Notas Musicais | Rafael Azevedo | Digestivo Cultural

busca | avançada
45841 visitas/dia
2,5 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Expo Cult - Semana de Arte do Agora estende prazo de visitação até dia 31/5
>>> Luiz Martins apresenta novas séries em serigrafia na MH8ARTE
>>> Espetáculo-instalação destaca histórias de mulheres pioneiras na construção de Brasília
>>> Bailarinos de Brasília apresentam espetáculo gratuito em Planaltina e Sobradinho
>>> Evento: escritora paulistana Daniela Bonafé lança “Rosas de Chumbo” na 7ª FLIMA
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> Folia de Reis
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
Colunistas
Últimos Posts
>>> Drauzio em busca do tempo perdido
>>> David Soria Parra, co-criador do MCP
>>> Pondé mostra sua biblioteca
>>> Daniel Ades sobre o fim de uma era (2025)
>>> Vargas Llosa mostra sua biblioteca
>>> El País homenageia Vargas Llosa
>>> William Waack sobre Vargas Llosa
>>> O Agent Development Kit (ADK) do Google
>>> 'Não poderia ser mais estúpido' (Galloway, Scott)
>>> Scott Galloway sobre as tarifas (2025)
Últimos Posts
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
>>> Transforme histórias em experiências lucrativas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Entre o jornalismo e a academia
>>> O primeiro parágrafo
>>> Kindle, iPad ou Android?
>>> Naval Ravikant no All-In (2025)
>>> Um olhar sobre Múcio Teixeira
>>> As cartas de Dostoiévski
>>> A eutanásia do sentido, a poesia de Ronald Polito
>>> A proposta libertária
>>> O que está por baixo do medo de usar saia?
>>> O reinado estético: Luís XV e Madame de Pompadour
Mais Recentes
>>> Bíblia Sagrada Com Zíper de Ludovico Garmus pela Vozes (2001)
>>> Contos Da Montanha de Lúcia Hiratsuka pela Sm (2005)
>>> Antes Da Chuva de Lúcia Hiratsuka pela Global (2025)
>>> A Guerra Da Luz Ciclo Das Trevas Volume 3 de Peter V. Brett pela Darkside (2025)
>>> O Caminhão de Lúcia Hirarsuka pela Cortez (2017)
>>> Corrida Dos Caracóis de Lucia Hiratsuka pela Global (2016)
>>> O Ogro E As Galinhas de Lucia Hiratsuka pela Sm (2017)
>>> Raposo Tavares e a Formação Territorial do Brasil de Jaime Cortesão pela Imesp (2012)
>>> Geografia Geral E Do Brasil - Volume Único. de João Carlos Moreira, Eustáquio De Sene pela Plurall (2018)
>>> Diálogos do Paraíso Perdido de Francisco Brennand pela Francisco Brennand (1990)
>>> Shrimad Bhagavad de Shivraj Patil pela Do autor (2007)
>>> Sobrados e mucambos 1 de Gilberto Freyre pela José Olympio (1985)
>>> Análise no espaço Rn de Elon Lages Lima pela Blucher (1970)
>>> Tantos Cantos de Lócia Hiratsuka pela Dcl - Difusão Cultural Do Livro (2012)
>>> A Trindade e a Sociedade de Leonardo Boff pela 1987 (2025)
>>> Hans Staden - Um Aventureiro No Novo Mundo de Jo Oliveira pela Conrad Livros (2005)
>>> Os Filhos De Safiri de Osamu Tezuka pela Newpop (2013)
>>> Gandhi: Uma Biografia Em Mangá de Kazuki Ebine pela Tambor / Case Editorial (2014)
>>> O 14.º Dalai Lama Uma Biografia Em Mangá de Tetsu Saiwai pela Case (2014)
>>> O Gourmet Solitario de Masayuki Kusumi pela Devir Livraria (2019)
>>> Segredo Do Licorne & O Tesouro De Rackham de Herge pela Quadrinhos Na Cia (2011)
>>> Quando a Corda se Rompe de Stephen Brown pela Vida (1988)
>>> Dom Quixote de Miguel De Cervantes pela L & Pm (2012)
>>> Orie de Lúcia Hirarsuka pela Zahar (2014)
>>> As Ondas (edição de bolso - texto integral) de Virgínia Wolf pela Saraiva - Nova Fronteira (2014)
COLUNAS

Sexta-feira, 27/7/2001
Notas Musicais
Rafael Azevedo
+ de 4100 Acessos

Yara Mitsuishi

Piano, pianíssimo
Ouço fascinado o 2o movimento do concerto para 2 cravos de Bach, tocado em 2 pianos, esplendidamente, por Clara Haskil e Géza Anda e, em meio à epifanias, atingiu-me uma questão que frequentemente me toma de assalto em minhas experiências musicais: a de que aquilo que eu ouvia era o que mais gostaria de fazer em minhas vida. Quero dizer, tocar. Este concerto é qualquer coisa de impressionante - e quase não pode ser chamado de concerto, já que a participação da orquestra se resume a algumas notas esparsas, meramente decorativas, em torno do inacreditável "esqueleto" musical das duas linhas de piano. Melodias incessantes, uma avalanche de beleza sendo desenvolvida de maneira impressionantemente precisa e organizada, emoções e sentimentos humanos sendo expressos da maneira mais divina. Eis um desejo meu: viver daquilo, dos sons extraordinários produzidos por dedos sobre um teclado, de maneira espetacular. Poder interpretar da minha maneira, a partir do silêncio absoluto, aqueles sons fantásticos, saber de cor cada uma das partes do piano, tocá-las separadamente, conhecendo-as como a mulher amada, em todos seus detalhes, em cada mínima semínima. Isto seria felicidade - pelo menos me sinto assim nos momentos em que sou arrebatado pela música. O pior é que sei de minha capacidade, sei que poderia ter aprendido, quem sabe ainda aprender, a tocar bem algum instrumento musical; então a sensação deste desejo não pode deixar de vir com um gostinho amargo de frustração. É o preço que pago, I guess, por minha inerte vida de observador.
Ou o fantástico concerto para 2 pianos de Mozart. Que brincadeira séria! Pode-se imaginar, em meio àquelas melodias virtuosamente brincalhonas, Wolferl e a pequena Nannerl, sua irmãzinha, tocando o concerto em sua estréia. Graciosidade inacreditável, beleza constante, em todas as melodias, e mesmo quando parece que Mozart, caprichoso por um instante se zanga, segue-se à sua elevação de voz a mais linda melodia já feita, tendo o efeito, embora infinitamente mais gracioso, daquela (escatológica, segundo o Salieri de F. Murray Abraham) risadinha sua no filme Amadeus. O segundo movimento é, não diria triste, melancólico - mas duma melancolia tão bela que não nos comove por sua qualidade emotiva, mas por puro encantamento estético. Nada nem ninguém é mais bem-humorado que Mozart; mas leio que ele viveu atormentado por um número infindável de doenças até sua morte um tanto prematura - e me sinto mal por reclamar tanto.

Theophilus
Kyrie Eleison, ouço Mozart nos dizer em sua missa (bem assim como em todas as outras) em dó menor. Senhor, tende misericórdia. Que Deus não pouparia e perdoaria a humanidade inteira ao ouvir estas palavras musicadas de tal maneira ? Nem o vingativo e ameaçador do Velho Testamento; talvez Alá, filisteu.

Arquitetura de verdade
Bach bota ordem na casa. Ao ouvi-lo somos imediatamente tomados pelas sequências de notas que lembram na delicada simetria e na perfeição racional de sua geometria aqueles jardins dos palácios contemporâneos de Herr Kapellmeister. A humanidade, por breves instantes, faz sentido. Deus existe. Se é feliz. Mesmo quando a melodia é triste, se é feliz ouvindo Bach. Ele dignifica e enobrece a tristeza. Certas obras deixam-nos estupefatos pela sua complexidade, pela imponência e intrincacy do arranjo, das harmonias - são verdadeiros castelos, arquitetonicamente impecáveis -, outras pela aparente simplicidade estonteante; o que ele fez com apenas um cello nas suas suítes não foi igualado por compositor algum, abrangendo de forma tão espetacular todo o ciclo de emoções e sentimentos humanos.

The Ol' Ludwig...
Stravinski, numa entrevista publicada no New York Review of Books, chama as sinfonias de Beethoven de "discursos públicos", dizendo preferir os quartetos e sonatas, que considera mais "íntimos". Acho genial sua opinião, e até penso que concordo; mas basta ouvir uma das sinfonias para que eu acredite preferi-las à tudo que ouvi... até mesmo a sexta, tão desprezada por pessoas de tamanho gabarito como o próprio Stravinski, Cony e Rossi, me diverte um bocado. Percebe-se em todas, no entanto, o excesso de rigidez com que Beethoven as construiu e que, apesar de não ter bloqueado, e sim estimulado, sua criatividade, retirou um pouco do humano delas, conferindo-lhes uma aparência olímpica, de monumentos de mármore - por exemplo, a oitava; fantástica, impressionante, mas não diz muito sobre nossos sentimentos, ou melhor, não diz nada. Música pela música. E embora sua estrutura seja rigorosamente clássica, Beethoven parece escolher sempre o caminho inesperado, o salto em vez do passo; desce quando o compositor médio de sua época subiria o tom; grita quando outros calariam, e abaixa a voz quando outros gritariam inflamados. Emociona todos às lágrimas para então explodir numa gargalhada cheia de repulsa; parece sempre ter essa intenção, de subverter mantendo-se dentro das regras.
A 5a é duma engenhosidade fascinante: o mesmo padrão rítmico, aquele da famosa melodia inicial, é repetido, como uma obsessão enlouquecedora, através dos três primeiros movimentos incessantemente, e ele leva essa loucura adiante - numa introspecção estranha para um "discurso público" - até uma espécie de clímax no terceiro movimento, que explode, na passagem do 3o ao 4o, e culmina com aquela "monumentalidade" inconfundível, construindo a nós um daqueles palácios de mármore gigantescos, este monumento à glória da humanidade que é o allegro final; glória esta que o velho Luís de Beethoven tentou, com razoável sucesso, provar tão insistentemente durante toda sua vida. Talvez soe piegas, em nossos dias, tanto a intenção como a melodia desse último movimento; mas ele jamais deixará de ser grandioso.
A nona é seu mais ambicioso monumento; e se talvez, no quarto movimento ele pareça ter se perdido em meio aos exageros da grandiosidade, foi exatamente essa sinfonia, e seu quarto movimento, com coros monumentais e a orquestra mais ruidosa que 500 mil Commendatori juntos que passou a pautar de maneira indelével os caminhos dos que viessem depois - im Beethovens Schatten - pela tortuosa via da Música. Há sim um certo deslocamento, if I may say so, dos vocais, que fica especialmente perceptível na parte dos solistas, com o resto da música, do instrumental. Wagner acreditava em erros na partitura, e reescreveu-a; Stravinski diz que a entrada do barítono é uma "intrusão chocante", e que "o cantor dificilmente ficaria mais deslocado nos Pagliacci". Existem momentos em que é humanamente impossível distinguir entre as diferentes linhas melódicas dos cantores, do coro e dos instrumentos; tudo se revolve e se contorce numa aparente mixórdia caótica, que ao contrário de todos não me apresso em desprezar - insanamente, prefiro crer que Beethoven tivesse um propósito nisso, que há como se encontrar algum sentido, ainda que em meio ao caos. As vozes que participam daquela balbúrdia há pouco entoavam a melodia principal deste movimento, feita com a visível intenção de ser a mais bela ode à alegria, à liberdade, à humanidade - "música alemã de banda estilo Kaisermarsch", segundo o incansável Igor - e agora irrompiam freneticamente em todas as direções. Stravinski nos diz ainda que as vozes induzem à música uma finitude que vai contra a natureza de sua mensagem, e vê mal-realizada a tensão dos gigantescos coros finais. Quem sou eu para discordar... mas não sei se tampouco posso concordar. Ele parece preferir o 3o movimento; confesso que gosto dele particularmente também. Há ali algo de wagneriano, tanto na intensidade das emoções como na maneira com que elas são executadas, com as cordas sendo tocadas duma maneira muito característica, contínua, ininterrupta quase, pelos arcos - quase não há um fraseado, propriamente dito, com pausas e staccatti; os arcos deslizam pelas cordas, como que "extraindo" sons do nada. O primeiro movimento é impressionante, desde seu início tonitruante, quando tudo desaba sobre os ouvintes, até as últimas porradas finais - é o Beethoven indomado, um animal feroz amordaçado, que faz os instrumentos explodirem com a ira de todo um universo após tocarem as mais lindas melodias. O segundo movimento, quando bem-regido, é uma experiência auditiva. Uma melodia iniciada pelos violinos é repetida rapidamente, e a eles se somam todos os outros instrumentos, um a um, num frenético contraponto, até que a orquestra inteira toma conta e acaba se deixando levar embora pelos devaneios da mente transtornada; mas retornando sempre à melodia inicial. Não há como discordar do que o velho Ludwig, num acesso de modéstia, disse certa vez: "Quem compreende a minha música, jamais poderá ser totalmente infeliz".


Rafael Azevedo
São Paulo, 27/7/2001

Mais Rafael Azevedo
Mais Acessadas de Rafael Azevedo em 2001
01. A TV é uma droga - 23/11/2001
02. Os males da TV - 6/7/2001
03. La Guerra del Fin del Mundo - 16/11/2001
04. A primeira batalha do resto da guerra - 30/11/2001
05. State of the art - 31/8/2001


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Coleção Paraíso da Criança Paraíso II 3 Livros Alemanha Portugal Espanha
Edelbra
Edelbra



Genética Molecular Humana
Jack Pasternak
Manole
(2002)



Guia Visual Folha de São Paulo - Férias em Família - Guia Paris
Publifolha
Publifolha
(2012)



Fundamentos de Ortopedia e Traumatologia
Lucio Honorio de Carvalho Junior
Coopmed
(2009)



O Regresso
Michael Punke
Íntrinseca
(2016)



Astro-signos: Aquário
Laurène Petit
Todolivro
(1997)



Kit 6 Cds Pop Rock Brasil Istoe Show Cd + Livreto
Istoe
Tres



Santo Agostinho Bispo e Pastor
Francisco Galende
Fabra



Buriti Plus História - 5º Ano
Vários Autores
Moderna.
(2018)



O Direito e os Animais: uma Abordagem Ética, Filosófica e Normati
Danielle Tetü Rodrigues
Juruá
(2008)





busca | avançada
45841 visitas/dia
2,5 milhões/mês