Apesar de vocês | Alexandre Petillo | Digestivo Cultural

busca | avançada
58271 visitas/dia
1,3 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Hebraica recebe exposição de Victor Brecheret
>>> SHOPPING GRANJA VIANNA TRAZ GUI MONTEIRO E CONVIDADOS ESPECIAIS PARA A PROGRAMAÇÃO DO SOM NA PRAÇA
>>> Omodé: O Pequeno Herói Preto no Sesc Bom Retiro
>>> Estímulo Mostra de Dança do 40º Festival de Dança de Joinville trará para o palco do Juarez Machado
>>> Sesc Sorocaba apresenta Nas Águas do Imaginar com a Companhia de Danças de Diadema
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Charges e bastidores do Roda Viva
>>> Diogo Salles no Roda Viva
>>> Pulp Fiction e seus traços em Cocaine Bear
>>> Rabhia: 1 romance policial moçambicano
>>> Nélio Silzantov e a pátria que (n)os pariu
>>> Palavras/Imagens: A Arte de Walter Sebastião
>>> Rita Lee Jones (1947-2023)
>>> Kafka: esse estranho
>>> Seis vezes Caetano Veloso, por Tom Cardoso
>>> O batom na cueca do Jair
Colunistas
Últimos Posts
>>> Interney sobre inteligência artificial (2023)
>>> Uma história do Yahoo! (2014)
>>> O Lado B da MTVê
>>> A história de Roberto Vinháes (2023)
>>> Something About You (Cary Brothers & Laura Jansen)
>>> Uma história do Airbnb (2023)
>>> Vias da dialética em Platão
>>> Uma aula sobre MercadoLivre (2023)
>>> Lula de óculos ou Lula sem óculos?
>>> Uma história do Elo7
Últimos Posts
>>> Não esqueci de nada
>>> Júlia
>>> Belém, entre a cidade política, a loja e a calçada
>>> Minha Mãe
>>> Pelé, eterno e sublime
>>> Atire a poeira
>>> A Ti
>>> Nem o ontem, nem o amanhã, viva o hoje
>>> Igualdade
>>> A baleia, entre o fim e a redenção
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Culture to Digest
>>> Um travesseiro nada confortável
>>> O site da cultura brasileira
>>> Saudações
>>> Telemarketing, o anti-marketing dos idiotas
>>> Paco Entre Dos Aguas (1976)
>>> Apologia dos Cães
>>> Cartier-Bresson: o elogio do olhar
>>> Calcanhotto, Lancellotti, Veloso e Antunes no Auditório Ibirapuera
>>> Formando Não-Leitores
Mais Recentes
>>> Enciclopédia do Patrimônio da Humanidade de Vários Autores pela Altaya (1998)
>>> A Revolução Americana de Vários Autores pela Três
>>> A Poética visual contemporânea de Juan Muzzi de Alberto Beuttenmuller pela Do Autor (2011)
>>> Contando a arte de Juan Muzzi de Oscar D Ambrosio pela Nova America (2007)
>>> The Microeconomics of Public Policy Analysis de Lee S Friedman pela Princeton University Press (2002)
>>> Anjos e demônios de Dan Brown pela Sextante (2004)
>>> Como fazer amigos e influenciar pessoas de Dale Carnegie pela Companhia Nacional (2012)
>>> Aula nota 10 - 49 técnicas para ser um professor campeão de Audiência de Doug Lemov pela Fundação Lemann (2011)
>>> O Caçador de Pipas de Khaled Hosseini pela Nova Fronteira (2005)
>>> Rodadas Pedagógicas de Vários Autores pela Penso (2014)
>>> Lessons of Hope - hOw to fix our schools de Joel Kleen pela Harper Collins (2014)
>>> Memoria Social - Urugaya Tu Eres Parte : No te quedes aparte de Oriana Jara , Brígida Scaffo pela São Paulo (2011)
>>> Ensino Híbrido de Lilian Bacich, Adolfo Tanzi Neto, Fernando de Melo pela Instituto Península (2015)
>>> O Príncipe de Nicolau Maquiavel pela Jardim dos Livros (2007)
>>> Tenho Algo a Lhe Dizer - coleção encontro 2 de Pe Carlos Afonso Schmitt pela Paulinas (1976)
>>> A Cidade do Sol de Khaled Hosseini pela A Cidade do SOl (2007)
>>> Esperança Além da Crise de Mark Finley pela Casa Publicadora Brasileira Tatui (2021)
>>> É Apenas o Vértice do Mundo Interior de Vladmir Pablik pela Não encontrada
>>> Como Avaliar um Livro Didático: Língua Portuguesa de Francisco Gomes de Matos; Nelly Carvalho pela Pioneira (1984)
>>> Ondas: um dia de nuvens listradas vindas do mar de KAtia Maciel pela Mis (2009)
>>> Experiências Inovadoras de ensino e aprendizagem de Edson Sadao Iizuka pela Tikinet (2015)
>>> Estado, Governo e Sociedade de Norberto Bobbio pela Paz e Terra (2012)
>>> As crianças mais Inteligentes do Mundo e como elas chegam lá de Amanda Ripley pela Três Estrelas (2014)
>>> Gestão de Custos e Formação de Preços 461 de Adriano Leal Bruni pela Atlas (2010)
>>> Ultra Metabolismo 461 de Mark Hyman pela Sextante (2007)
COLUNAS >>> Especial 1964-2004

Quarta-feira, 21/4/2004
Apesar de vocês
Alexandre Petillo
+ de 9500 Acessos
+ 2 Comentário(s)

31 de Março de 1964, instaurava-se o Regime militar no Brasil. O meio artístico brasileiro só foi se manifestar, de forma (mais ou menos) clara e contundente, seis anos depois, com essa música:

"Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão, viu
Você que inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão

"Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Eu pergunto a você
Onde vai se esconder
Da enorme euforia
Como vai proibir
Quando o galo insistir
Em cantar
Água nova brotando
E a gente se amando
Sem parar

"Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros, juro
Todo esse amor reprimido
Esse grito contido
Este samba no escuro
Você que inventou a tristeza
Ora, tenha fineza
De desinventar
Você vai pagar e é dobrado
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar (...)"

"Apesar de Você"
(Chico Buarque, 1970)

Simples e direto. As ditaduras existem para derrubar os regimes democráticos, por meio de golpes, e estão dispostas a acabar com a liberdade do povo - a exigir que todos façam aquilo que seus líderes acham certo. Geralmente, os ditadores, para conseguir seu intento, gozam de grande apoio por parte dos setores mais conservadores da sociedade. Além da elite da sociedade. O mote principal é manter sua ascendência sobre os menos favorecidos e reprimir opositores. Com o tempo, os democratas conseguem abrir seu espaço - a custa de alguns mortos e/ou desaparecidos.

E, a cultura brasileira, é e sempre foi de direita. No Brasil, quando se trata de cultura, mesmo quem é de esquerda, passa a ser de direita. Isso é facilmente perceptível, a maioria das pessoas que conhecemos tem certeza de que a MPB acabou com os discos do Chico Buarque nos anos 70. E que o rock brasileiro decente só aconteceu nos anos 80, com a Legião Urbana. Pensamento direitista.

Além disso, o brasileiro acredita que arte de qualidade é aquela rebuscada, de difícil compreensão e demorado processo de absorção pelo seu público. Durante quase duas décadas de ditadura, poucos artistas falaram diretamente para o povão, conscientizando e conclamando algum tipo de revolta. Caetano Veloso, por exemplo, no auge da ditadura, dizia que "devíamos aliviar o cálice". Neguinho achava que era pra todo mundo ficar bêbado.

Pode até parecer exagero dizer, mas a primeira demonstração de revolta democrática, que poderia diretamente ser compreendida pelo povo, aconteceu em 1982 durante a Democracia Corintiana. Porque, de futebol, o povo entende. Tudo bem que naquele ano, já vivíamos um início de uma abertura política. Pela primeira vez, desde 64, os brasileiros votaram, elegendo democraticamente governadores nos Estados. Mas, o fato é que o Parque São Jorge foi o primeiro local do Brasil a respirar ares democráticos. Um ato de coragem, contra o governo estabelecido e contra o espírito paternalista e ditatorial que é o futebol, até hoje.

A música também só começou a falar diretamente ao povo, contra a repressão, com a explosão do rock brasileiro, em músicas como "Proteção", da Plebe Rude e, principalmente, "Inútil", do Ultraje a Rigor. A música, junto com Sócrates, Casagrande, Wladimir, representantes da Democracia Corintiana, foi cantada por milhares na Praça da Sé, na maior convenção a favor das eleições diretas para presidente do País. Resumindo: a contestação saiu da união do futebol com o rock, coisas que todo mundo captava. Transgressão, mesmo que em tempos mais leves.

Juntou sua banda, chamou os conhecidos, os mais chegados e gravou o disco que faltava para aquela multidão que pedia voto, liberdade e a Copa do Mundo, cantar em uníssono, lá na Praça da Sé. "Inútil, a gente somos inútil".

Em 13 de janeiro de 1984, o principal nome das campanhas da Diretas, conhecido como Sr. Diretas em pessoa, deputado federal Ulysses Guimarães, declarou que ia mandar o compacto de "Inútil" para o presidente João Figueiredo. A letra dizia, entre outras coisas, que "a gente não sabemos escolher presidente/ a gente não sabemos tomar conta da gente". A citação ratificava o jovem rock nacional como trilha sonora da década. Enquanto que, no exílio, os representantes da MPB escreviam canções e faziam filmes que, nem sempre, os mesmos compreendiam.

Naquela época, entre 1983 e 85, era preciso ter cultura para mijar na escultura. Ou seja, dava para meter a boca, desde que fizesse isso com inteligência, refinamento, sagacidade, coisas que os censores não entendiam. Mas, ainda assim, corriam o risco de ver seus LPs riscados, manualmente, como aconteceu com a Blitz.

Na verdade, de acordo com o brilhante livro de Paulo César Araujo, Eu Não Sou Cachorro, Não, um dos artistas que mais contestaram o regime foi, acredite, Odair José. As páginas do livro mostram que ele foi corajoso e provocador durante o regime militar. Principalmente porque falava diretamente ao povão, enquanto Caetano, Milton Nascimento e afins atingiam um segmento de classe média, universitário, e naturalmente progressista.

Odair e a chamada "música brega" falava para o povão, em seu sentido mais comum: católico, conservador, apegado aos tabus, aos valores sociais vigentes. As composições de Odair José focalizavam diversos temas do cotidiano e convidavam seu ouvinte à reflexão e ao questionamento. Falava, por exemplo, de prostituição ("Vou Tirar Você Desse Lugar"), homossexualismo ("Forma de Sentir"), drogas ("Viagem"), anticoncepcionais ("Pare de Tomar a Pílula"), exclusão social ("Deixa essa Vergonha de Lado"), religião ("Cristo, quem é Você?"), adultério ("Pense ao Menos em Nossos Filhos"), só para ficar nos assuntos mais polêmicos.

Para completar, ele ainda compôs uma ópera-rock de protesto religioso, o que provocou a fúria da Igreja e levou alguns padres até a ameaçá-lo de excomunhão. Acabou proibido pela Igreja e pelo regime dos generais. Mas o povão entendeu o recado. Odair José, Agnaldo Timóteo e Waldik Soriano atingiam multidões muito maiores do que os fãs de Chico e Caetano.

Por essa falta de representação popular, capaz de inflamar e informar o povão, o Golpe aconteceu de forma pacífica, sem qualquer tipo de reação. Foi mais do que um Golpe, foi uma puxada de tapete. Não houve combate, revolução, batalha. Quando percebemos, já era tarde.

Hoje, estranhamente, paira um (péssimo) cheiro de 64 no ar. Dois dias antes do aniversario de 40 anos do Golpe, aparece no Jornal Nacional uma fita extremamente prejudicial para o Governo Lula. No dia seguinte, o Ministro da Justiça diz com contundência que está acontecendo uma "conspiração" no Planalto.

Para colocar ainda mais a pulga atrás da orelha, desde que o ano começou e a classe média intelectualizada convencionou que era melhor fazer uma onda negativa e pessimista contra Lula e asseclas. Toda e qualquer boa notícia era abafada, para dar espaço para toda e qualquer má notícia. E a classe média intelectualizada, estudada, mas sem o menor espírito crítico, reverbera as más vibrações com vontade e a boca cheia.

É até compreensível. A gente vem de uma série de governos catastróficos. Nosso primeiro presidente eleito em 30 anos, deu no que deu. Ainda tivemos Sarney, Itamar, um horrível segundo mandato de FHC. A coisa ficou bem preta. Bate realmente um desânimo, mas se for sempre assim, vamos todos nos mudar para o meio do mato e ficar esperando o salvador.

Brasil, ame-o ou deixe-o. Pelo que tudo indica, existe uma possibilidade da gente ouvir Dom e Ravel de novo liderando as paradas de sucesso. E todo dia, logo cedo, vamos ouvir uns 200 moleques perfilados e desafinados cantando a horrorosa "Eu te amo, meu Brasil" na escola.

Mas tem um lado bom. Agora, no Golpe de 2004, Caetano canta em inglês. Não que faça alguma diferença, ninguém ia entender mesmo. Já Chico, não cantava "Apesar de Você" nem mesmo na época da ditadura. Corria o risco de ser preso - os censores já tinha avisado. O público pedia, Chico fazia que não era com ele. Até que num show, sua mãe estava presente e percebeu a vontade dos presentes em tocar a música, e Chico se recusando. Não se conteve, gritou: "Seja homem, meu filho. Toca a música".


Alexandre Petillo
São Paulo, 21/4/2004

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Por uma lógica no estudo da ortografia de Marcelo Spalding


Mais Alexandre Petillo
Mais Especial 1964-2004
* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
4/5/2004
02h16min
Excelente texto. Alexandre, você tá se superando a cada dia. Parabéns
[Leia outros Comentários de Felipe]
18/5/2004
22h53min
O texto está bem escrito, como sempre. Mas o conteúdo merece reparos. A abordagem de Odair José sempre foi pra lá de conservadora. "Pare de tomar a pílula/ ela não deixa nosso filho nascer". Ou seja, nada que contrariasse as já então velhas senhoras do "com Deus, pela família", TFP e coisas afins. Também não é nem um pouco verdadeiro afirmar que Odair José e Waldik Soriano faziam mais sucesso que Chico Buarque. Eles não chegavam nem perto, apesar de suas músicas tocarem mais nas rádios. Acho que aí devem entrar outras variáveis. Chico, Caetano, Gil, etc., sempre atingiam um público com maior poder aquisitivo, nos grandes centros urbanos. Talvez por isso, vendiam mais discos. Quando fez sucesso no sul/sudeste, o Waldik já era "macaco velho". Aqui em Belém, por exemplo, ele fazia sucesso desde 1962/63. Mas vendia pouco, em âmbito nacional. Seu sucesso durou pouco no "sul maravilha". Uns dois ou três anos, se tanto. Não há como comparar esses artistas com gente do porte de Chico Buarque, seja em termos artísticos, seja do ponto de vista do sucesso. A menos que o objetivo seja, exclusivamente, fazer polêmica.
[Leia outros Comentários de Elias Tavares]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




A Pequena Porta-estandarte
Daniel Renard
Seed
(1996)



Dietoterapia na Prática Médica
Nilton M. Braga de Oliveira
Cultura Médica
(1975)



Life Beginner A1 Workbook com CD
Helen Stephenson
Cengage Learning



Livro - O Luxo Eterno; da Idade do Sagrado ao Tempo das Marcas
Gilles Lipovetsky
Companhia das Letras
(2005)



Gordelícias
Simone Gutierrez - Cacau Protásio - Mariana Xavier - Fabiana Carla
Academia
(2017)



Becky Bloom - delírios de consumo na 5ª avenida
Sophie Kinsella
Record
(2004)



Grandes Monumentos da Humanidade 8
Vários Autores
Delta
(1982)



Maintenance Practices in Today's Paper Industry
Ken L. Patrick
A Pulp Paper



Administração da Produção
Joseph G. Monks
Mc Graw Hill
(1987)



A Preface to Milton
Lois Potter
Longman
(1971)





busca | avançada
58271 visitas/dia
1,3 milhão/mês