A fúria do demônio | Adriana Baggio | Digestivo Cultural

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Quinta-feira, 12/9/2002
A fúria do demônio
Adriana Baggio
+ de 7100 Acessos

Shakespeare já dizia que não há estrago na natureza que se compare à destruição causada pela fúria de uma mulher desprezada. Ainda mais quando essa mulher consegue o poder necessário para perseguir aqueles que a fizeram sofrer.

Este é apenas um aspecto do caráter de uma das mulheres mais fascinantes da nossa história recente: Chiang Ching, esposa do ex-ditador da China, Mao Tse-Tung. Todo o estrago causado por Chiang Ching durante o regime político de seu marido fez com que fosse conhecida como Demônio de Ossos Brancos. Um epíteto nada lisonjeiro para quem usou nomes com significados bem mais singelos, como Rio Verde (Chiang Ching) e Maçã Azul (Lan Ping).

A vida de Chiang Ching foi banida dos livros da história da China, mas agora é resgatada através do romance de Anchee Min, A construção de Madame Mao (Rocco, 2002). Jornalista e mestre em Cinema e Televisão, Anhee Min chegou a conhecer Madame Mao pessoalmente, quando trabalhava nos estúdios de cinema de Pequim, dirigidos pela esposa do ditador. Mais tarde, já vivendo nos Estados Unidos, Anchee Min relata a vida de Chiang Ching de uma maneira polêmica, apresentando uma mulher com uma vida extremamente sofrida e solitária, e que usou o poder para se vingar daqueles que atrapalharam seu caminho.

Madame Mao nasceu uma menina pobre, filha de uma concubina de um senhor rural do interior da China. Revoltada com a sina de seguir o mesmo destino da mãe - uma entre as muitas mulheres de um pequeno fazendeiro, constantemente espancada pelo marido -, Chiang, então chamada Yunhe, recusa-se a adotar os mesmos costumes das meninas de sua época. Em uma atitude rebelde, inspirada não se sabe onde, Yunhe recusa-se a ter os pés atrofiados. Depois de algumas semanas de sofrimento com os pés atados, latejantes, manchados de roxo e amarelo e encharcados de pus, a menina decide libertar-se do costume cruel e deixa os pés crescerem livremente, para desespero da mãe.

A futura Madame Mao considera-se um pavão entre galinhas, uma metáfora recorrente no texto de Anchee Min. Este conceito de si própria faz com que Yunhe abandone um casamento arranjado e vá em busca de sua liberdade. Junta-se a uma companhia de ópera, vai para Xangai, trabalha em filmes classe B até juntar-se ao Partido Comunista. Nesse meio tempo, Yunhe troca seu nome para Lan Ping e envolve-se com diversos homens. Todos os relacionamentos da jovem e bela atriz são cheios de paixão e sofrimento. Parece que Lan Ping está sempre em um palco, representando um drama. Aliás, o livro mostra claramente o quanto a personagem sente-se à vontade em situações de emoções extremas.

Lan Ping junta-se ao Partido Comunista por uma ideologia baseada no seu interesse pessoal. Por conta disso, quando é presa e acusada de colaborar com os comunistas, Lan Ping nega fervorosamente suas relações e denuncia colegas do Partido, fato que, mais tarde, será veementemente negado por ela.

A construção de Madame Mao começa quando Lan junta-se a um acampamento do Partido no interior da China. A moça bonita, de pele clara, ainda não castigada pelo tempo e pelo trabalho duro dos acampamentos, atrai o líder Mao Tsé-Tung. Para ficar com ele, Lan precisa apagar qualquer vestígio que seja desabonador para uma futura esposa do Grande Timoneiro. Com a ajuda de um dos grandes aliados de Mao, Lan constrói sua nova imagem e casa-se com o futuro ditador.

Todos os atos de Lan, que ganha do marido o nome de Chiang Ching, são realizados calculadamente para alcançar o que a atriz mais deseja: o papel de protagonista na história da China. Mas depois de alguns anos de casamento, Chiang é abandonada pelo marido, embora continue oficialmente casada com ele. Nesse ponto, o livro traça um dos retratos mais repugnantes do ditador: um homem cruel, inteligente mas ingênuo, com uma sede enorme de poder e de eternidade. Mao acreditava piamente que viveria para sempre se mantivesse constantemente relações sexuais com virgens. As virgens eram recrutadas nas aldeias pobres do interior do país e enviadas ao Palácio Imperial, como vacas para um abatedouro. Chiang Ching, impotente diante da indiferença do marido, ridicularizada em suas tentativas de obter o reconhecimento por seu auxílio na direção do país, mais uma vez pede ajuda ao homem de confiança de Mao para recuperar sua importância junto ao ditador.

Foi nessa fase turbulenta para Mao enquanto governante, e para Chiang Ching enquanto esposa, que nascem os primeiros movimentos da Revolução Cultural. A Revolução Cultural foi responsável pela perseguição e morte de intelectuais chineses, com a clássica desculpa de que eram inimigos do povo. Chiang Ching teve um papel fundamental na organização e na condução da Revolução. Nesse drama, o Demônio de Ossos Brancos assume seu maior papel. É um período de intensa satisfação para Chiang. Sendo necessária, consegue a atenção do ditador. De uma maneira doentia, o casamento deles se fortalece, e Madame Mao assegura sua posição dentro do Partido e como braço direito de Mao. Mao, por sua vez, tem a saúde cada vez mais debilitada, e Madame Mao espera substituir o marido no comando da China.

Anchee Min sugere no livro que a Revolução Cultural teve causas muito mais mesquinhas do que poderia se esperar de um movimento desta magnitude. Para Mao, a Revolução Cultural foi uma maneira de vingar-se dos intelectuais de Pequim que o desprezaram na época da universidade. Para Chiang Ching,, a Revolução foi uma maneira de se aproximar do marido, e também de eliminar as pessoas que a fizeram sofrer no passado.

É a fúria da mulher que foi maltratada na infância, desprezada por alguns amantes e que não teve o merecido reconhecimento por sua atuação no governo da China. Sem entrar no mérito das suas atitudes, na crueldade das suas armações, é preciso reconhecer Chiang Ching como uma das grandes feministas do século XX. Desde a recusa em ter seus pés amarrados até o fato de não conformar-se com o papel secundário que lhe foi delegado, Chiang Ching lutou por coisas que as feministas reivindicavam no mundo ocidental: fim da opressão e da violência física, direitos iguais, oportunidade para desenvolver um papel que não fosse somente o de esposa, mãe e dona-de-casa. Na conservadora China, foi um sacrilégio. Madame Mao foi presa em seguida a morte do marido e excluída dos livros de história. Como nunca se conformou em que tomassem as rédeas de seu destino, o Demônio suicidou-se na cadeia, em 1991.

Para ir além





Adriana Baggio
Curitiba, 12/9/2002

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