Freud e a mente humana | Julio Daio Borges | Digestivo Cultural

busca | avançada
78889 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Festival exibe curtas-metragens online com acesso livre
>>> Lançamento do thriller psicológico “ A Oitava Garota ”, de Willian Bezerra
>>> Maurício Einhorn celebra os 45 anos do seu primeiro álbum com show no Blue Note Rio, em Copacabana
>>> Vera Holtz abre programação de julho do Teatro Nova Iguaçu Petrobras com a premiada peça “Ficções”
>>> “As Artimanhas de Molière” volta aos palcos na Cidade das Artes (RJ)
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
Colunistas
Últimos Posts
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Das coisas que você detesta
>>> 21 de Junho #digestivo10anos
>>> 3 Alexandres
>>> Blogueiros vs. Jornalistas? ROTFLOL (-:>
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> O poeta, de Vinicius de Moraes
>>> Crítica à arte contemporânea
>>> Pecados, demônios e tentações em Chaves
>>> Satã, uma biografia
>>> Críticos em extinção?
Mais Recentes
>>> Nos Bastidores da Disney Os Segredos do Sucesso Da Mais Poderosa Empresa de Diversões do Mundo de Tom Connellan pela Saraiva (2010)
>>> Comunicação Global A Mágica da Influência A Neurolinguística Aplicada à Comunicação de Lair Ribeiro pela Objetiva (1993)
>>> O Poeta E O Cavaleiro de Pedro Bandeira pela Moderna (2013)
>>> Em Algum Lugar Do Paraiso de Luis Fernando pela Objetiva (2011)
>>> Infinito - Os Imortais de Alyson Noël pela Intrínseca (2013)
>>> Para Sempre - Os Imortais de Alyson Noel pela Intrinseca (2009)
>>> Terra De Sombras - Portugues Brasil de Alyson Noel pela Intrínseca (2013)
>>> Lua Azul - Os Imortais - Portugues Brasil de Alyson Noel pela Intrínseca (2013)
>>> Calhoun: Catherine & Amanda - Vol. 1 de Nora Roberts pela Harlequin Books (2010)
>>> A Máquina De Fazer Espanhóis de Valter Hugo Mãe pela Biblioteca Azul (2016)
>>> Lembranças De Nós Dois de Judith Mcnaught pela Bertrand Brasil (2023)
>>> Crônicas De Repórter de Pedro Bial pela Objetiva (1996)
>>> Lula E Minha Anta de Diogo Mainardi pela Record (2007)
>>> Em Busca da Sabedoria de N. Sri Ram pela Teosófica (2020)
>>> A Cabeca De Steve Jobs As Licoes Do Lider Da Empresa Mais Revolucionaria Do Mundo de Leander Kahney pela Agir (2008)
>>> Nosso Jogo de John Le Carré pela Record (1996)
>>> A Grande Esperança Viva Com a Certeza de Que Tudo Vai Terminar Bem de Ellen G. White pela Casa Publicadora Brasileira (2011)
>>> Senhora Do Jogo - Mistress Of The Game de Sidney Sheldon pela Record (2007)
>>> O Regresso de Michael Punke pela Intrínseca (2016)
>>> The Casual Vacancy de J.K Rowling pela Wentworth Press (2012)
>>> Um Conto Do Destino de Mark Helprin pela Editora Novo Conceito (2014)
>>> Brinquedos E Brincadeiras de Roseana Murray pela Ftd (2014)
>>> A Risada Do Saci (contos De Espantar Meninos) de Regina Chamlian pela Editora Atica (2009)
>>> Histórias De Bichos Brasileiros de Vera do Val pela Wmf Martins Fontes (2010)
>>> Matemática. Caderno De Atividades. 7º Ano de Imenes pela Moderna (2010)
COLUNAS

Sexta-feira, 21/11/2003
Freud e a mente humana
Julio Daio Borges
+ de 102400 Acessos
+ 2 Comentário(s)

O século XX foi cruel com Freud, embora ele seja considerado uma das maiores "cabeças" do período. É moda dizer que foi refutado e que a maioria das suas "teorias" caiu por terra - apesar de ele ter consagrado a psicanálise. Hoje em dia, lê-se por aí que Freud é mais visto como "filósofo" do que como cientista (Wittgenstein, um filósofo contemporâneo seu, sempre duvidou que houvesse ciência em seus procedimentos). A neurociência chegou para impor suas "verdades"; mas a verdade é que Freud propôs um dos melhores modelos para a "mente humana" de que se tem notícia.

Todo mundo conhece o "id", o "ego" e o "superego". Os três caíram no gosto popular. O id seria o que resta de "animal" em nós ("animal" entre aspas, porque os verdadeiros animais não têm culpa). Michael Kahn, autor de Freud básico (um guia extremamente confiável, lançado recentemente pela editora Record/Civilização Brasileira), compara o "id" ao "monstro" do conto Dr. Jekyll and Mr. Hyde (O médico e o monstro), de Robert Louis Stevenson. O id quer realizar todos os nossos desejos e não entende que uma recusa ao "prazer momentâneo" pode se converter em "prazer duradouro". Aí entra o ego.

O ego ou a "consciência" faz a mediação (no jargão futebolístico: o "meio-de-campo") entre o id, insaciável, e o superego. Este último serviria para nos punir e para frear nossos instintos, com base na experiência. Kahn dá um exemplo ótimo: aprendemos, quando crianças, com os nossos pais, que não devemos transgredir certas normas sociais; no início, somos punidos e corrigidos por eles; mais tarde, sua mera presença nos faz lembrar de como devemos nos comportar; com o tempo, incorporamos as lições dos nossos pais em nós, de tal forma que o superego assume o papel de "vigia" dentro da nossa cabeça.

O superego é aquela voz que nos diz que "alguém pode estar olhando" (como na frase de Mencken). Kahn sugere a imagem de um "porteiro", que decide (como no conto de Kafka) quem deve ou não atravessar a "porta da consciência". Mas o superego pode ser traiçoeiro, crescer demais na vida de uma pessoa e, por meio da "culpa", impedir que ela se desenvolva como ser humano. O superego pode ainda protelar um "desejo" indefinidamente, de modo que ele se transforme em "recalque" - e lá vai o sujeito engrossar o coro dos "recalcados".

Freud é tomado, junto com Darwin e Marx, como uma das "bestas do apocalipse", porque ajudou a enterrar o que restou de "religiosidade" no século passado. E, realmente, depois de estudar Freud, fica difícil concordar que a "culpa" (como vista, por exemplo, pela igreja católica) possa trazer algum benefício ao indivíduo. Kahn evoca a vida de santos que, para livrar-se de "pensamentos pecaminosos", impunham castigos ao próprio corpo - para eles, a fonte de todo o "mal". Tinham razão; mas, pensando neles, Freud balançaria a cabeça negativamente, como se dissesse: "Tsc, tsc, tsc...".

Os "desejos" simplesmente existem em nós. Não têm qualquer origem "moral". Brotam junto com os pensamentos e não devem ser tomados como um indício de "má conduta" ou de "mau comportamento". Aqueles santos, que se autoflagelavam, não diferenciavam os seus "atos" das suas "vontades". Para Freud, um dos "custos" da civilização era justamente esse: impor que as últimas não se convertessem nos primeiros - e garantir uma convivência harmônica entre os seres humanos. Contudo, sem a pretensão de querer anular "desejos inconvenientes"; afinal, eles poderiam nos dar pistas para uma das forças mais poderosas que regem a nossa vida: o inconsciente.

O "inconsciente" não foi uma invenção de Freud, como aponta Kahn. Já existia na obra de poetas; e, justamente, aqueles com melhor acesso ao inconsciente seriam os "artistas". Muitas das nossas motivações ao longo da existência, por mais que as "racionalizemos", emanam do nosso inconsciente. Ele é a chave, por exemplo, para entender por que cometemos sempre os mesmos erros; por que reagimos a determinadas situações de forma semelhante; e, principalmente, por que não superamos certas dificuldades que nos acompanham desde a infância, até a idade adulta.

Freud, no contato com seus pacientes, descobriu que os "sonhos" eram o melhor caminho para o inconsciente. Através da sua "interpretação", por meio de associações de palavras, curou muita gente da chamada "compulsão à repetição", permitindo que pudessem viver plenamente. Afinal de contas, as relações que construímos desde que somos crianças e adolescentes tendem a se refletir, futuramente, nas ligações que continuaremos a estabelecer em etapas posteriores. Assim, um "trauma" ou um "complexo" mal resolvido pode redundar em problemas, cuja origem, depois, só ficará clara através da sondagem do inconsciente.

Portanto, é central na obra de Freud o "complexo de Épido". Ele fica claro se tomarmos o caso dos "meninos" mais do que das "meninas". Esses, para completar seu "desenvolvimento psicossexual", precisariam, em algum momento na puberdade, suplantar a figura do "pai" e conquistar a da "mãe". (Aquele que não fosse bem sucedido nesse instante sofreria as conseqüências.) A "conquista" da mãe, para o jovem rapaz, é a prova de que ele pode, posteriormente, conquistar outras garotas e, metaforicamente, "assumir" o lugar do pai (na família que irá constituir depois). Freud acreditava que os homossexuais "falhavam" ao tentar sobrepujar a figura do pai - o que provocaria, neles, uma identificação com o mesmo, de modo que passariam a vida "(re)conquistando" o pai (através de outros homens) e não a mãe. Do mesmo jeito, aquele que "falhasse" ao tentar conquistar a mãe se converteria num "dom juan" - que procuraria, em todas as mulheres que encontrasse, a figura da genitora, para subjugá-la ao final. (Talvez por esse motivo, Freud afirmasse que o "conquistador inveterado" está a um passo do homossexual [vide Lord Byron].)

Kahn, igualmente terapeuta, narra casos de pacientes que, à medida que o tratamento avançava, "projetavam" nele a imagem do pai ou da mãe. Alguns adotavam uma postura "desconfiada", agindo, em relação a ele, como "filhos rebeldes"; outros formavam um vínculo de tamanha afetividade que terminavam querendo estabelecer relações amorosas. Há, particularmente, no livro, a história de uma moça cujo "corpo" lhe enviava sinais do inconsciente: ela comparecia às sessões cada vez mais arrumada e ansiava por que Kahn a "desejasse", como o pai que não a desejou - a fim de suplantar um "complexo" que a impedia de relacionar-se com rapazes de sua idade. (Uma vez percebido isso, foi desatado o nó que levou à "cura".)

Freud chamou o fenômeno de "transferência" - e ele é bastante comum até os dias de hoje (vide os filmes de Woody Allen). Como dito anteriormente, a representação do "pai" e da "mãe", junto com os primeiros vínculos que estabelecemos, vão ecoar pela vida afora: na escola, no trabalho, na família, etc. Freud via em toda e qualquer afeição um potencial "erótico". Nas relações familiares inclusive (como o nosso Nélson Rodrigues, aliás), podendo explodir em descargas aparentemente sem sentido, mas segundo um padrão previsto no inconsciente. Não à toa, Freud considerava o amor da "mãe" pelo "filho" um dos mais perfeitos para a mulher - porque ele se realizava sem a consumação carnal (que proporciona sempre tantas frustrações).

Ainda com relação ao "pai", Freud teve dúvidas ao nomear o "complexo de Édipo". Baseando-se na obra-prima de Sófocles, percebeu que poderia muito bem chamá-lo de "complexo de Laio". Pois, como um dos protagonistas da história, os "pais" se sentiam ameaçados pelos "filhos" recém-chegados e temiam, como efetivamente acontece, que estes tomassem o seu "lugar", usurpando do "rei" o trono. Kahn fala de culturas em que, quando o bebê nasce, o pai é afastado do leito - o que evoca a imagem da "sucessão". Os "pais" então, inconformados com a perda da "posição", e enciumados diante do amor que a mãe naturalmente dedica ao recém-nascido, voltar-se-iam contra os próprios "filhos", em represália.

Freud e Kahn retornam ao "pai" e à "mãe", ainda uma vez, para discorrer sobre a experiência do luto. Freud achava "positivo" que a perda de um ente querido fosse vivida plenamente. Notava que, em sociedades onde os rituais do luto eram seguidos à risca, os indivíduos superavam mais facilmente a perda. A seu ver, era necessário esgotar as lembranças do ente (por exemplo, em conversas), incorporando, inclusive, hábitos ou mesmo pertences daquele que se foi, num processo denominado "introjeção". Quem não atravessasse a contento a experiência do luto ficaria preso num mundo "irreal", teria problemas para confrontar-se com o "mundo exterior" e não construiria novas relações, no lugar daquela que se rompeu.

É, em resumo, uma pena que todo o estudo, empreendido por Freud, sobre a natureza humana, atualmente se restrinja a alguns clichês, muitos conceitos equivocados e à firme convicção de que a ciência, definitivamente, o "ultrapassou". A descoberta de Freud (que era muito mais que "sexo" e "charutos") pode ser ainda reveladora, ajudando muita gente - com ou sem terapia - a se conhecer e a viver melhor com suas próprias idiossincrasias. Nesse sentido, Freud básico, de Michael Kahn, apresenta-se como uma bela introdução.

Para ir além


Julio Daio Borges
São Paulo, 21/11/2003

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Kardec, A Biografia, de Marcel Souto Maior de Ricardo de Mattos
02. Coro dos Maus Alunos de Duanne Ribeiro
03. Eugène Delacroix, um quadro uma revolução de Jardel Dias Cavalcanti
04. Nas redes do sexo de Guilherme Pontes Coelho
05. Os 100 maiores cientistas de Gian Danton


Mais Julio Daio Borges
Mais Acessadas de Julio Daio Borges em 2003
01. Freud e a mente humana - 21/11/2003
02. Frida Kahlo e Diego Rivera nas telas - 25/4/2003
03. Rubem Fonseca e a inocência literária perdida - 16/5/2003
04. A internet e as comunidades virtuais - 24/1/2003
05. Cabeça de papel - 23/9/2003


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
3/2/2004
01h00min
Mais uma vez brilhante!!! Comprarei esse livro por sua causa. Abraços, Fê
[Leia outros Comentários de ]
19/7/2010
03h27min
Estou lendo o livro e recomendo! Texto muito bom... Parabéns! Abraço!
[Leia outros Comentários de Rodrigo Castro]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




O Pequeno Príncipe
Antoine de Saint Exupéry
Círculo do Livro



A Princesa Nina e seus Cavalinhos Netuno o Pônei Mágico do Mar
Kilbride, Sarah e Sophie Tilley
Publifolha
(2012)



Exercício Físico No Envelhecimento Saudável E Patológico: Da Teoria À Prática
Flavia Gomes De Melo Coelho
Crv
(2013)



Análise de Investimentos
Rodolfo Leandro de Faria Olivo
Anhanguera
(2015)



Leonardo Da Vinci E Seu Supercérebro
Michael Cox
Seguinte
(2004)



Conversação em Coreano
Jung Sub Song
Hanjin Total Printing Solution
(2016)



La Economia De Los Pueblos Sin Maquinismo
Jean Paul Harroy
Guadarrama
(1973)



Livro Literatura Estrangeira Dorothy Must Die
Danielle Paige
Harper Collins
(2014)



A Arte Calmante da Massagem em Bebês + O Primeiro Ano do seu Bebê
Carolina Caires Coelho; Roma Turner; Susie Nanayakkara
CMS; Marco Zero



O Aprendiz do Evangelho
Wladimir Olivier
Eme
(1996)





busca | avançada
78889 visitas/dia
1,7 milhão/mês