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Sexta-feira, 16/5/2003
O Disperso Alberto Moravia
Urariano Mota
+ de 5100 Acessos

A recente publicação de "Contos Dispersos" de Alberto Moravia acende na gente alguns pensamentos. O primeiro deles já anotamos em outra oportunidade, quando chamávamos a atenção para o discutível que é anunciar-se um volume póstumo como obra de um escritor. A não ser, é claro, "As Memórias Póstumas de Brás Cubas", os autores não podem ter culpa do que vem à luz em seu nome, quando já do corpo não são. Fiquemos por ora nesse primeiro pensamento.

Ainda que um escritor assine um relato, ainda que assine e publique em vida trinta relatos, não se pode pôr a sua assinatura no conjunto enfeixado desses trinta relatos. Uma narração, um conto que se publica, não tem necessariamente a perspectiva de futuro, ele, esse conto, não guarda organicidade com o que se lhe seguirá, ele, no momento em que se publica, é uma obra autônoma, um momento da vida criadora. Assim como a soma dos momentos não produz o total mover-se, como o queriam os sofistas na Grécia antiga, assim também a reunião desses momentos criadores é distinta do tempo final em que um criador assina esse conjunto produzido. A assinatura de um autor em um livro é a garantia de organicidade que a sua consciência dá ao respeitável público. Numa situação ideal, o conjunto de contos daria a ilusão de romance, como até hoje dá o "Vidas Secas" de Graciliano Ramos, tão orgânico e amarrado que nem de longe o leitor imagina que Graciliano escreveu contos cujos personagens voltam, em movimento, rumo ao Sul. E essa garantia do autor não é só de organicidade. A sua assinatura é, bem antes, uma garantia de qualidade, de respeito a si mesmo. A assinatura é um legado que o autor nos deixa, uma vontade expressa de como ele quer ser lembrado.

Imaginem-se agora contos escritos durante vinte e três anos, de 1928 a 1951, como os agora reunidos sob o nome de Contos Dispersos. E como se tal não bastasse, assinados por um autor defunto, um "ser" distinto de um defunto autor, como o personagem de Machado. Que dizer? Esqueçamos qualquer insinuação de engodo, de estelionato, porque os contos jamais tiveram sua autoria negada por Moravia, e os selecionadores foram bastante criteriosos, como pesquisadores. Esqueçamos a insinuação também porque, refletimos, e perguntamo-nos, o que deveria ser feito da obra de um importante autor não publicada em livro? Queimá-la, como alguns editores fazem com a obra de desconhecidos? Ou mesmo, mais leve, desconhecê-la, deixá-la às traças nos arquivos empoeirados? Imaginamos uma saída, mas não é fácil. O diabo, a dificuldade, é que os livros precisam ser vendidos, e, ao mesmo tempo, reconhecidos como produtos espirituais. Como se fossem prostitutas puras. Daquelas que iriam à cama por amor, se recebessem dinheiro. Imaginamos então algo como um "Contos de Alberto Moravia reunidos por....", ou melhor, um "Selecionados por ...Contos que um dia foram assinados por Alberto Moravia". Menos mal, mas apesar da violência cometida contra a vontade de um autor que em vida não os destinou a volume, esses contos jamais seriam publicados. Porque não seriam comerciais se assim fossem editados. Pois quem é mesmo que teria interesse em ler contos reunidos por Fulano? O mercado precisa é do nome.

E assim chegamos à segunda reflexão. Assim como os produtos nas lojas do shopping, os textos que se escrevem têm griffe. O mercado transforma toda e qualquer humanidade, mesmo aquela que se quer mais espiritualizada, em mercadoria. Ou melhor, quanto mais "espiritualizada", quanto maior o espírito, vale dizer, quanto mais artístico, quanto mais poético, bem antes de ser mais verdadeiro, mais alto é o preço. Perdoem-nos o óbvio, mas esse é o óbvio que nossos narizinhos empinados fingem desconhecer. Portanto não nos surpreendamos se o que lemos, dizem, até, o que devemos ler, não nos espantemos de que consumimos obras eleitas por griffe. Assim, são editados aos montes contos de Hemingway, todos, porque afinal são contos de Hemingway. Edita-se, o mercado exige!, tudo que um cochilo de Saramago deixar, porque afinal é produto de um Nobel. Ninguém se dá conta, pior, não está nem aí, se o Hemingway, o Saramago publicado, tem mesmo algum valor estético, literário. Ninguém se envergonha de ler, de erguer a obra fina, genuína, sibilina, um rascunho esquecido, obscuro, apressado de Kafka. Pois qualquer linha garatujada de Kafka já está griffada pela metamorfose do K. Esta é a sua qualidade. Daí que se editem enfim os contos escritos por Moravia nos primeiros 23 anos de sua vida literária, contos perdidos em jornais, que o autor excluiu de volume na longa maturidade. Que reunidos recebem um nome esperto, verdadeiro, mas daquela verdade ambígua: "Contos Dispersos". Sim, são Contos, mas Dispersos, dispersos por quê? Abramos o volume.

A epígrafe da Introdução é um primor, de ambigüidade. Cita-se uma declaração do escritor, extraída de "Vida de Moravia", uma longuíssima entrevista biográfica, publicada no ano da sua morte, em 1990: "O segredo da escrita está, provavelmente, em deixá-la, por um tempo imperfeita: esta imperfeição vai se revelar depois como o máximo da perfeição possível.". Incisões de um discurso à parte, é de se notar que este é um bom começo para a aceitação, pelo leitor, da maioria dos 69 contos escolhidos para o livro. É como se nos dissessem, "o que você achar imperfeito, inacabado, é ilusão de primeira leitura, tente reler passado um tempo". Ora. Incisão por incisão, seria bom que se citasse do mesmo Vida de Moravia estas palavras:

"Depois dos Indiferentes, e afora 'Inverno di malato', nunca mais escrevi algo tão fundamental até 1942, quando em Anacapri reencontrei minha inspiração original e escrevi Agostino. Foi portanto uma longa batalha entre experimentação e impotência....Durante quinze anos eu nada mais tive a dizer." Note-se que esses quinze anos confessos de esterilidade cobrem, pelo menos, de 1928 a 1942, período de onde são arrancados do esquecimento, pelo Contos Dispersos, 29 contos. Ora, achando pouco, Moravia mais adiante declara, com a honestidade de um verdadeiro criador: "[Nesse período] eu também tive que superar algo muito parecido com a morte, isto é, a morte da inspiração". Ora. Ainda que concedamos a essas palavras um excesso de rigor, de aguda modéstia em Moravia, é de todo frouxo o conceito expresso pelos selecionadores na Introdução do livro: "O abandono, por parte do autor, de um ou outro de seus escritos publicados em antigos jornais tem motivações as mais diversas: esquecimento, insatisfação, escolha consciente, intervenção de acontecimentos externos. Mas, considerado em seu conjunto, é um fenômeno que confirma a vitalidade quase biológica, inquieta e impaciente, da busca narrativa moraviana...", para concluir, de matar: "O ato de escrever, mais do que o que fica escrito, é o que define o escritor" (!!!) . Se bem entendemos, isto quer dizer: O QUE DEFINE O ESCRITOR É O ESFORÇO. Nada a acrescentar. Melhor ir aos contos.

A sina da gente que escreve uma resenha é dura. Lê com o preconceito de que vai ficar contente. (E se escreve para grandes publicações, sente até o peso de que deve e tem que ficar contente.) Lê, mas a primeira leitura não confirma semelhante predisposição, mas luta, luta, e lê, e lê, e no final, entre os limites da honestidade e da oportunidade de uma Bienal que homenageia a literatura italiana; no final, entre os limites do reconhecimento da criação de Moravia, de seu valor como escritor e homem, e o volume patente nas mãos, no final, enfim, é isto: "Contos Dispersos" é um livro para ser lido de trás para a frente. São boas as narrativas que vão da página 395 à 271. Vá lá, na verdade, em seu conjunto, são razoáveis. Mas são, com certeza, excepcionais os contos "A Viúva", "As Contradições de Rodolfo", e, fundamentalmente, essa coisa rara de melancolia, delicadeza e verdade, "A Morte no Mar". E aqui encerramos a nossa dureza, pois já nos sentimos pagos em atingir o conceito, em pôr em nossa própria cabeça a carapuça do escritor por esforço. A Moravia, portanto, porto de "A Morte no Mar":

"Eu dizia que a morte no mar é preferível a todas as outras, porque é a mais limpa, e o mar salgado descarna melhor que as chamas e a terra. E os ossos que o mar devolve, depois de tê-los guardado longamente em seu regaço, são leves e limpos como pequenos galhos de alguma planta submarina. Um de meus amigos preferia o enterro, o outro a cremação. Em certo ponto vimos algo boiando entre uma onda e outra, à pouca distância da margem. Pensamos que fosse o morto, mas não era senão um velho impermeável escuro, já em pedaços, e esfarrapado, que logo a seguir uma onda atirou na praia, onde ficou secando ao sol, com os braços abertos."

Para ir além





Urariano Mota
Olinda, 16/5/2003

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