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COLUNAS

Quarta-feira, 28/1/2009
O romance da década
Luiz Rebinski Junior
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Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir levaram para o relacionamento amoroso a liberdade existencial que pautou o pensamento de ambos durante toda vida. Amantes, sim, mas, sobretudo, livres. Mantra que possibilitou que o relacionamento aberto dos filósofos sobrevivesse aos percalços que uma relação de mais de cinco décadas necessariamente impõe. O caolho Sartre, com sua feiúra proporcional à inteligência, sempre teve seus casos; Beauvoir, mesmo mantendo uma adoração quase que religiosa por Sartre, deixou se envolver em um longo e tortuoso relacionamento com o escritor americano Nelson Algren. Sartre e Beauvoir nunca se casaram, desprezavam os dogmas da igreja, mas fizeram valer como ninguém a máxima católica do "amar até que a morte os separe".

Os existencialistas Sartre e Beauvoir viveram o que para muitos é o relacionamento ideal. Valendo-se da liberdade que só a ficção proporciona, o argentino Alan Pauls foi além. Criou um relacionamento ainda mais perfeito (ou utópico, entenda como quiser) do que o vivido por Sartre e Beauvoir, em que a única saída, paradoxalmente, estava na separação. Um relacionamento que, diferentemente do amor anarquista dos intelectuais franceses, nada tinha de ideológico. Simplesmente o amor em seu estado mais bruto e natural; um amor adolescente e sincero, capaz de não tomar conhecimento das pequenezas do relacionamento a dois; um amor em que a lealdade, a verdadeira lealdade, mais comum em grandes amizades do que em relacionamentos amorosos, se sobrepõe a qualquer tipo de sentimento comezinho; um amor indestrutível, que não se abala com flertes ou paqueras, em que a paixão se coloca como algo superior, fora do plano terreno da possessão e do egoísmo.

Essa é a visão do amor apresentada por Alan Pauls em O Passado (Cosac Naify, 2007, 480 págs.), livro em que o tradutor Rímini e a jovem Sofía vivem uma espécie de catarse amorosa durante 12 anos até que simplesmente resolvem encerrar o relacionamento. Decisão que resultará em algo bem mais complicado do que os anos de monogamia. A ruptura deixará como espólio aos amantes um turbilhão de lembranças que os impedirá de viver. Ou melhor, viverão atormentados pelo espectro de um passado intenso que insiste em não desgrudar da memória. O que resulta em futuro incerto, sempre à sombra da intensidade do que viveram, como se nada pudesse, a partir dali, ser mais forte, interessante e bonito do que o passado.

Mas o passado não é só lembrança fugaz. Um caixa com centenas de fotos, um par de sapatos, mudas gastas de roupas, filmes antigos e outras quinquilharias tratam de materializar a lembrança que insiste em não dissipar. E aí a prosa engenhosa e labiríntica de Alan Pauls trata de tornar ainda mais complicada a separação de Rímini e Sofía. As idas e vindas da história dinamitam qualquer noção de tempo/espaço. A comparação com Proust pode parecer exagerada a quem não conhece a literatura de Pauls, mas certamente soará natural, até mesmo óbvia, para quem se aventurou nas caudalosas páginas deste intenso romance. Não só pelas sentenças longas e pelos parágrafos igualmente intermináveis, mas porque Pauls vai fundo na investigação da mente humana através de digressões que colocam o leitor no epicentro do furacão que se tornou a vida dos protagonistas, especialmente Rímini. A descrição minuciosa, aparentemente insignificante, do cotidiano dos personagens, que pode consumir algumas dezenas de páginas, torna o romance de Pauls uma arena propícia à investigação existencial.

Pauls parece não querer deixar nada para trás sem explicação. E por isso envereda por uma prosa insistentemente descritiva, minuciosa e detalhista. É como se cada digressão fosse uma peça do caleidoscópio que dará forma à trajetória tortuosa dos personagens. O escritor recorre a uma prosa que se faz cinematográfica não só pelas passagens que se fixam como fotogramas na mente do leitor ― ou nas referências a clássicos como Rocco e seus irmãos e A história de Adèle H ―, mas também por conta dos recursos estilísticos que fazem da história uma compilação de pequenos curtas-metragens. Pauls recorre a cartas, delírios poéticos e a uma enxurrada de referências culturais que agem como ponto de ligação à história de Rímini e Sofía. Um desses pontos, talvez o mais engenhoso, é o fascínio do casal pela obra do artista imaginário Jeremy Riltse, seguidor de uma corrente artística, a Sick Art, em que a automutilação é um recurso estético imprescindível. As obras de Riltse servem como uma espécie de roteiro, assim como as cartas e bilhetes, que iluminam não somente o passado, mas o futuro de Rímini e Sofía. As divagações críticas sobre a arte de Riltse ― com pitadas da hipotética vida excêntrica do artista ― são cortes narrativos em que o leitor pode desbravar histórias paralelas, que aparentemente não têm ligação direta com a trama principal, mas que no final agregam sentido à narrativa.

E assim Pauls convida o leitor a percorrer, de modo pouco convencional, a vida errante que Rímini passa a ter após o rompimento com Sofía. Ao querer apagar o passado, Rímini deixa de lado a monogamia, engata um romance atrás do outro e perde-se em sessões de tradução regadas a álcool, cocaína e masturbação. Em uma espécie de efeito colateral, vê sua habilidade para línguas estrangeiras se resumir ao domínio capenga do castelhano, único idioma que lhe sobrou após ser acometido por um estranho e precoce Alzheimer. Ao fazer o caminho inverso, não se descolando do passado recente, Sofía aparece como um fantasma na vida de Rímini, sem que este a veja como uma mera lembrança, mas sim como algo ainda presente não só em seus sonhos e elucubrações, mas de modo concreto e real.

Em seu projeto polifônico, onde encaixar peças díspares parece ser seu grande barato, Alan Pauls evoca o Cortázar surreal, o escritor que não diferencia real e imaginário, ficção e realidade. Como resultado dessa audaciosa jornada, o escritor argentino construiu uma obra grandiosa, um romance de muitas e variadas vozes.

Como nada se dá por acaso na literatura de Alan Pauls, Rímini, o personagem que é vasculhado pelo passado, leva o mesmo nome da cidade natal de Federico Fellini, autor que fez de suas recordações de juventude ― principalmente daquelas relacionadas ao universo circense ― o ponto central de sua obra. E assim como Fellini, para quem o cinema não era só profusão de imagens, mas um meio para disseminar poesia, literatura, música e pintura, Alan Pauls produziu um romance de muitas possibilidades, uma obra que transcende os limites da escrita.

Para ir além






Luiz Rebinski Junior
Curitiba, 28/1/2009

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