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Quarta-feira, 22/1/2014
Gustavo Rezende: uno... duplo...
Humberto Pereira da Silva
+ de 5700 Acessos

O imperador e seu Dorso

O imperador e seu Dorso, 1991, madeira, 98 X 70 X 12 cm, foto de Eduardo Brandão

A exposição Gustavo Rezende: Mergulho, curadoria de Ivo Mesquita, está aberta ao público na Pinacoteca de São Paulo desde 9 de novembro e vai até 26 de fevereiro. Nela estão reunidos cerca de 40 trabalhos, realizados da década de 1980 até os dias de hoje, que exibem diferentes momentos e inquietações do artista. Assim, nos trabalhos iniciais de Rezende predominam o uso de materiais como madeira, bronze, gesso e chumbo; já a partir dos anos de 1990, há uma ampliação de suportes: ele passa a explorar novas possibilidades de linguagem por meio de mangás, colagens com fitas crepe etc.; na exposição, destaque também para suas experiências com fotografia, que ganham densidade em sua trajetória no final dos anos de 1990.

A exposição também foi ocasião para o lançamento do livro Gus (Ed. Martins Fontes, 270 pág.), que reúne parte de sua obra e textos de Felipe Chaimovich, Fernando Oliva, Juliana Monachesi, Regina Teixeira de Barros e Tadeu Chiarelli. São redações curtas, mas instigantes e que procuram desvelar pontos cardeais das obras e das motivações implícitas do artista; com destaque, principalmente, para o lugar que ele ocupa no cenário artístico brasileiro nas duas recentes décadas. Nesse ponto, vale ressaltar, o modo como a obra de Rezende reflete os impasses da arte contemporânea: premida entre a ideia do artista como criador e injunções sociais e de mercado que colocam em xeque sua autonomia criativa.

Sendo assim, deve-se ter em vista em sua obra a persistência de duas constantes: a profusão de duplos de Gustavo Rezende e o caráter hermético na relação entre título de obra e obra referida pelo título.

Na primeira constante, os muitos "autorretratos" - ou imagens de Gustavo - são identificados com nomes próprios: Maxwell, Allan, Thompson, Gus...; ou um substantivo, como Hero. Para um olhar sem a devida cautela, a impressão de que o nome revelaria um processo de despersonalização: Maxwell seria um personagem, portanto, uma criação imaginária, com existência própria independente do artista (nesse sentido, do mesmo modo que Shakespeare e Hamlet não são o mesmo). Mas não é essa a ideia que está por trás do processo de nomeação de Gustavo Rezende. Sagaz, sua obra propõe um instigante e enigmático jogo entre a dimensão ontológica do nome e este tomado por mera etiqueta.

Seu próprio corpo é o meio que permite a nomeação. Sendo assim, Gustavo Rezende não se confunde com o corpo que lhe serve de nome; assim como seu corpo não se confunde com a imagem deste. Do mesmo modo, Maxwell não se confunde com a imagem que recebe este nome; tampouco, com o corpo que serve de modelo para a imagem. Contudo, da mesma maneira que o rosto - físico - de Gustavo Rezende não se confunde com o corpo que o prende, tal rosto assim considerado compõe com outros membros para que se tenha, efetivamente, o corpo. Assim, pelo menos, é como ele se expressa: "Não, não acho que seja eu, mas (ali) também tem eu. Às vezes é meu corpo, mas é claramente outra pessoa".

Ora, o nome "Maxwell", como o rosto no corpo, bem pode se separar do nome "Gustavo Rezende" e ganhar autonomia própria; do contrário, "Maxwell" é parte do que, na soma, é "Gustavo Rezende"; ou ainda, "Gustavo Rezende" é parte do que é "Maxwell". Certo, mas não é só a questão de se saber o que é "Maxwell", que está em jogo na obra do artista Gustavo Rezende. Nessa opção, na criação de personas, o nome concebido como etiqueta.

Se assim se deve considerar, levemos em conta a relação entre o nome e uma mercadoria exposta na prateleira de um supermercado. No nome, na etiqueta, está subsumido o valor. No nome, portanto, o quanto um produto se oferece como objeto de fetiche. A etiqueta pode separar, assim, o que na soma de incidentes traduz o mesmo sentido: saciamos a sede com água, ou com uma garrafa de coca-cola.

Ao jogar com duplos de si, assim me parece, a obra de Gustavo Rezende traz, justamente, um elemento de ambiguidade para se pensar a sociedade de consumo; o nome (a etiqueta) escolhido casualmente não é senão o sinal que aponta para uma coisa (um produto); mas, do ponto de vista simbólico - o campo dos chamados significados - essa coisa se adensa e carregá-la implica movimentar um peso que agrega mais do que a mera denotação.

Maxwell seria, então, apenas um nome a mais que se agregaria com outros duplos de Gustavo Rezende; sua obra, contudo, sugere que, assim como uma garrafa de coca-cola, esse não é o caso. O significado de "Maxwell" transborda, ao lado de Allan, Thompson, Gus..; como coca-cola ao lado de pepsi, sprite...

Maxwell sentado

Maxwell sentado, 2012, ferro fundido, madeira, folha de ouro, 33 X 19 X 17 cm

Outra constante que chama a atenção na obra de Gustavo Rezende refere-se ao caráter hermético dos títulos que ele dá. Tadeu Chiarelli observa que numa obra como "O imperador e seu dorso" não se percebe conexão entre "o imperador" e "seu dorso". Para ele, estas expressões não são equivalentes, nem com respeito ao significante nem quanto ao significado. Mas a questão interpretativa se estende ainda - mesmo que não observada por Chiarelli - ao nexo entre título e obra. Esta, uma escultura em madeira, com a forma de duas jarras de chope interligadas pelas alças.

Nada impede o apreciador em visita à Pinacoteca de buscar aproximação entre a forma da escultura e seu título. Com isso, uma possível significação. Mas para Chiarelli o enigma está no próprio título, cujas partes estariam desconectadas. Tenho, contudo, outro viés de observação: a obra está lá, autônoma em si mesma, inefável às palavras. Estas não explicam, ou esclarecem o que ela significa, pois a obra tão somente se mostra. Tentar significá-la é retirar dela seu caráter místico, conforme o filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein.

Se a pista sugerida por Wittgenstein for sensata, eis um dado para se pensar no nexo entre título e obra no conjunto de trabalhos de Gustavo Rezende. O título apenas sugere, revela traços imprecisos, oferece senhas falsas. Assim, a inefabilidade da obra se exibe por meio do título, que por sua vez se exibe como nonsense. Ora, por trás desse jogo entre procura de sentido e suspeita de absurdo, algo similar à relação entre Gustavo Rezende e seus duplos; entre Gustavo Rezende e Maxwell: ambos são e não são o mesmo. Ou seja, os sibilinos títulos de suas obras referem-se e não se referem às obras designadas.

Um observador atento poderá ver na junção de duas jarras de chope um dorso - uma questão de "ver como" wittgensteiniano; assim como poderá indagar sobre a "nobreza" da madeira que serve de suporte para a forma obtida. Mas se ele vir outra forma - e disser o que viu -, isso indica como as palavras são inefáveis para "dizer" sobre a obra (outro título podia ser pensado, algo como "O imperador e duas jarras de chope"...).

Esse dado inquiridor, constantemente presente na obra de Gustavo Rezende (no título e sua extensão material), desafia o olhar do observador; mas igualmente importante para perceber a relevância de seus propósitos, sua sagacidade para lidar com a tensão entre autonomia de criação e sujeição ao mercado (essas duas possibilidades são afirmadas e negadas, num paralelismo de espelhos cujas imagens se refletem ao infinito), assim como sobre os limites do que uma obra "queira dizer", com sentido, tendo por referência o mundo. Um tanto wittgensteiniano, "O imperador e seu dorso" está lá, e assim se mostra àqueles que visitem a exposição "Gustavo Rezende: Mergulho".

O título da exposição, por sinal, talvez inadequado; sem sentido, mas num nível diferente do nonsense dos títulos das obras. "Mergulho" sugere a tradução literal de "Hero", imagem de Gustavo Rezende nadando. Mas por um lado isso limita o alcance do que é exposto; e por outro sugere um sentido ausente no trajeto do artista (mais adequado, quiçá, "Mergulho e a vã busca de sentido para as palavras"...). Já o título do livro, "Gus", carrega o mesmo nonsense dos títulos das obras "retratadas", os duplos do que se vê na exposição.

Hero

Hero, 2000, fotografia sobre triedro [painel giratório com acabamento em aço inox] 200 X 140 X 12cm


Humberto Pereira da Silva
São Paulo, 22/1/2014

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