Trate-me, teatro! | Adriana Baggio | Digestivo Cultural

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Quinta-feira, 24/3/2005
Trate-me, teatro!
Adriana Baggio
+ de 4300 Acessos

Não entendo e nem freqüento muito teatro. É uma falha imperdoável, já que meus pais fizeram teatro quando jovens e passei minha infância pelas salas do Teatro Guaíra. Talvez minha relação com a arte tenha azedado quando eu ainda era criança. Certa vez, saí correndo da platéia para desvendar os segredos por trás da cortina que escondia os bonecos.

Uma outra lembrança ruim, porém mais recente, é da aula de Oficina de Teatro do curso de Educação Artística que eu comecei a fazer na UFPB. A professora insistia em atividades que envolviam contato físico, manifestações de emoções, exposição pessoal. Sou uma curitibana bem enrustida, odeio fazer isso diante de pessoas que mal conheço. A estupidez dela frente à resistência daqueles que não estavam à vontade com os exercícios (não era só eu) me deixou com uma péssima imagem do teatro. Por que as pessoas sentem tanta necessidade de impor algo a você? Deve ser por isso que eu fujo daquelas peças em que os atores interagem com a platéia, tão na moda ultimamente...

Prefiro uma relação mais distante, que privilegie a ilusão, a introspecção, a mágica da representação. Prefiro uma interação com o texto, os sons, as luzes, a emoção, os personagens. Na verdade, prefiro eu aqui e eles lá. Como deveria ter feito naquele espetáculo de bonecos da minha infância.

Apesar de passar quase o ano todo longe de um palco, em março fica meio impossível não participar do Festival de Teatro de Curitiba. É o maior do Brasil. Apresenta em primeira mão peças que serão vistas só depois, mesmo em São Paulo e no Rio, que tradicionalmente concentram as estréias. Fora a apresentação mainstream, que nesse ano tem 12 espetáculos, ainda é possível escolher entre 200 peças que participam da mostra paralela, o Fringe. Como eu, milhares de pessoas só vão ao teatro em Curitiba durante o mês de março (ou quando tem alguma peça com artistas da Globo, mas aí já não é o meu caso).

O Festival de Teatro de Curitiba é um dos melhores exemplos de sucesso da indústria cultural. Apesar de envolver uma manifestação que é meio alternativa, marginal, o Festival transformou-se em um produto de consumo de massa. A aura de "programa imperdível e cool" espetaculariza o espetáculo. O evento tem um forte componente mercadológico, cada vez mais presente e organizado, que envolve patrocinadores, suas respectivas agências de publicidade e promoção e o circuito de bares, restaurantes e festas "oficiais". A própria campanha publicitária do Festival é, tradicionalmente, uma atração quase que independente. Gera mídia espontânea e traz muita visibilidade para a agência responsável. São sempre campanhas geniais, divertidas, impactantes, mas que vendem o teatro como produto, assumidamente. É o anúncio do produto tornando-se, ele próprio, um produto.

Esse clima permanece na entrada dos teatros com distribuição de brindes, folhetos, apresentação de performances, tudo para a potencializar o patrocínio. Isso é bom ou ruim? Depende. Como produto da indústria cultural, o Festival tem seu lado apocalíptico e o lado integrado. Há uma pasteurização do evento, um nivelamento "pop", muitas vezes um oportunismo. Por outro lado, Curitiba transforma-se em uma vitrine e mesmo quem não tem o hábito acaba indo ao teatro. Mas acredito que o maior benefício mesmo é poder ter um panorama do que se faz em teatro no Brasil. Não através das peças da mostra contemporânea, com seus autores, diretores e elencos consagrados, mas pelos espetáculos do Fringe. A mostra paralela, com menos compromissos comerciais, tem mais oportunidade de apresentar novas linguagens e propostas diferenciadas. Claro que, continuando na metáfora de mercado, é como uma feira. Há de tudo um pouco, de preciosidades a puro lixo.

A pulverização do Fringe, no entanto, provoca acontecimentos como os de segunda-feira, na apresentação da peça Galvez imperador do Acre, da Cia. Les Commediens Tropicales, de Campinas (SP). O roteiro conta a história da disputa pelo território do Acre no final do século XIX, com um elenco quase mais numeroso do que a platéia. O pouco público parecia, em sua maioria, gente de teatro mesmo, atores e atrizes de outros espetáculos, denunciados pelos crachás e pela toilette exótica. O tamanho do elenco é um dos grandes méritos da peça: são muitas pessoas que cantam, dançam, falam e atuam em perfeita sincronia. Não há cenário e o figurino é mínimo: trapos, cuecas, calcinhas e sutiãs. Imagino que represente essa coisa do Brasil tropical, pouca roupa, muita sensualidade e safadeza, muita pobreza e exploração. Um país que não é sério desde sempre e que tem por herdeiros as prostituas, pedintes e vendedores de rua, personagens que recebem e intimidam o público começam a se acomodar na platéia (e promovem aquela "interação" que eu tanto detesto...). Talvez a nudez masculina, presença constante no palco, queira passar tudo isso também. Mas foi em excesso, assim como o estilo "chanchada", meio exagerado, que faz a comédia perder a graça.

Em Galvez, nem um bom teatro (SESC da Esquina), um texto "popular" (baseado na obra de Márcio Souza, mesmo autor do livro que deu origem à minissérie Mad Maria) e muitos homens pelados no palco conseguiram fazer o teatro encher. É uma situação que deve estar sendo vivida por muitos espetáculos do Fringe, que esperam a oportunidade de se destacar em meio às centenas de opções que 10 dias de programação oferecem.

E por falar em teatro...
Mais uma vez vou avisar que não entendo de teatro. Deve ser por isso que não consegui ver graça no texto da antológica Trate-me leão, o grande sucesso do grupo Asdrúbal trouxe o trombone. O roteiro de Hamilton Vaz Pereira foi publicado pela Objetiva em 2004 e traz também depoimentos do autor e de Regina Casé e Luiz Fernando Guimarães. Eles falam do método de criação coletiva que deu origem à peça, das motivações para que o grupo parisse um texto como aquele (a metáfora é válida, eles levaram nove meses para chegar à estréia) e da repercussão que se reflete até hoje em alguns dos nossos produtos culturais preferidos.

Depois dessa introdução, busquei avidamente as páginas do roteiro. Uma peça que tinha feito tanto sucesso, que arrastava legiões nas excursões pelo Brasil, que falava das angústias e do universo jovem, deveria me tocar. Mas talvez eu já não seja tão jovem e ser jovem hoje é muito diferente de ser em 1977.

Achei tudo muito alienado. A preocupação dos personagens se alternava entre sexo, a inutilidade da escola, formas de fugir de uma vida de terno e gravata. Uma preocupação de adolescentes de classe média da zona sul carioca. Mas parece ser isso que as pessoas queriam na época.

Comentei essas coisas com meu pai e ele me fez ver a peça dentro daquele contexto. Ao mesmo tempo em que havia grupos politizados, manifestações culturais que buscavam protestar contra a ditadura, outros desbundaram. A temática não tinha nada a ver com o país. Era centrada nas questões cotidianas de "como pegar a empregadinha", nos conflitos existenciais de gente mais preocupada em ignorar tudo aquilo. O próprio grupo dedicou-se a um processo de criação que exigia dedicação integral e não dava espaço para emprego, escola, coisas que as pessoas têm a obrigação de fazer na sociedade. Quando passavam pelas cidades, outros jovens juntavam-se a eles. Em Curitiba, meu pai conta que um deles comprou uma moto. Em outra cidade, compraram uma kombi. E assim, no melhor espírito dos anos 70, eles ficaram rodando o Brasil, às vezes com grana, às vezes sem.

Talvez hoje seja tudo muito conservador e racional, mesmo para quem está na idade de "contrariar o sistema". Ninguém mais quer sair pelo mundo com sua trupe. E pensar que essa geração foi formada nos anos 80. Curtiu muito Blitz, TV Pirata, Circo Voador. Todos subprodutos do Asdrúbal. Talvez o pessoal do Trate-me já estivesse prevendo a "década perdida". E quando os eighties chegaram, eles só embalaram toda essa divertida alienação e passaram a distribuir em massa - não mais no teatro, sim na televisão - e a ganhar dinheiro com o que faziam.

Não sei se essa "revolta" com o nonsense da peça não é uma espécie de despeito. Inveja de uma época em que parecia ser possível viver de forma mais livre, mais descompromissada, ainda mais se você morasse em uma cidade com sol e mar o ano inteiro. Deve ser por isso que as pessoas de 30 estão ávidas por tudo que os anos 80 representaram. Para quem começou a se entender por gente nessa época, é a referência de uma fase mais solta, mais rock'n roll mesmo. Você assistiu ao filme do Cazuza? Duvido que não tenha saído do cinema com vontade de aproveitar mais a vida e deixar de lado um pouco dessa caretice.

Para saber mais
Festival de Teatro de Curitiba

Para ir além






Adriana Baggio
Curitiba, 24/3/2005

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