Nos penhascos de mármore, de Ernst Jünger | Ricardo de Mattos | Digestivo Cultural

busca | avançada
53307 visitas/dia
2,5 milhões/mês
Mais Recentes
>>> Aluna da Alma vence festival nacional de violoncelistas
>>> Curta gravado na Chapada dos Veadeiros estreia no Teatro A Barca Coração
>>> Evento: escritora Flavia Camargo lança livro 'Enquanto Vocês Crescem' no dia 4 de maio
>>> Helena Black em Meu Avô Samantha leva diversão às Bibliotecas Municipais discutindo etarismo e preco
>>> Cristina Guimarães canta Luiz Melodia em seu primeiro álbum, Presente & Cotidiano
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Mario Vargas Llosa (1936-2025)
>>> A vida, a morte e a burocracia
>>> O nome da Roza
>>> Dinamite Pura, vinil de Bernardo Pellegrini
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
Colunistas
Últimos Posts
>>> El País homenageia Vargas Llosa
>>> William Waack sobre Vargas Llosa
>>> O Agent Development Kit (ADK) do Google
>>> 'Não poderia ser mais estúpido' (Galloway, Scott)
>>> Scott Galloway sobre as tarifas (2025)
>>> All-In sobre as tarifas
>>> Paul Krugman on tariffs (2025)
>>> Piano Day (2025)
>>> Martin Escobari no Market Makers (2025)
>>> Val (2021)
Últimos Posts
>>> O Drama
>>> Encontro em Ipanema (e outras histórias)
>>> Jurado número 2, quando a incerteza é a lei
>>> Nosferatu, a sombra que não esconde mais
>>> Teatro: Jacó Timbau no Redemunho da Terra
>>> Teatro: O Pequeno Senhor do Tempo, em Campinas
>>> PoloAC lança campanha da Visibilidade Trans
>>> O Poeta do Cordel: comédia chega a Campinas
>>> Estágios da Solidão estreia em Campinas
>>> Transforme histórias em experiências lucrativas
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Meu Marido, de Livia Garcia-Roza
>>> Los Hermanos
>>> Solidariedade na colméia
>>> Entredentes, peça de Gerald Thomas
>>> O ponto final da escrita cursiva
>>> Preconceitos
>>> Millôr Fernandes, o gênio do caos
>>> Superficiais
>>> Superficiais
>>> A moral da dúvida em Paulo Leminski
Mais Recentes
>>> Dorohedoro Vol. 6 de Q Hayashida pela Panini (2022)
>>> Meu Anjo de Fausto Oliveira pela Seame (1996)
>>> Testemunha Do Passado de Francisco Martins pela Panorama (2001)
>>> Escola De Almas de Roberto de Carvalho pela Aliança (2009)
>>> Hitler de Joachim Fest pela Nova Fronteira (1991)
>>> O Livro De Ouro Dos Heróis Da História de Will Durant pela Ediouro (2002)
>>> Comédias de Plauto pela Cultrix (1978)
>>> Um Estudo Crítico Da História 2 volumes de Hélio Jaguaribe pela Paz E Terra (2001)
>>> Esboço de psicanálise de Sigmund Freud pela Imago (2001)
>>> Princípios básicos da música para a juventude 1º volume de Maria Luisa de Mattos Priolli pela Casa Oliveira de músicas (2009)
>>> Dictionnaire Du Xxie Siècle de Jacques Attali pela Fayard (1998)
>>> Napoleão E Josefina de Evangeline Bruce pela Record (1997)
>>> 100 Maiores Lideres Militares Da História de Nigel Cawthorne pela Difel (2010)
>>> Churchill de Paul Johnson pela Nova Fronteira (2010)
>>> Bernoulli Ciências da Natureza e Matemática 2ª série volume 4 de George Campos de Oliveira pela Bernoulli Sistema de Ensino (2024)
>>> Curso de Direito do Trabalho - 14ª ed. de Carlos Henrique Bezerra Leite pela Saraiva (2022)
>>> Bernoulli Ciências da Natureza e Matemática 2ª série volume 3 de George Campos de Oliveira pela Bernoulli Sistema de Ensino (2024)
>>> Nação Dopamina: Por Que O Excesso De Prazer Está Nos Deixando Infelizes E O Que Podemos Fazer Para Mudar de Anna Lembke pela Vestígio (2023)
>>> Deixe-me Apresentar Você! Descubra Sua Verdadeira Identidade de Talitha Pereira pela Vida (2019)
>>> Bernoulli - Língua Inglesa 2ª série volume 1 de Sérgio d'Assumpção pela Bernoulli Sistema de Ensino (2024)
>>> Jacu Rabudo de Hein Leonard pela Todapalavra (2015)
>>> KiT C/5 Livros: As Melhores Receitas De Lanches E Aperitivos + Arroz Massas e Risotos + Carnes + Frango e peixes + Bolos Sobremesas e Doces de Culturama pela Culturama
>>> Tex Edição De Ouro V.90 - Os Irmãos Donegan de G. L. Bonelli; A. Galleppini pela Mythos (2017)
>>> A Origem dos Continentes e Oceanos de Alfred Wegener pela Datum (2021)
>>> História dos Hebreus - obra completa de Flávio Josefo pela Casa Publicadora da Assembléia de Deus (1990)
COLUNAS

Segunda-feira, 10/8/2009
Nos penhascos de mármore, de Ernst Jünger
Ricardo de Mattos
+ de 9200 Acessos
+ 1 Comentário(s)

"Todos conheceis a profunda melancolia que nos cerca, ao recordarmos tempos felizes." (Ernst Jünger)

O escritor alemão Ernst Jünger viveu 102 anos: de 1895 a 1998. Assistiu a tudo no curto século de Hobsbawm: duas guerras mundiais, a Guerra Fria, os conflitos menores, a sucessão dos papas, movimentos libertários e artísticos, ascensão e queda do comunismo, construção e demolição do muro de Berlin, a chegada do homem à Lua, a evolução do telégrafo à internet. O Prêmio Nobel começou a ser entregue seis anos após seu nascimento. Fugiu de casa aos dezoito anos para integrar a Legião Estrangeira, no norte da África. Lutou na Primeira Guerra Mundial, onde foi ferido diversas vezes. Após frequentar as universidades de Leipzig e de Nápoles, gradua-se biólogo especializado em entomologia, isto é, estudioso dos insetos. Sua formação acadêmica inclui-o no seleto grupo de escritores entomólogos: Goethe, Maeterlinck e Nabokov. Escreveu obra numerosa abrangendo romances, política, biologia, cartas e diários. Destacam-se os romances Tempestade de Aço, de 1920, e Nos penhascos de mármore (CosacNaify, 2008, 200 págs.), de 1940, ora reeditada no Brasil.

Retornando da Guerra de 1914-1918, Jünger indignou-se com a submissão da Alemanha imposta pelo Tratado de Versalhes. Engaja-se em defesa do nacionalismo defendendo, em síntese, a guerra como único "impulso de transformação histórica"; a queda da democracia; e estabelecimento de uma ditadura liderada por um führer. Entretanto, quando o Partido Nacional-Socialista chegou ao poder pela urna, revoltou-se. Pelo que se entende, defendia uma ditadura esclarecida, que honrasse o nível cultural então alcançado, o que não foi bem o caso de Adolf Hitler. Com as devidas mudanças, pode ter sido o último platônico. Apesar dos contatos teóricos iniciais, nunca aderiu ao nazismo como seria de se esperar do seu ímpeto juvenil. Recusou qualquer vinculação ao regime, mesmo que oferecida de conjunto a um cargo financeiramente atraente. Muitos de seus posicionamentos foram alterados pelo contato com a realidade. Rascunhando textos de cunho antissemita, rejeitou-os ao apaixonar-se e casar-se com uma judia. Também não idealizou impunemente a guerra. Como cidadão alemão e ex-soldado, foi convocado a lutar pela Alemanha na Segunda Guerra Mundial. Não deve ter sido o melhor momento de sua vida lutar a favor do que criticava.

Nos penhascos de mármore, escrito entre fevereiro e julho de 1939, e publicado no começo de 1940, costuma ser apresentado como roman à clef. Duas podem ser as acepções da expressão. A primeira refere-se à obra que, sozinha, permite entender a totalidade do trabalho de um escritor. Seria aquela que encerra suas principais indagações, seu posicionamento moral, literário, filosófico, político etc. A segunda é aplicável a obras que possibilitam o aguçamento da visão quando dirigida a um evento ou fase da História. Este é o sentido próprio ao romance ora comentado. Jünger apreendeu a essência dos fatos, filtrando e destilando tudo que testemunhou, tudo que vivenciou. Escreveu assim excelente narrativa. O resultado não é uma beberagem que queima a garganta, mas um licor que acalenta o espírito.

A trama desenrola-se em Marina Grande, país imaginário que resume toda a Europa. Seria o local onde cada povo do passado e do presente, bem como de cada um dos pontos cardeais, deu a sua contribuição para o aprimoramento cultural e civilizatório. No curso da história, descobre-se que não só o cenário, porém animais, plantas, personagens históricos e raças caninas são fictícios ou deslocados de seu habitat original em prol da ficção. Haveria numa aldeia o Eremitério, onde o narrador-personagem teria se retirado para dedicar-se a estudos botânicos em companhia de Irmão Otho. Apesar de claramente inspirado no seu irmão, no livro não é irmão de sangue, mas um antigo companheiro de batalha retirado à vida monástica. Difícil o texto consultado que não tenha feito a confusão. O que Jünger quer passar ao leitor é a ideia de região amena, onde a cultura adquire corpo e sofisticação, afastada do burburinho citadino, mas não tanto que coíba celebrações regulares. A paz seria tão grande a ponto de uma criança poder brincar tranquila entre cobras e lagartos. Daí o assombro com livre curso da barbárie num seio que deveria rejeitá-la de início. "O império deles não passa de uma grande terrina onde se vai cozendo a guerra", como teria observado Saint-Exupéry.

Segue-se a inversão paulatina deste estado contemplativo. A caterva vitoriosa em importante batalha anterior atua cada vez mais atrevidamente na vida social, política e institucional de Marina Grande. Forma partido encarregado de disseminar o horror e a destruição, encontrando aquela receptividade que causou estranheza ao narrador. Segundo ele, seriam pessoas que, incapazes de conceber ou de compreender o Belo, tomam por missão destruí-lo. "O mal prevalece porque os bons são tímidos". A Malícia nunca é brusca. Ela não rouba, apropria-se. Para isso, sua aproximação é cautelosa, cordial. Abraça para estudar punhalada futura. Quando não há mais o que disfarçar e a ruína consuma-se, Jünger cria uma batalha impressionante, na qual até os cães são envolvidos ativamente na fúria, remetendo-nos aos tempos romanos. Outra não é a origem dos mastins napolitanos.

Nos penhascos de mármore foi publicado com a Guerra de 1939-1945 já iniciada. Fatos e pessoas são reconhecíveis, mas parece não ter havido um embasamento exclusivo na construção de certos personagens. A exceção evidente é o monteiro-mor, líder do extermínio inspirado em Hitler. "Monteiro" era o empregado responsável pela supervisão de área florestal destinada à caça. Lembre-se do amante de Lady Chartelley. "Monteiro-mor" era o oficial de casa real, encarregado de organizar as caçadas da realeza. Além de menos óbvio que general, almirante ou brigadeiro, monteiro-mor é um título oficial, mas não militar, o que sabe a certa ironia. Zomba de quem se julga grande comandante e sequer pertence às forças armadas, ou pretende-se águia tendo envergadura de pardal. No sétimo capítulo, vemos um dos melhores esboços do führer verdadeiro: "Como nos velhos beberrões, seus olhos se inflamavam num traço de vermelhidão, mas, ao mesmo tempo, havia neles uma inabalável expressão de astúcia e de poder ― por vezes, de soberania".

Jünger queria uma sociedade dominante pela ciência, pela tecnologia e alta cultura, mesmo que imposta pela força bélica. Os acontecimentos decorrentes do privilégio do embrutecimento extinguiram-lhas melhores expectativas. Seu propagandismo nacionalista foi profundamente revisto e sua indignação transparece no romance. Não deve errôneo afirmar que o escritor contou com ele para negar ou esclarecer os escritos anteriores, para diferenciar entre o defendido em tese e o ocorrido de fato. "Naquela época, agradava-nos a sua proximidade ― vivíamos em estado de grande excitação e sentávamos à mesa dos poderosos do mundo (...) Tão logo percebemos essa falha, tratamos de repará-la".

Nota do Autor
O mesmo colunista teve publicado recentemente um texto na Revista da ABRAME ― Associação Brasileira de Magistrados Espíritas ―, também disponível on-line.

Para ir além






Ricardo de Mattos
Taubaté, 10/8/2009

Mais Ricardo de Mattos
Mais Acessadas de Ricardo de Mattos em 2009
01. O delfim, de José Cardoso Pires - 19/10/2009
02. Charles Darwin (1809-2009) - 16/11/2009
03. Américas Antigas, de Nicholas Saunders - 27/4/2009
04. Evolução e Adaptação da Imprensa Escrita - 23/3/2009
05. Nos penhascos de mármore, de Ernst Jünger - 10/8/2009


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
10/8/2009
16h43min
Obrigado, Ricardo de Mattos!, por resenhar esta obra-prima da literatura. Logo nas linhas iniciais do primeiro capítulo de "Nos penhascos de mármore", o referido texto nos empurra para uma leitura de perder o fôlego. Acrescento, aqui, a importância dos notáveis prefácio e posfácio contidos na bela edição da CosacNaify, redigidos, respectivamente, por Antonio Candido e Tercio Redondo (também tradutor desta magnífica obra). abs do Sílvio Medeiros. Campinas, é inverno de 2009.
[Leia outros Comentários de Sílvio Medeiros]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




O Homem Perfeito - o Meu Deve Estar Em Algum Lugar
Vanessa Bosso
Novo Conceito
(2014)



A Denúncia
Leonardo Sciascia
Rocco
(1988)



Vida Obra e época de Paulo Setúbal um Homem de Alma Ardente
Fernando Jorge
Geração
(2008)



Ousadia de Verão
Barbara Delinsky
Bertrand Brasil
(2006)



Monet
William C. Seitz
Abrams
(1982)



Trilogia O Teste 419
Joelle Charbonneau
Única
(2014)



Eletrônica Industrial
Gianfranco Figini
Hemus
(1982)



Manual da Constituição de 1988
José Afonso da Silva
Malheiros
(2002)



Poemas Inspirados em Contos de Fadas: Outra Vez Era Uma Vez
Colégio Nossa Senhora de Sion
Peregrina
(2012)



A Missão Do Povo Que Sofre
Carlos Mestrers
Vozes
(1981)





busca | avançada
53307 visitas/dia
2,5 milhões/mês