O poeta, a pedra e o caminho | Wellington Machado | Digestivo Cultural

busca | avançada
42527 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Mais Recentes
>>> ZÉLIO. Imagens e figuras imaginadas
>>> Galeria Provisória de Anderson Thives, chega ao Via Parque, na Barra da Tijuca
>>> Farol Santander convida o público a uma jornada sensorial pela natureza na mostra Floresta Utópica
>>> Projeto social busca apoio para manter acesso gratuito ao cinema nacional em regiões rurais de Minas
>>> Reinvenção após os 50 anos: nova obra de Ana Paula Couto explora maturidade feminina
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> A dobra do sentido, a poesia de Montserrat Rodés
>>> Literatura e caricatura promovendo encontros
>>> Stalking monetizado
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
Colunistas
Últimos Posts
>>> O coach de Sam Altman, da OpenAI
>>> Andrej Karpathy na AI Startup School (2025)
>>> Uma história da OpenAI (2025)
>>> Sallouti e a história do BTG (2025)
>>> Ilya Sutskever na Universidade de Toronto
>>> Vibe Coding, um guia da Y Combinator
>>> Microsoft Build 2025
>>> Claude Code by Boris Cherny
>>> Behind the Tech com Sam Altman (2019)
>>> Sergey Brin, do Google, no All-In
Últimos Posts
>>> Política, soft power e jazz
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Google Fontes
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Ler, investir, gestar
>>> Caixa Dois, sem eufemismos
>>> Fé e razão
>>> all type
>>> Um cara legal
>>> Histórias de agosto
>>> O mal no pensamento moderno
>>> Yarny e My Writing Spot
Mais Recentes
>>> Brincando Com Móbiles de Thereza Chemello pela Global (1999)
>>> O Informante - Cinemateca Veja de Abril Coleções pela Abril (2008)
>>> Doncovim? - a História de uma Semente de Gente de Andre J. Gomes pela Volta e Meia (2015)
>>> Do Tamanho Certinho de Claudio Cuellar pela Paulinas (2005)
>>> O Temor Do Sábio de Patrick Rothfuss pela Arqueiro (2011)
>>> Brincando Com Colagens, Recortes e Dobraduras de Rosangela Paiva do Nascimento pela Global (1985)
>>> Bis (autografado) de Ricardo da Cunha Lima; Luiz Maia pela Cia das Letrinhas (2010)
>>> Lewis the Duck - Goes to Mexico de Bill Duncan; Christian Ducan pela Hilton (2010)
>>> Rex, o Cachorro Que Tinha Medo de Trovoada de Jorge Calife, Vinicius Vogel pela Record (2004)
>>> Os Legados De Lorien: Livro 4 - A Queda Dos Cinco de Pittacus Lore pela Intrínseca (2013)
>>> Brincar Com Arte - Argila de Patricia Vibien pela Ibep Nacional (2005)
>>> O Menino do Caracol de Fernando Pessoa pela Global (2022)
>>> Maquiavel Essencial - 200 Pensamentos Escolhidos de Wagner Barreira pela No Bolso (2017)
>>> O Natal do Avarento (acompanha Suplemento de Leitura) de Charles Dickens; Telma Guimarães pela Scipione (2004)
>>> Eu Escolhi Viver de Yannahe Marques; Rose Rech pela Citadel (2021)
>>> O Cardeal e a Sra White de Eduardo Paraguassu pela Dpl (2005)
>>> Os Grandes Exploradores - Vol. 01 de Laurosse pela Larousse (2009)
>>> O Soluço do Sol de Valeria Valenza; Pina Irace pela Melhoramentos (2018)
>>> A Descoberta da América - Disney de Disney pela Abril (2011)
>>> Terapia das Perturbações Espirituais de Romário Menezes pela Dpl (2015)
>>> Danubio Azul Valsa de Johann Strauss de Esther Abbog pela Casa Sotero
>>> Conchas e Búzios de Manuel Rui pela Ftd (2013)
>>> A Expansão da Consciência e as Vibrações Psíquicas da Alma de J. Humberto E. Sobral pela Dpl (2002)
>>> Corpo Feliz - Melhore Sua Postura sem Extresse de Penny Ingham; Colin Shelbourn pela Publifolha (2003)
>>> Alice No Pais Do Quantum de Robert Gilmore pela Zahar (1998)
COLUNAS

Quarta-feira, 5/8/2015
O poeta, a pedra e o caminho
Wellington Machado
+ de 17700 Acessos


Imagem: Jak Lins



Alguém foi tomado de um espanto: tinha uma pedra! Ela sempre foi uma pedra qualquer, em meio a outras, e foi percebida como obstáculo naquele momento? Ou ela sempre esteve ali, isolada, imperceptível até então?

De que tamanho era a pedra? Se era grande, do tamanho de uma bola de futebol, por exemplo, seria impossível que ela não pudesse ser notada anteriormente. Se alguém a visse, certamente a removeria dali, sob pena de um outro se machucar.

E se até aquele exato momento ninguém tivesse passado por ali e percebido que aquela grande pedra incomodava? Teria sido este o primeiro encontro entre o homem e a pedra, desde o surgimento da Terra e da humanidade? E se, ao contrário, alguém tivesse, sim, passado por ali, mas não desse a mínima para aquela pedra, nem para a possibilidade de alguém tropeçar nela e se machucar no futuro? Apesar do encontro entre o homem e pedra, portanto, ela continuava ali, sem ser notada.

Como ou por que a pedra chegou ali, no meio do caminho? Seria ela a resultante de um vulcão pré-histórico, que fez pedras de variados tamanhos se deslocarem até atingirem o estado estático? Ou: alguém teria posto aquela pedra ali, num ato intencional?

Consideremos, então, que a tal pedra não fosse tão grande como uma bola de futebol, mas do tamanho de uma batata. Não seria em princípio, convenhamos, um obstáculo em si, a ponto de exigir grandes esforços do poeta para transpô-la. O mais provável era ele ter um primeiro impulso de lançá-la longe, o mais longe possível mirando o horizonte, como se quisesse imitar um atleta olímpico lançando um dardo - ele tomaria o cuidado de imitar os movimentos do atleta para conseguir o maior êxito possível.

Mas, sorte que as retinas fatigadas não estavam tão esgotadas assim a ponto de o poeta ignorar ou não enxergar a pedra. Se assim fosse, ou o poeta transporia distraidamente a pedra - como alguém que por sorte não pisa numa casca de banana - ou iria pisar nela, causando-lhe uma dor incômoda (ele iria xingar mentalmente a pedra, soletrando palavrões horrendos). Ou: na hipótese de a pedra ser arredondada (não sabemos que formato ela tinha), poderia o poeta derrapar e cair sentado. Em ambos os casos - pisando ou transpondo a pedra - não haveria poema.

De outra forma, se a pedra fosse do tamanho de um grão de feijão, já seria um grande mérito as retinas fatigadas terem-na percebido ali. Ora, se as retinas eram fatigadas, supõe-se que o transeunte já tinha uma certa idade. E o fato dele ter se atido a uma pedrinha num caminho (hipoteticamente longo), poderíamos considerar que este fora um ato intencional: o poeta praticamente procurava uma pedra (ou outra coisa qualquer) enquanto percorria o caminho. Mas a impressão que se tem é a de que a pedra era mesmo um pouco maior, do tamanho de uma batata média.

Mas quem estava diante da pedra: o poeta ou um personagem? Se foi o primeiro, muito provavelmente ele tivesse mesmo se deparado com a tal pedra motivadora do poema, dando a ela uma importância inédita. Quem haveria até então relevado um objeto comumente ignorado, quase vil? A pedra foi, com o poeta, alçada a mesma importância do amor, dos aromas, das flores, borboletas e estrelas, exaltados por outros notáveis. Se foi o poeta quem se deparou com a pedra, o cerne do poema é o acaso que se tornou relevante. A pedra é um mote para uma condição fenomenológica, uma intencionalidade do homem [o poeta] em reconhecer a existência de um objeto [a pedra] por alguns instantes.

Agora, se considerarmos que quem se deparou com a pedra foi um personagem, a pedra é tão ficcional como o próprio. Pedra e personagem estão em pé de igualdade e são joguetes nas mãos do poeta para ilustrar possíveis questões existenciais: a pedra foi "colocada" no caminho do personagem, a fim de ilustrar um momento de espanto, de auto-questionamento do poeta (não do personagem) no sentido de "estar-em-si", consciente daquele recorte (a percepção da pedra). O espanto do "tempo perdido", da vida que se esvaiu até ali, com a percepção da sua decadência física (retinas) sem que ele tivesse se atentado devidamente aos momentos sublimes da vida, presentes na simplicidade cotidiana. Personagem e pedra são a metáfora de uma descoberta tardia.

Há indícios de que não foi o poeta quem se deparou com a pedra, mas o personagem. Partindo do pressuposto de que o poema é de 1930, ano em que o poeta tinha 28 anos - jovem, portanto -, dificilmente ele teria retinas fatigadas.

E que caminho? Se o poema é já quase centenário, podemos inferir que na sua época havia vários caminhos, digamos, rurais - tipo aqueles que desenhávamos nos cadernos sem pauta e coloríamos de amarelo ou bege a terra desgastada pelo caminhar das pessoas, e de verde, a vegetação lindeira. A palavra "caminho" remete a campo, algo primaveril. Nas cidades não há caminhos; há ruas. Quem se depara com uma pedra, inevitavelmente está a pé. O poema seria impossível ser composto por um citadino, pois quase não há pedras nas metrópoles e por ali anda-se muito de carro, ônibus, metrô ou bicicleta.

O fato de as retinas estarem fatigadas nos leva a crer que o poeta tinha visto muita vida, e percorreu o mesmo traçado durante anos, sem notar a tal pedra. Provavelmente não só as retinas estavam cansadas, mas os pés rachados. O que ele sentiu ao fitar a pedra naquela altura da vida? Culpa - por ter perdido outras coisas na vida pelo fato de não estar permanentemente atento? Compaixão - por considerar aquela pedra um ser da mesma importância de uma formiga, ainda que a pedra seja inanimada e dura?

Aparentemente o poeta/personagem deixou a pedra pra trás, sem nela tocar. A pedra virou passado, memória, pois dela ele nunca se esqueceria, como prometeu. O "obstáculo", palavra que carrega um sentido negativo intrínseco, tornou-se uma espécie de epifania, um congelamento de um instante único, fotografia de um sentimento.

Pelo visto o poeta respeitou o estado da pedra: una, dura, estática. Estaria ela lá neste exato momento?

Nota do Editor
Leia também "No meio do caminho: 80 anos"


Wellington Machado
Belo Horizonte, 5/8/2015

Quem leu este, também leu esse(s):
01. O Brasil que eu quero de Luís Fernando Amâncio
02. livros não salvam o mundo. nem as pessoas. de Ítalo Puccini
03. Quando a Páscoa chega ao Sul de Celso A. Uequed Pitol
04. Expurgo, de Sofi Oksanen de Ricardo de Mattos
05. O mundo explicado por T.S. Spivet de Guilherme Pontes Coelho


Mais Wellington Machado
Mais Acessadas de Wellington Machado
01. O retalho, de Philippe Lançon - 6/5/2020
02. O poeta, a pedra e o caminho - 5/8/2015
03. A ilusão da alma, de Eduardo Giannetti - 31/8/2010
04. Enquanto agonizo, de William Faulkner - 18/1/2010
05. Meu cinema em 2010 ― 1/2 - 28/12/2010


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




O Poder Disciplinar do Empregador
Arion Sayão Romita
Freitas Bastos
(1983)



Envelhecimento - Estudos e Perspectivas (lacrado)
Manuel José Lopes
Martinari
(2014)



A Armada do papa
Gordon Urquhart
Record
(2002)



As Armas da Persuasão
Robert B. Cialdini
Sextante
(2012)



Conjuntura Atual em OSPB 1º e 2º Graus
Gleuso Damasceno Duarte
Ed Lê
(1978)



The Moment Of Lift: How Empowering Women Changes The World
Melinda Gates
Flatiron Books
(2019)



História do Ministério Público de Minas Gerais Vol. 1 Joaquim Cabral
Joaquim Cabral Netto
Speed



Were in Business
Susan Norman
Longman
(1983)



Filhos Longe da Pátria - o Desafio de Criar Filhos Em Outras Culturas
Márcia Tostes
Vale da Benção
(2011)



Voo Fantasma
Bear Grylls
Record
(2016)





busca | avançada
42527 visitas/dia
1,7 milhão/mês