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Segunda-feira, 25/3/2013
Da Renovação Papal
Ricardo de Mattos
+ de 4200 Acessos

"E vós sereis odiados por todos, por causa do meu nome. Mas aquele que se mantiver firme até ao fim será salvo" (Jesus Cristo).

"A condição de cristãos nos impõe muito mais deveres que direitos" (Inácio Ferreira).

Seja qual for a hora, seja o que for que tenhamos lido na cama antes da chegada do sono, não cerramos definitivamente os olhos sem a leitura de um trecho dos Evangelhos, hábito cíclico que conseguimos manter há anos. Na madrugada do dia onze de fevereiro deste ano, lemos no Evangelho de Mateus o trecho do capítulo dez que vai dos versículos dezesseis ao 23, e que contém a fala crística epigrafada na presente coluna. À tarde deste mesmo dia, enquanto assistíamos a um filme, a mãe entrou na sala anunciando: "Non habemus Papa". "Morreu?!", perguntamos. "Renunciou".

Renúncia. O leitor interessado já deve ter lido a respeito de quantas renúncias papais registra a História, renúncias oficialmente aceitas ou não. A raridade surpreende. Recordamos que, em 2005, Bento XVI foi apresentado como um papa de transição, alguém idoso que manteria o trono aquecido para outro escolhido calmamente pela cúpula eclesial. Aventuramo-nos a dizer que sim, ele foi um Papa de transição, mas não no sentido inicialmente previsto. Transitório não pôde deixar de ser, pois ao homem que ocupa sua posição - bem como qualquer outra, religiosa ou laica - é própria esta característica seja qual for sua permanência no posto. De transição, pois com sua atitude tirou a Igreja do caminho estável e acomodado para impulsioná-la em rumo indefinido. Poderão tentar frenar o comboio; poderão maquiar os escândalos para os quais ele parece ter querido solução e não obteve; atribuir-lhe-ão responsabilidades até pelo que não fez. Contudo, não há quem possa impedir os questionamentos que os fiéis se farão, quer apenas intimamente, quer na discrição de pequenos círculos ou mesmo aberta e publicamente. Toda dona de casa sabe que perigo representa para a construção, no decorrer dos anos, o surgimento de trincas nas paredes.

Segundo sua mensagem, Bento XVI alegou que a condução da Igreja Católica exige forças físicas e mentais que diminuíram em si a ponto de ser necessário reconhecer sua incapacidade de bem administrá-la. "Bem administrar", é a locução papal, e não "bem governar". Eis um sutil avanço terminológico que não podemos imaginar em Papas anteriores a ele e a João Paulo II. Lendo a parte da produção jornalística a que tivemos acesso, prestamos atenção nos qualificativos dados pelas pessoas à renúncia e ao próprio bispo de Roma. À renúncia ligaram-se termos como: compreensível, triste, grande surpresa, lição de humildade, respeitável, insegurança, orfandade, trovejante, inesperada, importante. A Bento XVI, qualificaram-no surpreendente, valente, grande, humilde, desapegado, aberto, prudente, honesto, confiante, corajoso, lúcido, criterioso, diminuído perante a responsabilidade, bom exemplo.

De nossa parte, compreendemos os motivos alegados de sua atitude. Diante do que passou a ser noticiado, e até de circunstâncias vexatórias que suportou, promovidas inclusive por aqueles que se dizem seguidores do Cristo e ao seu lado deveriam dar exemplo de humildade e de humanismo, somos-lhe solidários. A princípio, temos para nós que o compromisso assumido deve ser levado até o fim, pois "da cruz não se desce", tal como acentuou João Paulo II. Si há lixo na casa, este lixo deve ser lançado fora, reciclado, etc., e não deixado para que o sucessor decida o que fazer - ou não. Um homem não deve exigir o sacrifício do outro, mas há cargos que têm inerente sua própria quota de privações. Interrogamo-nos qual não teria. Entretanto, como já mencionamos acima, sua intempestiva saída poderá ter efeitos mais interessantes em longo prazo.

Estamos falando de uma instituição milenar, que assumiu as mais diversas facetas no correr dos séculos, não de uma destas boites itinerantes que hoje estabelecem-se, lançam moda e amanhã mudam-se para outra temporada alhures. Estamos falando, também, de pessoa cujas palavras e posturas influenciam milhões de pessoas ao redor do planeta, quer dando-lhes o que pensar, quer determinando a própria forma de elas viverem. Não podemos deixar de observar o quanto impressionou-nos a fragilidade a que foi reduzido o indivíduo perante a Instituição. Ao mesmo tempo, indignamos ao perceber a facilidade com que "pequenas cúrias" podem ser formadas e o estrago que ocasionam caso não sejam contidas.

Aderimos ao Espiritismo por encontrarmos na Doutrina codificada por Allan Kardec fundamentos mais sólidos que permitiram nossa reestruturação pessoal. Por sorte, completamos trinta anos apenas uma vez a cada encarnação. Todavia, estamos longe de defender que a frequência ao Centro ou a adesão incondicional à Doutrina são as únicas chances de compreensão da existência. Podemos até recomendar a leitura d'O Livro dos Espíritos, mas é o interlocutor quem se decidirá ou não por ela. Decorre que não aceitamos mais a ideia de que uma instituição humana, ou de que pessoas tão falíveis quanto nós mesmos possam intermediar nossa salvação ou iluminação - que é uma salvação qualificada. Encontramos melhor resposta às nossas investigações em Kardec, quando ele registrou que não é fora da Igreja que não há salvação, mas sim, que não é fora da Caridade que encontraremos o que precisamos.

Seria Caridade o mero ato de enfiar a mão no bolso, puxar algumas moedas, descontar o que se considera excessivo e entregar a apuração líquida à mão do pedinte? Caridade seria sinônimo de Amor, de forma que em qualquer livro religioso um termo pudesse ser trocado por outro. No catolicismo, há distinção conceitual entre Amor, Eros, Ágape e Caridade, de forma que nos contentaremos em apresentar a definição deste último termo conforme o pensamento que passamos a esposar. Desta forma, segundo a questão 886 d'O Livro dos Espíritos, Caridade é "benevolência para com todos, indulgência para com as imperfeições alheias, perdão das ofensas" - no original, bienveillance pour tout le monde, indulgence pour les imperfections d'autrui, pardon des offenses. Algo bem mais complexo e desafiador, portanto, que a esmola e que torna sujeito de caridade mesmo a pessoa encarnada mais poderosa do planeta, seja ela quem for. Torna-nos a nós todos sujeitos de caridade, pois ainda não encarnou quem dispense benevolência, indulgência e perdão.

O homem comum contemporâneo parece cada vez menos propenso a procurar quem lhe dê diretrizes de como comportar-se, como agir, no que se omitir. Todavia, sem reconhecer sua transcendência, sem encontrar seu sentido existencial e esquivando-se das suas responsabilidades, responsabilidades estas que, sejam quais forem, são decorrentes diretas de sua liberdade, o homem comum periga tornar-se mero homem medíocre, e não é isto que almejamos para nossos semelhantes. Não se fala em ruptura com o passado, algo que pode ser inútil ou repetitivo, mas a final percepção do processo espiritual abrangente de toda a humanidade, por mais díspares que possam ser as expressões da Fé. Torcemos para que futuramente as instituições sejam mais simples e que seus condutores falem menos e exemplifiquem mais. Entre os cristãos - que o leitor já deverá saber que não se reduzem aos católicos - a palavra que Cristo semeou há mais de 2000 anos em meio pastoril e desértico deve ser aproximada das questões atuais, mantendo a Fé sem prescindir da Razão.

Em nossa pequenez, cremos que o futuro da Igreja Católica depende de soluções inadiáveis a determinadas questões - como aborto, contracepção, união formal homoafetiva, celibato, ordenação de mulheres - quer estas respostas agradem a todos, quer não. Por mais que defendamos a redução da hipótese de abortamento apenas ao caso de risco físico à gestante, e entendamos que no caso de estupro uma das vítimas é que estaria sendo condenada, reconhecemos que este último caso é uma pedra no sapato para a qual ainda não temos luzes suficientes. Diante da irresponsabilidade e da fatuidade de certas uniões, temos que ainda é tardia a melhor conscientização a respeito da contracepção. Caso duas pessoas amem-se sinceramente e queiram viver uma união abençoada, mesmo pertencendo ambas ao mesmo sexo, desconfiamos que as chamar de pecadoras não é um bom ponto de partida.

O celibato cheira-nos a egoísmo institucionalizado, seja qual for o argumento com que se queira disfarçá-lo. Principalmente por não se confundir com castidade. "Cristo foi celibatário", pode-se arguir. Certo: Cristo. Nós mal somos cristãos, quanto mais espíritos crísticos. O celibato seria admissível quando o indivíduo transforma a sociedade em sua família, mas quantos podem afirmar isto com sinceridade e demonstrar na prática esta vivência? A manutenção do celibato visa, inclusive, evitar o divórcio de padres, típico raciocínio pelo pior, que nos irrita particularmente. Quanto às mulheres que reivindicam a ordenação sacerdotal, questionamo-las diretamente. Si o serviço a Cristo dispensa a ordenação, contra-argumenta-se que o mesmo não ocorre dentro de uma denominação. Todavia, este apego à formalidade diria mais respeito ao trabalho cristão em si ou à autossatisfação? Si à autossatisfação, então trabalho com Cristo não é suficiente, principalmente por este não se reduzir à ritualística, que seria o único diferencial.

***

Iniciamos esta coluna na véspera do conclave. A renúncia de Bento XVI causou comoção e o noticiário mantinha-a em pauta, apesar do recente desencarne do ditador venezuelano. Publicamo-la com o novo Papa já escolhido. Vislumbrará Francisco o curso tomado pela Igreja após o abandono do leme por seu antecessor? Perceberá as exigências da navegação no mar bravio da modernidade? Quer-nos parecer que, sem abrir mão de seus princípios, saberá manter-se aberto ao diálogo. Seus primeiros pronunciamentos mostram-no mais "palatável", bastando recordar que o atual bispo emérito chegou a afirmar preferir qualidade à quantidade dos fiéis, o que foi uma sutil indicação da porta de saída. Encerramos passando a palavra para Paulinho da Viola, coautor da excelente Timoneiro:

"Não sou eu quem me navega, quem me navega é o Mar;
É ele quem me carrega como nem fosse levar; (...)
Meu velho um dia falou, com seu jeito de avisar:
'Olha, o Mar não tem cabelos que a gente possa agarrar'".


Ricardo de Mattos
Taubaté, 25/3/2013

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