carros, o que tornou a situação impossível de se agüentar. Riobaldo, digo, eu, tomou dois goles de caipirinha e pediu mais uma vez que abaixassem. Num momento de descontração (que não lhe (me) é raro), sugeriu que colocassem o CD do Strauss. Ficou por isso mesmo. Até que Riobaldo levantou o bacamarte, ameaçadoramente, e se dirigiu, em cima de um cavalo de Dom Quixote, para o CD-player. O dono do barulho relutou, disse que a festa era dele também (argumento inteligentíssimo, não?). Ao que Riobaldo retrucou dizendo que o sertão era dele, empurrou o babaca da música sertaneja, pegou o CD e jogou-o na areia. Fez menção de ir pisar no disquinho, mas foi contido. Riobaldo estava feliz, naquela noite de Ano-Novo que acabara de estragar. Olhou para os lados: o silêncio. Recolheu o bacamarte, pegou seu livro novamente e foi para a rede, lê-lo.

Dois minutos mais tarde, novos apertos de mão, desta vez contidos. Feliz Ano-Novo daqui e dali, todos muito polidos e mentirosos. Os invasores fugiam da fúria literária de Riobaldo, às 23h30. Passaram o Ano-Novo lá deles na estrada, por certo comendo seu franguinho com farofa, enquanto Riobaldo, já um tanto esmorecido pela caipirinha, tentava dormir.

Pois é, este texto era para, na verdade, falar sobre as resoluções de Ano-Novo. Às vezes acontece isso: o texto que é para ser e não é. A história se impôs às minhas modestas pretensões para 2002. Ao contrário de todo mundo, eu quero é fumar. Não cigarro, mas um charuto bem bom, destes que se paga uma fortuna. Gosto besta, sô. Também não quero parar de beber. Só vou mesmo é mudar a marca e a idade de meu uísque, de um Red Label, 8 anos, para um Chivas, 12 anos. Amar vou continuar amando, quiçá com um pouco menos de poesia e um pouco mais de pragmatismo, como me ensina a vida neste momento. Vou escrever muito e até já cadastrei um blog para publicar as crônicas que escreverei diariamente. Vou ler Guerra e Paz, finalmente e de uma vez por todas, eu prometo. E vou reler Grande Sertão: Veredas (aliás, vou fazer isso agora mesmo), que é para ser Riobaldo de novo, quando precisar.


Paulo Polzonoff Jr
Curitiba, 2/1/2002

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Luz em agosto de Luiz Rebinski Junior
02. Dois em um de Rennata Airoldi
03. Duas noites de sono mais tarde de Paulo Polzonoff Jr


Mais Paulo Polzonoff Jr
Mais Acessadas de Paulo Polzonoff Jr em 2002
01. Alice no País de Freud, Marx ou Hegel - 16/1/2002
02. Riobaldo - 2/1/2002
03. Dois Idiotas - 13/2/2002
04. Ele, Francis - 6/2/2002
05. Pode guerrear no meu território - 30/1/2002


Mais Especial Festas 2001
* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
12/12/2008
17h47min
Cara, a internet tem destas coisas. Vc escreveu este texto faz tempo, e só agora eu o leio, e ao ler, penso em todas as vezes que tive vontade de incorporar, não o Riobaldo, mas o Wolverine, e sair rasgando quem me enchia a paciência. Embora goste muito de minha família - daquele jeito peculiar que a gente gosta de parente - não foram poucas as vezes em que quis fazer algo parecido. Diz aí? Desopilou o fígado? Eu me amarrei só de ler. Um abraço.
[Leia outros Comentários de Ronaldo ]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Guerra Civil 489
Stuart Moore
Novo Século
(2014)



Os Nacionalismos
Paulo Martinez
Scipione
(1996)



Testemunhos De Amor
Maria Salvador
Lachâtre
(2004)



O Dossiê Pelicano
John Grisham
Rocco
(1993)



Veja Sob Censura 1968-1976 566
Maria Fernanda Lopes Almeida
Jaboticaba
(2009)



A Redação de Trabalhos Acadêmicos - Teoria e Prática
Orgs. Claudio Cezar Henriques, Darcilia Marindir Simoes
Eduerj
(2004)



Vagabond 27
Takehiko Inoue
Conrad
(2003)



Simples e Complexos - Visão Espírita de Temas Diversos
Alessandro Viana Vieira de Paula
Fráter
(2014)



Um Verso a Cada Passo a Poesia na Estrada Real
Angela Leite de Souza
Autentica
(2015)



Como Proust Pode Mudar Sua Vida
Alain De Botton
Rocco
(1999)





busca | avançada
52275 visitas/dia
1,7 milhão/mês