O físico subversivo | Bruno Garschagen | Digestivo Cultural

busca | avançada
61737 visitas/dia
2,0 milhões/mês
Mais Recentes
>>> O escultor Renato Brunello participa do SCOGLIERAVIVA - Simpósio Internacional em Caorle (Veneza)
>>> “DESIGN versus DESIGUALDADES: Projetar um mundo melhor”
>>> “O Tempo, O Feminino, A Palavra” terá visita guiada no Sérgio Porto
>>> Marés EIN – Encontros Instrumentais | Lançamento Selo Sesc
>>> renanrenan e Os Amanticidas
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
Colunistas
Últimos Posts
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
>>> Claude 4 com Mike Krieger, do Instagram
Últimos Posts
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
>>> Transforme histórias em experiências lucrativas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Trema, sentirei saudades
>>> Carta para Sonia Rodrigues
>>> Se eu fosse você 2
>>> O Apanhador no Campo de Centeio
>>> Amor e relacionamentos em tempos de transição
>>> Gripe Suína por Nani
>>> Em defesa de Harry Potter
>>> O mundo como ele realmente é
>>> Histórias de quando eu tinha tempo livre de sobra
>>> Sex and the City
Mais Recentes
>>> Teoria da Poesia Concreta Textos Críticos e Manifestos 1950-1960 de Décio Pignatari Augusto e Haroldo de Campos pela Brasiliense (1987)
>>> Livro BTK Profile Máscara Da Maldade de Roy Wenzl, Tim Potter, Hurst Laviana, L. Kelly, traduzido por Eduardo Alves pela Darkside Books (2019)
>>> Os mestres secretos do tempo de Jacques Bergier pela Hemus (1985)
>>> Livro O Sofá Que Engoliu As Crianças de Mariza Tavares pela Globo (2013)
>>> Livro Aprendendo Inteligência Nova Edição Revista Coleção Neuropedagogia Volume 1 de Pierluigi Piazzi pela Aleph (2008)
>>> Livro O Beco das Ilusões Perdidas de William Lindsay Gresham, traduzido por Flávia Souto Maior pela Planeta (2021)
>>> Essa Garota E Demais de Pedro Bloch pela Fisicalbook (1991)
>>> Livro História Da Riqueza Do Homem de Leo Huberman pela Zahar Editores (1977)
>>> Livro Aline: O Amor Não Tem Idade de Marli Beretta Olim Marote pela Panorama (2001)
>>> Livro A Tirania do Mérito O Que Aconteceu Com O Bem Comum? de Michael J. Sandel, traduzido por Bhuvi Libanio pela Civilização Brasileira (2020)
>>> O sertão - o rio da terra de W. Bariani Ortencio pela Livraria São José (1959)
>>> Histórias sobre ética de Machado De Assis pela Ática (2025)
>>> Livro Mulan Uma Limonada Atrapalhada de Disney pela Melhoramentos (1998)
>>> Livro H. P. Lovecraft Medo Clássico Volume 1 de H. P. Lovecraft, traduzido por Ramon Mapa, ilustrado por Walter Pax e Robert Bloch pela Darkside Books (2017)
>>> Livro Doidinho de José Lins do Rego pela José Olympio (2011)
>>> Livro Mundo Fantástico Oceano de Samantha Gray pela Dorling Kindersley (2008)
>>> A Sorte Segue A Coragem! de Mario Sergio Cortella pela Planeta (2025)
>>> Livro Pinóquio Contos Clássicos Para Ler E Ouvir de Ciranda Cultural pela Ciranda Cultural (2018)
>>> Livro 200 Exercícios E Jogos Para Ator E O Não-Ator Com Vontade De Dizer Algo Através Do Teatro de Augusto Boal pela Civilização Brasileira (1979)
>>> Livro O Valor do Amanhã de Eduardo Giannetti pela Companhia Das Letras (2012)
>>> Primeiros Habitantes Do Brasil, Os de Norberto Luiz Guarinello pela Atual (paradidaticos) - Grupo Saraiva (1994)
>>> A Conspiracao de Majori Claro pela Scipione (2025)
>>> Livro Introdução À Teoria Da Eletricidade E Do Magnetismo de Nelson Martins pela Edgard Blucher Ltda (1973)
>>> Livro Um Porto Seguro: Nos Momentos Mais Difíceis, O Amor É O Único Refúgio de Nicholas Sparks pela Novo Conceito (2013)
>>> Livro Livre A Jornada de Uma Mulher em Busca do Recomeço de Cheryl Strayed, traduzido por Débora Chaves pela Objetiva (2013)
COLUNAS

Terça-feira, 16/7/2002
O físico subversivo
Bruno Garschagen
+ de 3700 Acessos

Quando tinha nove anos seu professor de grego no Luitpold Gymnasium disse-lhe na frente da classe inteira que nunca chegaria a ser coisa alguma na vida. Chegou a ser considerado lento na escola. Seus colegas o chamavam "biedermeier", nerd para nós. Foi esse garoto, tido como impudente, nascido em Ulm - cidade da região no extremo sudoeste da Alemanha conhecida como Suábia - que se transformou no pensador que derrubaria a maçã de Isaac Newton e mudaria a face quase enrugada da história da física. Albert Einstein (1879-1955), o contestador da teoria tradicional; o físico libertário que queria ser estudante por toda a vida; o mundano, namorador e sedutor; o homem desajeitado que perseguia na filosofia os segredos da física; o sujeito que renunciou a cidadania pela opressão sofrida na escola e sociedade alemãs; o cérebro movido a café e tabaco que forjou a famosa e inexplicável teoria da relatividade; a personalidade que recebeu o Nobel em 1922.

A formação intelectual do físico que distribui afagos e uma língua aos holofotes torna instigante o livro "Einstein apaixonado - Um romance científico" (Editora Globo, 524 páginas), do jornalista norte-americano Dennis Overbye. Como uma senhora paciente, Overbye vai cozendo os tapetes de lã, que pavimentam a construção do pensamento do grande gênio da física até seus 40 anos de idade. Delineia com delicadeza, o homem imperfeito que buscava a perfeição nos números, com base em centenas de cartas até então livres da violação dos biógrafos anteriores. Ao invés de mitificar o símbolo de cabelos desgrenhados e semblante fraternal, o jornalista recompõe o esforço intelectual do garoto, do jovem e, depois, do adulto, cuja capacidade acima do normal para lidar com ciências exatas dava às mãos a incapacidade de manusear seu cotidiano e uma atitude quase cruel com algumas mulheres que o amaram.

Mesmo assim, Einstein sabiamente construiu um círculo de amizade fundamental no desenvolvimento de suas teorias e na reorganização de seus fracassos. O físico que hoje nos parece um semi-deus nascido pronto foi elaborado sobre uma mistura heterogênea de cientistas, matemáticos, astrônomos, outros físicos, e a custa de muito, muito esforço. Os olhos escuros e luminosos cheios de determinação e uma forte inclinação para a insolência guardavam uma personalidade superior que tombava sob encantos seus interlocutores. Nada escapava ao seu olhar aguçado.

Quando saiu de casa para estudar, livre do cabresto das convenções, a atitude de Einstein para com o mundo era a do filósofo que ri, e a sua zombaria espirituosa, observou Overbye, fustigava qualquer presunção ou afetação. Exercia um humor dificilmente compartilhado pelos outros alemães. Aproveitava as oportunidades que as conversas nos cafés ou em casa lhe abriam para pespegar alguma observação satírica. Desabrochou cedo. Aos dois anos e meio, na expectativa de ganhar um brinquedo, exigiu da mãe saber por que a irmã recém-nascida não tinha rodas. Já adulto, escreveu um postal ao amigo Georg Nicolai, em plena Primeira Guerra, com a inscrição "A união faz a força" logo acima dos retratos do kaiser, do sultão da Turquia e do imperador Franz Joseph, os cabeças das chamadas Potências Centrais. Numa outra carta, ao amigo Michele Besso, Einstein se desculpava pela demora em dar notícias. "Mas agora - uma vez que o sabá das bruxas em Bruxelas já passou - serei senhor de mim mesmo de novo, a não ser pelos meus cursos", escreveu, referindo-se a um congresso científico sobre o problema quântico realizado na cidade belga.

Desde novo o jovem Albert Einstein tinha ambições Intelectuais. Filho de Pauline e Hermann Einstein, aos 12 anos o primeiro choque que o levou a galgar os espinhosos degraus do intelecto: o entusiasmo juvenil pela fé judaica foi implodido pelo contato com a ciência. No lugar de Deus, a matemática. Induzido a caminhar descalços pela estrada de tijolos científicos pelo tio Caesar e pelo estudante universitário Max Talmey, Einstein mergulhou numa orgia de livre-pensar fanático acoplado à impressão de que a juventude estava sendo intencionalmente enganada pelo Estado por meio de mentiras. Avançando mais que o amigo na matemática, descobriu, novamente por influência de Talmey, a filosofia. Juntos, iniciaram o estudo da Crítica da Razão Pura, a densa obra do filósofo Imannuel Kant. Na época, Kant estava em voga entre os universitários e continha implicações bastante significativas para a ciência. Também incursionaram na filosofia de Arthur Schopenhauer, o sedutor pessimista que escreveu aforismos geniais e tolices, impiedosamente coerentes, do tipo: ao dar uma esmola ao mendigo não terás feito nada além do que prolongar seu sofrimento.

A mudança para Zurique em 1896, onde estudaria na Escola Politécnica Federal, assegurou-lhe um ambiente de efervescência intelectual. A Europa fervilhava no fim do século. Revoluções se seguiam; Sigmund Freud, de Viena, abalava a medicina com seus estudos sobre sonhos e histeria sexual; o caso Dreyfus martelava os brios dos franceses e pontuava um marco do jornalismo com o "J'acuse" de Émile Zola; o impressionismo dava as cartas nas artes plásticas de Paris e o jovem Pablo Picasso começava a tirar alguns ases da manga; Stéphane Mallarmé levava a cabo experiências com o silêncio e o aleatório; os raios-X e a radiatividade são descobertos; com morte decretada alguns anos antes, a ciência da física içava as velas sob um vento norte, envolta de complexidade e mistério.

A cidade suíça era "daquelas metafisicamente limpas, protegida pela estabilidade política e pela liberdade, pelo ar fresco, pela prosperidade e pela neutralidade histórica sacrossanta", nos conta o biógrafo de Einstein, subeditor de ciências do The New York Times. Anos depois, Zurique abrigaria vários artistas e intelectuais, como James Joyce, os dadaístas, Lênin. "Ao longo da margem oriental do Limmat, sobre as encostas mais baixas de Zürichberg, uma comunidade de proscritos, livres-pensadores e estudantes ocupava um labirinto de hospedarias e cafés". O estilo de vida dos cafés nunca mais foi o mesmo. Na sua primeira temporada, Einstein e seus amigos lapidaram essa nobre arte de ócio. Acordavam tarde, conseguiam um desjejum de folhados da senhoria, flanavam pela manhã pelo laboratório de física, cochilavam em algumas preleções e acampavam no Café Metrópole, à tarde, com um livro. Viciado em café e tabaco, Einstein tocava violino (Mozart, Handel, Schubert, Beethoven) à noite e depois vagava até em casa. Como é doce morrer no mar!

Esse período marcou-o tanto, que o suábio impudente, tempos depois quando morou em Praga, freqüentou o Café Louvre, reduto de artistas, pensadores e músicos. Lá, conheceu os escritores Franz Kafka e Max Brod; o escultor Frantisek; e o compositor Leos Janacek.

Sofrendo a solidão dos que se atrevem a olhar além da superficialidade da vida, Einstein sentiu-se completo quando passou a se reunir com freqüência com dois amigos - Maurice Solovine e Conrad Habicht. Liam livros dos maiores pensadores do momento que serviam de temas para discussões. Logo se auto-intitularam "Academia Olympia", parte fraternidade, parte grupo de excursionistas, parte sociedade de jantares e parte clube de debates. Comiam lingüiça bolonhesa, um pedaço de Gruyére, frutas, mel e uma ou duas xícaras de chá antes de iniciar a leitura. Mal passavam da primeira página, irrompiam nas discussões. A Academia abriu-lhe os portões de Hume, Mills, Spinoza, Helmholtz, Sófocles, Platão, Dostoievski, Dickens e mais uma penca de autores científicos. A academia durou alguns anos até o grupo se dispersar. Talvez deve-se à essa formação o texto do jovem físico ser tão bom, nas correspondências e teses.

Como todo intelectual que se julga fundamental, Einstein atribuía seus fracassos à inveja e perseguição de outros físicos. Preterido por várias universidades onde esperava lecionar, o jovem físico disse a um amigo que teria encontrado alguma posição há muito tempo se não fosse o jogo sujo de Heinrich Friedrich Weber, um professor da Politécnica com quem Albert se desencantou pelo método de ensino das velhas verdades e velhos métodos deixando de comparecer às aulas. Inteligente e libertário que era, preferia estudar em casa a fazer concessões; e fazia tudo a seu modo. Afundado nas pesquisas que julgava importantes dava as costas solenemente às instruções dos professores. Os amigos já o tomavam por louco - por algumas afirmações ainda sem provas - e o jeito independente incomodava os docentes, apesar de trazer a razão no colo como um bebê sadio. " 'O que você acha do Einstein?, perguntou Pernet (professor) ao seu próprio assistente, Schaufelberger. 'Ele sempre faz as coisas de um jeito diferente do que eu mando'. O assistente retrucou judiciosamente: 'De fato, ele faz, Herr Professor, mas suas soluções estão certas e os métodos que ele usa são sempre de grande interesse' ". Einstein agia como o soldado responsável por acionar o canhão, mas que acendia e apagava o pavio quando achava necessário, às favas a ordem do comandante.

A narração das tentativas de Einstein para forjar a teoria da relatividade (inicialmente chamada de princípio da relatividade) instiga pelo suor. As formulações frustradas, as explosões de genialidade, os pequenos fracassos, o desencontro das idéias, o retorno aos cálculos deixados de lado anos antes por aparentarem não ter solução, são estimulantes. Overbye reconstrói o suábio impudente com texto elegante. Evita o mito e rejeita a exploração fácil das falhas de Einstein como homem - o relacionamento com a primeira esposa, Mileva; a reação com o "desaparecimento" da primeira filha, Lieserl; as chantagens emocionais com os filhos após a separação; a cruel insinuação à segunda esposa, Elsa, quando se apaixonou pela enteada Ilse (queria a cozinha e a companhia social de Elsa e o sexo de Ilse).

"Einstein apaixonado" é a obra sedutora para se entender a trajetória do físico subversivo e do desenrolar da ciência no início do século XX.

Para ir além





Bruno Garschagen
Cachoeiro de Itapemirim, 16/7/2002

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Os autômatos de Agnaldo Pinho de Ronald Polito
02. A pintura admirável de Glória Nogueira de Ronald Polito
03. A redoma de vidro de Sylvia Plath de Renato Alessandro dos Santos
04. O Carnaval que passava embaixo da minha janela de Elisa Andrade Buzzo
05. Gerald Thomas: cidadão do mundo (parte I) de Jardel Dias Cavalcanti


Mais Bruno Garschagen
Mais Acessadas de Bruno Garschagen em 2002
01. O romance da desilusão - 6/8/2002
02. Eu quero é rosetar - 12/2/2002
03. Niilismo e iconoclastia em Thomas Bernhard - 26/2/2002
04. Paz é conto da Carochinha - 28/5/2002
05. Anauê - 21/5/2002


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Educação financeira - para jovens e estudantes
Cultura e economia
Bela vista



Básico Em Administração
Fábio Kubica, Lilian S P Carvalho
Senac Sp
(2013)



Lisboa- Edição portuguesa
Vários autores
Jamp



A Realização Espiritual - Abra o Seu Coração
Sonia Ramos
Novo Século



Coletânea de Resoluções e Recomendações para o concurso da magistratura do Trabalho
Aline Leporaci
Freitas Bastos



La Poésie du Brésil - Anthologie du XVI au XX Siècle
Max de Carvalho
Chandeigne
(2012)



Inferno E Danaco A Queda Irreal No Funil De Nietzsche
Torres
Fisicalbook
(2022)



Uma Vida Para Seu Filho
Bruno Bettelheim
Círculo do Livro
(1987)



Medidas de Redução do Contencioso Tributário e o CPC/2015
Gisele Barra Bossa, Eduardo Perez Salusse
Almedina
(2017)



1822
Laurentino Gomes
Nova Fronteira
(2010)





busca | avançada
61737 visitas/dia
2,0 milhões/mês