Dilúvio, de Gerald Thomas | Jardel Dias Cavalcanti | Digestivo Cultural

busca | avançada
56774 visitas/dia
2,1 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Simões de Assis | Individual de Carlos Cruz-Diez
>>> Jazz Festival: Primeira edição de evento da Bourbon Hospitalidade promete encantar com grandes nomes
>>> Coletivo Mani Carimbó é convidado do projeto Terreiros Nômades em escola da zona sul
>>> CCSP recebe Filó Machado e o concerto de pré-lançamento do álbum A Música Negra
>>> Premiado espetáculo ‘Flores Astrais’ pela primeira vez em Petrópolis no Teatro Imperial para homenag
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
>>> Soco no saco
>>> Xingando semáforos inocentes
>>> Os autômatos de Agnaldo Pinho
>>> Esporte de risco
Colunistas
Últimos Posts
>>> A melhor análise da Nucoin (2024)
>>> Dario Amodei da Anthropic no In Good Company
>>> A história do PyTorch
>>> Leif Ove Andsnes na casa de Mozart em Viena
>>> O passado e o futuro da inteligência artificial
>>> Marcio Appel no Stock Pickers (2024)
>>> Jensen Huang aos formandos do Caltech
>>> Jensen Huang, da Nvidia, na Computex
>>> André Barcinski no YouTube
>>> Inteligência Artificial Física
Últimos Posts
>>> Cortando despesas
>>> O mais longo dos dias, 80 anos do Dia D
>>> Paes Loureiro, poesia é quando a linguagem sonha
>>> O Cachorro e a maleta
>>> A ESTAGIÁRIA
>>> A insanidade tem regras
>>> Uma coisa não é a outra
>>> AUSÊNCIA
>>> Mestres do ar, a esperança nos céus da II Guerra
>>> O Mal necessário
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Mais que cego em tiroteio
>>> Nosso Lar
>>> Bárbara Heliodora
>>> Uma leitura jornalística
>>> Prática de atelier: cores personalizadas *VÍDEO*
>>> Cheiro de papel podre
>>> O Nome Dele
>>> Um Leitor sobre Daniel Piza
>>> Um Furto
>>> Homenagem a Pilar del Río
Mais Recentes
>>> Dicionario Houaiss Da Lingua Portuguesa Com CD de Antonio Houaiss pela Objetiva (2024)
>>> Mulher Enjaulada de Jussi Adler-olsen pela Record2 (2014)
>>> As Melhores Receitas da Cozinha Portuguesa - Os segredos da cozinha das nossas avós de Vários Autores pela Globo
>>> As Melhores Receitas da Cozinha do Nordeste - Os segredos da cozinha das nossas avós de Vários Autores pela Globo
>>> As Melhores Receitas da Cozinha Baiana - Os segredos da cozinha das nossas avós de Vários Autores pela Globo
>>> Quem vai Salvar a Vida? de Ruth Rocha pela Salamandra (2015)
>>> Livro Cáuculo - volume 2 de Maurice D. Weir pela Pearson (2024)
>>> O Código da Vinci - Roteiro Ilustrado de Akiva Goldsman pela Sextante (2006)
>>> Delícias da Kashi - Gastronomia Vegana Gourmet de Kashi Dhyani pela Mauad X (2016)
>>> Livro Microbiologia Para As Ciências Da Saúde de Paul G. Engelkirk pela Guanabara Koogan (2005)
>>> Livro Comunicação E Comportamento Organizacional PLT 111 de Geraldo R. Caravantes pela Fisicalbook (2014)
>>> Livro Finanças Corporativas: Conceitos E Aplicações de Jose Antonio Stark Ferreira pela Pearson (2005)
>>> Livro Introdução a Genética PLT 248 de Anthony J F Griffiths ; RiCHARD C. Lewontin pela Guanabara (2008)
>>> Teoria Geral Da Administração. Da Revolução Urbana À Revolução Digital de Antonio Cesar Amaru Maximiano pela Atlas Br (2011)
>>> LivroTeoria Geral Da Administração: Da Revolução Urbana À Revolução Digital de Antonio Cesar Amaru Maximiano pela Atlas (2008)
>>> O Porco de William Hope Hodgson pela Diário Macabro (2024)
>>> Arvore Do Beto de Ruth Rocha pela Salamandra (2010)
>>> A Casa No Limiar e Outras Histórias Macabras de William Hope Hodgson pela Diário Macabro (2024)
>>> Ponto De Vista de Sonia Bergams Salerno Forjaz pela Moderna (2014)
>>> A Grande Campea de Maria Cristina Furtado pela Do Brasil (2015)
>>> Amigos De Verdade de Telma Guimarães Castro Andrade pela Brasil Literatura (2010)
>>> Bleach 57 - Out of Bloom de Tite Kubo pela Panini Comics (2014)
>>> O Fantástico Mistério De Feiurinha de Pedro Bandeira pela Moderna (2009)
>>> Cantigas Por Um Passarinho A Toa de Manoel de Barros pela Companhia Das Letrinhas (2018)
>>> Bleach 56 - March of the Stacross de Tite Kubo pela Panini Comics (2013)
COLUNAS

Terça-feira, 6/2/2018
Dilúvio, de Gerald Thomas
Jardel Dias Cavalcanti
+ de 6200 Acessos



O cenário inicial (e final) da peça Dilúvio, de Gerald Thomas, apresenta uma paisagem solitária, com um amontoado de guarda-chuvas quebrados e contorcidos num ambiente esfumaçado. Antes que qualquer ator entre em cena, já estamos diante da imagem trágica do resultado de um dilúvio: aqueles guarda-chuvas que figuram em nossa mente como símbolo da proteção contra a tempestade, agora são apenas desolação e destruição. Essa imagem pós-dilúvio é desconcertante e é com ela gravada em nossa mente que assistimos toda a peça. (Um amigo artista plástico, Fabricio Nery, que assistiu Dilúvio comigo, me disse ao pé do ouvido que apenas essa abertura já teria valido a peça – avec toutes les raisons).

O guarda-chuva quebrado e abandonado, existindo como uma espécie de símbolo do desalento, do abandono, do imprestável é uma constante na obra plástica de Gerald Thomas. E agora ele figura como personagem central na sua nova peça. Não poderia ter escolhido imagem melhor como metáfora de sua visão pessimista do mundo contemporâneo.

Dessa imagem desoladora dos guarda-chuvas, passamos para outra mais perturbadora ainda: duas atrizes aparecem penduradas, com sangue jorrando pelos seus corpos nus, postas sobre colunas gregas, que são o símbolo da Civilização Ocidental. Gerald Thomas cria uma imagem que vale por mil tratados sociológicos sobre o Ocidente.



Como numa montagem cinematográfica, em cenas seguintes a imagem do guarda-chuva já destruído retorna, agora na mão da atriz que luta contra uma ventania enfurecida nos fazendo pensar em alguma tempestade infernal e dantesca. O resultado dessa luta inglória contra as tempestades do mundo (Gerald pensa por metáforas), é a destruição do guarda-chuva e o desaparecimento da espécie humana – dada a solidão dos guarda-chuvas despedaçados no início e fim da peça.



Gerald Thomas produz a sua obra através de imagens, sons, luzes, falas e performances corporais. Seu teatro é plástico, operístico e, porque não, carregado de uma energia que vem do rock e da batida dos tambores da escola de samba. As referências que desaguam do seu inconsciente estético, sejam plásticos, musicais ou literários, passam pela convivência com criadores como Wagner, Schöenberg, Glass, Stones, Beckett, Kafka, Gertrude Stein, Godard, Eisentein, com toda a vanguarda de artes plásticas, de Duchamp até Francis Bacon, o Pop e o Minimalismo, no mínimo. A modernidade e sua desconstrução é o solo onde seus pés pisam. Outro dado importa: sua atenta, aguda e crítica observação do mundo (suas crônicas em Nada Prova Nada refletem sua tensão e insatisfação diante das contradições do mundo).

“Dilúvio” me parece uma síntese criativa (ou um ir além) desse caldo estético citado acima sem o qual não se pode falar em arte contemporânea. Gerald Thomas já reclamou do “excesso desconstrutivo” que atordoa a arte atual, sugerindo que estamos no momento de catar os cacos e criar um vitral novo a partir deles. O dramaturgo está nesse momento fazendo isso. Com Dilúvio criou a possibilidade de lidarmos com os fragmentos, agora transformados num belíssimo mosaico, que não deixa de fora a rasteira que os bons artistas sempre nos dão.

E é esse mosaico ao mesmo tempo construído por belíssimas imagens, guiadas por escolhas musicais arrepiantes e pelo desempenho notável de atrizes e performances, além de um texto “em ruína”, que faz de Gerald Thomas um dramaturgo renovador. A sensação a partir dessa obra prima que é Dilúvio é que seu teatro está se revolucionando e apontando para o futuro. D’ après Kafka: dê-lhe o machado e ele abrirá nossas cabeças.

Sua entrada na área de risco, a partir da criação de imagens metafóricas e simbólicas, que possibilitam a criação de uma obra aberta (Umberto Eco), só é possível, no entanto, porque seu inconsciente estético foi fertilizado pelas referências acima citadas.

Em Dilúvio as imagens paradoxais revelam o desgaste das existências consumidas no nosso tempo de horrores midiatizados à exaustão. Uma espécie de café da manhã com sangue nos acorda e atordoa. Diferente da famosa frase de um filósofo (Heidegger?) que dizia que para o homem moderno o jornal era sua oração matinal, o Google, Instagram, Facebook e Twitter nos oferecem um circo de horrores e imbecilidades liquidificadas no nosso suco de laranja de toda manhã.

O paradoxo das imagens: a busca pela beleza e pela poesia aparecem e logo são corrompidas. Na performance da leveza das atrizes em sua delicada conjunção amorosa, flutuando como num balanço (que lembra a atmosfera de “O Balanço” de Fragonnard e Wim Wenders em “Asas do Desejo”), até a luta que encenam em câmera lenta - como as imagens que vemos e revemos a todo momento na tela do computador, num círculo infernal e dantesco do qual não conseguimos sair.



O paradoxo das imagens: uma cena brutal de sexo entre duas mulheres -“come o meu cu”, diz uma delas desesperadamente- , onde o desejo explode, mas a frase “o meu pau não sobe mais” revela a impotência diante da oferta descartável de imagens eróticas e produção insana e aberrantes de desejos. A cena recebe a luz de uma luminária-máquina-roda-duchampiana.



A importância da concepção plástica das imagens no teatro de Gerald Thomas aparece em “Dilúvio” nos desenhos que são carregados e que passam como imagens de um museu diante dos olhos dos espectadores. São partes da peça, não apenas ilustrações, e tem seu uso conjugado na ideia wagneriana de uma “arte total”, cara a Gerald Thomas. Dessas imagens o sempre enigmático tubarão ferido e uma referência ao São Sebastião flechado – signos da violência transformada em espetáculo.

A peça se encerra com uma fala em tom comovente da atriz Maria de Lima, que está num cenário de desolação, dizendo algo como “eu até poderia achar algo positivo nisso tudo”, que ressoa a frase dita anteriormente invocando Beckett, um dos mestres da consciência artística de Gerald Thomas – “Você conhece o mundo maravilhoso e, claro, sombrio e, ainda, melancólico e, porque não dizer, um tanto cinzento, de Samuel Beckett?”.



Sobre sua condição de criador, dentro desse universo aterrador, diz Gerald Thomas: “Eu me vejo, como autor, numa terra perdida, sozinho, depois de uma guerra nuclear, com um balde de pipoca na mão. É o sinal da minha sobrevivência”.

“Teatro é Risco!!!” diz o Dramaturgo. Não apenas risco na forma do que se apresenta, mas na maneira como ele é gerado/criado. Sabemos que uma peça não existe a priori na cabeça de Gerald Thomas. Work in progress, eis o lema da arte moderna e da direção e criação do autor de Dilúvio. Nisso, Gerald Thomas é um mestre! E pode haver algum artista se se estiver aquém disso?



ELENCO: Maria de Lima, Julia Wilkins, Lisa Giobbi, Ana Gabi, Beatrice Sayd, Isabella Lemos, André Bortolanza.

APRESENTAÇÃO: SESC SP: 11 nov a 17 de dez.

Obs: A fotos foram retiradas do Blogg do Gerald Thomas


Jardel Dias Cavalcanti
Londrina, 6/2/2018

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Entrevista com Luiz Felipe Pondé de Humberto Pereira da Silva


Mais Jardel Dias Cavalcanti
Mais Acessadas de Jardel Dias Cavalcanti em 2018
01. Entrevista com a tradutora Denise Bottmann - 26/6/2018
02. A Fera na Selva, filme de Paulo Betti - 22/5/2018
03. Hilda Hilst delirante, de Ana Lucia Vasconcelos - 16/10/2018
04. Goeldi, o Brasil sombrio - 20/11/2018
05. O pai da menina morta, romance de Tiago Ferro - 3/4/2018


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Lord Jim
Joseph Conrad
Abril
(1980)



La Magia de La Batuta
Herzfeld
Labor



O espinheiro de Arimateia
Frank G. Slaughter
Itatiaia
(1964)



Diário do Futuro 10
Mirai Niki
Jbc



Iacobus
Matilde Asensi
Planeta
(2013)



O Pensamento Vivo de Buda
José Geraldo Simões Jr Tradução e Pesquisa
Martin Claret
(1985)



Uma Mulher Inacabada
Lillian Hellman
Francisco Alves
(1981)



Mestre NOZA (Xilogravura Popular)
Carolina Dumaresq
Demócrito Rocha
(2002)



Livro Pedagogia A Aula Como Processo Um Programa de Auto-Ensino
Juracy C. Marques
Globo
(1978)



Expatriados Com Um Novo Desafio Para Os Rhs Interculturais
Andréa Sebben, Andréa Sebben
Artes E Ofícios
(2009)





busca | avançada
56774 visitas/dia
2,1 milhões/mês