BLOGS
>>> Posts
Sábado,
5/3/2016
Por que viver sobre as cordas e não no chão?
Heberti Rodrigo
+ de 700 Acessos
Dom Quixote, Pablo Picasso
"Eu tinha 13 anos, e sofria porque não sabia que rumo tomar na vida. Nada ainda me revelara o fundo da minha sensibilidade[...]Resolvi, então, me submeter a uma estranha experiência: sofrer a sensação absorvente da morte. Achava que uma forte emoção, que me aproximasse violentamente do perigo, me daria a decifração definitiva da minha personalidade. E veja o que fiz. Nossa casa ficava próxima da educada estação da Barra Funda. Um dia saí de casa, amarrei fortemente as minhas tranças de menina, deitei-me debaixo dos dormentes e esperei o trem passar por cima de mim. Foi uma coisa horrível, indescritível. O barulho ensurdecedor, a deslocação de ar, a temperatura asfixiante deram-me uma impressão de delírio e de loucura. E eu via cores, cores e cores riscando o espaço, cores que eu desejaria fixar para sempre na retina assombrada. Foi a revelação: voltei decidida a me dedicar à pintura." Anita Malfatti
E para O Equilibrista...
Se a isto que as pessoas fazem chama-se viver, então não quer viver. Talvez por isso seja demasiado indolente para procurar um emprego normal. Jamais desejou essa coisa a que chamam de “vida”. Pouco lhe importa se o mundo vai contradizê-lo, mas por uma espécie de princípio, é contra essa “vida”. Escrever é sua reação a ela. Escreve para não ter de se submeter. Ao contrário do que se passa com os outros, a própria necessidade de dinheiro é mais um estímulo a escrever do que se sujeitar a essa coisa humilhante que é ser obrigado a fazer o que não vê sentido. A “vida” apenas lhe importa na medida em que o estimula a escrever, a transformar em palavras tudo aquilo que pensa e sente. Para ele, por si mesma ela não se justifica. Em si mesma não tem valor. Somos nós que lho conferimos. Escreve para inventar uma outra vida mais rica a partir desta que tem. Escreve para viver essa outra vida - a sua própria vida -, uma vida que sente ergue-lo acima do comum sempre que a transforma em palavras. Por isso, nada mais lhe interessa senão o poder de expressar-se, de criar e recriar-se a cada texto. A busca desesperada pela sua própria linguagem é o que confere valor à sua vida. É neste sentido que seu “eu” se dirige mesmo quando suas atividades cotidianas parecem desviar-se desta meta. O receio de passar fome atormenta-o constantemente, mas sente uma angústia terrivelmente maior de vir a morrer sem conseguir expressar tudo o que se passa consigo desde menino. Esta é a pior das misérias a um homem como ele – o autêntico fracasso. O que o difere dos outros creio que seja o fato de que não sente necessidade de “viver a vida”, como eles próprios dizem; o que sente, de fato, é necessidade de enriquecê-la e expressá-la. Atingir o poder de expressão para tal exige um esforço extraordinário de sua parte, pois tem de lutar contra o seu medo de fracassar e suas próprias limitações. Viver é um contínuo desafio para alguém como ele, e o que o move nesta sua aventura não é apenas um desejo fútil de tornar-se célebre ou rico, mas, sobretudo, uma questão de consciência, uma questão de princípio.
Postado por Heberti Rodrigo
Em
5/3/2016 às 08h25
Ative seu Blog no Digestivo Cultural!
* esta seção é livre, não refletindo
necessariamente a opinião do site
|
|