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COLUNAS

Terça-feira, 4/8/2009
A vitrola de Jaime Prado Gouvêa
Rafael Rodrigues
+ de 9100 Acessos

Pode-se dizer que o conto é um gênero um tanto desprezado pelo alto clero da crítica literária (e também por alguns escritores), mas talvez ele seja mais complicado de ser executado do que o romance. Porque, no romance, passagens fracas, de pouca qualidade, podem ser compensadas ― e ofuscadas ― por trechos de grande valor. Já ao conto não é dada esta chance: ou o escritor faz um bom conto do início ao fim ou terá no fim das contas um texto "mais ou menos" (e, se formos frios o bastante para admitir, um conto "mais ou menos" é um conto ruim).

Seguindo este raciocínio, não se pode dizer que há, em Fichas de vitrola & outros contos (Record, 2007, 256 págs.), do escritor mineiro Jaime Prado Gouvêa, sequer um texto ruim. Nesta seleção de histórias curtas ― a maioria delas publicada entre as décadas de 1970 e 1980 ―, não há nenhum conto "mais ou menos". Como bem diz o jornalista e escritor (também mineiro) Humberto Werneck, a quem coube a escritura do prefácio de Fichas de vitrola, "Nada do que ele [Jaime] põe na tela, no papel, está ali por acaso ou descuido, nada escorregou dos dedos. Cada vírgula é capaz de justificar presença, e o que se busca, incansavelmente, não é menos que a perfeição".

No conto que abre o livro, "Concerto para berimbau e gaita", acompanhamos, por algumas horas, o protagonista ― um boêmio literato ― flanando pelas ruas e bares de Belo Horizonte. E também a construção dessa história, porque o narrador, ao mesmo tempo em que nos conta as andanças deste personagem sem nome ("... não vou te dar um nome, primeiro porque acho isso dispensável no momento, segundo porque não estou com muita disposição de pensar se você tem cara de Pedro, de João, ou qualquer desses substantivos que rotulam a chamada pessoa comum"), nos mostra como ela está sendo escrita, e quais os problemas e soluções que ele, narrador-escritor, enfrenta para escrevê-la ("Então, para não perdermos tempo, corto um parágrafo do texto e você já está do outro lado da avenida"). É um conto encharcado de música e poesia, como é a maioria dos textos de Fichas de vitrola (não é à toa que o livro tem este nome).

Outro conto, "Oh, Bernardine", além de carregar o mesmo título de uma canção do americano Pat Boone, tem como personagem principal um radialista, ou seja, novamente a presença forte da música. Ele, o radialista, não é apenas o responsável pela trilha sonora de um sem número de pessoas. Sua vida também depende da música ― não só como fonte de renda, mas como fonte de sobrevivência ("... me acostumei a esse tipo de vida, de ficar recriando, pela música, meus filmes, meus momentos, minhas épocas, tentando fazer minha vida à parte das pessoas que conheço"). É um conto suave, melancólico, talvez até triste, mas de qualidade inegável ― e invejável.

Mais adiante, em "Noite de Reis", dois amigos cujas esposas foram passar o fim de semana fora com seus respectivos filhos, resolvem aproveitar a noite, uma sexta-feira, mas o começo dela não é promissor:

"Sentados na mesa escura, uísque com gelo e gim-tônica, eles ficam olhando um único par dançando na pista de mármore.
― Que noite fodida, sô.
― Nós saímos muito tarde. Nesta cidade a gente tem de vir cedo pegar mulher."

As coisas ficam mais animadas ― e engraçadíssimas ― durante a madrugada, mas depois de algumas confusões, boas risadas e alguns drinques, a realidade parece ganhar mais cores, e o que resta é a melancolia.

Além dos contos citados, há outros igualmente soberbos, como "Vocês ainda não viram nada", "Do outro lado", "A nossa infância" e "Pequenas canções de outono". Em quase todos, pequenos fatos dão origem a acontecimentos determinantes e grandes reflexões, que terminam por revelar sutilezas antes encobertas por uma espécie de neblina.

Há quinze anos sem publicar um livro (o último havia sido o romance O altar das montanhas de Minas, de 1991), a literatura de Jaime Prado Gouvêa felizmente vai retornando às livrarias (O altar das montanhas de Minas deve ser reeditado ainda este ano). Não é preciso ser um gênio para notar que Jaime é um escritor diferenciado, com um talento fora do comum. Difícil definir a atmosfera que envolve seus contos. Há muita poesia e uma espécie de aura de sonho, mas ao mesmo tempo somos colocados diante da realidade nua e crua, por menos (ou mais) nua e crua que ela possa ser, e de uma prosa calculada, segura, digna de ser lida e admirada. Acredite: é um livro diferente de tudo o que você está acostumado a ler.

Na entrevista a seguir, realizada via e-mail, Jaime Prado Gouvêa fala sobre como surgiu a ideia de publicar um livro depois de tantos anos, além de refletir sobre o ato de escrever.

1. Como surgiu a ideia de publicar Fichas de vitrola & outros contos?

A situação era a seguinte: eu havia publicado Areia tornando em pedra em 1970, em edição da Imprensa Oficial de Minas Gerais, Dorinha Dorê em 1975, por uma editora de Belo Horizonte chamada Interlivros, Fichas de vitrola, pela editora Guanabara, do Rio de Janeiro em 1986, todos de contos (em 1991, a Siciliano, de São Paulo, editou meu único romance, O altar das montanhas de Minas ― que deve ser relançado no fim deste ano pela Record). O primeiro livro, obviamente com todos os defeitos de estreante, era uma edição praticamente minha que, depois de ter sido distribuída amadoristicamente por umas cinco livrarias de Belo Horizonte, foi recolhida ao sótão da minha casa; o segundo, um livro de bolso em papel jornal (manjar preferido das traças), foi extinto junto com sua pequena editora, fato que só fiquei sabendo uns seis meses depois, me deixando com dois exemplares; o terceiro, quando do fim da editora Guanabara, teve seu estoque restante enviado para mim. Coincidiu com essa devastação a necessidade de tentar um romance, que acabei escrevendo, e um longo afastamento do conto, pois se produzi uns três depois disso foi muito.

Então, tempos depois, meu amigo Humberto Werneck me sugeriu reeditar o Fichas de vitrola, pois achava que esse livro não deveria cair no ostracismo, e sugeriu uma seleta dos dois livros iniciais, para salvar pelo menos a História (com maiúscula, por se tratar de um registro e não de "estória"). Fiz, então, um apanhado de quais contos eu ainda assinaria daqueles livros iniciais, e optei por dois contos do primeiro, seis do segundo, acrescentando mais dois escritos posteriormente, além do arranjo de cinco textos menores, que englobei sob o título "Pequenas canções de outono", que era a estação espiritual em que eu me sentia, além da estranha sensação de que as editoras por onde eu passava iam se acabando, sensação essa que aumentou pela coincidência de ter entregado os novos originais nas mãos do Werneck, que os levaria para tentar uma editora em São Paulo ― e acabou conseguindo a Record, no Rio ― no exato momento do atentado às torres gêmeas de Nova York.

2. Fazia muito tempo que você não tinha contato com os textos publicados anteriormente? Como foi reencontrá-los? E no processo de revisão/edição deles, houve muitas mudanças?

Mudei umas poucas vírgulas, quase nada. Sempre achei que, a recauchutar um texto antigo, é preferível partir para um novo texto. É uma forma de respeitar o que fiz há quatro décadas e que, na época, era o melhor que eu podia fazer.

3. Em alguns contos os narradores meio que se confundem com os protagonistas ("Concerto para berimbau e gaita" e "A nossa infância"), ou há uma alternância entre eles (como em "Toda manhã ela volta"). Em outras histórias, a boemia está muito presente, além de personagens que parecem realmente ter existido. Dito isso, pergunto: você diria que a sua maior inspiração são mesmo fatos reais ― ou seja, a vida?

A vida, como coisa real por fora e por dentro, como ensinou Fernando Pessoa. E toda a liberdade para contracenar com os personagens que, afinal, como a mulher bíblica, também saíram da minha costela, e, de certa forma, não saíram nunca.

4. Duas palavras podem ser lidas na maioria dos contos de Fichas de vitrola. Uma, claro, é "vitrola". Outra é "seios". Elas aparecem propositalmente ou você sequer tinha se dado conta disso?

Há um personagem, no conto "O batuque dos gambás", que explica a ideia do livro como uma vitrola de zona boêmia. Como, ao organizar o livro, notei que a música estava entranhada em quase todos os textos, achei que esse título ficaria mais a caráter. Quanto aos "seios", sou de opinião que quanto mais, melhor (desde que mantendo-se a característica de dois por mulher, é claro).

5. Nesse seu hiato de livros publicados você chegou a parar totalmente de escrever? Independentemente da resposta, o que te levaria a parar de escrever? E o que te levaria a nunca parar de escrever? A literatura salva? Ou faz se perder?

A literatura não salva: a literatura é. E me dá a certeza de que não vou mais morrer, pois continuarei vivendo através dela. Como (acho) não tive filhos, ela é meu legado, para o bem ou para o mal. Há anos não escrevo literatura, mas espero que, a qualquer hora, ela volte a me visitar, como as velhas amantes do Vinicius. Mas não gosto de ir atrás dela. Sou muito orgulhoso (e meio burro), como alguns mineiros que se prezam.

Para ir além






Rafael Rodrigues
Feira de Santana, 4/8/2009

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