Expurgo, de Sofi Oksanen | Ricardo de Mattos | Digestivo Cultural

busca | avançada
85352 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Lenna Baheule ministra atividades gratuitas no Sesc Bom Retiro
>>> “Carvão”, novo espetáculo da Cia. Sansacroma, estreia no Sesc Consolação
>>> “Itália Brutalista: a arte do concreto”
>>> “Diversos Cervantes 2025”
>>> Francisco Morato ganha livro inédito com contos inspirados na cidade
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
Colunistas
Últimos Posts
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Se falam em autor novo, saco logo a minha pistola
>>> Se falam em autor novo, saco logo a minha pistola
>>> A república dos bugres
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> FLIP X FLAP
>>> Viciados em Internet?
>>> Um plano
>>> 29ª Bienal de São Paulo: a politica da arte
>>> Música Popular, não
Mais Recentes
>>> De Maos Atadas de Álvaro Cardoso Gomes pela Atica (2006)
>>> O Bezerro De Ouro de José Louzeiro pela Ediouro Publicações (1997)
>>> Uma Razão Para Viver de Richard Simonetti pela Ceac (1998)
>>> Reforma íntima de Astrid Sayeghi pela Feesp (2005)
>>> Quem Pergunta Quer Saber de Carlos de Brito Imbassahy pela Petit (1993)
>>> Você É Insubistituivel de Augusto Cury pela Sextante (2002)
>>> Geração Alpha Port 7 La F2 5ª Ed24 de Cibele Lopresti Costa pela Sm (2023)
>>> Estudar Historia - 6ºAno de Patrícia Ramos Braick pela Moderna (2018)
>>> Expedições Geográficas - 7ºAno de Melhem Adas pela Moderna (2018)
>>> Estudar Historia: Das Origens do Homem á Era Digital - 7ºAno de Patrícia Ramos Braick e Anna Barreto pela Moderna (2018)
>>> Física: Conceito e Contextos - 2ºAno do Ensino Médio de Maurício Pietrocola e Outros pela Editora Do Brasil (2016)
>>> Gravity Falls: Journal 3 de Alex Hirsch pela Disney Press (2016)
>>> Dinossauros Vivos - Perigo! Este Livro Pode Morder! de Robert Mash pela Ciranda Cultural (2010)
>>> Escalas de representação em arquitetura de Edite Calote Carranza; outros pela G & C arquitectônica (2025)
>>> Coisas De Índio. Versão Infantil de Daniel Munduruku pela Callis (2020)
>>> Manual Pirelli de instalações elétricas de Pini pela Pini (2003)
>>> Piadas Para Rachar O Bico. Proibido Para Adultos - Volume 1 de Gabriel Barazal pela Fundamento (2011)
>>> O Ultimo Cavaleiro Andante de Will Eisner pela Companhia Das Letras (1999)
>>> Manual De Projeto De Edificações de Manoel Henrique Campos Botelho; outros pela Pini (2009)
>>> Introdução À Ergonomia: Da Prática A Teoria de Abrahão Sznelwar pela Edgard Blucher (2014)
>>> Concreto Armado: Eu Te Amo Para Arquitetos de Manoel Henrique Campos Botelho pela Edgard Blucher (2016)
>>> Instalacoes Eletricas E O Projeto De Arquitetura de Roberto De Carvalho Júnior pela Edgard Blucher (2016)
>>> O Edifício Até Sua Cobertura de Hélio Alves de Azeredo pela Edgard Blucher (2015)
>>> Um Garoto Consumista na Roça (2º edição - 13º impressão) de Júlio Emílio Braz pela Scipione (2018)
>>> O Misterioso Baú Do Vovô (com suplemento de leitura) de Marcia Kupstas pela Ftd (2001)
COLUNAS

Segunda-feira, 31/12/2012
Expurgo, de Sofi Oksanen
Ricardo de Mattos
+ de 5200 Acessos

"Nem mesmo um cachorro pode mastigar a corrente da hereditariedade" (Sofi Oksanen).

O que sabemos a respeito do pequeno país europeu nomeado Estônia? Que é um país cuja independência finalmente veio em 1992, quando mais nenhuma potestade reivindicou poder sobre ele, seja poder territorial, seja o poder necessário para impor uma ideologia. Que é um país cujo território está definido numa área disputada ao longo dos séculos, onde os nativos precisaram ser teimosos para manterem-se contra tudo e contra todos e, ainda assim, desenvolverem um sentimento nacionalista que fortalecesse e permitisse-lhes pensar na independência.

De fato, em sua história mais remota, a Estônia foi disputada por dinamarqueses, suecos, alemães, russos e pelo poder papal. No século XII, foi alvo de uma cruzada planejada e promovida pelo Papa Celestino III (1106-1198), fundamentada na necessidade de combater hereges. Acossada entre 1208 e 1227 por esta investida pontifícia, precisou defender-se concomitantemente ao norte contra a invasão da Dinamarca. Apesar da resistência, os estonianos perderam e seus territórios foram divididos em bispados. Tanto se esforçou Roma que os estonianos aderiram ao luteranismo e hoje são um dos povos menos religiosos do mundo. Assim, deu-se a sequência de invasão, divisão e reunificação que parece ser o contorno geral de sua história. Conforme a ordem dominante perdia força e prestígio, outra se apresentava para reivindicar o espólio. Exemplo disto, à Ordem Teutônica - associação análoga à dos Templários - sucedeu o principado de Moscou.

No começo do século XX houve uma primeira tentativa de independência estoniana. Foi em 1918. Contudo, Roma, Suécia e Dinamarca foram apenas substituídas por Rússia e Alemanha. Si real ou virtualmente dotada de autonomia política, a Estônia acabou compondo a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Apenas em 1992 a Estônia pôde dizer-se livre. O que não significa um desembaraço total, pois, si a Natureza não dá saltos, que dizer de situações nas quais estão envolvidos interesses diversos, mormente interesses econômicos.


Estônia
Fonte: davybarreto.com

Diante de tal instabilidade, não se poderia esperar grande desenvolvimento literário. Não se trata de crítica, mas de compadecimento. Oito poetas de biografia escassa e obra inacessível compõem o quadro estoniano: Villem Gunthal-Ridala, Jaan Kaplinski, Lydia Koidula, Kalyu Lepik, Juhan Liiv, Karl Ristikivi, Gustav Suits e Marie Under. Um estudioso local poderá espernear e aumentar a lista. Observamos que localizar os mais famosos já foi inusitado, que dizer daqueles de expressão restrita. Dentre eles, o mais famoso é Juhan Liiv, por nomear o mais importante prêmio literário nacional. O número de escritores importantes não parece muito maior. Nas histórias destes poetas, e de outros poucos escritores encontrados, reflete-se a história do país: nacionalismo na busca e valorização de suas origens, patriotismo, preocupação humanística, perseguição política, exílio. As obras do escritor August Annist e do poeta Suits tiveram estreita ligação com o fogo.

Reputamos a esta falta de fôlego da literatura nacional o fato da mais importante obra de ficção envolvendo a Estônia ter sido escrita por uma finlandesa. Referimo-nos a Sofi Oksanen, escritora que numa só obra conseguiu projetar seu talento para o mundo e, de quebra, evidenciar a importância da escrita em aproximar realidades geograficamente distantes mas semelhantes em diversos aspectos.

Segundo os dados constantes de seu site pessoal, Oksanen nasceu em 1977, na Finlândia, na cidade com o impronunciável nome de Jyväskylä. Até o momento é autora de cinco livros: Stalin's Cows, de 2003; Baby Jane, de 2005; Purge - Expurgo -, de 2008; Too Short Skrit - Tales from the Kitchen, de 2011; e When the Doves Disappeared, de 2012, em vias de ser lançada no Brasil. Antes de passar a escrever em tempo integral, Oksanen foi estudante de dramaturgia na Academia de Teatro de Helsinki. A primeira versão de Expurgo, seu principal romance, foi uma peça encenada pela primeira vez no Teatro Nacional Finlandês em sete de fevereiro de 2007. A mais recente adaptação é para o cinema, sendo que já há fumos de indicação para o "Oscar" na categoria de melhor filme estrangeiro. De acordo com o dicionário Houaiss, "expurgo" é o ato ou o efeito de "expurgar". Este verbo, por sua vez, significa "deixar puro, limpo, purificar (...) deixar livre (...) ficar sem erros, corrigir-se". O competente e injustamente menos lembrado dicionário de Pasquale acrescenta: "tornar imune". Limpar e impedir que suje: "Vá e não peque mais".


Teatro Nacional Finlandês

Há duas personagens principais: Aliide Truu e Zara. A primeira é idosa, ressentida, magoada e colaboracionista quando da ocupação da Estônia pelos soviéticos durante a Segunda Guerra Mundial. A segunda, jovem presa das ofertas sedutoras de vida fácil e rica, alcançável sem trabalho ou esforço. Avaliando a narrativa, o expurgo foi "benefício" concedido a ambas, uma oportunidade de reajustarem prioridades e apaziguarem-se com seus fantasmas. Si no primeiro momento Aliide sacrificou os de seu sangue em favor dos invasores, no segundo momento fez o que seria esperado.

O que tornou Aliide "impura", "suja"? Sua vida foi reunião de frustrações e preterições. Todas as atenções voltavam-se para sua irmã, tida como mais bonita e hábil nos afazeres típicos de uma mulher do campo. O homem que escolheu para si, viu-o casar-se com ela. O incentivo de seus familiares ao casamento com um militar alemão não apenas a fez sentir-se mais rejeitada que encorajada como criou-lhe problemas por ocasião da ocupação soviética. Quando a Alemanha foi expulsa e os soviéticos chegaram, precisou lidar com as suspeitas destes sobre eventual colaboracionismo. A abertura de arquivos e o estudo e publicação de documentos mostram que os soviéticos, sob a batuta de Stálin, não representaram exatamente o papel de mocinhos. Como estoniana, Aliide nada queria com um alemão. Trocados os invasores, casou-se por estratégia com um russo, o que lhe garantiu proteção. Com a proteção, todavia, granjeou também a rejeição generalizada de seu povo, rejeição que a acompanhou até a velhice.

Em Expurgo, o colaboracionismo de Aliide foi ao mesmo tempo um estratagema para livrar-se de novas agressões, um instrumento de vingança e uma forma de manter junto a si o homem amado. Uma faca pode cortar a mão inábil, mas pode-se aprender a manuseá-la com destreza e utilizá-la para o ataque. Socialmente, medidas extremas podem ser antipáticas, mas para quem não se preocupava com a reação social, a opinião das pessoas foi inócua. Pessoalmente, a avaliação dos próprios atos promovida pelo tempo pode ser um incômodo semelhante à mosca que, volta e meia, vinha atormentá-la. Tenha ela desejado ou não uma oportunidade para acertar as contas, esta oportunidade veio através de Zara.

Talvez pareça relativamente óbvio o curso que a trama seguirá, bem como as ligações reveladas entre as personagens. Não as mencionamos aqui, pois desejamos que o leitor desfrute de ótima leitura, ainda que em alguns momentos demasiado crua. Que não havia notável diferença entre nazistas e soviéticos e que Hitler e Stálin eram farinha do mesmo saco, isto nós sabemos hoje. Que o aliciamento de jovens com a promessa de sucesso nas passarelas pode ser, em muitos casos, o encaminhamento para a prostituição, é um alerta ao qual não atentam apenas estas mulheres que abdicam da maternidade em favor do conforto pessoal mediante a entrega das filhas a rufiões. O horror encontra-se nos fatos, não na referência a eles, bem o sabemos. Oksanen desenvolve o enredo de maneira a prender a atenção pelas quase 350 páginas bem escritas.


Ricardo de Mattos
Taubaté, 31/12/2012

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Um lugar para o tempo de Elisa Andrade Buzzo
02. Jornais do futuro? de Fabio Silvestre Cardoso
03. 2009: enfim, um ano musical de Diogo Salles
04. Do Luxo ao Lixo de Rennata Airoldi


Mais Ricardo de Mattos
Mais Acessadas de Ricardo de Mattos em 2012
01. A ilha do Dr Moreau, de H. G. Wells - 12/3/2012
02. Aborto - 2/4/2012
03. Freud segundo Zweig - 25/6/2012
04. Deus: uma invenção?, de René Girard - 6/2/2012
05. A Virada, de Stephen Greenblatt - 8/10/2012


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Guía de Salud y Prevención en Pediatría
Leonardo Vázquez; Paula Dal Din
Osde
(2015)



Coleção Vida e meditação (obras de R. Tagore) - 7 livros
Rabindranath Tagore
Edições Paulinas
(1991)



Os Grandes Pensadores
Will Durant
Companhia Nacional



Livro Biografias Every Second Counts
Lance Armstrong e Sally Jenkins
Broadway Books (ny)
(2003)



Picasso - Artistas Famosos
Antony Mason
Callis
(2016)



Amor e Obstáculos (lacrado)
Aleksandar Hemon
Rocco
(2011)



Fala, Amendoeira
Carlos Drummond de Andrade
Record
(1986)



ética dos Governantes e dos Governados
Gabriel Chalita
Max Limonad
(1999)



O Nazismo sobrevive ao terceiro reich
Roberto Botacini
Combrig



Natureza uma Concepção Sistêmica da Natureza
Airton Freire
Bagaço
(1999)





busca | avançada
85352 visitas/dia
1,7 milhão/mês