Evidências do Nada: a poesia de Paulo Ferraz | Jardel Dias Cavalcanti | Digestivo Cultural

busca | avançada
64082 visitas/dia
2,5 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Eudóxia de Barros
>>> 100 anos de Orlando Silveira
>>> Panorama Do Choro
>>> Eduardo Freire lança livro e promove imersão em Project Thinking na Bett Brasil 2025
>>> Renan Inquérito celebra 10 anos do álbum “Corpo e Alma” de forma gratuita em SP
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
Colunistas
Últimos Posts
>>> Pondé mostra sua biblioteca
>>> Daniel Ades sobre o fim de uma era (2025)
>>> Vargas Llosa mostra sua biblioteca
>>> El País homenageia Vargas Llosa
>>> William Waack sobre Vargas Llosa
>>> O Agent Development Kit (ADK) do Google
>>> 'Não poderia ser mais estúpido' (Galloway, Scott)
>>> Scott Galloway sobre as tarifas (2025)
>>> All-In sobre as tarifas
>>> Paul Krugman on tariffs (2025)
Últimos Posts
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
>>> Transforme histórias em experiências lucrativas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Abraços Partidos, de Pedro Almodóvar
>>> Leituras, leitores e livros – Parte III
>>> Ceravolo e a velha internet
>>> Felicidade: reflexões de Eduardo Giannetti
>>> Promoarte 2001
>>> A Promessa de Nicholson e o bem-acabado Desmundo
>>> Apresentação autobiográfica muito solene
>>> Parei de fumar
>>> Tem café?
>>> Por que a Geração Y vai mal no ENEM?
Mais Recentes
>>> O tao e o t'ai chi kung de Robert C. Sohn pela Pensamento
>>> Harpas Eternas - Vol. 1 (11º edição) de Josefa Rosalia L. Alvarez pela Pensamento (2010)
>>> Os vingadores - a chegada dos vingadores e a vingança de Ultron de Kurt Busiek - George Perez pela Panini Comics - Salvat (2014)
>>> Introdução a mecânica quântica de Hrebert A Pohl pela Edgard Blucher (1971)
>>> Os Lusiadas Em Quadrinhos - serie classicos em HQ (11º reimpressão) de Fido Nesti pela Peiropolis (2018)
>>> Requiem For A Nun (modern Classics) de William Faulkner pela Penguin (1982)
>>> Metalografia dos Produtos Siderugicos Comuns de Hubertus Colpaert pela Colpaert (2025)
>>> Thelma O Unicornio de Aaron Blabey pela Nanabooks (2021)
>>> Distribuição De Renda: Medidas De Desigualdade E Pobreza de Rodolfo Hoffmann pela Edusp (1998)
>>> Conversa Com Gestores De Acoes Brasileiros de Luciana Seabra pela Empicurus (2016)
>>> O Dilema de John Grisham pela Rocco (2015)
>>> Coleções e Expedições Vigiadas de Luís Donisete Benzi Grupioni pela Anpocs (1998)
>>> L'étranger de Albert Camus pela Gallimard (2003)
>>> Cinematographic theory and new dimensions in ethnographic film de Paulo Hockings/ Yasuhiro Omori pela NaTional Museum of Ethnology (1988)
>>> Toque Quântico 2.0 O Novo Homem. Descoberta E Formação de Wickhorst Vickie pela Madras (2015)
>>> O Método de Phil Stutz E Barry Michels pela Goodmi (2023)
>>> Tornar-se Pessoa de Carl R. Rogers pela Wmf Martins Fontes (2009)
>>> O Cérebro De Buda de Rick Hanson pela Alaúde (2012)
>>> Vida E Poesia De Olavo Bilac de Fernando Jorge pela Novo Século (2007)
>>> O Poder Da Resiliência de Rick Hanson/ Forrest t Hanson pela Sextante / Gmt (2019)
>>> Pensamentos Que Ajudam: Inspirações De Paz, Saúde E Felicidade Para A Sua Vida de José Carlos De Lucca pela Intelitera (2016)
>>> Questões do Coração de Emily Giffin pela Novo Conceito (2011)
>>> A Revolução Francesa Contra a Igreja da razão aos Ser Supremo de Michel Vovelle pela Jorge Zahar (1988)
>>> Como Dizer Tudo Em Espanhol de Ron Martinez pela Campus (2001)
>>> Pensando a Revolução Francesa de François Furet pela Paz E Terra (1989)
COLUNAS

Terça-feira, 1/1/2008
Evidências do Nada: a poesia de Paulo Ferraz
Jardel Dias Cavalcanti
+ de 7200 Acessos
+ 1 Comentário(s)

Acaba de ser lançado pela editora Selo Sebastião Grifo o longo poema "De novo nada", de Paulo Ferraz. Em seus 584 versos livres o poema abre-se à experiência da própria existência contemporânea: fragmentada, crispada, insegura, flutuante e fraturada. Para isso, vale-se da liberdade dada pelo ritmo de uma escrita ela também flutuante e fragmentada, tal qual a realidade que nos cerca.

Bacharel em Direito e mestre em Teoria Literária, Paulo Ferraz é autor de outros dois livros: Constatação do óbvio (1999) e Evidências pedestres (2007), também publicados pela Sebastião Grifo.

O título do livro De novo nada, relacionado na capa à antiqüíssima imagem da Vênus de Willendorf, evoca a idéia de que sempre estivemos vivendo numa espécie de "terra desolada" ou no círculo vicioso e diabólico de Sísifo e que, conseqüentemente, "nada de novo há sob o sol".

Existiria no centro do poema, a partir da consciência da fragmentação universal e da ausência de utopias ou de qualquer desejo de transcendência, a crença na falência da cultura? Não, pois se assim fosse nem o poema seria escrito pelo poeta.

O que se passa é que é a partir dessa consciência, alfinetada pelo desqualificado mundo contemporâneo, que o poeta parte para sua experiência de escrita poética. Como dizia Walter Benjamim, autor de uma das epígrafes do livro, se só temos o caos é a partir dele que devemos criar. A poesia de Paulo Ferraz, pode-se dizer, adequa-se a esse pensamento. O resultado é seu instigante poema "De novo nada".

Na orelha do livro Viviana Bosi chama a atenção para o aspecto da experiência da cidade contemporânea (metáfora do existir contemporâneo) "que fundamenta toda a paisagem e sensibilidade do poema — história embebida na singularidade subjetiva". É, pois, a partir da experiência dentro da cidade que o poeta mergulha seu focinho na realidade desconcertante e na suposta falaciosidade da vida contemporânea.

O livro se abre com um encontro inusitado entre o poeta e uma cigana, mais mendiga que cigana, que lhe agarra a mão num átimo. Nesse encontro já se anuncia a crise com as utopias, pois o futuro lido por uma mendiga mais que cigana (decadência dos oráculos) já traz em si o desconcerto de qualquer idéia de realização ou adivinhação futura. A utopia, impossibilitada de habitar a memória, esta inútil, "perdeu-se na poluição".

O poema expõe na sua linguagem irritantemente desenraizada o principal aspecto da nossa existência "asfáltica, estéril, onde nada nasce", inclusive "imprópria para o plantio das palavras". Por isso, "nossa mudez é absoluta, mesmo a daqueles que pensam ter o dom da palavra, mudez seca como nem a pedra é seca".

A idéia já apresentada e, inclusive, defendida pela literatura moderna, da experiência como um espelho aos cacos, de onde só podemos captar fragmentos isolados, parece ao poeta tingida por uma certa melancolia. Embora seu próprio poema seja um amontoado de cacos, captação de dados relativos, sem a mínima pretensão à totalidade, há uma contradição dentro do poeta e dentro do poema: uma utopia negativa, um desejo insistente de que não deveria ser assim e que pode ser percebida na preocupação com a mulher do outdoor ("É de carne? Paga suas contas no fim de cada mês? Come o que como?"), "seu corpo falso, luzes prisioneiras do papel, não nos esconde que é engodo". O que diria o poeta diante do belo ideal das esculturas gregas? O mesmo que Platão?

E o que diz do mundo contemporâneo? Diz, talvez, o mesmo que Saramago, que estamos como sempre e mais que sempre dentro da caverna de Platão. A relação que o poeta estabelece entre a beleza falsa da modelo do outdoor e a cigana, que é apenas uma mendiga inapta para o projeto de adivinhar possibilidades para o futuro, se dá através da idéia da impossibilidade da constituição de significados ou de palavras que tenham valor: o resultado é claro — "nossa mudez é absoluta". Ou ainda: "não tenho mais nada a dizer, não espere de mim a palavra ou o gesto".

A experiência da desterritorialização (outro aspecto da existência contemporânea), vista como um terrível isolamento social, aparece nos versos seguintes: "Se tombamos, não há quem nos levante, e na cama, quem nos aqueça, e na ofensa, quem nos defenda". Ao longo do poema alguns versos anunciam a contraditória nostalgia por um lugar outro que não esse da desolação da realidade falsa, da esterilidade ou da transcendência inviável: "Devo esquecê-la? Sem ela, viver não posso, não posso viver contente, pois a sombra me cobre aonde eu for, uma espessa nuvem de tormentas e saudade que minha vida envenena."

Embora condene este mundo é dele que sua poesia nasce, é dele que retira os seus versos velozes e estonteantes, é dele que brota seu poder de dialogar com a possibilidade de conviver em crise com a incapacidade de comunicação, inclusive transformando isso em poesia: "O mundo nos atravessando a cento e dez, o mundo em movimento, o mundo se perdeu na confusão de tanta noite e tanto dia, na profusão das coisas passando...". Como que descrevendo a negatividade de sua própria experiência poética, diz: "mas essas linhas são confusas, não me levam a nenhuma visão".

O que o poeta parece temer é o que Joyce transformou em máxima para sua obra: "A história é um pesadelo do qual eu quero acordar". O real pode ser apenas "êxtase-tormento", já que tornou-se deserdado do passado, do presente ou do futuro, mas é onde o poeta mergulha sua fuça para nos trazer seus versos, frutos da sua vivência pelas ruas, "em que nada mantém sua aura".

A Vênus da capa do livro não é apenas o atestado de que estamos sempre paralisados num tempo morto. Talvez seja a lembrança de que esta estatueta, tal qual a poesia, seja um talismã da fertilidade, e que a única verdadeira fertilidade possível, a da linguagem, só pode ser alcançada pela poesia. Mesmo que a poesia não signifique mais nada nesse mundo. E o mundo, o que, afinal, significa? De novo nada. Assim vaticina o poeta.


Jardel Dias Cavalcanti
Campinas, 1/1/2008

Mais Jardel Dias Cavalcanti
Mais Acessadas de Jardel Dias Cavalcanti em 2008
01. Quem destruiu Anita Malfatti? - 16/9/2008
02. Escrevo deus com letra minúscula - 5/3/2008
03. Arthur Bispo do Rosário, Rei dos Reis - 11/11/2008
04. Evidências do Nada: a poesia de Paulo Ferraz - 1/1/2008
05. Jogos olímpicos na China - 2/9/2008


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
24/1/2008
10h10min
Muito bem colocada a experiência fragmentada da realidade no poema de Paulo Ferraz, como o fez também nos seus outros livros, onde relata visões peculiares (que só um poeta pode perceber) do mudo visível e palpável em que estamos inseridos (no caso de Paulo a cidade de São Paulo e seus habitantes), com uma maestria invejável. Uma correção: os Versos de Paulo Ferraz não são versos livres, são uma redondilha maior (7 sílabas poéticas) com uma divisão peculiar.
[Leia outros Comentários de Danilo Zanirato]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Biblioteca Infantil
Figueiredo Pimentel
Científica
(1963)



Arte no Brasil:cinco Séculos de Pint, Escult , Arq. e Artes
Abril Cultural
Globo
(1979)



Felicidade Demais
Alice Munro
Companhia das Letras
(2013)



O Estado, o Poder, o Socialismo
Nicos Paulantzas
Graal
(1986)



Livro Concurso Caixa Econômica Federal Técnico Bancário Novo
Apostila Stillo
Apostila Stillo



O Enigma de Sally Jupp
P D James
Livros de Bolso
(1962)



La Piel Fría
VariosAlbert Sánchez Piñol
Edhasa
(2003)



O Jovem Törless
Robert Musil
Globo



Sem Clima para o Amor
Rachel Gibson
Jardim dos Livros
(2014)



Viagem à Palestina
Bei Dao e Outros
Ediouro
(2004)





busca | avançada
64082 visitas/dia
2,5 milhões/mês