Os beijos de Tchekhov | Marília Almeida | Digestivo Cultural

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COLUNAS

Terça-feira, 25/9/2007
Os beijos de Tchekhov
Marília Almeida
+ de 8900 Acessos
+ 2 Comentário(s)

Os contos do russo Anton Tchekhov parecem beijos. Não quero fazer referência a um de seus livros, O Beijo e outras histórias, mas não encontrei melhor palavra para resumir seus textos cheios de humanidade, sentimentos intensos e amor pela vida. Ao final de cada um dos pequenos escritos reunidos no livro A dama do cachorrinho e outros contos (Editora 34, 2006, 368 págs.), traduzido por Boris Schnaiderman, conhecido como o maior tradutor do russo para o português, podemos ouvir estalos superficiais, mas que podem nos satisfazer profundamente, apesar de delicados e fugazes.

Mesmo para mestres do gênero, é um grande desafio manter o mesmo patamar de qualidade e efeito em textos tão heterogêneos como os aqui colocados lado a lado. Esses estilos vão desde brincadeiras populares com grande inspiração no teatro, que marcaram o início do autor na literatura, passando por reflexões existenciais e fortes protestos sociais, que permeiam todos seus textos ora em menor ou maior grau e é o ponto de homogeneidade entre todos eles, além das características pontuadas acima. Há os de menor força, como "Olhos mortos de sono" e "Ceninha", mas os grandes os superam.

Um exemplo de brincadeira é "Nos banhos", que nada mais é que um desfile de histórias divertidas e tipos exóticos cujo objetivo é culminar no riso do leitor. Outros escritos sentem mais o peso do estilo teatral e consistem em um grande diálogo com ritmo frenético e repetitivo, arrematado por um pensamento que visa resumir em apenas uma frase a moral do que se contou, como em "Pamonha" e o eficiente "Fantasiados", que desvenda diversas pessoas sob o véu da hipocrisia. Confira:

"Um mujiquezinho bêbado vai andando pela aldeia, canta e faz chiar a sanfona. Uma ternura de ébrio espalha-se em seu rosto. Exclama hi-hi-hi e vai ensaiando passos de dança. Tem uma vida alegre, não é verdade? Não, está fantasiado. 'Quero comer', pensa."

O protesto social faz parte de algumas histórias mais marcantes e é veemente em contos como "Um caso clínico". Apartidário e cético, características do médico e homem da ciência que era, o protesto de Tchekhov é livre, marcadamente humano, reduzido a desigualdades sociais concretas. Seu tom satírico é explicado no posfácio esclarecedor do tradutor. Geralmente, Tchekhov troca nomes e os adapta, fazendo com que ganhem um significado dúbio, como em "Caso com um clássico", que, conforme Boris explica em um posfácio esclarecedor, pode ser tanto um aluno dos ginásios clássicos como um escritor clássico.

Está presente também em seus escritos a luta de classes e hierarquias tão características da vida e idealismo russo, como no belo "Angústia - a quem confiar a minha tristeza", que conta o desesperado desabafo de um cocheiro, que tenta traduzir em palavras o profundo pesar que sente com a morte do filho para todos os seus clientes, sempre em vão.

Tchekhov também utiliza por vezes a desafiante visão infantil em suas narrações, como em "Criançada" e "Vanka". Algumas são cheias de ternura e possuem uma descrição de ambiente surpreendente, própria do olhar do infante, mostrando a extrema delicadeza e senso de observação do autor. "Gricha", que relata um passeio de um pequeno com a babá e conhece o mundo, é um exemplo. Essa passagem traduz bem seu estilo:

"A babá e a mamãe são compreensíveis: elas vestem Gricha, servem-lhe comida e deitam-no para dormir, mas para que existe o papai, não se sabe. Existe ainda outra personagem misteriosa: a tia que presenteou Gricha com o tambor. Ora aparece, ora desaparece. Para onde é que ela vai? Mais de uma vez, Gricha espiou embaixo da cama, atrás do baú e debaixo do divã, mas ela não estava lá..."

Mas o autor russo, admirado e criticado por Tolstói e analisado por Virginia Woolf, mostra sua melhor forma ao tratar dos relacionamentos humanos. A "Corista" é um desses contos e conta a história de Pacha, corista que é amante, sem conhecimento, de Kolpakóv. O conto narra o encontro entre ela e sua mulher, quando esta vem procurar por seu marido em sua casa, e vai destilando o ódio da estranha, gestos nervosos e argumentos de mulher humilhada até que a história se inverte de tal modo que começamos a mudar de opinião sobre quem defender.

Esses sentimentos contraditórios e confusos também aparecem em "Bilhete Premiado", onde Ivan Dmítritch passa por um turbilhão de sentimentos com relação à sua esposa quando pensa que pode ganhar na loteria, e "Volódia", a história de um adolescente tímido e cheio de sentimentos conflituosos que desperta para o desejo do sexo oposto e o fato culmina em tragédia. Muitas vezes, Tchekhov se inspirou em fatos reais para criar suas histórias. Na época em que "Volódia" foi escrito, houve muitos suicídios de ginasianos. Veja um trecho:

"Ele sabia muito bem que maman dizia a verdade. Em seu relato sobre o general Chumíkhin e a Baronesa Kolbe, não havia sequer uma palavra de mentira e, apesar de tudo, Volódia sentiu que ela estava mentindo. Sentia-se a mentira em seu modo de falar, na expressão do rosto, no olhar, em tudo."

"Volódia Grande Volódia Pequeno", "Queridinha" e "Ventoinha", uma história mais longa dividida em oito capítulos, revelam, além de magníficas relações humanas, figuras femininas complexas, com interessante psicologia. Mas nenhuma delas se compara à protagonista da história que leva o título do livro. A dama do cachorrinho, uma mulher casada, solitária e misteriosa, desperta a atenção de um homem volúvel com tal profundidade que perdura em sua imaginação e lugares por onde passa, lembranças estas que o autor consegue expressar nos mais ínfimos detalhes. Eis um excerto:

"...tudo ressuscitava, de repente, em sua memória: o que sucedera no quebra-mar, o amanhecer com aquela névoa sobre as montanhas, o navio chegando de Feodóssia, os beijos. Passava muito tempo caminhando pelo quarto e recordando, sorria e, depois, as lembranças transformavam-se em sonhos e o passado, misturava-se, em sua imaginação, ao que viria ainda. Não sonhava mais com Ana Sierguéievna, ela o acompanhava por toda parte, como uma sombra, e vigiava-o."

O mais marcante nos textos é a continuidade que trazem consigo, estilo que, afinal, o tornou um contista revolucionário que ditou o estilo moderno. Suas pequenas histórias não terminam: são apenas passagens. Às vezes parecem começar no meio da história e não sabemos bem como os personagens estão ali, mas isso de modo algum tira seu encanto e força. Por todas essas características, Tchekhov é mais um do grande rol de autores russos que fizeram a história da literatura mundial.

Para ir além






Marília Almeida
São Paulo, 25/9/2007

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COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
26/9/2007
20h53min
Marília, Tchekhov é simplesmente o melhor contista de todos os tempos. Sem nenhum medo de errar. "Enfermaria nº 6" é o clássico do gênero.
[Leia outros Comentários de Daniel Lopes]
22/10/2007
22h12min
Muito bom. Ótima relação entre os textos.
[Leia outros Comentários de Juliana Pereira]
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