O Oratório de Natal, de J. S. Bach | Ricardo de Mattos | Digestivo Cultural

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Quinta-feira, 26/12/2002
O Oratório de Natal, de J. S. Bach
Ricardo de Mattos
+ de 16100 Acessos

Johann Sebastian Bach - 1.685/1.750 - encerrou a composição do seu Oratório de Natal no mês de outubro de 1.734, ocorrendo sua primeira execução nas comemorações natalinas do mesmo ano. A evidente finalidade d'esta obra era celebrar o nascimento de Jesus Cristo, e esta homenagem ao facto máximo do cristianismo verifica-se no decorrer e alternância de 31 recitativos, catorze corais, dez árias, oito coros, dois ariosos, um quarteto, um terceto, um dueto e uma sinfonia.

Bach foi um homem de entranhada e madura religiosidade. Uma crença fervorosa e sincera transparece em suas obras sacras, e diante d'isso podemos calcular seu senso de responsabilidade ao compor um oratório pelo advento d'Aquele que tanto amou. O compositor era luterano, mas esta peça é tão bonita e possui nobreza tal que já comovia, e ainda comove, pessoas de credo diverso. Ao romper esta barreira, já mostra uma primeira face de sua excelência.

O texto-base do Oratório de Natal é formado por trechos dos Evangelhos segundo São Lucas e São Mateus, complementado com versos de Christian Friedrich Henrici, dito "Picander". Este poeta é autor do texto de várias cantatas e da Paixão Segundo São Mateus. Muitas foram, contudo, as intervenções de Bach. Não há como acompanhar o Oratório sem ler o texto, e quem, como eu, não fala alemão, deve procurar uma versão acompanhada da tradução. Não é difícil ouvir a música em alemão, ler o trecho e sua tradução ao mesmo tempo.

Oratório e cantata, nos séculos XVII e XVIII, são géneros musicais a apresentar certa confusão, e a peça de Natal ora comentada pode trazer ainda mais dúvidas. O oratório irmana-se à ópera por descender dos mistérios medievais, dela diferindo apenas pela temática, pois inicialmente era acompanhado até de acção, cenário e costume. A cantata nada mais é além de uma peça profana para ser cantada e tem sua origem nos madrigais, ainda da Idade Média. Tínhamos então peças para serem cantadas - cantatas - e peças para serem tocadas - toccatas. Até aqui tudo simples e claro. Introduzindo na cantata o coro, levando-a para a igreja e no oratório substituindo-se a encenação pela narração - ficando esta a cargo do narrador ou historicus - confundiram-se os géneros. Talvez a única diferenciação restante seja a extensão, sendo maior a do oratório. Além disso, uma cantata pode ser religiosa ou profana - a Cantata do Café, do próprio Bach - mas um oratório será sempre religioso ou, no mínimo, de orientação religiosa, como As Estações, de Haydn. Este Oratório de Natal mostra bem a referida mistura, porém é um caso proposital. Na igreja de São Tomás, em Leipzig, para a qual foi composto, as celebrações natalinas estendiam-se por seis dias: 25, 26 e 27 de dezembro, primeiro e seis de janeiro e o primeiro domingo do ano. Assim, ou para não fraccionar uma peça única, ou para não repetir a mesma durante esses seis dias, Bach dividiu-o em seis partes, ou seis cantatas, reunidas de forma mais ou menos uniforme. Recebeu algumas críticas não só pela indefinição do género - nada tão indefinido assim, convenha-se - como pelo aproveitamento da música e texto de outras cantatas. O novo aproveitamento não era hábito exclusivo de Bach, mas a ocupação de alguns compositores levava a tal proceder. Vivaldi utilizou na ária Dell'aura al sussurrar o conhecido tema do allegro da Primavera.

O carácter geral do Oratório é glorificar, exaltar o espírito pelo nascimento do Messias, sendo assim oposto ao das Paixões, nas quais predominam a consternação e o drama. Com este objectivo de alegrar as almas, a primeira peça é um retumbante coro, ao qual os trompetes e tímpanos conferem um carácter de intrata:

Regozija-vos, cantai de alegria! Louvai estes dias!
Abandonai vossos temores, cessai vossos prantos,
Entoai hinos de regozijo e alegria!
Uni vossas vozes para cantar a glória do Altíssimo,
Adoremos o nome do Todo Poderoso!

Após o coro, inicia-se a narrativa, com a viagem de José e Maria de Nazareth à Belém. O parto ocorre e a contralto, primeiro em recitativo, depois em ária, admoesta Sião a bem receber o Salvador dos judeus, já padecentes do jugo romano. Cristo nasceu sob Augusto e foi crucificado na era de Tibério. Dando-se o parto no presépio, um coro de sopranos acompanhado do baixo - não ainda no papel de Herodes - acentua a humildade do facto ("Pobre veio à terra/Quem saberá honrar como merece/ O Amor que nos oferece nosso Salvador?"). O mesmo baixo, na ária seguinte, lembra a pouca importância do meio escolhido para nascer por aquele que reina sobre o mundo. Além d'isso, percebemos em vários momentos um capricho de ternura bem próprio de Bach, que curiosamente lembra-nos os escritos de Santa Terezinha do Menino Jesus e São Pedro Julião Eymard. Repare-se no coral Ach mein herzliebes Jesulein - Ah, meu bem amado Jesusinho! Aqui Bach demonstra o amor mencionado, referindo-se ao Menino como se pudesse estar pessoalmente com ele.

A segunda parte inicia-se com uma sinfonia pastoral substituindo um previsível coro, e melhor escolha Bach não poderia ter feito. Pastoral é uma obra vocal ou instrumental que pela melodia e emprego de certos instrumentos (flauta, oboé) pretende reproduzir um ideal de vida simples e pacífica, tal como imaginou-se sempre, nas Artes, ser a dos pastores. Pesquisando este ideal, chegamos em Virgílio. Ulisses desejou, em certa altura da Odisseia, ter nascido um mero pastor. Portanto, a escolha da sinfonia pastoral para iniciar a segunda parte, ou segunda cantata, é perfeita para retractar o ambiente rústico do nascimento de Jesus. Pode-se afirmar que toda esta cantata é pastoral, pois o tema da sinfonia repete-se no último coral, só retornando no coro de abertura da quarta parte.

Segundo a mensagem da segunda parte, os simples serão os primeiros a encontrar Jesus Cristo, e nos Evangelhos encontramos o desenvolvimento doutrinário desta assertiva. Basta ler o Sermão da Montanha. A última ária de contralto é uma canção para embalar o Recém Nascido. Esta parte foi apresentada pela primeira vez há exactos 268 anos.

Se na segunda cantata os pastores são avisados por um anjo - soprano - do nascimento de Jesus, na terceira eles efectivamente visitam-no. O mesmo coro do início é o do final (da capo), responsável pela volta do clima de júbilo. Deve-se reparar no duo de soprano e baixo Herr dein Mitled, dein Erbarmen - Senhor, Tua piedade, Tua Misericórdia.

A quarta parte, segundo o plano de comemorações da igreja de São Tomás, foi executada em primeiro de janeiro de 1.735. Por isso a primeira menção que o Evangelista faz em seu recitativo é à circuncisão e baptismo de Jesus, factos celebrados no dia. Após um arioso emoldurado por dois recitativos, segue-se a curiosa ária Flösst, mein Heiland, flösst dein Namen - Poderia, meu Salvador, poderia seu Nome. Nela temos duas sopranos, a segunda servindo de eco para a primeira. Eco mesmo: a primeira termina um verso e a segunda repete a última palavra apenas, de preferencia com o inte'rprete fora de cena. E um oboé ecoa esta segunda soprano. Este efeito do eco pode ser percebido também no concerto Audi , coelum do orato'rio Vésperas da Virgem Maria de Cláudio Monteverdi (1.567/1.643) e mais recentemente, na ária de Violetta Follie! Delírio vano é questo! na famosa ópera La Traviata de Giuseppe Verdi (1.831/1.901) Bach dedicou toda esta parte à relação entre o homem e Jesus, bem como a Sua palavra.

Um mui alegre coro complementado por vozes infantis inaugura a quinta cantata, dedicada à chegada dos Magos e à reacção de Herodes ao receber a notícia. Muita atenção para a ária Erleucht' auch meine finstre Sinnen - Ilumina também meus escuros sentidos, na qual o baixo é acompanhado pelo órgão e pelo oboé.

Um coro épico abre a sexta e última cantata, apresentada na Epifania de 1.735. Por este motivo Bach destacou a visita dos Reis Magos ao Menino, embora também se discorra sobre a ordem de Herodes e à fuga de José e Maria. Esta a cantata mais dramática de todo o conjunto, transpirando tensão e aflição. O alívio pela salvação do Menino recompõe, no quarteto e coral finais, a sobreexcitação e alegria dominantes em todo o Oratório. Nada adianta eu tagarelar sobre esta excelente obra. Ela deve ser apreciada e sua contribuição para um Natal melhor será inafastável.


Ricardo de Mattos
Taubaté, 26/12/2002

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