A dança das décadas | Pilar Fazito | Digestivo Cultural

busca | avançada
37550 visitas/dia
2,0 milhões/mês
Mais Recentes
>>> CCBB Educativo realiza oficinas que unem arte, tradição e festa popular
>>> Peça Dzi Croquettes Sem Censura estreia em São Paulo nesta quinta (12/6)
>>> Agenda: editora orlando estreia com livro de contos da premiada escritora Myriam Scotti
>>> Feira do Livro: Karina Galindo lança obra focada na temática do autoconhecimento
>>> “Inventário Parcial”
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
Colunistas
Últimos Posts
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
>>> Claude 4 com Mike Krieger, do Instagram
>>> NotebookLM
>>> Jony Ive, designer do iPhone, se junta à OpenAI
>>> Luiz Schwarcz no Roda Viva
Últimos Posts
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
>>> Transforme histórias em experiências lucrativas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Autor não é narrador, poeta não é eu lírico
>>> Queridos amigos
>>> Agonia
>>> Sugerido para adultos?
>>> A literatura infanto-juvenil que vem de longe
>>> 2021, o ano da inveja
>>> O futuro político do Brasil
>>> David Foster Wallace e Infinite Jest
>>> Arquitetura de informação
>>> L’Empereur
Mais Recentes
>>> O Grande Livro Do Medo Contos De Arrepiar de Pedro Rodriguez pela Ciranda Cultural (2012)
>>> Descobrindo As Garotas de Carla Nieto Martines pela Ciranda Cultural (2011)
>>> Paisagem de Lygia Bojunga pela Agir Editora (1998)
>>> Contabilidade Introdutoria de Equipe De Professores ( Fea Usp ) pela Atlas (1998)
>>> Minhas Rimas De Cordel de César Obeid pela Moderna (2005)
>>> AVC e Sono de Fernando Morgadinho Santos Coelho pela Minha (2014)
>>> Nascido Para Correr de Christopher McDougall pela Globo (2010)
>>> Se Nao For Agora, Quando Sera? de Marcelo Rittner pela Planeta (2013)
>>> A Bruxinha Atrapalhada de Eva Furnari pela Global (2002)
>>> O Menino Azul de Cecilia Meireles pela Global (2013)
>>> Nascer sabendo de Ronaldo Simões Coelho pela Ftd (1997)
>>> O Rei Preto De Ouro de Sylvia Orthoff pela Moderna (1997)
>>> Odisséia de Homero. Adaptação Leonardo Chianca pela Scipione (2000)
>>> Cara De Bolacha de Eliana Martins pela Scipione (2005)
>>> Cuidando E Crescendo - Ted Ajuda de Alison Reynolds pela Ciranda Cultural (2008)
>>> Viewpoint de Michael Mccarthy, Jeanne Mccarten, Helen Sandiford pela Cambridge University Press (2016)
>>> Brick Lane de Monica Ali pela Black Swan (2004)
>>> A Década De 80 de Marly Rodrigues pela Ática (1999)
>>> Crianças Francesas Não Fazem Manha de Pamela Druckerman pela Fontanar (2013)
>>> De Cara Com A Midia de Francisco Viana pela Negocio (2001)
>>> Já Entendi de Gladys Mariotto pela Planeta Do Brasil (2015)
>>> O Oitavo Vilarejo de Gustavo Rosseb pela Jangada (2016)
>>> O Pequeno Príncipe de Antoine de Saint-Exúpery pela Novo Século (2021)
>>> El Tatuador De Auschwitz de Heather Morris pela Espasa (2018)
>>> The Corporate Culture Survival Guide de Edgar H. Schein pela Jossey-bass (1999)
COLUNAS

Segunda-feira, 5/10/2009
A dança das décadas
Pilar Fazito
+ de 5500 Acessos
+ 2 Comentário(s)

Em mil-novecentos-e-refrigerante-com-rolha, a chegada aos trinta anos vinha com uma chacoalhada existencial, uma pausa para uma angustiada reflexão, já que a expectativa de vida não passava muito dos sessenta. Nesse tempo, os trinta marcavam um conjunto de metas que deveriam ter sido cumpridas até o dia do aniversário do sujeito: emprego sólido e bacana, marido ou mulher minimamente apresentáveis à sociedade, filhos pródigos, uma casa com uma cerca branca e um beagle correndo pelo jardim. Daí em diante, haveria mais trinta anos para ver os filhos crescerem e os netos nascerem. Já a aposentadoria era considerada a antessala da morte.

Hoje, a expectativa de vida beira os oitenta e quem chega aos trinta sente que mal saiu da adolescência. Ainda há uma pá de coisas a fazer e um monte de gente e lugar para conhecer antes de se dedicar à procriação e à perpetuação da espécie.

O fato é que a velhice é a última coisa que passa pela cabeça de um jovem de vinte anos e a penúltima que passa por quem está na casa dos trinta. Quando a gente começa a contabilizar o tempo das amizades em décadas, ou quando aquele primo que vimos nascer vem nos entregar o convite de formatura, parece que a nossa estrutura espaço-temporal sofre uma espécie de tilt. Mas a gente não dá muita bola para isso e continua a viver como se a imortalidade fizesse parte dos nossos super poderes.

Então, todo mundo começa a se casar e a gente começa a também contabilizar em décadas o tempo de exercício profissional e de fim de namoro. Na primavera, crianças nascem por todo lado, na proporção de um pimpolho para cada flor que brota na cidade; a gente se dá conta de que faz quase trinta anos que E.T. estreou no cinema e que, não, Belinas e Caravans não são mais carros seminovos.

Por mais que a gente tente ignorar que as moiras já fiaram mais de um terço do nosso novelo do tempo, estão todos lá: as moiras, as moscas e os relógios derretidos de Salvador Dalí; todo mundo celebrando a morte diária das nossas células.

Quem luta contra o tempo acaba caindo na patética resistência às mudanças. Não tem coisa mais fofa e engraçadinha do que um adolescente cabeludo, seja à moda riporonga, punk ou metaleira. Não tem coisa mais decadente do que manter esse "papel" depois dos trinta.

Mas a gente começa a sentir que o tempo está passando mesmo quando a força da gravidade faz sentir seus efeitos, jogando tudo no chão: cabelo, pele, músculos. Haja abdominal para manter tudo no lugar. Haja ginástica facial, Botox, colágeno... A preocupação com a celulite cede lugar às rugas, muitas delas causadas pelas juvenis preocupações com a celulite. Como se não bastassem as questões estéticas e fúteis, o corpo começa a dar sinais de disfunções estruturais: dá-lhe diabetes, hérnia de disco, hipertensão e toda a letra titânica do "Pulso ainda pulsa".

Há quatro anos carrego um disco lombar rompido, o qual carinhosamente chamo de Clotilde. Achei que essa hérnia merecia um nome, já que ela tem vontade própria. Ela não pode ser operada e, por isso, tivemos - ela e eu - que aprender a conviver de forma mais ou menos pacífica. Por duas vezes, entretanto, tivemos sérias desavenças e, em ambas, Clotilde ficou emburrada por um mês, negando-se a trabalhar, como sempre fez. Nesses casos, sou obrigada a ficar deitada no chão, rodeada de bolsas de água quente, travesseiros sob as pernas e à base de antiinflamatórios que irritam o estômago, fazem o cabelo cair, mas ao menos acalmam a raiva de Clotilde.

Na primeira vez em que isso me ocorreu, passou-me pela cabeça, por um certo momento, a estúpida ideia de que nunca mais andaria novamente. É que a gente só dá valor ao que tem depois que perde, mesmo que momentaneamente. E naquele instante foi duro perceber que eu não estava cuidando da minha coluna como deveria. Só depois de arrebentar meu disco lombar é que passei a dar mais valor à minha capacidade de locomoção e à liberdade de ir e vir. Para piorar, do chão eu observava meus sobrinhos entrarem correndo pela casa e me perguntava onde eu havia deixado a minha elasticidade infantil, as estrelas, cambalhotas e as bananeiras que eu plantava encostada na parede.

Não é só um corpo que cai. Não sei bem o que acontece entre os 27 e os 33, mais especificamente, mas parece que no meio desses números inteiros aí a gente se parte. Em dois pedaços ou mais.

Aos 27, a gente não titubeia em aceitar um programa tosco de viagem "zero-oitocentos" pro carnaval de Salvador, dividindo com vinte e cinco amigos uma quitinete e um único banheiro com chuveiro frio. Quando tem água.

Aos 33, a gente pensa no que tem para fazer no dia seguinte, antes de cogitar qualquer saída para uma "balada". Aliás, a cama e o lar, de repente, ganham contornos muito mais convidativos do que a ideia de sair de casa, aturar um monte de gente bêbada, chegar em casa cansado e ainda ter que pagar por tudo isso. Uma boa noite de sono e a certeza de não ter olheiras pela manhã passam a ter um valor bem maior.

Os gostos mudam, as preocupações mudam, as conversas, idem. O papo, agora, é filho, marido/mulher, uma promoção, a troca do carro, a compra de um apartamento, a poupança, o plano de saúde, o plano odontológico, a viagem de férias, o tratamento estético e, se sobrar dinheiro..., "será que esse negócio de previdência privada vale mesmo a pena?"

Mas os 30 ainda não são os 40. E os 40 não são os 50. E os 50, definitivamente, não são os 60. A geração de hoje que tem mais de 60 parece rejuvenescer a cada dia. Do mesmo modo que um portal para outra dimensão etária se abre entre os 27 e os 33, parece que depois dos 60 a classe média encontra o caminho de volta. A lógica é outra: finalmente, os filhos estão crescidos, a casa já tá paga, a aposentadoria saiu e o sujeito não tem mais a necessidade de "engolir sapos" ou de ouvir calado a disparates de quem quer que seja.

É bem verdade que os remédios e tratamentos são mais caros e a saúde já não permite fazer tantas estripulias - embora eu conheça e inveje uma senhora de 90 que até os 87 andava sozinha de jetski. Mas o fato é que os pós-sessentanos andam muito saidinhos e os programas da terceira idade de clubes, associações e instituições chegam a ser mais animados do que muita noitada teen.

Enfim, ainda não sei como são os 40, 50 e 60 em diante, mas já deu pra saber que o tempo passa para todos. E embora essa assertiva faça parte do senso comum e, portanto, não traz nada de novo para o desenvolvimento da humanidade, rende algumas crônicas, além de despertar reflexões periódicas sobre os nossos projetos de vida. Nessas ocasiões, a gente tem a oportunidade de reconhecer o valor das escolhas que fizemos. E depois que a melancolia do saudosismo passa, a gente acaba empolgando e perguntando "tem mais?"


Pilar Fazito
Belo Horizonte, 5/10/2009

Mais Pilar Fazito
Mais Acessadas de Pilar Fazito em 2009
01. Leis de incentivo e a publicação independente - 5/1/2009
02. O tamanho do balde - 2/11/2009
03. @mores bizarros - 6/4/2009
04. É a mãe! - 2/2/2009
05. Plantar bananeira, assoviar e chupar cana - 20/7/2009


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
21/10/2009
20h48min
Muito bom seu texto, Pilar! Engraçado que, com o passar dos anos, ficamos cada vez mais questionadores de tudo o que acontece, talvez porque passamos a contabilizar o quanto falta, e geralmente quando vamos nos aproximando de uma suposta metade. O desafio é justamente esse: achar graça e tirar um sarro daquilo que cada vez mais não parece fazer sentido lógico. Parabéns. Um grande abraço!
[Leia outros Comentários de aluizio]
13/10/2010
04h34min
A vida é uma eterna dança.Dançaremos hoje e seremos o ridículo de amnhã.Mas até andar é dançar.
[Leia outros Comentários de Manoel Messias Perei]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Matematica Temas E Metas Volume 2 Trigonometria E Progressoes
Antonio dos Santos Machado
Atual
(1996)



Morte e vida de Charlie St Cloud 526
Ben Sherwood
Novo Conceito
(2010)



A Coragem de Ser
Paul Tillich
Paz e Terra
(1976)



Improvisação para o Teatro
Viola Spolin
Perspectiva
(2015)



Só o Amor Liberta
Célia Xavier de Camargo
Petit
(2007)



Educação a Distância - uma Visão Integrada
Michael G. Moore - Greg Kearsley
Thomson Pioneira - Abed
(2007)



Gibi Semanal - Volume 36
Diversos autores
Rge
(1973)



Indústria Cultural E Sociedade
Theodor Adorno
Paz E Terra
(2002)



Só Há Paz Onde Há Amor
Celso Santos
Lar Frei Luiz
(2019)



Cartas Inglesas tratado de metafísica dicionário filosófico o filósofo ignorante 576
Voltaire
Abril Cultural
(2024)





busca | avançada
37550 visitas/dia
2,0 milhões/mês